PREFÁCIO
I
Eis que consigo, finalmente, folhear, reunidas, as mais
re-presentativas poesias de Eduíno de Jesus, seleccionadas por
ele próprio e em não pequena parte corrigidas ou mesmo
(al-gumas das mais antigas, sobretudo) refundidas.
Através do tempo, pude apreciá-las, primeiro, em três
volumes —
Caminho para o Desconhecido (1952), O Rei Lua
(1955) e
A Cidade Destruída durante o Eclipse (1957) —,
publicados nos anos de Coimbra, que tão fecundos foram ao
autor, pois é também por essa altura que vem a lume a sua
única peça de teatro editada em livro:
Cinco Minutos e o
Des-tino (1959); depois, à maneira que as fui encontrando neste
ou aquele jornal, nesta ou aquela revista, principalmente de
Lisboa e do Porto, onde foram sendo publicadas (raramente, é
preciso dizer) ao longo de quase meio século.
Eduíno de Jesus nasceu pelo começo do segundo quartel do
século
XXnos Açores, ilha de S. Miguel, numa aldeia limítrofe de
Ponta Delgada, mas logo depois passou a viver nesta cidade
até passante dos vinte anos.
Eu, menino provinciano também, mas do continente, criado
em terra aberta às navegações do mundo e a uma fronteira
activa, posso apenas imaginar a infância plácida do
menino
feio, de bibe, como o próprio poeta se recorda (menino que fui,
um dia…, diz
1) na austeridade da pedra escura erguida em
igrejas, conventos, palácios, frente a um mar vazio, a bruma
a descer sobre as coisas, sobre as almas.
O lar do poeta era acolhedor. Havia serões de leitura em
família em que uma das irmãs (a mais velha dos quatro
fi-lhos da casa) lia romances em voz alta. Outras vezes era a
mãe que preenchia o serão com paráfrases entremeadas de
excertos cantados do romanceiro, contos tradicionais e outros
de proveito e exemplo (tradicionais ou não), lendas, fábulas e
histórias de animais conhecidas ou que ela mesma, as mais
das vezes, inventava a pedido dos mais pequenos, a fim de os
manter quietos e atentos e como forma mais atractiva de lhes
ir desenvolvendo o senso moral e a fantasia.
Longas eram essas noites da Ilha, propícias ao sonho — e
algumas de estrelas, se a bruma dava licença —, quiçá
recor-dadas no lirismo de uma «Xácara das Moças Donzelas», que
vem no primeiro livro, em que estão retratadas, à maneira de
modinha, as meninas provincianas daquele tempo, de coração
alerta para o deslumbramento do amor… mas tão «sozinhas
no mundo»
2.
Solto da vigilância da casa, vieram, depois, as tropelias da
rua, algumas recordadas no poema «Linhas para um Retrato
do Poeta quando Jovem»
3; mais tarde, os alegres ou tristes
amores juvenis, evocados em poemas como «Quadro Antigo»
4,
«Ai Amor!»
5, «Uma Parede onde não Bate o Sol»
6, etc.; e, a
breve trecho, a perda da inocência (das «asas brancas»
7, diria
garrettianamente Eduíno no mesmo poema das «Linhas para
um Retrato»):
Este poema é o […] / das mãos que vieram
ti-rar-me as asas brancas.
Então foi o
cais que lhe dirigiu o apelo, um cais de
apar-tamentos e reencontros
(navios vão / navios vêm
8), com lenços
acenando adeuses aos que vão
tão doentes da partida e dos
2 In Caminho para o Desconhecido. Neste vol., p. 64. 3 In O Rei Lua. Neste vol., p. 99.
4 Ibid., p. 98.
5 Vide, neste vol., «Melodia Imperfeita», p. 239. 6 Vide ibid., p. 250.
7 In O Rei Lua. Vide, neste vol., p. 99. 8 Vide nota 9 infra.
que ficam
tão cansados, tão chorosos à sua espera (e ay Deus
se verra [n] çedo!).
Nesse cais o poeta terá assistido na juventude, numa
noi-te de luar ultra-romântica, ao resganoi-te de uma menina encon-
trada «deitada nas ondas», cuja visão havia de evocar, bem
depois, poeticamente transfigurada e posta em «palavras
re-buscadas»
(como ele mesmo reconhece utilizar em poesia
9),
numa das suas mais belas composições — uma
suite de cinco
apontamentos líricos muito breves sob o titulo de «Ode
Elegía-ca a Luzília Afogada»
10— a que me hei-de voltar a referir
mais adiante a outro propósito.
