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DO RURAL AO URBANO: considerações socioeconômicas sobre a Região Sudoeste do Paraná

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DO RURAL AO URBANO: considerações socioeconômicas

sobre a Região Sudoeste do Paraná

Área Temática: Ciências Econômicas

Modalidade: Artigo Científico

Tiago Arcanjo Orben (Unioeste)

Mariângela Alice Pieruccini (Unioeste) mpieruccini27@hotmail.co m

Resumo

Este trabalho procura pensar a estrutura agrária da região sudoeste do Paraná, com referência ao levante social ocorrido em outubro de 1957. Para tanto, será dada atenção ao processo de reocupação do referido espaço, sua formação histórica e as políticas desenvolvidas para a chamada colonização da região. Para refletir tais peculiaridades será destacada a microrregião geográfica de Francisco Beltrão, a partir de dados demográficos serão ponderadas considerações acerca do grau de urbanização dos municípios pertencentes a este espaço. Propõem-se assim refletir as relações de sociabilidades a partir do rural e urbano ou do campo e da cidade, questionando as variadas relações estabelecidas nesta microrregião a partir destes horizontes de entendimento. Neste contexto, tem-se como objetivo destacar alguns aspectos sobre estas noções salientando as ideias de dicotomia e continuum, que são comumente atribuídas a estes espaços e os redimensionam enquanto categorias de entendimento. O objetivo não é simplesmente estabelecer fronteiras entre o rural e o urbano, mas sim, perceber como essas relações são diluídas e até que ponto esses espaços se tornam construções sociais.

Palavras chave: Sudoeste do Paraná, Estrutura Agrária, Microrregião de Francisco

Beltrão-PR, Rural/urbano.

1 Introdução

Este artigo privilegia a microrregião geográfica de Francisco Beltrão e analisa, a partir dados demográficos, o grau de urbanização dos municípios pertencentes a este espaço. Assim, ao caracterizar estes elementos, são elencados implicitamente os conceitos de rural e urbano, observando-se como os mesmos podem ser identificados na referida região. Neste contexto, tem-se como objetivo destacar as ideias de dicotomia e continuum rural-urbano, que são comumente atribuídas a estes espaços, permitindo, a partir disso, um redimensionamento como categorias de entendimento geoeconômico.

O município de Francisco Beltrão tem destaque no sudoeste paranaense como um dos espaços mais dinâmicos em termos agrícolas, além de ter a maior população urbana da região. Possui assim, um espaço rural ativo que flexiona sua economia de maneira significativa. Este

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panorama é elencado como suporte para as considerações apresentadas a seguir. Isso se deve por entender que distintos processos pautam a organização da referida região, nos quais, as categorias de rural e urbano muitas vezes são apresentadas e entendidas sem se questionar o que representam.

Notadamente esta análise também é elaborada com a intenção de refletir as interações dos sujeitos na região, isto é, pensar estas condições em contexto histórico: o que levou este espaço a ter inúmeros médios e pequenos municípios? Ao mesmo tempo em que esta microrregião possui apenas dois “grandes” municípios, notadamente, Francisco Beltrão e Dois Vizinhos. Portanto, se todos os municípios da microrregião tem uma formação histórica similar, que remete ao “levante de 1957”, outros processos fazem com que alguns aumentem sua população urbana e outros diminuam a população rural.

Para entender este cenário de forma mais apurada é necessário apresentar o contexto histórico de formação econômica e social da região. Ou seja, serão destacados alguns aspectos em relação ao processo de ocupação do espaço estudado, salientando sua reocupação como fruto de um movimento social, que, de acordo com parte da historiografia que o pesquisa, lhe dá uma estrutura agrária diferenciada.1 Essa contextualização é importante para que fique claro de onde emergem as relações econômicas e sociais presentes na atualidade.

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICO-HISTÓRICA 2.1 A noção de Região

O espaço como organização, é um processo e, como tal, está em permanente transformação o que expressa a ideia de movimento e desdobramentos na dinâmica capitalista.

