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econômica Faculdade de Ciências Econômicas UFRGS ano 17 Março, 1999 n 31 I lllih.

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Faculdade

de Ciências Econômicas

UFRGS

econômica

Balança Comercial e Capacidade

Produtiva da Indústria de Transformação - F I á v i o B e n e v e t t F l i g e n s p a n - J e f e r s o n L u i s B i t t e n c o u r t

Breves Reflexões sobre a Relevância da História da Teoria Econômica - G i i b e r t o T a d e u L i m a

A Competitividade do Arroz Gaúcho e seus Condicionantes

- A u g u s t o M . A l v i m - C a r l o s G . A . M i e l i t z N e t t o

Uma Análise da Economia de Ricardo - L i d e r a u S. M a r q u e s J u n i o r

A Estratégia de Substituição de Importações Revisitada - A l e x P e r e i r a B e n í c i o - J o a n í l i o R o d o l p h o T e i x e i r a

The Refinements of the Orthodox Macroeconomic Theory and the Post Keynesian Theory

- F e r n a n d o F e r r a r i F i l h o

Instrumentos de Gestão Ambiental - J a i l d o S a n t o s P e r e i r a - V i t o r E m a n u e l T a v a r e s

The Economic Implications for Sustainable Mining - D i n a F r a n c e s c h i - J a m e s R. K a h n

Mudança Institucional e Estrutural na

Economia Brasileira do Inicio dos Anos Noventa - E d u a r d o S i m õ e s d e A l m e i d a

lllih.

n ° 3 1

I

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL

Reitora: P r o f . Wrana Maria Panizzi

FACULDADE DE CIÊNCIAS ECONÔMICAS

Diretora: P r o f . Otilia Beatriz Kroeff Carrion

C E N T R O DE ESTUDOS E PESQUISAS ECONÔMICAS

Diretor. Prof. Fernando Ferrari Filho

DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS ECONÔMICAS

Chefe: Prof. Luiz Alberto Oliveira Ribeiro de Miranda

CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ECONOMIA

Coordenador. Prof. Marcelo Savino Portugal

CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ECONOMIA RURAL

Coordenador. Prof. Carlos Guilherme A. Mielitz Netto

CONSELHO EDITORIAL: Achyles B. Costa, Aray M. Feldens, Carlos A. Crusius, Carlos G. A. Mielitz Netto, Eduardo A. Maldonado Filho, Eduardo P. Ribeiro, Eugênio Lagemann, Fernando Ferrari Filho, Gentil Corazza, Mar-celo S. Portugal, Naii J . Souza, Otilia B. K. Carrion, Paulo A. Spohr, Paulo D. Waquil, Pedro C. D. Fonseca, Roberto C. Moraes, Ronald Otto Hillbrecht, Stefano Florissi, Eleutério F. S. Prado (USP), Fernando H. Barbosa (FGV/RJ), Gustavo Franco (PUC/RJ), João R. Sansón (UFSC), Joaquim P. Andrade (UnB), Juan H. Moldau (USP), Paul Davidson (Univ. of Tennes-see), Werner Baer (Univ. of Illinois).

COMISSÃO EDITORIAL: Eduardo Augusto Maldonado Filho, Fernando Ferrari Filho, Gentil Corazza, Marcelo Savino Portugal, Paulo Dabdab W a -quil; Roberto Camps Moraes,

EDITOR: Gentil Corazza

EDITOR ADJUNTO: Pedro Silveira Bandeira

SECRETARIA: Fábio Sparremberger. Revisão de textos: Vanete Rica-cheski.

FUNDADOR: Prof. Antônio Carlos Santos Rosa

Os materiais publicados na revista Análise Econômica são da exclusiva responsabilidade dos autores. É permitida a reprodução total ou parcial dos trabalhos, desde que seja citada a fonte. Aceita-se permuta com revistas congêneres. Aceitam-se, também, livros para divulgação, elaboração de resenhas e recensões. Toda correspondência, material para publicação (vide normas na terceira capa), assinaturas e permutas devem ser dirigidos ao seguinte destinatário:

PROF. GENTIL CORAZZA

Revista Análise Econômica - Av. João Pessoa, 52

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UMA ANÁLISE DA ECONOMIA DE RICARDO^

Liderau dos Santos Marques Junior^

R E S U M O

Este artigo a p r e s e n t a u m a releitura d o s Principios, particulai fuente d o s seis p r i m e i ros c a p í t u l o s e, a l é m d i s s o , o e s b o ç o d o s i s t e m a r i c a r d i a n o c a n ó n i c o . A releitura c o n s t i -tui-se e m u m e x a m e d e t a l h a d o da teoria d a d i s t r i b u i ç ã o d e r e n d a d e R i c a r d o e o e s b o ç o , u m a i n t e r p r e t a ç ã o n ã o f o r m a l i z a d a d a teoria r i c a r d i a n a . N o e s b o ç o e x p l i c i t a m s e o s s u -p o s t o s r i c a r d i a n o s e e x -p l i c a m - s e os m o t i v o s d a e c o n o m i a t e n d e r -para o e s t a d o estacio-nário.

C ó d . A E A : 0 4 0 Palavras-chave: e c o n o m i a d e R i c a r d o , teoria d a distribuição d e r e n d a , s i s t e m a ricardiano.

A B S T R A C T

T h i s article p r e s e n t s a rereading of Principles, e s p e c i a l l y of first six c h a p t e r s , b e -s i d e -s it p r e -s e n t -s a -s k e t c h o f c a n o n i c a l ricardian -s y -s t e m . T h e r e - r e a d i n g i-s a detailed e x a m o n t h e R i c a r d o ' s t h e o r y of i n c o m e distribution a n d t h e s k e t c h is a not f o r m a l interpretation of r i c a r d i a n t h e o r y . In t h e s k e t c h the ricardians s u p p o s i t i o n s a r e explicited a n d the r e a s o n s to t h e e c o n o m y t e n d s t o e s t a c i o n a r y e s t a t e are e x p l a i n e d .

A E A C o d e : 0 4 0 Key words: R i c a r d o ' s e c o n o m i c s , t h e o r y of i n c o m e d i s t r i b u t i o n , ricardian s y s t e m .

^Este t r a b a l h o é b a s e a d o na s e g u n d a parte d a d i s s e r t a ç ã o d e m e s t r a d o d o autor, cujo título é Sistemas ricardianos: uma revisão e um esboço do sistema ricardiano canónico. A g u i s a d e i n f o r m a ç ã o , n a primeira parte d a d i s s e r t a ç ã o t r a t o u - s e d e revisar muitas d a s i n t e r p r e t a ç õ e s d a e c o n o m i a d e Ricardo d e s d e a i n t e r p r e t a ç ã o d e Sraffa ( 1 9 8 2 ) . A p r o v e i t a s e e s t e e s p a ç o p a r a , m a i s u m a v e z , a g r a d e c e r a o p r o f e s s o r R o b e r t o C a m p s d e M o r a es por ter s i d o o m e u orientador. C o m o d e p r a x e , r e s e r v a s e a o a u t o r a inteira r e s p o n s a -bilidade p e l a s i m p e r f e i ç õ e s r e m a n e s c e n t e s .

^Mestre e m E c o n o m i a ( U F R G S ) .