Embora ilhéu de nascimento e coração, Eduíno de Jesus
não é, todavia, poeta de
insularidades: o açorianismo (ou a
açorianidade, como agora sói dizer-se por lá) não se revela,
intenso ou vago, na sua poesia. Ou
quase, para ser mais
exac-to. Pois não terá alguma coisa de
insular aquele imaginário
«Cais da Saudade»
11em que se desfazem e renascem os
so-nhos do poeta?
No cais da Saudade
diz ele,
Choro um sonho e ponho
outro sonho à água.
O mesmo, de resto, se poderá notar noutros poemas, embora
raros, de despedida, de saudade, de evocação. Assim, por exem-
plo, e até de forma bem mais vincada, numa nostálgica
«Pai-sagem com Barcos»
12, em que se sente, aí sim, o peso de uma
certa atmosfera insular:
A esfumada paisagem o porto solitário
[…]
9 Vide, adiante, a advertência «Ao Leitor», no «Pórtico» deste livro, p. 39. 10 Vide, adiante, pp. 255-260
11 In O Rei Lua. Vide, adiante, p. 120. 12 Vide, adiante, p. 295.
Acaso conheceis vós outros acaso conheceis
a melodia do vento o rumor das vagas no bojo dos
barcos parados?
[…]
Agora há só os fantasmas que passam em silêncio
descem as ruas que vão dar inevitavelmente ao porto
ficam parados observando os barcos para sempre
ancorados na doca
e ao entardecer regressam outra vez cabisbaixos ao
interior da ilha
e lá ficam
Outrora houve por aqui uma cidade sim
Em todo o caso, Eduíno de Jesus não é, dizia eu, poeta de
insularidades, como os paradigmáticos Roberto de Mesquita e
Vitorino Nemésio e muitos outros poetas dos Açores que
na-vegam na corrente nativista derivada daqueles mestres e que
se tornou marcante na poesia açoriana a partir do meado do
século
XX(ver Pedro da Silveira, por exemplo). Talvez porque
depressa abandonasse a ilha-berço, numa precipitação de
ras-gar, adulto, horizontes amplos, desafogados, livres…?
Ainda na Ilha, Eduíno de Jesus, com outros jovens da sua
geração — quase todos, na altura, finalistas do Liceu de Ponta
Delgada —, fundou o Círculo Literário de Antero de Quental,
tomando para patrono um grande das Letras e do Pensamento
nacionais, açoriano pelo nascimento (e pela ancestralidade, que
remontava ao século do povoamento das ilhas), cujo nome
pró-prio substitui, numa poesia de António Nobre, o do Arcanjo no
topónimo da sua ilha-berço: a «Ilha de Antero». As
conferên-cias públicas e recitais de poesia promovidos por esse Círculo
juvenil alvoroçaram um tanto a pacatez do meio literário local.
Eduíno de Jesus começou por esse tempo a colaborar
as-siduamente nos jornais da Ilha com poesias, contos e artigos,
revelando-se — após ter, no alvoroço sentimental da
adoles-cência, consagrado as suas primícias no altar da musa
ro-mântica — um
activista irreverente e iconoclasta no combate
pela modernidade, ávido de mergulhar nas novas correntes de
ideias e estéticas adoptadas
cá fora pelas vanguardas
literá-rias e artísticas europeias, as quais, na altura, ainda eram
ou desconhecidas ou hostilizadas com ostensiva acrimónia no
meio intelectual micaelense, não obstante alguns poetas dos
Açores terem servido nas fileiras modernistas nacionais ou
andado perto, como Côrtes-Rodrigues, Rebelo de Bettencourt,
Duarte de Viveiros, Nemésio e provavelmente mais um ou
ou-tro de que não tenho notícia
13.
Foi também então que se reacendeu na imprensa insular
a sempre inconclusa questão da autonomia da literatura
aço-riana no contexto da literatura portuguesa, alimentada por
teorias antagónicas, nem sempre assaz fundamentadas, e, por
isso, geradoras de inúmeras polémicas, nas quais Eduíno de
Jesus interveio desde o início
14.