Assim, inicialmente o conceito de região pode ser considerado flexível, segundo Friedmann (1960, p.33), podendo corresponder a grande variedade de significações. Este autor continua sua análise, afirmando: “ [...] nossa definição de região terá de ser extremamente geral, podemos dizer que uma região é uma área delimitada de acordo com certos critérios; teremos regiões diferentes, segundo os critérios que decidirmos utilizar.[...] Não se pode falar numa região melhor2 nem numa melhor definição de certa região.”

Uma das conceituações sobre região que, também, merece ser destacada, é a que apresenta a divisão espacial do trabalho como um dos fatores que podem determinar uma região. A este respeito ROLIM (1995, p.50) afirma que esta espacialidade relaciona-se “com a formação de sub-unidades de produção com uma certa especialização, em âmbitos territoriais restritos e diferenciáveis, pertencentes a um sistema de produção social.”

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Verificar, (Abramovay, 1981), (Amâncio, 2009), (Colnaghi, 1984), (Feres, 1990), (Gomes, 1986) (Lazier, 1986), (Pegoraro, 2008), (Voltolini, 2003) e (Wachowicz, 1985).

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Para a questão relativa à espacialidade das atividades econômicas, este autor considera importante a noção conceitual de região, mesmo sabendo das dificuldades relativas à construção deste conceito. Diante das espacialidades observadas, afirma-se que a região implica em um princípio de organização (ANDRADE, 1981). As regiões geográficas congregam, a partir desta definição, tanto a organização do espaço, que surge de acordo com as necessidades humanas, quanto os aspectos relativos ao domínio físico. A diversificação no tempo e no espaço está implícita nestes pontos.

Diante disso, a região é definida como sendo parte de um todo maior, sendo considerada, desse modo, um quadro territorial, no qual se inserem os planos de ação e aonde se aplicam as decisões, desdobrando-se em eventos e nova organização.

Portanto, é dentro do contexto de espaço organizado que se apresenta uma região, e mais, é por meio da combinação do potencial natural e humano que pode ser resgatado um dos aspectos da evolução da região Sudoeste, ou seja, a ação do homem sobre o meio, gerando especificidades próprias no espaço local, construídas e reconstruídas historicamente e de modo contínuo.

2.1 Formação histórica da região Sudoeste Paranaense

Compreender a formação da região Sudoeste significa levar em consideração os levantes sociais ocorridos em outubro de 1957 em suas principais cidades, de maneira especial: Francisco Beltrão, Pato Branco, Santo Antônio do Sudoeste e Capanema. Entretanto, a formação histórica da região por meio da ocupação do espaço pelos ditos “colonizadores” acontece a partir da década de 1940.

O contexto que favorece essa reocupação está relacionado a um programa político governamental criado pelo Governo Federal, em fins da década de 1930. Getúlio Vargas, presidente do Brasil no período, procura estabelecer a chamada “Marcha para Oeste”, com o objetivo de ocupar vazios demográficos e integrar novas áreas agrícolas ao território nacional.

A partir deste projeto político, em 1943, por meio do Decreto número 12.417, Vargas cria a Colônia Agrícola Nacional General Osório – CANGO. Lazier destaca que “a CANGO era um órgão público federal e os lotes de terra eram distribuídos gratuitamente, o que era mais um fator que favorecia a grande migração interna para a região” (LAZIER, 1998, p.38). Além da distribuição gratuita dos lotes, os colonos que chegavam à região recebiam da colônia assistência técnica e incentivo para a agricultura.

Vale ressaltar as inúmeras referências que apontam para a ação efetiva desta colônia agrícola e sua ajuda aos colonos, tanto na chegada a região, quanto no levante de 1957. Para Gomes a colônia:

[...] teve uma importância decisiva na colonização do Sudoeste do Paraná. Embora a criação de colônias agrícolas tenha decorrido de uma medida ditatorial e conservadora, a análise da atuação da CANGO, uma das poucas colônias que apresentou resultados significativos, mostra qu e esta atuação foi extremamente democrática (GOMES, 1986, p.16, 17).