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1 - INTRODUÇÃO

O tema deste trabalho é a economia de Ricardo. O seu objeto principal é a teoria da distribuição de renda de Ricardo. Isto posto, o trabalho está assim dividido: na segunda seção apresenta-se uma releitura dos

Princípi-os, ou seja, examinam-se os principais pontos dos seis primeiros capítulos

dos Princípios e conclui-se com um rhodelo não formalizado, no qual o autor do presente artigo explicita os pressupostos de Ricardo, entre os quais o de que a economia é fechada, a tecnologia é dada e o salário monetário é go-vernado apenas pelo preço do trigo. Baseando-se principalmente nestes

pressupostos, conclui-se que a economia tende para o estado estacionário, situação na qual tanto a população quanto o capital param de crescer. Na terceira seção, estabelece-se o esboço do sistema ricardiano canónico, ou seja, interpretação também não formalizada, fiel e, pretensamente, conclu-siva acerca da teoria da distribuição de renda ricardiana. Nesta explicitam-se os supostos ricardianos, entre os quais o de que não há progresso técni-co na etécni-conomia, a cesta de técni-consumo dos trabalhadores é técni-composta princi-palmente de alimentos e as atividades que utilizam mais intensivamente o fator terra apresentam retornos decrescentes, enquanto as atividades que utilizam mais intensivamente os fatores trabalho e capital apresentam retor-nos constantes. Conclui-se então que, à medida que o capital e a população crescem, a tendência da economia é em direção ao estado estacionário, situação na qual a taxa de lucro é muito baixa, o que desestimula os capita-listas a realizarem investimentos. Ocorrendo isto, não serão mais garantidos os fundos para o crescimento da massa dos salários e, portanto, também a população cessa de crescer. Finalmente, na quarta e última seção apre-sentam-se as considerações finais, entre as quais incluem-se os pontos que distinguem o esboço do sistema canónico do modelo não formalizado com o qual se conclui a releitura.

2 - RELEITURA DOS PRINCÍPIOS

O primeiro ponto a ser esclarecido nesta seção é sobre o principal pro-blema com o qual Ricardo se defronta nos Princípios. Para os objetivos do presente artigo é suficiente considerar que Ricardo, no prefácio da sua obra, é categórico ao afirmar que determinar as leis que regulam a distribui-ção do produto total era a principal questão da Economia Política.

O segundo ponto é sobre o valor. Na primeira seção do capítulo 1 dos

Princípios, Ricardo afirma que a primeira causa de variação nos valores

relativos é a quantidade relativa de trabalho necessária para a produção de uma mercadoria. Para ele, o que regula o valor de troca de uma mercadoria não é a remuneração paga aos trabalhadores, mas sim a quantidade de

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trabalho contida na mesma, portanto todo acréscimo na quantidade de tra-balho deve aumentar o valor da mercadoria e toda diminuição deve reduzi-lo.^ Na segunda seção, Ricardo estabelece que embora os trabalhos de diferentes qualidades sejam remunerados diferentemente, "Isso não é cau-sa de variação no valor relativo das mercadorias" (Ricardo, 1982, p.48) Na terceira seção, Ricardo leva em conta o trabalho gasto em máquinas, fer-ramentas e edificações e, mesmo assim, a segunda causa de variação dos valores, qual seja, as variações de salários, não opera.^ Na quarta seção, ao considerar que o grau de durabilidade dos capitais (fixo e circulante) e as proporções dos mesmos variam de uma atividade para outra, então o au-mento ou redução dos salários causa variação no valor.® Porém, argumenta Ricardo, "essa causa de variação do valor das mercadorias é comparativa-mente pequena nos seus efeitos". Assim sendo, para todos os efeitos, a causa de variações no valor relativo das mercadorias é a maior ou menor quantidade de trabalho. Na quinta seção, ao considerar a desigual durabili-dade do capital e a desigual rapidez de retorno do capital ao aplicador, Ri-cardo reforça a idéia de que a variação na quantidade de trabalho não é a única causa de variações dos valores relativos.^ Na sexta seção, embora reconheça a inexistência de uma medida perfeita do valor, Ricardo estabe-lece como sendo o ouro a mercadoria cujo valor é invariável.® Na sétima e última seção, Ricardo distingue os aumentos de salários que provocam redução dos lucros dos que não provocam tal efeito. No caso de aumento dos salários, resultante de uma alteração no valor do ouro, produz-se um

' D a i ele c o n c l u i q u e q u a n t o m a i o r a f a c i l i d a d e para suprir o s u s t e n t o d o t r a b a l h a d o r , o u seja, m e n o r q u a n t i d a d e d e t r a b a l h o na p r o d u ç ã o d a s m e r c a d o r i a s c o n s u m i d a s p e l o tra-balhador, m e n o r s e r á o v a l o r d o t r a b a l h o . •'isto é, R i c a r d o s u p õ e c o m o d a d a a e s c a l a d e v a l o r e s d a s d i f e r e n t e s q u a l i d a d e s o u tipos d e t r a b a l h o : " S e u m dia d e t r a b a l h o d e u m j o a l h e i r o v a l e m a i s q u e u m dia d e t r a b a l h o d e u m t r a b a l h a d o r c o m u m , e s t a r e l a ç ã o foi há m u i t o t e m p o a j u s t a d a e c o l o c a d a na d e v i d a p o s i ç ã o na e s c a l a d e v a l o r e s " .

Isto, d a d a s a s s e g u i n t e s c o n d i ç õ e s : m o n t a n t e s iguais de capital fixo e capital c i r c u l a n t e e m p r e g a d o s n a p r o d u ç ã o d a s m e r c a d o r i a s , igual d u r a b i l i d a d e d o capital e igual d u r a ç ã o d o t e m p o d e p r o d u ç ã o .

®É i m p o r t a n t e o b s e r v a r q u e o s p r e ç o s d a s m e r c a d o r i a s , q u e a n t e s e r a m r e g u l a d o s s o -m e n t e pela q u a n t i d a d e d e t r a b a l h o , a g o r a , p a s s a -m a ser r e g u l a d o s t a -m b é -m p e l o t e -m p o d i s p e n d i d o p a r a l a n ç a r u m a m e r c a d o r i a n o m e r c a d o .

''Ainda n e s t a s e ç ã o , e l e trata d o s e g u i n t e efeito: "na m e d i d a e m q u e o capital fixo p r e p o n -dera e m u m a indústria, o v a l o r d a s m e r c a d o r i a s ali p r o d u z i d a s s e r á , e m c a s o d e a u m e n t o d e salários, r e l a t i v a m e n t e m e n o r q u e o d a q u e l a s f a b r i c a d a s e m i n d ú s t r i a s o n d e p r e p o n -dera o capital c i r c u l a n t e " . ^Assim, p o d e - s e e s t i m a r o s p r e ç o s e os v a l o r e s d a s d e m a i s m e r c a d o r i a s e m t e r m o s d e tal m e r c a d o r i a e, m a i s d o q u e isso, c o n s i d e r a r q u e t o d a s a s a l t e r a ç õ e s d e p r e ç o s s ã o o c a s i o n a d a s por m u d a n ç a s n o v a l o r d a s próprias m e r c a d o r i a s e n ã o n o v a l o r d a m e d i d a p a -d r ã o .

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efeito geral sobre os preços, sem efeito real algum sobre os lucros. No caso de aumento dos salários, "resultante do fato de serem os trabalhadores mais liberalmente remunerados, ou de uma dificuldade de obter os gêneros de primeira necessidade nos quais os salários são gastos", então haverá uma redução dos lucros.

Em suma, no primeiro capítulo, Ricardo identifica a principal causa de variação dos valores relativos das mercadorias, que é a quantidade de tra-balho necessária para produzir as mercadorias; define como medida do valor o ouro, que é uma mercadoria cujo valor não se altera auando varia a quantidade de trabalho empregada nas demais mercadorias; e, em último lugar, distingue o aumento dos salários que gera redução dos lucros do aumento que não gera tal efeito.

