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A CUIDADORA NATURAL: A MULHER E OS CUIDADOS DO LAR E DE SEUS MORADORES.

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Academic year: 2021

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A medicina popular praticada por mulheres em âmbito doméstico: a tradição do uso das ervas medicinais em Vitória da Conquista Bahia de 1950 até a atualidade.

A CUIDADORA NATURAL: A MULHER E OS CUIDADOS DO LAR E DE SEUS MORADORES.

Em cada sociedade, em cada período histórico, a divisão sexual do trabalho está presente com características próprias de cada cultura e de cada época.

Toda sociedade conhecida reconhece e elabora algumas diferenças entre os sexos e embora hajam grupos onde homens vestem saias e as mulheres calças, em todo lugar há tarefas, maneiras e responsabilidades características, especialmente associadas com as mulheres ou com os homens1.

Aristóteles, em sua obra Oykonomica (Economia), afirmava:

La naturaleza estableció que uno de los sexos tendiese a la vida sedentaria, no siendo suficientemente fuerte para resistir la intemperie; el otro es menos adaptado a los trabajos inactivos, y está bien dispuesto para los trabajos al aire libre. En cuanto a la prole, dispuso que ambos compartiesen la procreación de los hijos, dedicándoles cana uno sus peculiares cuidados; la mujer está destinada a la lactancia, el hombre a la educación. 2 Assim, tradicionalmente, a mulher por muitos séculos teve sua vida restrita aos domìnios privados do lar, aos cuidados com a casa e com a familia. As mulheres são as geradoras do cuidado. São elas que detém, apesar de todas as mudanças sociais relacionadas aos papéis femininos, as funções tradicionais de cuidar dos filhos e da casa. Estas tarefas são denominadas cuidados:

En el domicilio, ella está siempre disponible a las solicitudes de sus familiares, en los cuidados con la higiene, en la alimentación, en el tratamiento de los enfermos y en el autocuidado. Es evidente que el papel de cuidadora de la mujer es consecuencia del proceso de socialización que ella sufre en la propia familia, ya que ésta es la responsable por la socialización educativa y social, pero también por la división sexual del trabajo, cuya tipología, organizativa se basa en diferencias de género, moldeando los límites de la estructura familiar. 3

Cuidar é uma tarefa que tradicionalmente foi delegada às mulheres, e elas a incorporaram de tal forma que, cuidar de algum membro da família que precise ajuda ou algum doente, se torna um processo quase natural. A mulher é a guardiã da saúde da família e dos que vivem em seu lar..

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A MEDICINA POPULAR NO BRASIL E AS CUIDADORAS

As terapêuticas populares no Brasil têm origens que remontam à presença dos indígenas que já viviam aqui antes da chegada dos colonizadores portugueses, no século XVII. Eram estes homens, sem escrita e sem deuses cristãos, que detinham os conhecimentos sobre as plantas medicinais existentes. Mas é necessário salientar que o conhecimento sobre o poder de curar das plantas remonta a tempo imemoráveis. São muitos os relatos do uso das plantas medicinais nas civilizações da antiguidade.

Saberes populares e eruditos foram constituindo a arte de curar pelas plantas desde tempos imemoriais. Saberes dos quais o homem pôde utilizar-se para a cura de determinadas doenças e para o desenvolvimento da própria ciência médica. Saberes que foram de ervanistas, de mezinheiros, mulheres consideradas bruxas ou feiticeiras, de médicos e boticários. Saberes que se constituíram independentemente do estatuto daqueles que coletivamente os geraram, mas cujo reconhecimento científico coube aos credenciados pelas ciencias. 4

No Brasil os indígenas mostraram aos colonizadores as plantas e ensinaram seus usos: para a cura e para a alimentação. Esses “seres inferiores” ainda tinham conhecimentos da natureza, isso era útil e assim aceitável.

Mas não somente dos conhecimentos dos indígenas se fez a arte de curar no Brasil. Há que se dizer que as bases socioculturais da medicina do Brasil em seus primeiros tempos, foram formadas pela combinação de três tradições culturais diferentes: indígena, africana e européia.

A medicina só se impôs como ciência no final da primeira metade do século XIX.5 Até este período existiam as chamadas “artes de curar”, onde estava incluída a medicina, mas que também abarcavam curandeiros, feiticeiros, raizeiros, benzedores, padres, barbeiros, parteiras, sangradores, boticários e cirurgiões.