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A partir deste cenário pode-se considerar que o aumento populacional ocasiona o consequente aumento na produção. Neste sentido, a agricultura de subsistência, baseada em pequenas propriedades ganhou expressão no ano de 1956, ano em que cereais como, trigo, milho e feijão (GOMES, 1986, p.20) foram os de maior produção, assim como a criação de porcos. Quadro diferente do que pode-se verificar em contexto recente, em que a soja predomina na região.3 Já o aumento populacional da década de 1950 é significativo, principalmente relacionado à área rural:

A população da Colônia Agrícola, em 1950, era de 7.147 pessoas, enquanto que a da região era de 76.373 pessoas. De 50 para 60, houve uma verdad eira explosão populacional na região. Enquanto a CANGO, em fins de 1956, tinha cadastradas 15.284 pessoas e 26.000 esperavam cadastramento, em 1960 a região estava com 230.379 pessoas, sendo 119.787 na área rural (GOMES, 1986, p.22).

Dos números apresentados, aqueles que mais chamam atenção são o aumento populacional de 1950 para 1960. Enquanto a população da região em 1950 era de 76.373 pessoas, em 1960 esse número aproximou-se de 230.379, o que significa um aumento de mais de 200% na década em que ocorreu o grande fluxo migratório para a região. Dentro desses dados, apresenta-se também o número de pessoas morando no campo, o qual, na década de 1960, perfazia 119.787 na área rural, ou seja, mais de 50% da população recenseada na época. Após essa data, a quantidade de pessoas morando na área rural diminuiu significativamente e não voltou a ser maior. A partir destes dados, percebe-se o relativo sucesso do programa político governamental de incentivo à migração, bem como o reconhecimento da CANGO na organização dos colonos.

Com referência a este contexto, parte da historiografia que pesquisa a região sudoeste do Paraná ou o “levante de 1957” distingue este espaço por ter uma caracterização fundiária singular, baseada em pequenas propriedades com uma agricultura familiar, isto é, essa estrutura seria fruto dos levantes sociais de outubro de 1957.

A partir deste contexto é que são apresentadas as reflexões em relação aos conceitos de rural e urbano no referido espaço. A distinção que a região possui, enquanto fruto deste movimento social abre espaço para estas ponderações, posto que se nas décadas de 1940, 50 e 60 tinha uma estrutura agrária diferenciada, com uma região ainda pouco explorada e com pouca produção – basicamente extensiva em que se vendia o excedente. Em contexto recente ou nas últimas décadas esta estrutura tem modificações significativas e evidentemente isso se reflete nas populações rurais e urbanas deste espaço.

3 Segundos dados do IBGE, na safra 1986/87 a área de cultivo de soja no Paraná em hectares era de 1.998.476,

aparecendo como segunda cultura mais cultivada. Já na safra 1999/00, a soja é a principal cultura, com um total de 2.967.685 hectares. Estes números também refletem a produção do sudoeste paranaense, com o predomínio

da soja já a partir de fins da década de 90. IBGE:

<http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/economia/agropecuaria/estatisticas_previsao_safras/Previsao_safras.p df>.

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3 ANÁLISE E DISCUSSÃO

3.1 Dinâmicas rurais e urbanas no sudoeste paranaense

A partir do cenário apresentado anteriormente, é possível destacar alguns dados demográficos referentes a microrregião de Francisco Beltrão, local onde pode-se notar uma evidente concentração econômica em alguns municípios.4 (Ver figura 01 p.05).

Para compreender de forma mais apurada o que foi referido é importante pensar que ao situar a denominação, “urbano” ou “urbanização” para grande parte das pessoas, associam-se imagens de grandes e médias cidades, de prédios ou até de uma determinada cidade com a qual tem alguma identificação, que nossa mente remete enquanto sinônimo de cidade ou urbano. Dificilmente será associado o termo urbano a sede de um pequeno município que tenha entre 5.000 a 10.000 mil habitantes. Entretanto, cabe salientar que no contexto brasileiro inúmeros espaços são considerados urbanos, mesmo possuindo estas características de baixa densidade populacional.

Esta realidade é a encontrada com facilidade na região sudoeste do Paraná, com exceção de Francisco Beltrão e Pato Branco, o restante dos municípios deste espaço possuem uma baixa densidade populacional, o que torna difícil associar o termo urbano as sedes destes municípios. Todavia, isso não significa que esses espaços não sejam assim reconhecidos, política e administrativamente, para as prefeituras, IBGE e para a grande maioria dos habitantes ali residentes, esses locais são identificados como urbanos, mesmo com relações muito distintas de um espaço como, por exemplo, São Paulo ou Curitiba.