O terceiro ponto é sobre a renda da terra. Para Ricardo, a renda "é a porção do produto da terra paga ao seu proprietário pelo uso das forças originais e indestrutíveis do solo", ou ainda, é remuneração paga aos pro-prietários de terras pela utilização das forças produtivas da mesma. Para ele, não haveria pagamentos de rendas se a terra fosse ilimitada em quan-tidade e uniforme na qualidade, pois, neste caso, nada seria pago pelo seu uso. No entanto, como este não é o caso, paga-se renda e sua magnitude dependerá da diferença de qualidade entre as faixas de terra utilizadas para cultivo (margem extensiva) ou da diferença "entre os produtos obtidos com o emprego de duas quantidades iguais de capital e de trabalho" na mesma

^Sraffa ( 1 9 8 2 ) e s c l a r e c e q u e o p r o b l e m a ricardiano d a m e d i d a d e valor era o d e e n c o n t r a r u m a m e r c a d o r i a q u e t i v e s s e a s c a r a c t e r í s t i c a s d e u m a m o e d a e q u e o s e u valor n ã o v a r i a s s e , f o s s e pela e l e v a ç ã o o u q u e d a d o s salários, f o s s e p e l o a u m e n t o o u r e d u ç ã o d a q u a n t i d a d e d e t r a b a l h o . Isto p o r q u e , c a s o o v a l o r d a m e r c a d o n a e s c o l h i d a c o m o m o e d a v a r i a s s e , e n t ã o n ã o se p o d e r i a d e t e r m i n a r os efeitos d e u m a v a r i a ç ã o nos salários s o b r e o s l u c r o s , o u s e j a , n ã o se poderia e s t a b e l e c e r a r e l a ç ã o i n v e r s a e n t r e lucros e salários. E m o u t r a s p a l a v r a s , s u p o n d o q u e o o u r o seja e s c o l h i d o c o m o m o e d a , s e poderia m e d i r o valor a g r e g a d o d a s m e r c a d o r i a s p r o d u z i d a s e m u m d e t e r m i n a d o p o n t o d o t e m p o . P o r é m h a v e n d o o a u m e n t o d o s salários e u m a m u d a n ç a no valor d o o u r o , p e r g u n t a - s e ; q u a l é o efeito d e tal a u m e n t o s o b r e os lucros n o a g r e g a d o ? O r a , d a d o q u e t o d a s o u a m a i o r i a d a s m e r c a d o r i a s t ê m o s s e u s v a l o r e s a l t e r a d o s e m o u r o , t a m b é m o valor a g r e g a d o é a l t e r a d o ; isto, portanto, impossibilita afirmar, c o m p r e c i s ã o , o efeito d o a u m e n t o d o s salários s o b r e o s lucros. S e g u n d o Sraffa (1982), a s o l u ç ã o d e Ricardo para e s t e p r o b l e m a foi a d e p r o -por u m a m e r c a d o r i a q u e f o s s e " p r o d u z i d a c o m u m a p r o p o r ç ã o tal d e a m b a s as c l a s s e s d e capital [fixo e circulante] q u e se a p r o x i m a o m á x i m o p o s s í v e l da q u a n t i d a d e m é d i a e m p r e g a d a n a m a i o r i a d a s m e r c a d o r i a s " o u " p r o d u z i d a c o m a s p r o p o r ç õ e s dos dois tipos d e capital m a i s p r ó x i m o s possíveis d a q u a n t i d a d e m é d i a " . A s s i m s e n d o , c a s o haja u m a u m e n t o d e s a l á r i o s , a l g u n s b e n s s o b e m d e p r e ç o e o u t r o s b a i x a m , d e p e n d e n d o d o l a d o d a m é d i a e m q u e e s t e j a m s i t u a d o s , p o r é m o p r e ç o m é d i o d a s m e r c a d o r i a s , o u seja, o valor d a m e r c a d o r i a p a d r ã o se m a n t e r i a o m e s m o . Sraffa e n t ã o a r g u m e n t a : se as m e r c a -dorias s ã o m e d i d a s e m tal p a d r ã o , o valor a g r e g a d o n ã o s e r á a l t e r a d o pela e l e v a ç ã o d o s salários, p o r t a n t o p o d e - s e afirmar c o m p r e c i s ã o a relação i n v e r s a entre salários e lucros

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terra (margem intensiva). Os montantes pagos como renda entre faixas de terra de diferente qualidade, mas igual emprego de capital e trabalho, são de tal monta que o que sobra para os agricultores é o mesmo produto líqui-do:

Tabela 1 - Renda paga em função da fertilidade decrescente das faixas de terra

(1) f a i x a s d e terra (2) p r o d u t o líquido* (3) r e n d a *

1 100 2 0

2 9 0 10

3 8 0 0

Fonte: Princípios, ( R i c a r d o , 1 9 8 2 , p.67). * e m quarters d e t r i g o .

Isto é, as rendas pagas pelas faixas de terra 1 e 2 (coluna 3) são parte do produto líquido (coluna 2), isto resultando em 80 quarters de trigo como lucros na três faixas de terra da tabela 1.

A mesma igualdade de lucros se dá quando se aplica igual montante de capital, mas obtêm-se produtos diferentes:

Tabela 2 - Renda paga em função dos

diferentes produtos obtidos com igual ca Ditai empregado

(1) m o n t a n t e d e c a p i t a l * (2) p r o d u t o * * (3) r e n d a * * 1000 1 0 0 0 1 0 0 0 100 8 5 7 5 2 5 10 0 Fonte: Princípios, ( R i c a r d o , 1 9 8 2 , p.67). * e m libras; * * e m quarters d e trigo.

Isto é, á medida que se emprega mais capital (coluna 1), o produto ob-tido decresce (coluna 2), e a renda, que é a diferença entre os produtos obtidos, aumenta (coluna 3). Em virtude do pagamento de rendas, os arren-datános obtêm igual montante de lucros ao do ijltimo arrendatário que não paga renda.^°

Para reduzir a renda da terra, ou melhor, para reduzir os preços relati-vos dos produtos agrícolas e, então, a renda da terra, Ricardo considera dois tipos de melhoramentos na agricultura que produziriam tais efeitos. O

^°Ricardo a f i r m a , a l é m d i s s o , q u e u m a d a s c o n s e q ü ê n c i a s d o e m p r e g o d e m a i s capital o u d o cultivo d e t e r r a s d e q u a l i d a d e inferior é o a u m e n t o d o valor d e troca d o s p r o d u t o s a g r í c o l a s . Este a u m e n t o d o v a l o r d e troca s e d á p o r q u e s e e m p r e g a m a i s t r a b a l f i o p a r a p r o d u z i - l o s e n ã o p o r q u e s e p a g a r e n d a . Isto é, n o c a s o d o trigo, p o r e x e m p l o , R i c a r d o a f i r m a : o "valor d o trigo é r e g u l a d o pela q u a n t i d a d e d e t r a b a l h o a p l i c a d a à s u a p r o d u ç ã o n a q u e l a q u a l i d a d e d e terra, o u c o m a q u e l a p o r ç ã o d e capital q u e n ã o p a g a r e n d a " , port a n port o , o "portrigo n ã o e n c a r e c e p o r c a u s a d o p a g a m e n port o d a r e n d a , m a s , a o c o n port r á r i o , a r e n -d a é p a g a p o r q u e o trigo t o r n a - s e m a i s caro".

