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A relação entre o envelhecimento e a habilidade de escuta dicótica em indivíduos com mais de 50 anos

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A relação entre o envelhecimento e a habilidade de

escuta dicótica em indivíduos com mais de 50 anos

The relationship between aging and dichotic listening ability in individuals aged over 50 years

Resumo

Objetivo: estudar a habilidade de escuta dicótica de um grupo de indivíduos

com mais de 50 anos e verificar as relações entre processamento auditivo, envelhecimento e perda auditiva. Método: foram avaliados 40 indivíduos na faixa etária de 50 a 83 anos, subdivididos em Grupo A (normo-ouvintes), grupo B (indivíduos com audição normal para idade) e grupo C (indiví-duos com perda auditiva). Realizaram-se os seguintes procedimentos: anamnese, inspeção otológica, exames audiológicos e avaliação do processamento auditivo por meio da aplicação dos testes dicóticos de dissílabos alternados e dígitos. Resultados: verificou-se um transtorno do processamento auditivo em todos os grupos avaliados; o grau de alteração foi mais importante no grupo C; em todos os grupos, a habilidade auditiva mais afetada foi a de atenção seletiva. Conclusão: observou-se que o avanço da idade é um fator predisponente para alterações do processamento audi-tivo, em especial para a escuta dicótica, sendo que este pode, ainda, rece-ber influência de perdas auditivas periféricas.

Abstract

Objective: To study the dichotic listening ability of a group of individuals over

50 years old and to verify the relationship between auditory processing, aging and hearing loss. Method: 40 individuals aged from 50 to 83 years were evaluated, subdivided into group A (normal listeners), group B (individuals with normal audition for their age) and group C (individuals with hearing loss). The following procedures were performed: anamnesis, otological

Universidade Tuiuti do Paraná. Curitiba, PR, Brasil 1 Curso de Fonoaudiologia.

2 Programa de Pós-graduação em Distúrbios da Comunicação Correspondência / Correspondence

Ângela Ribas

E-mail: angela.ribas@utp.br

Marine Raquel Diniz Rosa1 Angela Ribas1 Jair Mendes Marques2

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332 REV. BRAS. GERIATR. GERONTOL., 2009; 12(3):331-343

Key words:

Audiology. Hearing. Aging. Hearing Loss. Auditory Perception.

inspection, audiological exams and evaluation of auditory processing by the administration of the dichotic tests of alternate disyllables and digits. Results: A disorder of auditory processing was verified in all the groups evaluated; the degree of alteration was more important in group C; in all groups the most affected auditory ability was selective attention. Conclusion: It was observed that the aging progress is a susceptible factor for alterations of auditory processing, especially for dichotic listening in view of the fact that this can still receive influences from peripheral auditory losses.

INTRODUÇÃO

Do ponto de vista demográfico, segun-do Carvalho & Andrade,1 envelhecer signi-fica aumentar o número de anos vividos. Paralelamente à evolução cronológica, coe-xistem fenômenos de natureza biológica, psíquica e social importantes para a percep-ção da idade e do envelhecimento.

O crescimento da população de idosos, em números absolutos e relativos, é um fe-nômeno mundial e está ocorrendo em um nível sem precedentes. A população mun-dial está vivendo uma fase de declínio nos índices de natalidade e mortalidade, com consequente aumento da expectativa de vida. Estima-se que em 2020 existirão mais de um bilhão de pessoas com idade igual ou superior a 60 anos em todo o mundo.2

Tal assertiva aponta para o envelhecimen-to da população e, consequentemente, para o aumento das demandas relacionadas à saú-de saú-desta faixa etária. Segundo Papáleo Net-to & Borgonovi,3 O envelhecimento carac-teriza-se por ser um processo dinâmico e progressivo, no qual as alterações, tanto morfológicas como funcionais e

bioquími-cas, vão alterando progressivamente o orga-nismo, tornando-o mais suscetível às agres-sões físicas que terminam por levá-lo à morte.A diminuição da capacidade funcio-nal de órgãos e tecidos é a principal caracte-rística do envelhecimento e acarreta um ris-co aumentado de doenças crôniris-co-degene- crônico-degene-rativas e o declínio do status do idoso na família e na sociedade. A gradual perda de energia física e produtividade econômica tende a isolá-lo e privá-lo de fontes de in-formação e comunicação.