A título de exemplo, a figura 01 (p.05) apresenta a Microrregião Geográfica de Francisco Beltrão, a qual possui dois municípios com população urbana acima dos 20.000 mil habitantes.

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Não foram expostos no gráfico, mas também fazem parte desta Microrregião os munícipios de: Nova Esperança do Sudoeste, Nova Prata do Iguaçu, Pinhal de São Bento, Renascença, Salgado Filho, Salto do Lontra, Santo Antônio do Sudoeste, São Jorge d’ Oeste e Verê. Destes, o mais densamente povoado é Santo Antônio com 18.893 mil habitantes e um grau de urbanização de 72,57%, enquanto que os demais – com exceção de Nova Esperança do Sudoeste, Pinhal de São Bento e Verê – mesmo possuindo uma pequena população, possuem mais pessoas residindo no perímetro urbano do que no rural. Isto é, possuem um grau de urbanização superior a 50%.

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Figura 1, Microrregião Geográfica de Francisco Beltrão. População total, rural, urbana e g rau de urbanização. IPARDES – Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social: < http://www.ipardes.gov.br/pdf/mapas/base_fisica/relacao_mun_micros_mesos_parana.pdf>. Acesso em 22 de junho de 2016.

É indagando questões similares a estas, que Wanderley (2004) trabalha com a “Urbanização e ruralidade: relações entre a pequena cidade e o mundo rural e estudo preliminar sobre os pequenos municípios em Pernambuco”. Assim, sinaliza que pesquisar os pequenos municípios brasileiros mostra-se como um “interesse a margem” e indica que isso pode acontecer porque na década de 1990 eles representavam apenas 12% da população total do Brasil, por outro lado, neste mesmo período “correspondiam a 72,6% dos municípios brasileiros” (WANDERLEY, 2004, p.03, 04).

Para Wanderley (2004), a partir dos critérios definidos por Faria (1991), os pequenos municípios identificados como “urbanos” são os que possuem uma população urbana de mais de 20.000 mil habitantes. É bem verdade que isto é diferente da população total do município, ou seja, para a sede de um município ser considerada urbana ela precisaria ter mais de 20.000 mil habitantes, desta maneira, as pequenas cidades com números inferiores a esse não seriam consideradas urbanas.

Esta realidade, conforme se verifica no gráfico, encontra-se de forma predominante na região sudoeste do Paraná. Apenas Francisco Beltrão, Dois Vizinhos e Pato Branco possuem

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uma população urbana superior a 20.000 mil habitantes, enquanto que se considerada a população total se acrescenta apenas o município de Coronel Vivida com 21.749 mil habitantes. Chopinzinho quase alcança esse número, entretanto fica com 19.679 mil habitantes.

Desta maneira, ao aplicar as considerações de Wanderley (2004), com exceção de Francisco Beltrão e Dois Vizinhos, nenhum pequeno município nessa microrregião pode ser considerado urbano. Todavia, se for observado o grau de urbanização dos outros 17 municípios que a compreendem, nove deles têm um elevado grau de urbanização, são mais urbanos do que rurais. Os únicos municípios que a população rural é maior que a urbana são: Boa Esperança do Iguaçu, Bom Jesus do Sul, Enéas Marques, Flor da Serra do Sul, Manfrinópolis, Nova Esperança do Sudoeste, Pinhal de São Bento e Verê, sendo que nenhum destes chega a ter uma população superior a 10.000 mil habitantes, isto é, são municípios extremamente pequenos.

Tem-se assim, uma estrutura que se analisada superficialmente indica para a maioria dos munícipios com um significativo grau de urbanização, que chega aos 71,99% em Barracão, o qual tem uma população total de apenas 9.735 mil habitantes.