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primeiro tipo é o que aumenta a capacidade produtiva da terra, ou seja, se deixa de cultivar a porção de terra menos produtiva ou se retira a porção de capital menos produtiva. O segundo tipo é o que com menos trabalho ob-tém-se o mesmo produto, ou seja, emprega-se menos capital na terra para se obter o mesmo produto, porém sem diminuir a extensão de terra cultiva-da. Em suma,

... qualquer fator que diminua a desigualdade entre os produtos obtidos com sucessivas porções de capital empregadas na mesma terra ou em novas terras tende a reduzir a renda, e que qualquer fator que aumente aquela desigualdade necessariamente pro-duz o efeito oposto, tendendo a elevá-la. (Ricardo, 1982, p.73)

Finalmente, Ricardo conclui que os proprietários de terras são dupla-mente beneficiados com o aumento da dificuldade de produção dos produ-tos agrícolas: primeiro porque recebem uma parcela maior do produto agrí-cola e segundo porque a mercadoria com a qual são pagos tem maior valor.

O quarto ponto trata da chamada "teoria do fundo de salários". Para Ri-cardo, a "população se regula pelos fundos destinados ao seu emprego, e, portanto, sempre cresce ou diminui de acordo com o aumento ou diminui-ção do capital" (Ricardo, 1982, p.70). Ele afirma ainda que toda redudiminui-ção de capital é seguida "... necessariamente por uma menor demanda de trigo, por uma queda de preços e por uma redução do cultivo" (Ricardo, 1982, p.70). Isto é, por uma redução da renda, isto porque a última porção de capital empregada ou a última faixa de terra cultivada torna-se mais produti-va. Caso inverso, todo aumento de capital é seguido de uma maior deman-da de trigo, por um aumento do seu preço e por uma elevação deman-da rendeman-da.

O quinto ponto refere-se aos salários. Para Ricardo, o trabalho é uma mercadoria cuja quantidade pode ser aumentada ou diminuída, portanto tem o seu preço natural e seu preço de mercado: o "preço natural é aquele necessário para permitir que os trabalhadores, em geral, subsistam e per-petuem sua descendência, sem aumento ou diminuição." (Ricardo, 1982, p.81); o "preço de mercado do trabalho é aquele realmente pago por este, como resultado da interação natural das proporções entre a oferta e a de-manda" (Ricardo, 1982, p.81). O primeiro "depende do preço dos alimentos, dos gêneros de primeira necessidade e das comodidades exigidas para sustentar o trabalhador e sua família"; o segundo depende da oferta e da demanda de trabalho: quando esta mercadoria é abundante, o seu preço é barato; quando ela é escassa, o seu preço é caro.^'

" A s s o c i a d o a e s s a d i s t i n ç ã o está a c h a m a d a "lei m a l t h u s i a n a da p o p u l a ç ã o " ( q u e , d i g a -se d e p a s s a g e m , é u m a v e r s ã o d o q u e M a l t h u s e s c r e v e u n o Ensaio sobre a População), q u e afirma o s e g u i n t e : q u a n d o o p r e ç o d e m e r c a d o d o t r a b a l h o e x c e d e o p r e ç o n a t u r a l , o n ú m e r o d e t r a b a l h a d o r e s t e n d e a crescer; c o n s e q ü e n t e m e n t e , os salários b a i x a m a t é se i g u a l a r e m a o p r e ç o n a t u r a l ; q u a n d o o p r e ç o d e m e r c a d o d o t r a b a l h o é inferior a o p r e ç o n a t u r a l , o n ú m e r o d e t r a b a l h a d o r e s t e n d e a diminuir; c o n s e q ü e n t e m e n t e , o p r e ç o d e

(9)

Isso posto, Ricardo define o que é salário monetário e o que é salário real. Salário monetário é a remuneração do trabalhador em moeda e o salá-rio real é a remuneração em termos de quantidade de mercadorias efetiva-mente consumidas pelo trabalhador. Os salários monetários dependem dos preços das mercadorias que compõem a cesta de consumo dos trabalhado-res e os salários reais dependem dos salários monetários e dos preços das mercadorias. Dado que os preços dos produtos agrícolas tendem a crescer com o progresso da riqueza e da população, os salários monetários tam-bém crescem, porém este crescimento não compensa a elevação dos pre-ços de todas as mercadorias consumidas pelo trabalhador, de maneira que os salários reais tendem a decrescer. A fim de esclarecer este ponto, Ricar-do propõe um exemplo, suponRicar-do que a cesta de consumo contém apenas trigo, no qual se nota a elevação do salário monetário e a queda do salário em trigo;

Tabela 3 - Elevação do salário monetário e queda do salário em trigo

(1) s a l á r i o a n u a l * (2) preço d o q u a r t e r d e t r i g o * (3) = (1)/(2) salário e m t r i q o * * 2 4 , 0 4,0 6,0 2 4 , 7 4 , 2 3 5,84 2 5 , 5 4 , 5 0 5,67 2 6 , 4 4 , 8 0 5,50 2 7 , 4 5,14 5,33

Fonte: Princípios, ( R i c a r d o , 1 9 8 2 , p.85). * e m libras; * * e m quarters

Isto é, o aumento do salário monetário (coluna 1) não compensa o au-mento do preço do trigo (coluna 2), de tal sorte que o salário real, medido em trigo, cai (coluna 3).

O sexto ponto é sobre os lucros. Para Ricardo, dado o fato de que nem o agricultor que cultiva a terra marginal e "nem o fabricante de manufatura-dos sacrificam qualquer parcela do produto para pagar renda", então o valor de qualquer mercadoria é dividido somente em duas partes, a saber, os lucros do capital e os salários do trabalho. Isto posto, considere-se a tabela abaixo:

m e r c a d o t e n d e a subir até se igualar a o p r e ç o n a t u r a l . A i n d a c o n f o r m e esta lei, a t a x a d e c r e s c i m e n t o d a p o p u l a ç ã o o u d a o f e r t a d e t r a b a l t i o é c o n s t a n t e , j á a t a x a d e c r e s c i m e n t o d a p r o d u ç ã o d e p r o d u t o s a g r í c o l a s é d e c r e s c e n t e . P o r t a n t o o p r e ç o d e m e r c a d o d o t r a -b a l t i o t e n d e a d e c r e s c e r a o l o n g o d o t e m p o . E m r e l a ç ã o a isto, R i c a r d o o -b s e r v a : " n ã o d e v e m o s e s q u e c e r , n o e n t a n t o , q u e [os salários] s ã o r e g u l a d o s t a m b é m pelos p r e ç o s d a s m e r c a d o r i a s e m q u e s ã o g a s t o s " . P o r último, R i c a r d o o b s e r v a q u e a taxa d e m e r c a d o p o d e p e r m a n e c e r a c i m a d a t a x a natural por u m p e r í o d o indefinido d e t e m p o e q u e o p r e ç o natural d o t r a b a l h o n ã o é a b s o l u t a m e n t e fixo e c o n s t a n t e , pois d e p e n d e " e s s e n c i -a l m e n t e d o s hábitos e c o s t u m e s d o s p o v o s " e v-ari-a -a o l o n g o d o t e m p o n u m m e s m o p -a i s e e n t r e p a í s e s .

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Tabela 4 - Determinação do produto livre de renda em libras

(1) número (2) produto* (3) renda* (4)=(2),5,142 (5)=(3).5,142 (6)=(4)-(5)

de homens produto** renda** prod. livre de renda**

10 180 40 925,6 205,7 720

10 170 30 874,1 154,3 720

10 160 20 822,7 102,8 720

10 150 10 771,3 51,4 720

10 140 0 720 0 720

Fonte: Princípios, ( R i c a r d o , 1982, p.92-3) * e m quarters d e trigo; * * e m libras.