Mas um dia chegou que foi o dia do
adeus. Um adeus de
despedida de si mesmo:
eu, o único passageiro do navio
e único amigo
ainda com o último abraço no cais;
15ou como aquele do excêntrico emigrante das ilhas, retratado,
em verso livre, no poema «Conquista»
16, um
sem-abrigo, uma
13 Côrtes-Rodrigues privou intimamente em Lisboa com Fernando
Pessoa e colaborou nas revistas do 1.o modernismo Orpheu (1915) e Exí-lio (1916); Rebelo de Bettencout é o panegirista de Santa Rita Pintor, que no Portugal Futurista (1917) assina Bettencourt-Rebelo e B.-R.; Du-arte de Viveiros, apologeta de Sidónio Pais como Fernando Pessoa, fre-quentou os modernistas em Lisboa e vem mencionado pelo futuro poeta da Mensagem numa carta a Côrtes-Rodrigues; e, finalmente, Nemésio, um dos mais originais poetas da 2.a geração modernista, conta-se entre
os colaboradores da revista Presença, de Coimbra, embora não integrasse o movimento presencista, pelo menos não ortodoxamente. Destes autores, entre outros, me ocupo no livro 12 Poetas Açorianos, Lisboa, ed. Sala-mandra, 2001.
14 Cf. Onésimo Teotónio Almeida, A Questão da Literatura Açoriana,
Angra do Heroísmo, Secretaria Regional da Educação e Cultura, 1983.
15 In A Cidade Destruída durante o Eclipse. Vide, adiante, p. 172. 16 In A Cidade Drestruída durante o Eclipse. Versão neste livro,
vítima de
exclusão social, como hoje se diz (antigamente
cha-mado
vagabundo), lunático, a um tempo orgulhoso e
magoa-do, que trocara a aldeia natal pela grande metrópole e que,
em seus sonhos de banco de jardim
(hoje, sou o dono de um
parque onde há um banco e aí durmo e sonho), conquista a
cidade
(pois, apesar disso, a cidade, conquistei-a) e ascende a
um lugar de destaque na alta finança internacional:
Tenho uma mansão em Newport, na Nova
Inglater-ra, e um yacht ancorado em Saint Tropez, e amanhã
mesmo vou montar um negócio de baleias em Liverpool.
[…]
Sou, isso sim, um armador grego, controlo a
maio-ria dos casinos de Las Vegas, tenho 5% nos negócios de
petróleo da Pérsia e já comprei (meu sonho antigo!) o
aeroporto de Santa Maria,
temeroso apenas de que a edilidade
mande despejá-lo daquele
banco em que dorme e sonha:
(Só tenho medo que um dia
o inspector dos bancos dos jardins públicos
descubra
e me venha comunicar
que o meu banco ali debaixo do plátano à beira do
tanque onde nadam os pequenos peixes vermelhos que
me vêm comer à mão
pertence à Câmara Municipal.)
Poema de meia-ironia, ao mesmo tempo grave e
caricatu-ral, tão diferente do retrato daquele frustrado emigrante da
poesia do cabo-verdiano Jorge Barbosa, todo doído do desejo
de partir e ter de ficar…
Enfim, concluídos os estudos secundários e havendo-se
di-plomado pela Escola do Magistério Primário de Ponta
Delga-da, Eduíno de Jesus deixou a Ilha e passou a girar na órbita
coimbrã, leccionando ao mesmo tempo as primeiras letras em
Lorvão, num estreito vale da margem direita do Mondego, a
montante de Coimbra, que deve a notabilidade a um imenso
e histórico convento que anda na écloga
Crisfal e no poema
D. Branca, do «divino» Garrett, e cuja data da fundação se
perde nas brumas de antigas lendas e na fantasia
historiográ-fica de Frei Bernardo de Brito.
Deixou para trás, ao deixar a Ilha, justamente pelo meado
do século, um fervilhar de tertúlias literárias e o convívio com
um mago do
Orpheu, Armando Côrtes-Rodrigues, de quem
mais tarde viria a estudar profundamente a obra
17e com
quem longamente se havia de cartear
18.
(Foi por intermédio
de Eduíno de Jesus — deixo aqui entre parêntesis — que
conheci pessoalmente aquele poeta no remoto ano de 1971 e
estabeleci com ele laços de uma duradoira amizade literária,
que já tive ocasião de recordar em mais do que um lugar dos
meus estudos e memórias
19.
)
O fito do poeta, ao instalar-se em Lorvão, ali a poucos
quilómetros de Coimbra, não era o remanso de uma vida
bucólica, longe da trepidação da cidade moderna
(como vem
sugerida na sua «Elegia da Chuva»
20), mas tão-só, e mais
pragmaticamente, a formatura em Filologia Românica na
ve-lha Universidade da Lusa-Atenas.