Esses elementos nos apresentam uma realidade singular neste espaço, ao mesmo tempo em que recoloca em xeque o conceito de urbano, posto em debate neste momento quando se observa que a maioria dos municípios seriam mais urbanos do que rurais. Entretanto isso se evidência a partir de um debate mais amplo:

Como é sabido, o IBGE distingue as situações urbana e rural, tais como são legalmente definidas em cada município. Na situação urbana cons ideram-se as pessoas e os domicílios recenseados nas áreas urbanizadas ou não, correspondentes às cidades (sedes municipais), às vilas (sedes distritais) ou às áreas urbanas isoladas. A situação rural abrange a população e os domicílios recenseados em toda a área situada fora dos limites urbanos, inclusive os aglomerados rurais de extensão urbana, os povoados e os núcleos (WANDERLEY, 2004, p.04).

Entrelaça-se a este debate o que pode ser considerado urbano e cidade. As caracterizações do IBGE e de outros institutos de pesquisa ao tomarem como base o que é legalmente definido pelos municípios acabam por considerar urbano todo e qualquer aglomerado. Entretanto, as cidades para muitos autores, como Faria (1991), seriam apenas as localidades com mais de 20.000 mil habitantes, existiriam assim aglomerados urbanos abaixo deste número, mas estas localidades não seriam consideradas cidades.

Desta maneira, ainda em relação ao aspecto urbano, mais especificamente no debate “cidade-campo” procura-se observar a constituição conjunta dos espaços:

No que tange ao espaço urbano, entendemos que este decorre de uma densificação populacional no espaço, da inserção de objetos técnicos (tecnicização), e da racionalidade técnica, que percebe, nas aglomerações populacionais, po ssibilidades para o desenvolvimento de cidades e, consequentemente, facilidades para concentração da produção e circulação de mercadorias, pessoas, atividades e capital. Ademais, cabe a ressalva de que toda paisagem-espaço considerado urbano, ou seja,

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toda cidade, sempre se sobrepõe ao rural ou ao “natural”. Assim, todo o urbano já foi rural, mas nem todo rural será urbano (CANDIOTTO; CORRÊA, 2008, p.216).

A caracterização apresentada aponta para um urbano como resultado da “densidade populacional no espaço”, que acontece em decorrência do progresso técnico que introduz a circulação de mercadorias pessoas e capital, assim se constituiria a cidade enquanto sede do espaço reconhecido como urbano. Ou seja, pode-se pensar que o urbano é mais amplo do que a cidade, já que o mesmo abrange tanto a sede do município como seus distritos, já a cidade propriamente dita, ficaria apenas indicada enquanto a sede do município, assim, o distrito até pode ser urbano, mas não chega a ser uma cidade.

Outro ponto interessante refere-se à afirmação de que o urbano ou a cidade se “sobrepõe ao rural”, considerando, que todo o urbano vem do rural ou “já foi rural”, mas que nem todo “rural será urbano”. Neste ponto considera-se que se parte do rural entendido como “natural”, enquanto o urbano ou a cidade acontece muito mais enquanto construção. (CANDIOTTO; CORRÊA, 2008, p.216).

Candiotto e Corrêa (2008) ainda alertam que a delimitação desses espaços não significa o esgotamento da discussão em torno destes conceitos, pois os mesmos “reproduzem uma realidade social concreta” e diversificada, não sendo possível atribuir a determinado espaço uma caracterização rural ou urbana e acreditar que os conteúdos presentes ou os indivíduos e suas relações sejam pertencentes ou tipicamente rurais ou urbanas. A industrialização, os processos que envolvem a agricultura brasileira são complexos, nos quais, cada realidade social precisa ser observada e aplicada junto aos conceitos, para que se tenha uma análise apurada das relações presentes em cada espaço. Cada espaço possui suas especificidades, as quais, precisam ser consideradas antes de delimitar a categoria de rural ou urbano aos mesmos.

Os autores ainda fazem um balanço sobre as correntes historiográficas que interpretam os espaços rurais e urbanos, ao se posicionarem apresentam um quadro de pesquisadores que apostam na noção de “continuum rural-urbano” para o qual o avanço do progresso e da industrialização traria junto o avanço no campo. Enquanto outro grupo de pesquisadores volta-se para a visão dualista e dicotômica, que comumente atribui ao rural o atraso e ao urbano o progresso. Para os autores a noção mais aceita recentemente ou mais difundida no meio acadêmico é a de “continuum”, pois a mesma se encontra mais alinhada a “realidade contemporânea” (CANDIOTTO; CORRÊA, 2008, p.217).