Diversas ciências têm laços de afinidade com a geriatria e a gerontologia, por inves-tigarem, de maneira interdisciplinar, as ques-tões envolvidas com o envelhecimento hu-mano. Uma delas, foco deste trabalho, é a Fonoaudiologia.

A Fonoaudiologia estuda os aspectos re-lacionados à comunicação humana, seus dis-túrbios e formas de tratamento, envolvendo a audição, o equilíbrio, a fala, a linguagem oral e escrita e a voz. Um dos aspectos da comunicação estudados pela Fonoaudiolo-gia é a audição, tanto do ponto de vista peri-férico (estruturas do ouvido) quanto central (vias auditivas e córtex auditivo).

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Pesquisas demonstram que o ouvido humano atinge sua maturidade por volta dos 18-20 anos. A partir desta faixa etária, o órgão auditivo começa a envelhecer, seja por perda de células sensoriais, degenera-ção neurológica, exposidegenera-ção a agentes ototó-xicos ou ruído. As vias auditivas centrais e o cérebro também sofrem alterações ao lon-go da vida, e problemas relacionados à aten-ção auditiva, memória, codificaaten-ção e deco-dificação podem ser encontrados em popu-lações idosas.4

Estes problemas, sejam de ordem peri-férica, como perdas auditivas,5 ou de ordem central, as chamadas desordens de processa-mento auditivo,6 quando afetam o idoso, acabam por desencadear problemas de co-municação importantes, que por sua vez geram dificuldades de adaptação social, ocu-pacional e familiar. É muito comum indiví-duos idosos referirem que são capazes de ouvir, mas não entendem a fala.

No idoso, a presbiacusia é o tipo de al-teração auditiva mais comum. Trata-se de uma perda auditiva bilateral para sons de altas frequências que pode gerar uma de-sordem do processamento auditivo por pri-vação sensorial que afeta diretamente o mecanismo cerebral. Por processamento auditivo entendem-se as habilidades auditi-vas relatiauditi-vas à codificação, decodificação e interpretação dos estímulos em nível de sis-tema nervoso central,7 e a desordem do pro-cessamento auditivo refere-se exatamente às alterações ou dificuldades de processamen-to da informação auditiva. Nestes casos, a

perda das informações acústicas diminui a probabilidade de se entender a fala e a in-terpretação dos sinais complexos.8

Uma das melhores maneiras de intervir na diminuição auditiva e na dificuldade em entender a fala é adaptar um aparelho de amplificação sonora individual, também conhecido por prótese auditiva. Entretan-to, é comum encontrar, na prática clínica da Fonoaudiologia, mesmo após várias ten-tativas, pacientes idosos que não se adap-tam a ele. Essa dificuldade na adaptação se deve, muitas vezes, a uma desordem do pro-cessamento auditivo, o que pode limitar o benefício do aparelho e influenciar na rea-bilitação de forma negativa.9

Tendo por bases estes pressupostos, o objetivo deste estudo foi analisar a qualida-de das funções auditivas periféricas e cen-trais de um grupo de indivíduos com idade entre 50 e 83 anos, por meio de testes audi-tivos dicóticos, determinando suas peculia-ridades quando isoladas as variáveis idade e perda auditiva periférica.

MATERIAL E MÉTODO

Esta pesquisa foi realizada no Laborató-rio de Audiologia da Clínica de Fonoaudio-logia da Universidade Tuiuti do Paraná (UTP). A amostra foi composta por 40 in-divíduos, com idade variando entre 50 e 83 anos, sendo 24 do gênero feminino e 16 do masculino, tendo em vista a dificuldade em encontrar indivíduos com idade acima de

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50 anos com audição dentro dos padrões de normalidade.