Nota: o s d a d o s d a s c o l u n a s (4), (5) e (6) f o r a m o b t i d o s a o p r e ç o d e 5,142 libras o quarter d e trigo e l i g e i r a m e n t e a r r e d o n d a d o s . '

Isto é, à medida que se emprega mais homens em uma mesma porção de terra (coluna 1), o produto diminui (coluna 2); ao mesmo tempo, o preço do trigo sobe na mesma proporção da queda do produto, ficando em 5,142 libras o quarter de trigo - este preço é determinado pelos últimos dez ho-mens empregados na porção de terra. Nota-se, além disso, que em função das diferenças de produtos obtidos, se paga renda, à exceção dos últimos dez homens empregados que não pagam renda alguma. Note-se também que a renda total sobe em termos de trigo (coluna 3), e em termos de valor (coluna 5); dadas estas condições, o valor do produto livre de renda (gerado por cada grupo de dez homens na mesma porção), a ser repartido entre lucros e salários, é igual a 720 libras (coluna 6).

Então, baseado na Tabela 4, Ricardo demonstra a relação inversa en-tre salários e lucros:

Tabela 5 - Queda da participação dos lucros no produto livre de renda

(1) n ú m e r o d e h o m e n s

(2) preço d o trigo* (3) salário a n u a l * (4)=(1).(3) salários totais* (5) lucros totais* 10 4,0 24 2 4 0 4 8 0 10 4,23 24,7 2 4 7 4 7 3 10 4 , 5 0 25,5 2 5 5 4 6 5 10 4,80 26,4 2 6 4 4 5 6 10 5,14 27,4 2 7 4 4 4 6 F o n f e : Princípios, ( R i c a r d o , 1982,p.94).

Wofa: a c o l u n a (3) foi obtida da coluna (1) da t a b e l a 3.

' e m libras

Isto é, à medida que aumenta a quantidade de trabalho empregada em uma mesma porção de terra (coluna 1), o preço do trigo sobe na mesma proporção da queda do produto (coluna 2) e, conseqüentemente, o salário

^^Este p r e ç o d e 5,142 foi obtido a o se t r a n s f o r m a r o p r e ç o d e £ 5 2 s . 10 d . e m libras 6 6

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anual (monetário) pago aos trabalhadores também sobé (coluna 3), porém em menor proporção. Conseqüentemente, a participação dos salários no valor do produto livre de renda sobe (coluna 4), enquanto a participação dos lucros decresce (coluna 5).

A taxa de lucro é determinada pela relação entre os lucros, após o pa-gamento dos salários, e o montante de capital investido por cada arrendatá-rio ou fabricante. Considere-se a seguinte tabela, na qual se demonstra a queda da taxa de lucro decorrente do aumento da participação dos salários no produto livre de renda:

Tabela 6 - Queda da taxa de lucro

(1) lucros totais* (2) capital original* (3)= (1)/(2) t a x a d e lucro %

4 8 0 3 0 0 0 16

4 7 3 3 0 0 0 15,8

4 6 5 3 0 0 0 15,5

4 5 6 3 0 0 0 15,2

4 4 6 3 0 0 0 14,9

Fonte: Princípios, ( R i c a r d o , 1 9 8 2 , p . 9 5 ) . * e m libras. Nota: c o l u n a (1) a d v é m d a c o l u n a (5) d a T a b e l a 5.

Repare-se que se emprega como capital original um montante fixo de 3.000 libras (coluna 2), para cada grupo de dez homens. Assim, com a queda dos lucros totais (coluna 1), a queda da taxa de lucro é um resultado natural (coluna 3).

Ricardo afirma então que a tendência natural dos salários e da renda é de elevação, ou seja, a participação da renda no excedente e a participação dos salários no valor do produto total livre de renda tendem a crescer. Por conseguinte, a tendência natural dos lucros é de queda, o mesmo aconte-cendo com a taxa de lucro.

Q sétimo e último ponto refere-se à ampliação da explicação básica da distribuição de renda, ou seja, refere-se às considerações de Ricardo acer-ca dos lucros, dos salários e a da renda no agregado. Riacer-cardo afirma:

O p r o d u t o d a terra e d o t r a b a l h o d o país d e v e a u m e n t a r e s e u valor a u m e n t a r á [ c o m a a c u m u l a ç ã o d e capital], n ã o s o m e n t e p e l o valor d o q u e se a c r e s c e n t o u à q u a n t i d a d e anterior d e p r o d u ç ã o , m a s t a m b é m pelo n o v o valor q u e s e c o n f e r e a o p r o d u t o d a terra, e m c o n s e q ü ê n c i a da m a i o r d i f i c u l d a d e de o b t e r a última p o r ç ã o . M a s , q u a n d o a a c u m u l a ç ã o d e capital s e t o r n a m u i t o g r a n d e , a p e s a r d e s e u m a i o r valor, e l e s e r á distribuído d e tal f o r m a q u e u m valor m e n o r d o q u e a n t e s s e r á a p r o p r i a d o c o m o l u c r o , e n q u a n t o a u m e n t a r á a q u e l e d e s t i n a d o à r e n d a e a o s s a l á -rios. ( R i c a r d o , 1 9 8 2 , p.99).

Portanto, para Ricardo, com a acumulação de capital, o produto da ter-ra e do tter-rabalho do país cresce em quantidade e valor, porém a sua distri-buição varia, aumentando a participação dos salários e da renda e

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diminu-indo a dos lucros. Ricardo busca esclarecer esta idéia ampliando o exemplo das Tabelas 4 e 5 da seguinte maneira:

se o capital empregado fosse bastante grande para proporcionar 100 mil vezes 720 libras, ou 72 milhões de libras, os lucros totais seriam 48 milhões de libras, quando o preço do quarter áe trigo fosse 4 libras; 105 mil vezes 720 libras seriam obtidas quando o trigo estivesse a 6 libras, ou o equivalente a 75,6 milhões de libras, e os lucros dimi-nuiriam de 48 milhões de libras para 44,1 milhões de libras, ou 105 mil vezes 420 li-bras, e os salários aumentariam d e 24 milhões d e libras para 31,5 milhões Os salários aumentariam porque mais trabalhadores seriam empregados, em proporção ao capital, e cada trabalhador receberia maiores salários monetários. Mas, a situação do trabalha-dor, como já mostramos, pioraria, pois ele somente poderia comprar uma quantidade menor dos produtos do pais Os únicos reais ganhadores seriam os proprietários de terra; eles receberiam maiores rendas, primeiramente porque o produto teria valor mais alto, e, além disso, porque receberiam uma parte muito maior da produção (Ricardo, 1982, p.99)

Isto é, à medida que se acumula capital, o valor do produto livre de renda cresce em função do próprio aumento da produção e da maior dificul-dade de obtê-lo. Todavia há uma variação na distribuição do valor do pro-duto livre de renda em detrimento dos lucros, ou seja, os salários totais aumentam porque mais trabalhadores são empregados e porque os salários monetários são maiores. Estes crescem, porém, em menor proporção do que o preço do trigo, daí a piora na situação do trabalhador, ou seja, em termos reais consomem uma quantidade menor dos produtos do país. Quanto à participação da renda no valor do produto total, ela cresce porque os produtos agrícolas têm valor mais alto e porque os proprietários de terra obtêm em termos reais uma parte maior do produto.

