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Relatório das II Jornadas da Associação Portuguesa de Retórica - "Retórica e Poesia", Faculdade de Letras do Porto, 24 e 25 de Novembro de 2005

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As II Jornadas da Associação Portuguesa de Retórica realizaram-se na Faculdade de Letras do Porto, nos dias 24 e 25 de Novembro de 2005, tendo-se subordinado ao tema ‘Retórica e Poesia.’ Este trabalho tem o duplo propósito de transmitir as noções fundamentais das comunicações que foram apresentadas e abrir uma passagem para este Seminário de modo a que os temas debatidos num e noutro lugar sejam um contributo e um estímulo para a investigação. Opta-se pela organização cronológica das temáticas, de modo a possibilitar um mapeamento do modo como as diversas épocas representadas compreenderam a retórica. Com esta intenção preparou-se um brevíssimo slide para cada comunicação, onde constam os pontos de ancoragem de cada conferência.

A noção ‘retórica’, de uma maneira geral refere o discurso construído de acordo com determinadas regras, que é orientado para uma determinada finalidade. Do mesmo modo, a noção ‘poesia’ designa o carácter convencional do discurso, todavia tem implícita a capacidade do leitor ou do audiente para desconstruir a utilização simbólica e desviante do sentido comum das palavras.

Com o propósito de explorar a percepção de diversos períodos em relação a estas duas noções, retórica e poesia, o plano de trabalhos considerou o discurso propriamente dito, apresentou teorias, mencionou doutrinas, analisou a recepção dos tratados clássicos e referiu expressões anti-retóricas, percorrendo a escala cronológica desde a Antiguidade até aos dias de hoje

As perspectivas mostradas abriram um horizonte largo aos investigadores, tendo descortinado a omnipresença da retórica nas mais variadas expressões do conhecimento, mesmo quando se pretende repudiá-la, como são exemplo a oratória, a pintura, a música, a prosa e a poesia. Nestas áreas, a retórica sobressai como apoio da linguagem

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vinculado a processos que incluem a escrita, de letras, sons ou imagens, como sendo um sistema organizado de alternância, contraste, proximidade, de passagem e de fundição de elementos quer estes estejam associados a códigos e a práticas sociais, quer representem aqueles códigos e estas práticas simbolicamente.

Seis conferências que se debruçaram sobre a antiguidade, forneceram uma visão ampla sobre o tema em três vertentes,. Em primeiro lugar, reflectiu-se acerca dos primórdios da retórica, tendo-se mostrado duas concepções diferentes, a de Górgias (tekne logon) e a de isócrates (poietikon logon), referindo-se ainda que Aristóteles nega a dimensão poética da retórica (Noël). Em segundo lugar, a poesia de Teógonis de Megara, um poeta do período arcaico, foi apresentada como expressão de uma forte consciência do valor da poesia numa época em que nada era estável (Jorge Deserto), percepção também partilhada por Eurípides, cuja retórica do ritmo e do pathos reflecte as consequências avassaladoras e universais da guerra, particularmente para as mulheres quer sejam mulheres de vencidos ou de vencedores. A língua mostra estes aspectos com a utilização de imperativos consecutivos que mostram tensão psíquica e urgência de acção, particularmente quando são ecos uns de outros. Os gritos e as exclamações denotam espectacularidade e desespero, ao passo que as sílabas breves transmitem a indignidade sofrida (Carlos Morais). Ifigénia em Áulide, outra tragédia de Eurípides, foi assunto de uma conferência acerca da retórica da crise decalcada em diversos discursos de persuasão, que não são persuasivos, mas desconstroem máscaras como modo de dizer a tensão, e as consequências nefastas da sede de riqueza (Maria do Céu Fialho). As figuras de estilo, nomeadamente o símile n’A Tomada de Tróia de Trifiodoro configuram a retórica da guerra, vinculando-a à natureza e aos poemas homéricos (Joaquim Pinheiro)

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Em terceiro lugar, um corpus de representações de Aquiles nos vasos gregos descortina por um lado a retórica da cólera neste meio de expressão como sendo paralela com alguns preceitos que também orientam o discurso verbal, nomeadamente a intencionalidade (inuentio), o plano (dispositio) e a persuasão (elocutio); e, por outro lado, sugere que estes artefactos, muitas vezes resultam de encomendas para ambientes específicos, sendo ainda objectos frequentemente exportados, constituem canais portáteis de comunicação e de debate. A representação é poética porque corresponde a uma determinada organização formal, que é simbólica e criativa (Ana Rita Figueira).

Duas comunicações ocuparam-se da Idade Média. A primeira ocupou-se da imitação (imitatio) e originalidade que, por um lado se aliam à matriz provençal e aos códigos poéticos da fin’amors peninsulares na cantiga de amor galego-portuguesa, e, por outro lado exemplificou a maneira como estes preceitos são rejeitados em canções que versam os topoi ‘amor-coita’ e o ‘amor-joi’ (Henrique Manso).

A segunda apresentou as artes poéticas medievais dos séculos XII e XIII, observando não só a sua vinculação à união entre retórica e poética, mas também a sua finalidade didáctica e a preferência pela composição em verso como modo de instrução (Manuel Ramos).