As pessoas que exerciam a medicina informalmente, que poderiam ser mestiços, africanos e indígenas, usavam várias formas de tratamento: magia, ervas, infusões, sangrias, raízes e ungüentos, sem deixar de unir a tudo isso a medicina tradicional européia. Mas era uma medicina bem diferente da que se praticava na metrópole:

(...) a precariedade da vida material, marcada pela raridade de médicos, cirurgiões e produtos farmacêuticos, e o sincretismo dos povos, responsável pela formação de uma medicina multifacetada e afeita ao universo da magia. 6

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Assim, a ciência médica no Brasil teve características muito originais com a utilização de elementos da medicina oficial e de uma medicina popular, praticada por pessoas sem nenhum tipo de formação específica, mas era a estas pessoas a quem a população recorria para sanar seus males.

Na segunda metade do século XIX a metrópole impôs uma fiscalização mais efetiva aos profissionais informais da medicina. Eram necessárias permissões para exercer tal labor, mas esses documentos tornaram-se muito difíceis de se conseguir, pois nesta época a medicina formal já se apresentava como ciência e depreciava os chamados “práticos”7.

Mas, ainda que a medicina culta estivesse institucionalizada, os médicos, medicinas e hospitais continuavam escassos. A “medicina culta” era cara e pouco acessível. Enquanto os terapeutas populares seguiam com seu prestígio social, os médicos sofriam de impopularidade. Os terapeutas populares eram vistos por seus pacientes não só como uma opção mais barata de cura, senão que também eram considerados mais eficazes. Também há que se destacar que a relação entre paciente e terapeuta popular era mais fluída, com um bon nível de entendimento das duas partes pois as concepções de doença, suas causas e tratamento eram compartilhadas 8.

O despeito que os representantes da medicina oficial tinham dos práticos, principalmente quando se tratava das mulheres, certamente não era gratuito, pois estes, por partilharem de crenças e práticas próximas e familiares à maior parte da população, eram muitas vezes preferidos aos profissionais diplomados.9

Por fim, venceu o discurso médico e os terapeutas populares foram desqualificados e considerados ilegais. O monopólio da arte de curar tinha que ser dos médicos e os terapeutas não tinham conhecimentos necessários para cuidar da saúde das pessoas e até colocariam suas vidas em risco: eram chamados de charlatões. Mas, apesar da legislação e do discurso médico, os terapeutas populares continuaram a exercer suas artes de cura, como fazem até a atualidade10.

O sistema público de saúde ainda não dá conta de atender a contento toda a população que necessita de cuidados médicos, deixando um espaço para que a medicina popular siga como uma alternativa áqueles que querem cuidar de suas doenças. Assim, A medicina popular segue, ainda, como uma forma de cura, ou de

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cuidado paliativo, empregada, principalmente por mulheres e nos recônditos dos seus lares. Uma herança dos tempos em que a medicina popular tinha prestígio e era tolerada Em geral, essas práticas terapêuticas populares desenvolvidas por mulheres (para cuidar de suas famílias e comunidade) são baseadas na utilização de plantas medicinais e alguns medicamentos tradicionais,vendidos sem receita médica.

Entretanto esse é um universo onde não existe a apropriação exclusiva do saber por parte dos especialistas. Ele é partilhado por todo o grupo. Tanto podemos encontrá-lo no trabalho do raizeiro que faz seus remédios a partir dos vegetais nativos que recolhe no campo, como na seleção de ervas medicinais cultivadas nas sacadas dos apartamentos de uma metrópole. Esse saber partilhado faz da mãe de família o principal agente terapêutico da medicina popular. Ela a tem como o recurso primeiro em qualquer doença que apareça em sua casa, até que possa ter acesso a um médico. 11

Estas mães de família são as mulheres cuidadoras de seus familiares, vizinhos e amigos. Cultivam em seus lares, nos quintais e em vasos, as ervas para fazer seus medicamentos. Geralmente não compram nenhuma erva, mas costumam recolher sementes ou plantas em casas de familiares, amigos e vizinhos.

A MEDICINA POPULAR PRATICADA POR MULHERES EM VITÓRIA DA CONQUISTA.