Seguidores desta corrente indicam autores como, Maria Nazareth Baudel Wanderley, Paulo Roberto Alentejano, Maria José Carneiro e com destaque José Graziano da Silva, que estabelece o conceito de rurbano junto às relações observadas no estado de São Paulo. Apesar destes autores e desta perspectiva ser muito interessante e possivelmente muito bem adaptável a diversas regiões do Brasil, ela possui suas limitações. A ideia de continuum estabelece relações muito próximas entre o rural e urbano, ao colocar estes espaços não só enquanto dependentes, mas em desenvolvimento integrado, não acontecendo necessariamente o fim do rural, mas sua afirmação ao lado do urbano. (CANDIOTTO; CORRÊA, 2008, p.217, 218).

Notadamente o Brasil é um país de dimensões continentais com diferentes realidades rurais e urbanas. Para a região sudoeste do Paraná a noção de “continuum” pode ser aplicada

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em determinados espaços, existe uma organização dinâmica entre os espaços rurais e urbanos que são facilitadas por uma agricultura moderna, intermediada por cooperativas agrícolas e de crédito, não que isso seja uma regra, mas é possível encontrar a noção de “continuum” no sudoeste paranaense.

Diante deste contexto, a adoção desta metodologia explicativa para os espaços rurais e urbanos mostra-se válida de acordo com cada realidade, entretanto, não deve ser a única, pois cada espaço possui suas especificidades de organização social, política e econômica.

Cabe acrescentar, nessa discussão, a capacidade de percepção em torno da realidade urbano-rural brasileira proposta por Carneiro (2001). A autora pauta sua argumentação sobre a emergência de novas relações no meio rural, indica assim que novas estruturas se apresentam ao país:

Observamos a partir dess as constatações um certo estranhamento ou, melhor, um certo mal estar, entre os pesquisadores ao se depararem com uma realidade que não cabe mais (ou jamais coube) no arcabouço teórico -conceitual existente, e até então sustentando pela dualidade rural-urbano e que se traduz também pela subordinação do campo à cidade e do agrícola ao industrial (CARNEIRO, 2001, p.02).

Frente a estas considerações é importante salientar que as mesmas são apresentadas na esteira do conceito de “novas ruralidades”. Carneiro (2001) e outros autores como Graziano da Silva (1998), Alentejano (2003) e Wanderley (2004) além de proporem uma observação dos espaços rurais e urbanos a partir do fim das velhas dicotomias, também procuram pensar a ideia de “continuum” a partir da introdução do conceito de “novas ruralidades”. Isto é, se o rural passa a ter interferência e é constituído essencialmente junto ao urbano, são “novas ruralidades” que são apresentadas a este espaço. Como adverte Carneiro (2001), se observa “uma realidade que não cabe mais no arcabouço teórico e conceitual” que existia até então.

É fundamentando nessas questões que a referida autora apresenta alguns questionamentos em relação a estes aspectos: “até que ponto é possível continuarmos operando com os mesmos instrumentos analíticos elaborados em outros contextos históricos, econômicos e sociais? Em outros termos, será que categorias genéricas como ‘rural’ e ‘urbano’ são ainda pertinentes para qualificar espaços e universos sociais nas sociedades contemporâneas?” (CARNEIRO, 2001, p.02).

Estas questões devem ser pensadas separadamente. A primeira delas indaga como se pode analisar a realidade a partir da visão dicotômica entre o rural e o urbano, como categorias de compreensão da realidade histórica, econômica e social de determinada sociedade. Pode-se concluir que este processo foi superado parcialmente, entretanto isso não significa que ele não seja constantemente revisitado, alguns juízos de valor ainda são apresentados como típicos do campo ou da cidade. Ao mesmo tempo, não há como negar que em determinadas realidades existem diferenças fundamentais entre estes espaços, desta maneira, pode-se considerar que o superar acontece no sentido pejorativo que era constantemente empregado ao rural, a noção de que do campo vem o atraso, a falta de conhecimento e informação, muito bem estereotipada pela ideia do “jeca tatu”.