Ricardo então conclui:"... em todos os países e em todas as épocas, os lucros dependem da quantidade de trabalho exigida para prover os traba-lhadores com gêneros de primeira necessidade, naquela terra ou com aquele capital que não proporciona renda." (Ricardo, 1982, p.100). Portanto, um país com solos de baixa fertilidade e onde se proíbe a importação de alimentos, qualquer taxa de acumulação de capital implicará grandes redu-ções da taxa de lucros e um rápido aumento da renda da terra. Já um país com solos férteis e, principalmente, onde a importação de alimentos é livre, a acumulação de capital poderá ser elevada, pois não acarretará grandes reduções na taxa de lucro nem em grande aumento da renda da terra.

Para concluir esta seção, estabelece-se agora um modelo não formali-zado. A fim de tratar do problema da divisão do produto total entre as três classes (proprietários de terras, proprietários de capital e trabalhadores), Ricardo estabeleceu os seguintes pressupostos: na produção de trigo há rendimentos decrescentes seja na margem extensiva, seja na margem in-tensiva; a economia é fechada, ou seja, não importa trigo; a tecnologia é dada, ou seja, não há aperfeiçoamentos técnicos ou inovações tecnológi-cas; o ouro é a mercadoria cujo valor é invariável e a libra é a moeda que o

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representa; o preço do trigo sobe à medida que as dificuldades de produção aumentam, ou seja, à medida que a quantidade de trabalho para produzi-lo aumenta; o salário monetário é governado apenas pelo preço do trigo.

Então, uma vez que se tenha acumulado muito capital, de tal modo que o valor do produto livre de renda tenha atingido um valor bastante alto (por exemplo, 72 milhões de libras), uma nova adição de capital elevará o valor do produto livre de renda para, por exemplo, 75,6 milhões de libras - isto em função da adição de capital e do maior preço do trigo. O valor do produto livre de renda, antes da adição de capital e ao preço de 4 libras o quarter de trigo, era assim dividido: 48 milhões de libras para os lucros e 24 milhões de libras para os salários. Com a adição de capital, o preço do quarter de trigo passa a custar 6 libras e o valor do produto livre de renda passa a ser assim dividido: 44,1 milhões de libras para os lucros e 31,5 milhões de libras para os salários. Portanto a queda da participação dos lucros resultou do au-mento dos salários monetários e do auau-mento do emprego de mais trabalha-dores. Conseqüentemente, a taxa de lucro se reduziu, pois, além do mon-tante dos lucros totais ter se reduzido em quase 4 milhões de libras, o ca-pital acumulado aumentou ainda mais.^^

Isso posto, Ricardo afirma que as atividades industriais também sofrem uma redução dos lucros, cuja causa é a elevação dos salários monetários.^'' Assim sendo, se se mantiverem todos os pressupostos do modelo e a população e o capital continuarem a crescer, não importante se a taxas iguais ou diferentes, pois o que realmente governa os salários monetários é o preço do trigo, é evidente que se manterá a tendência de queda da parti-cipação dos lucros no valor do produto livre de renda. Quando a taxa de lucro chegar a um ponto em que nenhum proprietário de capital se sente estimulado a investir, se atingiu o estado estacionário, no qual tanto a po-pulação quanto o capital não crescem mais.

3 - ESBOÇO DO SISTEMA RICARDIANO CANÓNICO

A lista de supostos ricardianos para explicar a distribuição de renda entre proprietários de capital, proprietários de terras e os trabalhadores,

" L e m b r a n d o q u e a r e n d a d a terra n a d a m a i s é d o q u e a q u e l a parte d o valor d o p r o d u t o u s u r p a d a d o s a r r e n d a t á r i o s d e terra q u e n ã o t ê m o u t r a alternativa se n ã o a d e p a g a r a o s p r o p r i e t á r i o s d e terras

^"Para o b t e r e s t e r e s u l t a d o , R i c a r d o e s t á p r e s s u p o n d o q u e os capitalistas i n v e s t e m e n -q u a n t o a t a x a d e lucro for c o n s i d e r a d a satisfatória, -q u e há plena c o n c o r r ê n c i a , -q u e o s r e n d i m e n t o s s e j a m c o n s t a n t e s e q u e o s p r e ç o s d o s p r o d u t o s i n d u s t r i a l i z a d o s s e m a n t e -n h a m c o -n s t a -n t e s . D e f a t o , R i c a r d o a d m i t e q u e o s p r e ç o s das m e r c a d o r i a s p o d e r i a m ser a u m e n t a d o s por c a u s a d a e l e v a ç ã o d o s s a l á r i o s e, m e s m o a s s i m , o s lucros c a i r i a m E n t r e t a n t o , p o r e l e n ã o t e r d e s e n v o l v i d o e s t a p a r t e d e s e u a r g u m e n t o , é q u e s e c o n s i d e r a q u e os p r e ç o s dos p r o d u t o s i n d u s t r i a l i z a d o s se m a n t e n h a m c o n s t a n t e s .

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tanto a curto como a longo prazo, é um tanto longa. O primeiro suposto diz respeito à medida invariável de valor. Como se viu na seção anterior, embo-ra Ricardo reconhecesse a inexistencia de uma mercadoria cujo valor não variasse em função de mudanças na taxa de lucro ou na quantidade de trabalho, ainda assim, ele supõe que o ouro ç uma mercadoria que apre-senta as principais características de uma moeda; necessita sempre da mesma quantidade de trabalho para obter a mesma quantidade de ouro; e é produzido "com as proporções dos dois tipos de capital [circulante e fixo] mais próximas possíveis da quantidade média empregada na produção da maior parte das mercadorias". Portanto o seu valor não varia, seja pela ele-vação ou queda dos salários, seja pelo aumento ou redução da quantidade de trabalho.''

Quanto à causa de variação do valor relativo, Ricardo, mesmo reco-nhecendo que a variação de salários é uma das causas de variação dos valores das mercadorias, supõe que a principal causa é a maior ou menor quantidade de trabalho necessária para produzi-las, tanto que a primeira pode ser desconsiderada.'®

No que tange aos itens da cesta de consumo do trabalhador, Ricardo considera que os principais são os alimentos. Associado a isto, supõe-se que os hábitos e costumes da sociedade não se alteram ao longo do tempo; portanto não há mudança dos itens que fazem parte da cesta de consumo do trabalhador nem mudanças dos produtos ofertados. Além disso, supõe-se que o que regula os salários monetários são os preços dos itens que compõem a cesta, isto porque, no caso dos salários monetários não au-mentarem quando há uma subida dos preços dos itens da cesta, haverá uma redução do número de trabalhadores e, portanto, uma menor demanda

' ^ A s s o c i a d o a e s s e s u p o s t o , e s t á o d e q u e a libra esterlina é o p a p e l m o e d a q u e r e p r e -s e n t a a m e d i d a invariável d e v a l o r e é nela q u e -s ã o e x p r e -s -s o -s t o d a -s a -s v a r i á v e i -s d o s i s t e m a . A i n d a c o m r e l a ç ã o a e s t e s u p o s t o , o b s e r v a - s e q u e o principal p a p e l d a m e d i d a invariável d e valor no s i s t e m a r i c a r d i a n o é o d e q u e o s p r e ç o s d a s m e r c a d o r i a s v a r i e m e m f u n ç ã o a p e n a s d a m a i o r o u m e n o r q u a n t i d a d e d e c a p i t a l . A s s i m , s e o v a l o r d o p r o d u t o total (ou a g r e g a d o ) a u m e n t a r é p o r q u e a u m e n t o u o valor d a s m e r c a d o r i a s e/ou p o r q u e a u m e n t o u a oferta d e p r o d u t o s . D e s s a m a n e i r a se p o d e c o m p a r a r e m t e r m o s r e a i s a distribuição d e r e n d a n o s dois m o m e n t o s , o anterior e o posterior a o a u m e n t o d e c a p i t a l . E m outras p a l a v r a s , a o s e d e s c a r t a r u m a a l t e r a ç ã o no p r ó p r i o v a l o r d o o u r o e, por c o n s e g u i n t e , n o v a l o r d o p a p e l m o e d a , se e s t á , de fato, d e s c o n s i d e r a n d o a s v a r i a ç õ e s n o m i -nais nos p r e ç o s d a s m e r c a d o r i a s e p o r t a n t o , v a r i a ç õ e s n o m i n a i s no p r o d u t o t o t a l .