Todos os sujeitos da amostra foram sub-metidos a anamnese específica, avaliação au-diológica básica (audiometria tonal limiar e imitanciometria) e exame de processamen-to auditivo (testes dicóticos SSW e Dígi-tos). Estes testes foram escolhidos por ava-liarem os dois ouvidos ao mesmo tempo, com estímulos diferentes e competitivos entre si, o que permite verificar a capaci-dade que o indivíduo possui de realizar algumas tarefas auditivas complexas, como: atenção seletiva, fechamento auditivo, aná-lise e síntese e organização de eventos so-noros no tempo.

Os exames foram realizados em cabine acústica, por meio do audiômetro Intera-coustics, modelo AC-40, devidamente cali-brado e acoplado a um CD player. Os resul-tados obtidos foram organizados em gráfi-cos e tabelas e analisados através do

progra-ma SPHINX LEXICA. Para análise dos re-sultados do exame de processamento audi-tivo e para determinar relação de melhor ouvido, utilizou-se o teste de WILCO-XON, adotando-se como valores significan-tes quando p<0,05.

Este estudo é do tipo descritivo, tendo em vista seu objetivo primordial, a descri-ção das características de determinada po-pulação, fenômeno e suas relações. Foi apro-vado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade Tuiuti do Paraná-UTP (apro-vação n°074/2005) e todos os participantes do estudo assinaram o termo de consenti-mento livre e esclarecido.

RESULTADOS

A avaliação audiológica básica permitiu qualificar a amostra e definir algumas condi-ções auditivas dos indivíduos avaliados. Os resultados estão especificados na tabela 1.

Feminino Masculino Faixa Etária

Limiares auditivos dentro da normalidade

9 (22,5%) 1 (2,5%) 50 a 68 anos

Limiares auditivos levemente alterados 6 (15%) 4 (10%) 50 a 71 anos Perda auditiva neurossensorial leve 9 (22,5%) 11 (27,5%) 60 a 83 anos

Total 24 (60%) 16 (40%)

Tabela 1 – Número de sujeitos de acordo com as características auditivas periféricas (N=40).

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Os dados obtidos na audiometria tonal foram classificados de acordo com Davis & Silverman.10 Todos os sujeitos apresentaram resultados da imitanciometria compatíveis com os da audiometria tonal limiar.

Considerando os resultados da avaliação audiológica básica, foi possível agrupar os indivíduos avaliados em três categorias, que posteriormente tiveram os dados analisados, de forma independente, com a finalidade de determinar a qualidade auditiva dos mesmos. Desta forma, os sujeitos que tiveram

resulta-dos audiológicos normais passaram a ser de-nominados neste estudo de grupo A (n=10), os que tiveram resultados audiométricos le-vemente alterados, mas ainda considerados normais, segundo ISO 7029,11 grupo B (n=10), e aqueles com perda auditiva leve ou moderada de grupo C (n=20).

A anamnese permitiu verificar dados im-portantes que caracterizam as queixas e con-dições de escuta dos sujeitos e é apresentada na tabela 2, já se considerando a subdivisão dos grupos citada anteriormente.

Tabela 2 – Número de sujeitos de acordo com queixas auditivas e de escuta. Tuiuti, PR,

2007. Grupo A (n=10) Grupo B (n=10) Grupo C (n=20)

Não refere dificuldade auditiva 10 (100%) 8 (80%) 3 (15%)

Refere dificuldades para compreender a fala em ambientes confortáveis

acusticamente

0 (0%) 4 (40%) 16 (80%)

Refere dificuldades para compreender a fala em ambientes ruidosos

4 (40%) 4 (40%) 18 (90%)

Refere dificuldades para compreender a fala na presença de 2 ou mais

interlocutores

0 (0%) 5 (50%) 18 (90%)

Com relação ao exame de processamento auditivo, observamos que em todos os grupos houve a identificação de algum tipo de altera-ção de percepaltera-ção auditiva. Os resultados obti-dos nos testes SSW e Dicótico de dígitos

per-mitiram classificar o grau desta alteração de acordo com critérios de Pereira,12 o ouvido mais afetado e a condição de escuta, ou seja, habili-dade auditiva mais alterada. Estes dados estão representados nos gráficos 1, 2 e 3.