Havia também, no entanto, aquém da
Porta Férrea, uma
vida literária efervescente à sua espera e Eduíno não ficou
in-diferente ao seu apelo. A cidade estendeu-lhe a amizade do
poeta Afonso Duarte, venerando sobrevivente da pléiade da
Renascença Portuguesa, assim como outras relações literárias
com autores também consagrados nas letras, dos quais o
ex--presencista Miguel Torga, entre os mais ilustres, Campos de
Figueiredo, que tinha prefaciado a estreia poética de Natália
Correia, e outros de gerações mais recentes (Aureliano Lima,
por exemplo) e mesmo de alguns jovens de nome já feito ou em
construção, a maioria estudantes como ele, de que me apraz
17 Cf. Eduíno de Jesus, Antologia de Poemas de Armando Côrtes-Ro-drigues, Coimbra, col. «Arquipélago», 1956.
18 Armando Côrtes-Rodrigues e Eduíno de Jesus, Correspondência,
com prefácio de Fernando Aires, Ponta Delgada, ed. Museu Carlos Ma-chado, 2002.
19 António Manuel Couto Viana, 12 Poetas Açorianos, Lisboa, ed.
Sa-lamandra, 2001.
distinguir o malogrado Victor Matos e Sá, embora, este, por
pouco tempo, visto estar já no final do curso. Isto falando só
de poetas, e de apenas alguns dos muitos que povoavam então,
como sempre têm povoado, a incomparável Coimbra doutora.
Embora raramente o real circundante transpareça nos
ver-sos deste lírico e reflexivo poeta, ainda assim Coimbra não
deixa de passar, posto que indirectamente, numa sua «Oração
em Santa Clara a Nova»
21, poema magnífico àquela Rainha
Santa Isabel, cuja lenda ainda perfuma de rosas as margens
melancólicas do Mondego:
Isabel, trago-te estas rosas. São
o milagre do pão
que me deixaste:
Rosas brancas, na haste,
ainda em botão:
Isabel, a tua morte lhes baste.
Que sejam sempre brancas, sempre rosas, na rosa
da tua mão!
(Lá fora, os homens não
querem saber mais das rosas que inventaste…)
Entretanto, Eduíno começou a aparecer numa ou outra
re-vista de cultura, principalmente de Coimbra
(Vértice, Estudos,
etc.
), e tornou-se assíduo colaborador das páginas literárias de
alguns dos mais importantes jornais portugueses daquela
épo-ca, tanto do Porto como de Lisboa. Foi por esse tempo que lhe
enviei um convite para colaborar também na revista
Graal,
que historicamente sucedia em Lisboa à
Távola Redonda,
ambas por mim dirigidas, a primeira em parceria com David
Mourão-Ferreira e Luiz de Macedo. O poeta correspondeu com
um pequeno ensaio sobre «Poesia e Libertação», em que voltava
a um dos temas recorrentes na sua actividade ensaística de
en-tão, que era a conciliação dos contrários
liberdade e disciplina
na produção do poema, o acto
poiético propriamente dito,
pro-curando neste caso abonação na poesia de Manuel Bandeira,
na altura um dos seus poetas dilectos
22. Foi assim que teve
iní-cio a nossa estima fraterna e o
crescendo da minha admiração.
Quando Eduíno, depois, se mudou para Lisboa — isto pelo
final dos anos 50 — fui eu, do meio literário da capital, um
dos primeiros, senão o primeiro, a bater-lhe à porta.
Marcá-mos encontro num almoço em que também participou, levado
por mim, o poeta Fernando Guedes, então à frente da revista
Tempo Presente, de cujo Conselho de Redacção eu fazia parte.
Não se tratava apenas (embora o fosse também) de um
al-moço de cortesia, pois esse primeiro encontro tinha o propósito
de alcançar de Eduíno de Jesus colaboração, em verso ou
pro-sa, que também honrasse as páginas daquela revista.
O poeta aceitou o convite com a mesma presteza com que
o fizera em relação ao pedido de colaboração para a
Graal.
De facto, são da sua autoria alguns poemas e ensaios ali pu-
blicados. Dos ensaios, permito-me destacar — por, de certa ma-
neira, me dizer respeito? (perdoe-se-me, então, a imodéstia) —
um em que são analisadas histórica e criticamente as folhas
de poesia
Távola Redonda
23, a que me hei-de voltar a referir
mais adiante. Mas devo salientar também, pelo menos, um
outro ensaio sobre o tema da Liberdade no teatro de Paul
Claudel
24, um dos seus dramaturgos preferidos, de quem
mais tarde me havia de sugerir, para o reportório da Ofi-
cina de Teatro da Universidade de Coimbra, por mim
diri-gida pelos finais dos anos 60/começos dos anos 70, o poema
dramático
Le Livre de Christophe Colomb, que pus em cena
pela primeira e suponho que única vez em Portugal.