São diversas as doenças tratadas por estas mulheres: gripe, sarampo, feridas, verminoses, dores, gripe, tosse, tensões, etc. As receitas são passadas oralmente e algumas já são pouco utilizadas.

Essas mulheres dispensam seu tempo em fazer estes medicamentos, armazená-los, e dar-lhos aos doentes. Muitas são referências para a vizinhança e para suas famílias. Por esta atividade, de cuidados, não recebem nenhum tipo de ajuda dos doentes ou de suas famílias. Tudo é realizado por amizade e caridade.

No Brasil, as cuidadoras que cultivam ervas em seus lares, preparam as medicinas e lhas administram aos doentes, que costumam ser os vizinhos, amigos e membros da família. Estes cuidados estão baseados em conhecimentos da medicina popular, os quais dependem da preservação das tradições, principalmente por médio da transmissão oral.

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A medicina popular e os cuidados estão unidos em a vida das mulheres cuidadoras em Brasil. Os cuidados realizam-se em o espaço do lar mediante a utilização de jarabes, infusiones, ungüentos e outros medicamentos caseiros preparados com as plantas cultivadas em o lar.

Esta combinação entre o lar e a medicina popular segue vigente por várias razões. As tradições orales permanecem, e com elas, as receitas das medicinas caseiras. O custo elevado da medicina formal fá-la inaccesible para muitos brasileiros. As ervas medicinales e os cuidados dessas mulheres são gratuitos. A flora brasileira é rica em ervas medicinales, e a maioria tem sua eficácia comprovada.

1 ROSALDO, M. Z. A Mulher, a Cultura e a Sociedade: Uma Revisão Teórica . En: ROSALDO, M. Z. y LAMPHERE, L. (Coords), A mulher, a cultura e a sociedade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979, p. 35.

2

DURÁN, M. A . Sociopsicología del Trabajo no Remunerado. En: LUQUE, Alicia Garrido (Coord.). Sociopsicologia del Trabajo. Madrid: Edit. Uoc, 2006, pp. 6-7.

Extraído em 03.06.2009. http://books.google.com.br/books?id=HWZwRMlUrGYC&pg=PA133&lpg=PA133&d q=sociopsicologia+del+trabajo+no+remunerado+dur%C3%A1n&source=bl&ots=p_wh x-77y4&sig=qdtjG25UKjiogsFJGNiNxzLKKBM&hl=pt-BR&ei=3CpTSoyHGoHH-Qa6m_G_CA&sa=X&oi=book_result&ct=result&resnum=1

3SALCI, M. A. S. y MARCON, S. S. De cuidadora a cuidada: quando a mulher vivencia o câncer. Texto Contexto Enferm, Florianopólis, 17 (3), 2008, p. 405. Extraído em 20.05.2009: http://www.scielo.br/pdf/tce/v17n3/a16v17n3.pdf

4

MARQUES, Vera Regina B. Natureza em Boiões: medicinas y boticários no Brasil setencentista. São Paulo: Editora da Unicamp, 1999, p. 39.

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5

FERREIRA, Luiz Otávio. Medicina Impopular: ciencia médica e medicina popular nas páginas dos periódicos científicos (1830-1840). En: CHALOUB, Sidney at all Claudia Página 2 04/06/2012(org.), (2003), Artes e ofícios de curar no Brasil: capítulos de história social. Campinas: Editora da Unicamp, 2003.

6

RIBEIRO, Márcia Moisés. A Ciência nos Trópicos. A Arte Médica no Brasil do Século XVIII. São Paulo: Hucitec, 1997, p. 16.

7

FERREIRA, Luiz Otávio. Op. Cit.

8

PIMENTA, Tânia Salgado. Terapeutas populares e instituições médicas na primeira metade do século XIX. En: CHALOUB, Sidney at all (org.). Artes e ofícios de curar no Brasil: capítulos de história social. Campinas: Editora da Unicamp, 2003.

9

RIBEIRO, Márcia Moisés. Op. Cit., p. 40.

10

PIMENTA, Tânia Salgado. Op. Cit.

11 RODRIGUES, A. G. . Buscando Raízes.

Horizontes Antropológicos, Porto Alegre,

ano 7, n. 16, 2001, p. 132. Extraído em 02.05.2009:

Referências

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