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Gráfico 1 – Número de sujeitos de acordo com o grau da alteração do processamento

auditivo. Tuiuti, PR, 2007. 30% 60% 15% 50% 30% 30% 35% 10% 30% 10% 0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70%

Grupo A Grupo B Grupo C

Normal Leve Moderado Severo

Gráfico 2 – Número de sujeitos de acordo com o ouvido mais alterado. Tuiuti, PR, 2007.

30% 20% 40% 70% 70% 60% 10% 0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80%

Grupo A Grupo B Grupo C

OD OE Igual

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Com relação ao ouvido mais afetado, registrou-se diferença estatisticamente signi-ficante (p=0,0005), quando comparados os dados do grupo C, que diferem significati-vamente dos grupos A e B, ou seja, os sujei-tos do grupo C tiveram pior desempenho nos exames de processamento auditivo quan-do o input se deu pelo ouviquan-do esquerquan-do.

DISCUSSÃO

Buscando atingir o objetivo proposto no início deste estudo, analisamos as respostas auditivas aos testes auditivos periféricos e centrais dos sujeitos avaliados, e observamos, como dado mais relevante, que independen-temente da presença da perda auditiva

peri-férica (vide tabela 1), as alterações de pro-cessamento para a escuta dicótica apareceram nos três grupos avaliados (vide gráfico 1), o que permite inferir que o envelhecimento das vias auditivas centrais está diretamente rela-cionado à dificuldades de escuta normalmen-te relatadas por populações idosas.

Por escuta dicótica entende-se a capacida-de que o indivíduo possui capacida-de escutar sinais de fala, ou outros, pelos dois ouvidos ao mesmo tempo, em situações de fala degrada-da, ou seja, na presença de estímulos compe-titivos. Esta tarefa é realizada constantemen-te e sem dificuldades no dia a dia das pesso-as, em situações como salas de aula, conver-sas em grupo, nas igrejas e nas próprias resi-dências. Normalmente as pessoas conseguem

Gráfico 3 - Número de sujeitos e a dificuldade na condição de escuta. Tuiuti, PR, 2007.

100%

90%

95%

5%

10%

0%

20%

40%

60%

80%

100%

120%

Grupo A

Grupo B

Grupo C

Com competição Sem Competição Igual

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focalizar a atenção no que é importante e relegam para segundo plano aquilo que não interessa no momento, apesar de estarem sem-pre atentas a todos os sons sem-presentes no am-biente. Desta forma, o que registramos nesta pesquisa é que em todos os grupos houve dificuldades em escuta dicótica.

Outro aspecto relevante a ser pontuado foi o fato de que, com o avanço da idade, aumentam as queixas auditivas e aumentam também as dificuldades audiológicas, obser-vadas tanto em nível auditivo periférico quanto central (vide tabela 1 e gráfico 1).

Todos os indivíduos do grupo A referi-ram ouvir bem, porém 70% deles apresenta-ram alteração de percepção no exame de pro-cessamento. O não-aparecimento dessa quei-xa auditiva se deve ao nível de audição nor-mal encontrado nesses indivíduos, porém os resultados dos exames revelam que esta po-pulação já apresenta dificuldades de percep-ção, principalmente no que se refere ao escu-tar a fala em situação acústica degradada.