Em Lisboa, a vida de Eduíno de Jesus tornou-se frenética,
nas espinhosas funções de crítico de teatro
25e,
ocasionalmen-te, de artes plásticas
26; de membro do Conselho de Direcção
22 Cf. Graal, n.o 3, Lisboa, 1958.
23 Cf. Tempo Presente, n.o 9, Lisboa, Janeiro de 1960. 24 Id., n.os 8, de Dezembro de 1959, e 11, de Março de 1960. 25 Na revista Rumo (1960-1967).
26 Na revista Panorama e noutras publicações, assim como em
para a parte de teatro de uma importante enciclopédia de
cultura
27; de co-director e editor de uma revista de artes e
letras
28; de produtor e director de programas literários para
a televisão
29, etc.; e, ainda, na actividade profissional que o
trouxera de Coimbra a Lisboa, como docente do antigo ensino
técnico profissional e eventualmente do ensino liceal privado,
de onde, mais tarde, transitaria para a Faculdade de Letras
da Universidade de Lisboa, em que se manteve mais de vinte
anos, os últimos da sua longa carreira de professor.
II
Entretanto, a poesia continuava a jorrar-lhe, original e
exemplar. Raramente, porém, saindo à luz. E mesmo quando
correndo em letra de forma, só em jornais e revistas. Em
li-vro jamais até agora, salvo em antologias, algumas das quais
no estrangeiro. De tempos a tempos, um ou outro livro seu
começava a ser preparado para a estampa, mas a publicação
acabava sempre adiada.
Sine die… nem explicação. Ou talvez,
se me é lícito conjecturar, por uma destas duas razões, senão
por ambas:
Uma, o escrúpulo, que o leva a nunca considerar
acaba-da (perfeita) qualquer acaba-das suas poesias. Vejam-se a apertaacaba-da
selecção e revisão — e, em alguns casos, a reelaboração — a
que submeteu os poemas dos livros que publicou nos anos 50,
esgotados há cerca de meio século e só agora reeditados na
pri-meira parte desta antologia, e também as alterações sofridas
por umas tantas das poesias anteriormente publicadas na
im-prensa periódica — algumas delas mais do que uma vez,
sem-pre com variantes —, que se encontram na segunda parte
30.
Outra razão do retraimento de Eduíno de Jesus quanto à
publicação de poesia, penso que talvez seja o sentimento que
27 Verbo — Enciclopédia Luso-Brasileira de Cultura, da Editorial
Verbo.
28 Contravento (1968-1971).
29 Convergência (1969-1972) e Livros & Autores (1972-1974). 30 Vide, adiante, «Inéditos & Dispersos».
ÍNDICE
Prefácio,
por ANTÓNIO MANUEL COUTO VIANA ... 7
PÓRTICO Ao leitor ... 39
PARTE I CAMINHO PARA O DESCONHECIDO Inscrição ... 45
I Prece ... 49
Metamorfose ... 50
Expectativa ... 52
Como se fosses a vida ... 53
Como uma flor nocturna ... 54
Noite contra a vidraça ... 55
Simplesmente ... 58
II
Xácara das moças donzelas ... 63
À hora do diabo ... 65
Pela noite dentro ... 67
Sobre as cinzas ... 69
Pedro sem ... 71
III A grande encruzilhada ... 75
Os teus olhos mansos ... 76
Destino ... 78 O REI LUA I Epígrafe ... 83 Proposição ... 84 Estiagem ... 86
Girassóis de Van Gogh ... 88
A mensagem do poeta ... 90
II Regresso ... 93
Toada do menino feio ... 94
Melodrama ... 95
Drama ... 96
Quadro antigo ... 98
Linhas para um retrato do poeta quando jovem ... 99
III Princípio ... 103
Bucólica triste ... 104
Hipocondria ... 105
Desde ... 107
Vem, como a noite, imperceptível ... 108
Ritual ... 109
Quando vieste. E eu ... 110
Memória ... 113
Luccia ... 114
IV Da flor do arco-íris as pétalas ... 117