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Por outro lado, as categorias de rural e urbano ainda continuam muito pertinentes na sociedade contemporânea. Não é possível acreditar que ao conceituar uma maior integração e aproximação destes espaços, como “novas ruralidades”, exclua o rural e o urbano como categorias de compreensão. Ocorreu uma expansão das relações conhecidas como “novas ruralidades”, isto é, as ocupações não agrícolas no campo, os trabalhadores urbanos que residem no campo, o turismo rural, a ideia de “mancha urbana” que compreende a extensão de grandes e médias cidades em direção ao campo – tornando difícil a diferenciação de que espaço é rural ou urbano – são todas expressões destas novas dinâmicas apresentadas ao meio rural.

Existe um emaranhado de novas relações que são constantemente apresentadas a estes espaços na sociedade contemporânea, todavia, isso não significa o esgotamento das categorias de rural e urbano. Por outro lado, é neste momento que as mesmas se redimensionam, se constituem novas conceitualizações como as “novas ruralidades”. São essas dinâmicas que reafirmam as diferenças fundamentais entre estes diferentes espaços e demonstram como operações políticas, sociais e econômicas podem recolar o rural e o urbano em constante contato, seja enquanto afirmação seja como diferenciação.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O propósito deste artigo foi elencar a microrregião geográfica de Francisco Beltrão, com o objetivo de refletir os aspectos rurais e urbanos. Verificou-se assim, a partir de dados demográficos e do grau de urbanização, que é possível associar distintas dinâmicas econômicas e sociais ao mesmo, em especial no que se refere a inserção de novas relações capitalistas de produção e mercado nos espaços rurais e urbanos.

Notadamente as designações de rural e urbano, tanto enquanto continuum, quanto como dicotomia, ao serem pensadas com referência a microrregião elencada, apresentam particularidades de sua organização econômica e social. Têm-se cidades com maior densidade populacional e alto grau de urbanização – como Francisco Beltrão e Dois Vizinhos, também existem municípios com alto grau de urbanização e pouca população total, como Barracão e Marmeleiro. Colocar estes dados para reflexão junto as conceitualizações de rural e urbano mostrou uma estrutura diversificada no referido espaço, que em grande medida é mediada pelos complexos agroindustriais.

Locais como Francisco Beltrão e Dois Vizinhos, que possuem grandes agroindústrias, tem uma maior densidade populacional urbana, enquanto que os municípios circunvizinhos, apesar de sofrerem forte influência destas agroindústrias, acabam perdendo população rural, tanto para a sede destes municípios mais “desenvolvidos”, como para a sede urbana do próprio município. São processos amplos e complexos, mas que demonstram como as dinâmicas econômicas da região, refletem nas experiências e transitoriedades dos indivíduos nos espaços reconhecidos como rurais e urbanos.

É possível notar dinâmicas diversificadas neste espaço, que são mediadas por relações de produção e mercado regradas pelas lógicas capitalistas de agro-exportação. Afirmam-se

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estruturas de poder e dominação que determinam as relações econômicas e sociais do espaço elencado, notadamente existe uma valorização de monoculturas e de produção para o mercado externo, que são valorizadas e reafirmadas pelos grupos que detém o poder econômico e político da região. Todavia isso não significa que não possam existir na região, relações de produção que estejam fora desta lógica, existe a produção orgânica familiar, entretanto isso acontece em contexto ínfimo em comparação a produção e reprodução das relações agrícolas de mercado.

A partir disto, as análises empreendidas no artigo possibilitaram concluir que: mesmo com uma estrutura agrária diferenciada, que seria fruto do movimento dos colonos de 1957, existem características de polarização, ignorando este modelo ou mesmo fazendo uso do mesmo enquanto agente fomentador de “desenvolvimento”.

Essas são algumas tendências que as pesquisas que estão sendo desenvolvidas neste espaço têm demostrado: concentração fundiária com o aumento das grandes propriedades baseadas na produção de monoculturas e forte expansão dos complexos agroindustriais. Ambos os processos trazem em seu esteio o abandono do homem do campo, que reforça a mão de obra nas médias e grandes cidades.

5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Referências

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