O grupo B, em sua maioria (80%) acha que ouve bem, apesar de os indivíduos apresentarem rebaixamento auditivo quan-do consideraquan-dos os padrões sugeriquan-dos por Davis & Silvermann.10 Este dado se expli-ca em função de a perda auditiva acome-ter as frequências altas, responsáveis mais pela inteligibilidade de fala do que pela sensação auditiva propriamente dita. Nes-te grupo também se registrou alNes-teração de processamento auditivo em 70% dos su-jeitos, mais especificamente na habilida-de habilida-de atenção seletiva.

Já 85% dos idosos do grupo C respon-deram que não escutam bem. Trata-se, por-tanto, da perda auditiva periférica interfe-rindo no processo de comunicação. É no grupo C que aparecem os relatos significa-tivos de dificuldades para compreender a fala, para escutar em ambientes ruidosos e de dificuldades para se comunicar quando há dois ou mais interlocutores (vide tabela 2), sendo que 100% dos sujeitos deste gru-po falharam no exame de processamento auditivo. Estes resultados estão compatíveis com a literatura,de acordo com Freitas & Oliveira,13 que afirmaram que é comum a prevalência da perda auditiva em aproxima-damente 46% em indivíduos de 48 a 92 anos, tornando-se mais frequente a partir dos 55 anos de idade, atingindo cerca de 14% da população entre 60-64 anos e 50% a 60% acima dos 80 anos.

Os testes dicóticos aplicados nesta pes-quisa permitiram verificar se as pessoas ava-liadas possuem algum problema de percep-ção auditiva. Em caso positivo, qual o grau desta alteração e qual a habilidade auditiva mais comprometida.

Em relação ao grau, Pereira14 refere que esta pode ser leve, moderada ou severa, e que quanto pior for a classificação, mais difícil é o processo de comunicação com o indivíduo afetado.

No que se refere às habilidades auditi-vas, fazem parte do processo de escuta as capacidades de realização de análise e sín-tese (ou fechamento auditivo), organização de eventos sonoros no tempo (ou

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memó-ria de curto prazo) e figura-fundo (ou aten-ção seletiva).

Conforme afirmamos anteriormente, em todos os grupos avaliados, foi detectado al-gum tipo de alteração do processamento auditivo para a escuta dicótica. Mesmo no grupo A, no qual os indivíduos não apre-sentam queixas em relação à percepção au-ditiva (tabela 2), observa-se alguma altera-ção de processamento, e como não há pre-sença de perda auditiva, nem rebaixamento auditivo nas frequências altas, as alterações encontradas podem estar relacionadas ao envelhecimento do sistema auditivo.

No grupo B há presença de rebaixamento auditivo nas frequências altas, podendo estes déficits de grau leve e moderado estar relacio-nados com a alteração da percepção auditiva, como também com o comprometimento pe-riférico apenas nas altas frequências.

Os resultados obtidos nos grupos A e B vão de encontro à literatura pesquisada, ten-do em vista que Bess, Hedley-Williams e Lichtenstein15 relatam que a dificuldade na compreensão de fala entre os idosos parece ser acentuada mesmo entre ouvintes nor-mais quando a tarefa de escuta se torna nor-mais difícil por meio da degradação do sinal de fala. Em se tratando da presença de rebaixa-mento auditivo nas altas frequências, a per-cepção da fala torna-se difícil, principalmen-te devido à concentração maior de conso-antes nesta faixa de frequência.

No grupo C, todos os idosos apresenta-ram alteração do processamento auditivo,

confirmando estudos que relataram que, no idoso, a função auditiva central pode estar reduzida por uma perda geral de neurônios em todo o sistema nervoso.16,17

Os variados graus de alteração encontra-dos na população do Grupo C podem estar relacionados com a presença de perda auditi-va periférica. Segundo Katz, Tillery e Mec-ca,18 a associação entre fatores periféricos e centrais aumenta o desafio para o paciente e, desta forma, ele acaba cometendo mais er-ros. No entanto, os autores Jerger et al.19 dis-cordam desta afirmativa e relatam que a alte-ração do processamento auditivo parece ser independente da perda de sensibilidade peri-férica, mas segundo os mesmos, a diminui-ção na velocidade do processamento da in-formação, muito frequente na população idosa, pode afetar significativamente o de-sempenho da percepção da fala.

