TÍTULO: Higiene Industrial no Fabrico de Louça Metálica – Algumas considerações
AUTORIA: Factor Segurança
PUBLICAÇÕES:TECNOMETAL n.º 116 (Maio/Junho de 1998)
1. HIGIENE INDUSTRIAL: GENERALIDADES
A higiene industrial é definida como uma técnica ou ciência não médica que se dedica à identificação e quantificação dos contaminantes do ambiente de trabalho, assim como à avaliação da exposição dos trabalhadores a esses contaminantes. Por fim e para as situações de risco estabelece medidas preventivas adequadas ao factor humano, às matérias-primas e aos equipamentos de trabalho.
Actuando de um modo quase exclusivo na atmosfera dos locais de trabalho, tem como principais objectivos criar e manter condições de trabalho que não prejudiquem a saúde dos trabalhadores e que sejam as mais adequadas à psicologia e fisiologia dos trabalhadores. Prevenindo assim o aparecimento de doenças profissionais e aumentando o bem-estar psico-social e simultaneamente a produtividade e a satisfação no trabalho.
Para a realização destes objectivos a Higiene Industrial conta com quatro áreas fundamentais: a Higiene de Campo, a Higiene Analítica, a Higiene Teórica e a Higiene Operativa.
- A Higiene de Campo é considerada a “pedra angular” da Higiene Industrial e está ligada à Higiene operativa. Recolhe nos postos de trabalho e/ou ambiente todos os elementos para o estudo da situação higiénica. Para tal é necessário realizar-se uma identificação de potenciais riscos, é importante a observação rigorosa das instalações, do processo produtivo, dos equipamentos e materiais, dos métodos de trabalho e da própria organização do trabalho. A recolha do maior número de elementos é de extrema importância e deve ser realizada por um técnico especializado, de modo a permitir uma análise correcta do local de trabalho. Pois esses dados serão posteriormente analisados com a colaboração das outras áreas, dando origem a resultados, a partir dos quais se emitirão conclusões e recomendações, com vista a solucionar o problema em questão.
- A Higiene Analítica faz a determinação qualitativa e quantitativa dos poluentes existentes no ambiente. Na generalidade há sempre mais do que um contaminante no ambiente de trabalho. Na fase da quantificação dos factores
ambientais, a exactidão dos seus resultados vai depender, não só da calibração dos aparelhos de medida, da recolha de amostras de ar para análise laboratorial posterior e da qualidade destas análises (determinadas por métodos analíticos padronizados), mas também dos locais e altura das medições e colheitas.
- A Higiene Teórica estuda a relação dose-resposta, isto é a relação contaminante - tempo de exposição - homem e estabelece valores padrão de referência, níveis de acção ou valores limite de exposição (VLE), para os quais a maioria das pessoas não sofre qualquer tipo de alteração funcional. A correcta avaliação da exposição do trabalhador requer conhecimento das tarefas desempenhadas e da sua duração, a integração destes dois elementos é comparada com os referidos valores limite fixados por lei, normas, recomendações ou orientações.
- A Higiene Operativa - efectua estudos no sentido de prevenir, eliminar ou reduzir a situação de risco para níveis aceitáveis. Propõe correcções (medidas construtivas e medidas organizacionais) e/ou medidas preventivas a adoptar de modo a conseguir-se que as condições ambientais permaneçam, dentro de limites não perigosos para a saúde do homem. É fundamental que o estabelecimento de medidas correctivas e/ou preventivas se adaptem à situação concreta dos postos de trabalho e se desenvolvam acções de sensibilização para que as medidas em causa sejam aceites por todos os intervenientes: trabalhadores, chefias e empregadores.
Para que a Higiene Industrial se desenvolva eficaz e eficientemente ela necessita da colaboração e cooperação de todos os outros sectores ligados à actividade industrial.
2. PRINCIPAIS AGENTES AGRESSIVOS LIGADOS AO SECTOR DAS LOUÇAS METÁLICAS
O fabrico das louças metálicas é uma actividade inserida no ramo das indústrias metalúrgicas e metalomecânicas, que possui um ciclo produtivo bastante complexo, atendendo não só ao conjunto de operações que efectua, mas também aos variadíssimos equipamentos de trabalho, assim como as matérias-primas e outros produtos manuseados.
Resumidamente, o ciclo fabril envolve operações de corte, rebarbagem, estampagem, desengorduramento (por solvente ou alcalino e electrolítico), soldadura (por brasagem, por pontos), lixagem, polimento, lavagem, aplicação de acessórios e embalagem. Poderá ainda incluir revestimento a metal (niclagem de acessórios), tratamento químico e pintura.
Para o desenvolvimento deste processo de fabrico são necessárias matérias-primas, como aço inox, alumínio, latão, e produtos químicos, como o tricloroetileno, hidróxido de sódio, soluções ácidas, etc. que ao serem maquinadas e manuseadas durante a laboração existe a possibilidade de se libertarem para o ar ambiente vários tipos de poluentes, entre os quais se destacam:
Agentes físicos: ruído, temperatura, humidade. Agentes químicos:
- Metais - alumínio, ferro, níquel,….
- Nevoeiros ácidos - ácido sulfúrico, ácido nítrico, ácido clorídrico, ácido crómio,…
- Nevoeiros alcalinos - hidróxido de sódio
- Solventes - tricloroetileno (desengorduramento), tolueno, xileno, acetona (pintura)...
- Empoeiramento (polimento e lixagem). - Fumos: fumos da soldadura.
Para se verificar se existem situações de risco de exposição profissional é necessário aplicar a metodologia da higiene industrial, que como se pode verificar no ponto 1 envolve várias fases, desde a identificação, quantificação e avaliação com aparelhos certificados e calibrados segundo normas e organismos credenciados e por último a prevenção ou controlo caso se verifiquem situações de risco.