' ^ A s s o c i a d o a e s s e s u p o s t o , e s t á o d e q u e o c u s t o d e p r o d u ç ã o d e q u a l q u e r m e r c a d o r i a inclui s o m e n t e salários e lucros, o u s e j a , as r e m u n e r a ç õ e s d o s t r a b a l t i a d o r e s e d o s c a p i -talistas, r e s p e c t i v a m e n t e .

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por alimentos com a conseqüente interrupção do processo de acumulação de capital.^''

Em relação ao fator de produção terra, Ricardo postula que é um fator que não pode ter a sua quantidade aumentada pelo trabalho. Associado a isto, supõe então que a terra seja dividida em porções ou faixas e que haja uma classificação entre as mesmas em termos de fertilidade; além disso, supõe que a ocupação das porções é feita em ordem decrescente, ou seja, da mais fértil até a menos fértil. Em relação aos fatores capital e trabalho, Ricardo afirma que "O capital é a parte da riqueza de um país empregada na produção, e consiste em alimentos, roupas, ferramentas, matérias-primas, maquinaria, e t c , necessários à realização do trabalho." (Ricardo, 1982, p.82). Portanto o capital é dividido em capital fixo e capital circulante, não podendo ser reduzido a alimentos, roupas, e t c , que é a parte da rique-za nacional destinada aos trabalhadores.

Como se viu, Ricardo considera apenas a atividade produtora de trigo e supõe que a mesma apresenta rendimentos decrescentes, tanto na margem intensiva como na extensiva. A partir disso, supõe-se que existam inúmeras atividades que produzam diversos produtos. Portanto o produto total não se constitui somente em trigo. Além disso, supõe-se que as atividades produti-vas que utilizam principalmente o fator terra apresentam rendimentos de-crescentes; já as demais atividades que utilizam mais intensivamente os fatores capital e trabalho apresentam rendimentos constantes. Tais supos-tos têm a seguinte implicação: os valores dos produsupos-tos que utilizam mais o fator terra aumentam com a acumulação de capital, enquanto os valores dos demais produtos mantêm-se constantes.

Supõe-se ainda que há plena concorrência entre os capitalistas em to-dos os mercato-dos, ou seja, os fatores capital e trabalho são livremente des-locados entre as atividades na busca da maior taxa de lucro.

Em relação a quem recebe a renda e como ela é gasta, supõe-se o se-guinte: os proprietários de capital são os que recebem os lucros e investem tudo o que poupam; os proprietários de terra recebem as rendas da terra e gastam tudo em consumo; já os trabalhadores recebem os salários e gas-tam tudo na compra dos itens componentes da cesta de consumo.

Outro suposto é o de que não há qualquer tipo de avanço ou progresso técnico na economia. A razão é bastante óbvia: se se admitesse o progres-so técnico (ou seja, uma mudança na proporção dos fatores ou uma subs-tituição entre os fatores, ou ainda, as duas coisas juntas, de tal modo que os rendimentos nas atividades produtivas crescem, com a conseqüente queda dos preços das mercadorias), então seria logicamente incorreto

su-^"^Lembre-se q u e , para R i c a r d o , a t e n d ê n c i a d o s salários m o n e t á r i o s é a d e c r e s c e r e m m e n o s d o q u e os p r e ç o s d o s a l i m e n t o s , o u seja, os salários reais t e n d e m a cair c o m a a c u m u l a ç ã o d e c a p i t a l .

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por rendimentos decrescentes nas atividades que utilizam intensivamente o fator terra e rendimentos constantes nas atividades que utilizam intensiva-mente os fatores capital e trabalho.

O último suposto é o de que a economia é fechada, ou seja, não há li-vre comércio de bens e serviços, tampouco há imigração e emigração de trabalhadores. Caso contrário, se poderia importar, por exemplo, trigo e, neste caso, resumidamente, deixar-se-ia de cultivar uma porção de terra menos fértil, o que provocaria uma redução no preço do trigo (pois o capital antes aplicado nesta porção seria deslocado para outra atividade), uma queda do salário monetário e, por conseguinte, uma elevação da taxa de lucro não só na atividade produtora de trigo, mas também em todas as ou-tras, isto porque o montante pago como salários seria reduzido.

Dados esses supostos, suponha-se que se adicione um determinado montante de capital (decorrente dos investimentos realizados pelos capita-listas) sobre um montante bastante grande de capital e, portanto, a popula-ção cresça a uma determinada taxa, a conseqüência imediata destes fato-res é o aumento da demanda por produtos. A fim de fazer frente a este au-mento de demanda agregada, e lembrando que não se pode importar pro-dutos do exterior, as atividades intensivas em terra ocupam novas porções de terras, menos férteis, e/ou empregam mais capital nas porções já ocu-padas, enquanto as atividades intensivas em capital e trabalho empregam mais capital; conseqüentemente, há uma elevação da oferta agregada de produtos compatível com a elevação da demanda agregada.

Contudo, dado que não há progresso técnico, os preços dos produtos se comportam diferentemente nos diversos setores. Nas atividades intensi-vas em terra, há uma elevação de preços, decorrente dos rendimentos de-crescentes, ou seja, ao se empregar mais capital nestas atividades o pro-duto em vez de crescer ele decresce. Portanto os preços sobem na mesma proporção da queda relativa do produto a fim de igualar as taxas de lucro à taxa obtida pelo capital ou porção de terra menos produtiva. Nas atividades intensivas em capital e trabalho, os preços se mantêm os mesmos devido aos rendimentos constantes, ou seja, ao se empregar mais capital nestas atividades, o produto cresce na mesma proporção do aumento de capital, de maneira que os preços se mantêm constantes.

Pelo fato de os alimentos serem mercadorias produzidas nas atividades intensivas em terra ou que tenham sua origem nas mesmas, seus preços se elevam em decorrência da adição de capital. Como os alimentos são o prin-cipal item da cesta de consumo do trabalhador e como os salários monetá-rios são governados pelos preços dos produtos que participam da cesta.

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então a elevação dos preços dos alimentos provoca a elevação, embora em menor proporção, dos salários monetários per capita}^

Depreende-se, portanto, que houve uma queda da participação dos lu-cros nos produtos por atividade econômica. Isto é, nas atividades intensivas em terra, a participação da renda no excedente do produto de cada ativida-de cresceu porque a última porção ativida-de capital ou a última porção ativida-de terra tornou-se menos produtiva. Além disso, devido ao crescimento dos salários monetários per capita e ao aumento do número de trabalhadores emprega-dos nessas atividades, aumenta a participação emprega-dos salários no valor do produto livre de renda de cada atividade econômica. Já nas atividades in-tensivas em capital e trabalho, caiu a participação dos lucros no valor do produto porque tanto os salários monetários per capita como o emprego de trabalhadores aumentaram. A conseqüência lógica da queda dos lucros em cada atividade econômica e do aumento de capitai empregado nas mesmas é a queda geral das taxas de lucros, que igualam-se por força da concor-rência entre os capitalistas.