Assim como a diminuição auditiva, a dificuldade de entender o que as pessoas falam, mesmo em ambientes confortáveis acusticamente, é uma queixa muito comum entre os idosos e esta se deve à própria con-figuração audiométrica desses indivíduos. Nos grupos B e C, onde há alteração de limiares auditivos, percebe-se aumento de queixas relacionadas à compreensão da fala. Pedalini et al.20 afirmaram que essa queixa se deve à configuração audiométrica da per-da auditiva, que, no caso per-da presbiacusia, atinge as frequências altas, tornando difícil a percepção dos fonemas consonantais. En-tretanto, os mesmos autores asseguram que esta queixa nem sempre pode ser explicada exclusivamente pela perda auditiva,

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do ser atribuída a alterações do sistema ner-voso central. Quintero, Marotta e Marone21 afirmaram que as diversas mudanças que ocorrem nas vias auditivas periféricas e cen-trais do indivíduo idoso possivelmente in-terferem na sua habilidade de processar efi-cientemente a fala que recebe, determinan-do com frequência sua dificuldade de com-preensão, independentemente do grau da perda auditiva.

Duas situações de escuta difícil foram bem identificadas nesta pesquisa: a primei-ra, relativa à existência de dificuldades de compreensão frente a vários interlocutores; a segunda, relativa à dificuldade de compre-ender a fala em ambientes degradados, onde há ruído de fundo importante.

Quando, num mesmo ambiente, vários interlocutores competem entre si, dificulta-se a tarefa de atenção dificulta-seletiva ou figura-fun-do auditiva. Nenhum sujeito figura-fun-do grupo A afirmou ter esta dificuldade, porém 50% de idosos do grupo B e 90% do grupo C recla-mam que nestas condições é mais difícil co-municar-se. A situação de fala com mais de um interlocutor dá uma ideia de outros ruí-dos de fala, isto é, várias pessoas conversan-do ao mesmo tempo, e isso já representa cer-to ruído competitivo. Em se tratando de gru-pos com perda auditiva (grupo C), mesmo que restrita às altas frequências (grupo B), a situação de escuta deixa de ser ideal, pois agora o indivíduo terá outros sons de fala para pres-tar atenção e discriminar.

Quando o ambiente sonoro não é o ideal, no caso de haver ruído competitivo, como

motores funcionando, eletrodomésticos liga-dos, barulho de carros e outros veículos, por exemplo, as dificuldades aumentaram. No grupo A, 10% afirmaram que não ouvem bem em ambientes ruidosos; no grupo B, 40% dos idosos afirmaram sentir dificulda-de; e no grupo C, foram 80%. Segundo Northern & Downs,22 ruídos de fundo co-muns variam de aproximadamente 35 a 68 dB NPS, e para adultos com audição nor-mal, a situação na qual o ruído é 10-15 dB abaixo do nível da fala não cria dificuldade de escuta, pois o ouvinte pode preenchê-lo com as pistas acústicas que faltam. Entretan-to, em se tratando de idosos, a discrimina-ção da fala torna-se difícil, principalmente, devido à perda auditiva mais restrita às altas frequências, onde se concentram o maior número de fonemas consonantais.

Soncini, Costa e Oliveira23 explicaram que adultos com mais de 50 anos, normo-ouvintes, necessitam de maior intensidade na apresentação das sentenças no silêncio e no ruído para alcançar o mesmo percentual de reconhecimento de fala que os adultos jovens também normo-ouvintes. Desta for-ma, acreditam que o processo de envelheci-mento é um fator que interfere no reconhe-cimento da fala no silêncio e no ruído, quando a audição periférica é normal. Zam-perlini, Kyrillos e Santos24 também afirmam que a diminuição na inteligibilidade da fala, sobretudo em ambientes ruidosos, é decor-rente das alterações centrais que em geral se iniciam aos 60 anos.