Saudade marítima ... 118 Sortilégio ... 119 Cais da saudade ... 120 Regresso eterno ... 121 V Definição ... 125 Frémito ... 126 Sonho envenenado ... 127 Poeira de astros ... 128 VI Édipo ou a esfinge ... 131
Ladainha à grande estrela ... 132
O silêncio ... 134
Quem foi que passou? ... 136
Mãos cheias ... 137
Serenada ... 138
Cruz ... 139
Um homem vida abaixo ... 140
Testamento ... 141
A CIDADE DESTRUÍDA DURANTE O ECLIPSE I — POESIA Poesia (1) ... 149 Poesia (2) ... 150 II — SANGUÍNEAS Incipit ... 153 Retrato ... 154 Aventura ... 155 Conquista ... 156
Madrigal a uma desconhecida ... 158
Cinismo ... 160
Alternativa ... 161
Ter um destino ... 162
Obsessão ... 164
Epitáfio romanceado para um vencido ... 166
III — OS ADEUSES Adeus ... 171
Os adeuses digo ... 172
Sonho interrompido ... 175
IV — 7 ANFIGURIS COM UM INTRÓITO, UMA ALEGORIA E UMA ORAÇÃO Intróito ... 179
Sinopse ... 180
Os cavalos voantes ... 182
O que disse o inominado ... 183
A serpente ... 184
Um ramo de flores para o salvador da pátria ... 185
As figuras de cera do Museu das Janelas Verdes ... 187
Como um rio ... 188
Alegoria da ave ... 189
Oração em Santa Clara a Nova ... 190
V — O ECLIPSE Simples apontamento coreográfico ... 193
Historiazinha sem moralidade nenhuma ... 194
Fala do fantasma no meio da cidade em ruínas ... 195
Elegia da chuva ... 197
VI — MEDITAÇÃO PARA UMA SEXTA-FEIRA SANTA Gólgota ... 207
Eterno retorno ... 208
EPÍLOGO Nunca mais ... 213
PARTE II
INÉDITOS & DISPERSOS
POÉTICA FRAGMENTÁRIA
O apelo ... 219
O adeus, o perfume, o voo da ave, o ritmo ... 220
Anunciação ... 221 O cerco ... 224 O sopro ... 225 Gaia ciência ... 227 Artesania poética ... 228 As palavras ... 229 Da poesia o corpo ... 230 Poesia nua ... 231 A flor na água ... 232 MELODIA IMPERFEITA Iluminura ... 237 Primavera ... 238 Ai amor! ... 239
Loas à cantiga de 4 versos ... 240
Cantiga da rosa ... 241
Faunesa ... 242
Erótica ... 245
Anacreôntica ... 246
Com as mãos ... 247
Da nossa solidão feridos ... 249
Uma parede onde não bate o sol ... 250
Romanticismo ... 251
Quando nunca mais ... 252
Onde elegíaca a luzília afogada ... 255
A MELODIOSA FLAUTA LONGÍNQUA DO SILÊNCIO Os navios ... 263
A cabra heráldica ... 264
Pegasus miserabilis ... 265
Assombração ... 266
Tanta, tanta coisa ... 268
3 cantigas de mal haver ... 269
A última folha ... 272
Toada por um poeta morto ... 273
EPIGRAMAS Sabedoria ... 277
Jonglerie da sede e da fome ... 278
Aviso ... 280 Programa ... 281 Por um fio ... 282 Zimbad, o pedinte ... 283 O rei de corinto ... 284 Navio fantasma ... 285 IMEMORIAIS Menino com tesoira ... 289
O Velho-da-Lepra e as pombas ... 291
Os amantes do Barreiro ... 293
Paisagem com barcos ... 295
S. João triste ... 297
Na praça, altas horas ... 299
Tema para um quadro de António da Costa ... 301
Guitarra portuguesa ... 303 A ABÓBADA Génesis ... 311 Pedra ... 312 As perguntas ... 313 Árctico silêncio ... 315 A voz do silêncio ... 316 A palavra única ... 318
Diálogo a uma voz ... 319
Sinal ... 323 Asa flutuante ... 324 Lambda ... 325 A estrada ... 326 Maceração ... 327 Teofagia ... 329
A FÁBULA DO MUNDO
Limbo ... 333
Edital ... 334
Os mensageiros ... 335
Capitulação ... 336
Rimance dos rebeldes insanos ... 337
Instantâneo em Memphis ... 339
Os retornados de Sodoma ... 341
Já não são precisas as vossas ferramentas ... 343
Day after ... 344
Fábula do mundo ... 345
A longa espera ... 347
Esboço de uma biobibliografia, por ONÉSIO TEOTÓNIO ALMEIDA ... 349