Em suma, no agregado, os efeitos da adição de um certo montante de capital sobre um montante bastante grande de capital são os seguintes: o produto total da economia aumenta, haja vista que se ofeilou mais produtos a fim de satisfazer a maior demanda; porém a distribuição de renda varia, pois diminui a participação dos lucros no valor do produto total livre de ren-da. A razão disto é apenas uma: o aumento da participação dos salários no valor do produto total livre de renda em decorrência da elevação dos salári-os monetárisalári-os per capita e do aumento do número de trabalhadores empre-gados. Conseqüentemente, a taxa geral de lucro decresce, igualando-se às taxas de lucros obtidas em cada atividade econômica. Quanto à participa-ção da renda da terra no excedente do produto total, esta cresce porque cresceram as participações das rendas da terra em cada atividade econô-mica intensiva em terra.

Finalizando o sistema canónico, se a acumulação de capital continuar, ou seja, se os capitalistas continuarem investindo, então a população conti-nuará crescendo, pois estarão garantidos os fundos para a manutenção dos trabalhadores. Todavia se se mantiverem os supostos do modelo, princi-palmente o de que a economia é fechada e sem progresso técnico, então a tendência da distribuição de renda é no seguinte sentido: a participação dos lucros se torna cada vez menor e, e m contrapartida, maior é a participação da renda da terra e dos salários. Porém, como se viu, em termos reais os que mais se beneficiam deste estado de coisas são os proprietários de

ter-" O u t r o f a t o a ser d e s t a c a d o é o d e q u e a r e n d a é c a l c u l a d a c o n f o r m e a d i f e r e n ç a d o s p r o d u t o s o b t i d o s entre as d i f e r e n t e s f a i x a s d e terra o u e n t r e os d i f e r e n t e s m o n t a n t e s - d e c a p i t a l . P o r t a n t o , e m f u n ç ã o d a a d i ç ã o d e c a p i t a l , há u m a e l e v a ç ã o n o s p a g a m e n t o s d e r e n d a s f e i t o s pelos a r r e n d a t á r i o s .

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ras. Assim sendo, a tendência da taxa de lucro é de queda que cessa quando atinge um nível, não necessariamente igual a zero, que desestimula os capitalistas a realizarem investimentos. Quando isto acontecer, não se-rão mais garantidos os fundos para o crescimento da massa de trabalhado-res e, portanto, também a população cessa de ctrabalhado-rescer. Chama-se esta situ-ação de estado estacionário.

4 - CONSIDERAÇÕES FINAIS

A primeira consideração refere-se à relação de causa e efeito que existe entre salários e preços: se os preços dos bens que compõem a cesta de consumo do trabalhador aumentam, então os salários se elevam. Para Ricardo, o contrário não é verdadeiro, isto é, variações nos salários não provocam alterações nos preços. Por quê? Porque se os preços sobem em decorrência de uma elevação dos salários então não há como estabelecer a relação inversa entre lucros e salários em cada atividade econômica ou em nível agregado. Em outras palavras, resumidamente, se se adiciona mais capital ao montante já existente, os preços das mercadorias produzidas pelas atividades intensivas em terra sobem e com eles os salários monetá-rios, isto provocaria, então, se se aceita o inverso da relação causai, uma subida generalizada dos preços. Ora, neste caso, a participação dos lucros não se reduziria e, portanto, não se poderia estabelecer a relação inversa, isto porque o valor do produto livre de renda a ser repartido entre lucros e salários aumentaria por duas razões, o aumento do emprego de capital e o aumento dos salários.

A segunda consideração refere-se à Lei de Say (que diz que toda oferta cria a sua própria demanda). Como se viu, problemas como o de subconsumo (demanda agregada menor que a oferta agregada) ou de su-perprodução (oferta agregada maior que a demanda agregada) inexistem na análise, isto porque se supõe que os capitalistas investem em capital todo o lucro obtido, os trabalhadores gastem em bens de salário todo o salário recebido e os proprietários de terra gastem em bens de consumo toda a renda recebida. Se assim não fosse, poderia haver problemas de escassez ou superoferta em determinados mercados e, portanto, desequilí-brio no agregado entre a oferta e a demanda. Mas, mesmo que isto ocor-resse, o desequilíbrio seria passageiro, pois os capitalistas que estivessem operando naquelas atividades de menor taxa de lucro (ou seja, onde há excesso de oferta) deslocariam o seu capital para as atividades de maior taxa de lucro (ou seja, onde há excesso de demanda). Desse modo, se estaria solucionando os desequilíbrios nos mercados e também equalizando as taxas de lucro.

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A terceira consideração propõe que se se admitir apenas o livre comér-cio de bens e serviços no sistema, então o comportamento da distribuição de renda já não será o mesmo como o descrito pelo sistema canónico. A razão é muito simples: com o livre comércio se pode, por exemplo, importar trigo ao invés de produzi-lo em uma porção de terra menos fértil. Assim, os custos de produção do trigo se reduzem e, conseqüentemente, também os salários monetários per capita. Havendo esta queda dos salários, a taxa de lucro na atividade produtora de trigo aumenta, assim como em todas as outras atividades econômicas. Isto é, aumenta a participação dos lucros no valor do produto livre de renda. Assim sendo, a importação possibilita aos capitalistas obterem maiores lucros, o que é fundamental para se dar conti-nuidade ao processo de acumulação de capital. Pode-se então perguntar: o que aconteceria com aquele capital que estava empregado na porção de terra menos fértil antes da importação? A resposta é muito simples: ele se desloca, por força da concorrência, para uma outra atividade para a qual haja demanda. Desse modo, mantém-se o pleno emprego no sistema.

A quarta e última consideração diz respeito aos pontos que distinguem o esboço do sistema canónico do modelo não formalizado com o qual se concluiu a releitura: a cesta de consumo é composta principalmente de ali-mentos e não apenas de trigo; supõe-se, explicitamente, que a terra é divi-dida em porções (ou faixas), classificadas em termos de fertilidade e que a ocupação das porções é feita em ordem decrescente, ou seja, da mais fértil até a menos fértil; supõe-se que as atividades produtivas que utilizam prin-cipalmente o fator terra não produzem apenas trigo e apresentam rendi-mentos decrescentes; já as demais atividades que utilizam mais intensiva-mente os fatores capital e trabalho produzem diversas mercadorias e apre-sentam rendimentos constantes; outra diferença é a explicitação dos su-postos a respeito do comportamento dos agentes econômicos: os proprietá-rios de capital são os que recebem os lucros e investem tudo o que pou-pam; os proprietários de terra recebem a renda da terra e a gastam inte-gralmente em consumo; já os trabalhadores recebem os salários e os gas-tam totalmente na compra dos itens componentes da cesta de consumo; por último, o esboço do sistema canónico supõe explicitamente que a eco-nomia é fechada e que não há progresso técnico.

Finalizando, o esboço do sistema ricardiano canónico se distingue da releitura dos Princípios porque explicita todos os supostos e as hipóteses ricardianas que fundamentam a argumentação de Ricardo em torno da questão da distribuição de renda. Desse modo, estabelece-se uma inter-pretação fiel e, possivelmente, conclusiva sobre a teoria da distribuição de renda ricardiana.

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Referências

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