O século XVI esteve presente em seis comunicações. A primeira mostrou como quatro orações metrificadas de Miguel de Venegas (1561) reflectem a indistinção que o autor fazia entre poética e retórica, uma vez que as considerava necessárias e úteis para combaterem a heresia que dividia a Europa. Esta concepção reflecte a noção de que retórica e poesia são faculdades que concorrem para a eloquentia perfecta (Ratio Studiorum) (Margarida Miranda).

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A segunda ilustrou o modo como a arenga militar na épica e na poesia novilatina, cujas origens remontam à Antiguidade imitando a técnica de Homero e de Tucídides, ao introduzir discursos que glorificam o ethos dos heróis portugueses. A arenga visava enaltecer os vencedores, encorajar uma atitude guerreira à semelhança de Alexandre ou de César ou consolar os vencedores (Luís Miguel Ferreira Henriques).

A terceira distinguiu Diogo Bernardes como autor cuja poesia se ancora na retórica do queixume de uma maneira excessiva que sobressai entre os seus contemporâneos.

A quarta apresentou o Borrador de huma arte poética de D. António de Ataíde como sendo uma teorização portuguesa original. Ataíde diz, por exemplo que a epopeia é um ordenamento retórico, louva a língua portuguesa, e exalta o rei. Versa ainda acerca da métrica e debate a predisposição para o furor poético (Adriano Milho Cordeiro).

A quinta mencionou o modo como a retórica está presente no discurso histórico de Pero de Magalhães Gândavo. O autor edifica os elementos naturais da Província de santa cruz e desvaloriza o habitante local mediante um discurso demonstrativo que segue por duas vias, a via do louvor e a via da desvalorização ou insulto. Edifica o rei, tendo por modelo Xenofonte e orientando-se por três directrizes: honestidade, gravidade e autoridade. Foram editados 38 livros em 1576, que foram redescobertos em 1836. Há 4 versões desta obra (Alexandre Barboza Costa).

A centúria de setecentos esteve representada por duas comunicações. A primeira estudou as Flores Eloquentiae do Padre Francisco de Mendonça, um autor da passagem do século XVI para o século XVII. O padre António Vieira designava seu mestre, este autor cuja obra Viridarium Sacrae ac Profanae eruditionis inclui discursos, poemas, prognymasmata, questões e pequenos tratados (Carlota Urbano).

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A segunda lembrou um esquecido elogio do Português como língua universal, de Pedro Henequim (tempo de D. João V). O autor considerava que o Português é uma língua universal, tendo sido a primeira que Deus ensinou a Adão (Pedro Tavares).

A terceira apresentou uma poética fundada numa retórica, mostrando a maneira como a poética da mimese no século XVI é reinventada no século XVII como poder visual da metáfora, onde se reconhece Aristóteles. Trabalha-se o texto procurando o ponto de ligação entre coisa e fala, coisa e coisa, palavra e palavra em construções onde sobressaem paralelismos anafóricos (Joana Matos Frias)

A quarta exemplificou a maneira como a retórica e a poesia se relacionaram no Renascimento, salientando a noção ‘ritmo’ e a noção ‘numerus’ na oratória e na poesia e fazendo sobressair o metadiscurso retórico na poesia e a integração da poesia na retórica. O tratado de Thomas Sébillet foi o primeiro tratado de poética francês (Kees Merhoff) .

O século XIX retoma o tópico da defesa do Estado, como é exemplo a poesia de Almeida Garrett, como modo de exaltação do liberalismo (Ricardo Nobre)

O século XX foi objecto de uma comunicação onde se salientou a articulação entre a hermenêutica, a retórica e a poética em Paul Ricoeur, mostrando que o pensamento deste século se distingue pelo regresso da retórica, pela acção criadora do homem como espelho da sua interioridade e pela relação entre o homem e o seu passado biológico, capaz de pensar o património herdado, como sua responsabilidade. (Paulo Barroso).

A actualidade esteve representada com a análise da obra Uma viagem à Índia de Gonçalo M. Tavares, onde se mostrou uma retórica que respeitando a tríade clássica docere, delectare, mouere, desmonta e dilui as fronteiras entre géneros literários e por

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este motivo não só parecem constituir anti-retóricas, mas também são a retórica da vanguarda, onde se discerne a responsabilidade de pensar o passado, repensando, por exemplo, Camões. Alia-se o niilismo à alienação, fazendo sobressair o desencanto (Ana Isabel Correia Martins).

A articulação entre música e retórica foi ainda alvo de uma comunicação que mostrou paralelos entre a escrita musical e a retórica verbal desde o século XVII até ao século XIX, tais como a repetição, a variação, a progressão, a supressão e a inversão, técnicas vinculadas à performance e aos efeitos do discurso, que apelam à memória do receptor e que têm como finalidades docere, delectare e movere e ainda persuadir (Ana Paixão)

Em suma, este colóquio mostrou diversas maneiras de utilizar a palavra, incluindo as referências ao sublime como um modo de dizer deslumbramento, o estranhamento que se encontra para além do dizível e que se realiza plenamente quando se deixa de precisar de palavras

Referências

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