Os aparelhos para a quantificação dos poluentes podem ser de dois tipos: aparelhos de leitura directa - sonómetro e dosímetro para medir o ruído; - “monitor de stress térmico” para medir a temperatura; luximetro para medir a intensidade luminosa.
aparelhos de colheita de amostras de ar para posterior análise laboratorial com equipamentos e técnicas instrumentais validados por Institutos de referência, é o caso dos aparelhos para colheita dos agentes químicos.
A esta monitorização chama-se monitorização ambiental, que terá que ser complementada com a monitorização biológica, ou seja estudo dos indicadores biológicos no trabalhador (através do sangue e urina) e exames médicos (ex. audiometria - teste à audição), sendo estes da competência da medicina do trabalho.
Convém realçar que para estes poluentes existem dispositivos legais que obrigam as entidades empregadoras a proceder à sua avaliação como é o caso do ruído através do Decreto Regulamentar n.º 9/92 de 28 de Abril. Para os outros poluentes enumerados existem normas, recomendações e orientações, como é o caso da Norma Portuguesa NP 1796 (1988) – “Higiene e Segurança no Trabalho - Valores Limite de Exposição para substâncias nocivas existentes no ar dos postos de trabalho”.
3. EFEITOS NA SAÚDE DE ALGUNS POLUENTES LIBERTADOS DURANTE O PROCESSO PRODUTIVO
De acordo com as referências bibliográficas pesquisadas indica-se um resumo dos efeitos que alguns poluentes podem causar à saúde do trabalhador.
RUÍDO
O ruído afecta o trabalhador simultaneamente nos planos físico, psicológico e social. Pode com efeito:
Lesar os órgãos auditivos Perturbar a comunicação Provocar irritação
Ser fonte de fadiga
Diminuir o rendimento de trabalho
A surdez profissional é considerada doença profissional e é uma das patologias mais preocupantes devido à acção nociva do ruído.
As consequências do ruído não se limitam apenas à redução da capacidade auditiva. O ruído pode também afectar o organismo e provocar stress e outros efeitos psíquicos.
NÍQUEL
A inalação de nevoeiros de soluções com níquel origina rinites crónicas e o contacto com soluções deste metal provoca dermites alérgicas, podendo desenvolver-se eczemas crónicos.
HIDRÓXIDO DE SÓDIO E ÁCIDO SULFÚRICO
Os nevoeiros alcalinos e ácidos provocam irritação do tracto respiratório e lesões nas mucosas. O seu contacto com a pele provoca queimaduras.
TRICLOROETILENO
A inalação de vapores deste solvente provoca efeitos narcóticos, exercendo acção a nível do sistema nervoso central. Provoca dores de cabeça, intolerância ao álcool e por vezes alteração dos sinais neurológicos. O seu contacto com a pele provoca dermites.
4. MEDIDAS DE PREVENÇÃO E CONTROLO DOS RISCOS
A patologia do trabalho previne-se ou controla-se agindo sobre a fonte emissora, o ambiente agressor ou sobre a saúde individual susceptível de ser agredida.
Após feita a identificação, caracterização e avaliação dos riscos de exposição e portanto encontradas situações de risco, terão de ser desenvolvidos programas de prevenção técnica para controlo e correcção das situações de risco.
Entende-se por prevenção técnica a redução do grau de poluição do ambiente de trabalho para níveis aceitáveis.
Podemos diferenciar uma prevenção ambiental (colectiva) e uma prevenção individual (pessoal ou humana).
Sobre situações de risco a metodologia a seguir deve ter a seguinte sequência: 1º sobre a fonte emissora do poluente, 2º sobre o ambiente de trabalho geral (meio de difusão do poluente) 3º e só em último recurso a prevenção individual (receptor do poluente).
A prevenção ambiental (colectiva) é a base da prevenção contra os riscos profissionais.
As acções de prevenção técnica centram-se portanto:
Sobre o foco de poluição com o objectivo de impedir a libertação do poluente; Sobre o poluente já gerado para evitar a sua difusão;
Sobre o ambiente poluído de modo a limitar a concentração do poluente a níveis não nocivos;
Sobre o indivíduo, protegendo-se, para que o poluente não exerça sobre ele efeitos nocivos.
As medidas de controlo colectivas podem ser classificadas nas seguintes categorias apresentadas por ordem preferencial:
Eliminar os factores de risco: substituição de técnicas, processos e materiais (ex. substituição do tricloroetileno por um produto menos tóxico, automatizar o processo de desengorduramento);
Segregar no espaço, instalando à parte as operações com risco por forma a expor o menor número possível de trabalhadores, ou no tempo, efectuando as operações com risco em alturas em que estejam presente o menor nº de trabalhadores;
Impedir a emissão – hermetização / blindagem, isolamento térmico e acústico (fechar os tanques sempre que possível);
Impedir a dispersão - ventilação por exaustão localizada, humidificação, anteparos contra a protecção do calor e do ruído (acoplar às máquinas e tanques de exaustão local);
Actuar no ambiente - melhoria da ventilação geral para diluição dos poluentes, tratamento acústico e térmico das superfícies do local;
Actuar no indivíduo - educação, formação, aconselhamento e treino do trabalhador (deve ser devidamente informado sobre tudo que diz respeito ao seu posto de trabalho), rotação periódica dos trabalhadores (medida organizativa), exames médicos periódicos, utilização do equipamento de protecção individual (EPI) (os trabalhadores devem usar fatos ou pelo menos
avental luvas e sapatos resistentes aos ácidos e bases, devem ainda usar más caras e auriculares).