Quando analisamos os dados relativos ao ouvido mais afetado (vide gráfico 2),

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ve-rificamos que houve diferença estatistica-mente significante quando se compararam os dados dos grupos A e B com os do gru-po C. A literatura pesquisada gru-por Hallgren et al.25 refere que estudos realizados com testes dicóticos em idosos encontraram pro-blemas quando o input se dava pelo ouvido esquerdo. Os referidos dados também con-cordam com os autores,26 que estudaram casos de adultos destros e encontraram van-tagem auditiva do ouvido direito para pro-cessar estímulos dicóticos verbais, sugerin-do déficit na transferência da informação via corpo caloso. Em outro caso estudado pelas mesmas autoras, evidenciou-se diferen-ça de desempenho entre os dois ouvidos no teste dicótico, com vantagem auditiva do ouvido direito de 12%, podendo este dado ser explicado pelo início do processo de envelhecimento das vias auditivas centrais.

Os dados coletados a respeito do ouvi-do mais alteraouvi-do são essenciais para se fazer o topodiagnóstico da alteração, além de auxiliar a escolha do ouvido a ser proteti-zado em casos de adaptação unilateral, onde, de acordo com a literatura pesquisada,9 a orelha com menor comprometimento da função auditiva central seria a mais indica-da para a aindica-daptação.

Para finalizar a análise dos dados, é rele-vante demonstrar que praticamente todos os sujeitos da amostra (90%) apresentaram dificuldade quando a condição de escuta foi competitiva (vide gráfico 3). Desta forma, quando os sujeitos desta pesquisa foram submetidos à fala em situação degradada,

mesmos apresentam dificuldade para com-preendê-la.

Conclui-se, portanto, que a idade, além da perda auditiva, contribui para o baixo desempenho de idosos na percepção de fala na presença de ruído, em que tarefas auditi-vas mais complexas que envolvem estímu-los de fala apresentados em condições me-nos favoráveis demonstram deterioração maior nos resultados de indivíduos idosos do que em indivíduos mais jovens. Desta forma, o processo de envelhecimento é um fator que interfere no reconhecimento da fala em situações degradadas, mesmo quan-do a audição periférica é normal.

CONCLUSÃO

A pesquisa em questão revelou, através de seus resultados, a existência de uma rela-ção importante entre o processamento au-ditivo com o fator envelhecimento, tendo em vista que:

• 85% da amostra apresentaram alguma alteração de processamento auditivo, independentemente da presença de per-da auditiva periférica.

• A queixa auditiva relativa à dificuldade de ouvir em locais não ideais de escuta é preponderante na amostra estudada, o que evidencia dificuldades com a habilidade de atenção seletiva na população idosa. • Na medida em que aumenta a faixa etária

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auditivas e o grau de alteração do processamento auditivo.

• Na medida em que aumenta a perda auditiva, aumenta o grau de alteração do processamento auditivo.

• No que concerne à condição de escuta com-petitiva e não-comcom-petitiva, a maioria dos indivíduos, em todos os grupos, apresen-tou resultados piores, estatisticamente significantes, em condição de escuta com-petitiva. A alteração do processamento au-ditivo aparece com maior significância quan-do o input se dá pelo ouviquan-do esquerquan-do.

Tendo em vista os resultados encon-trados neste estudo, pode-se inferir a im-portância da avaliação audiológica com-pleta, que envolva testes periféricos e cen-trais, em populações idosas, com vistas a uma reabilitação auditiva adequada, espe-cialmente direcionada para as habilidades auditivas prejudicadas. Os resultados au-diológicos podem auxiliar no processo de seleção e adaptação de próteses auditivas e, assim, mais benefícios podem ser apre-sentados a esta população, minimizando os efeitos do envelhecimento sobre a per-cepção auditiva.

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Recebido:1/10/2008 Revisado: 27/5/2009

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Referências

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