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Da casa ao apartamento, Das varandas às sacadas envidraçadas: A transformação do Balneário Mar Grosso / From the house to the apartment, From balconies to glazed balconies: Transformation of the Balneário Mar Grosso

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Academic year: 2020

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Da casa ao apartamento,

Das varandas às sacadas envidraçadas:

A transformação do Balneário Mar Grosso

From the house to the apartment,

From balconies to glazed balconies:

Transformation of the Balneário Mar Grosso

DOI:10.34117/bjdv6n5-613

Recebimento dos originais: 20/04/2020 Aceitação para publicação: 29/05/2020

Danielle Benício

Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc). Laboratório Artemis. Rua Coronel Fernandes Martins, 270, Progresso, Laguna/SC, 88790-000.

daniellebenicio@gmail.com Juliana Oliveira

Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc). Laboratório Artemis. Rua Coronel Fernandes Martins, 270, Progresso, Laguna/SC, 88790-000.

juliana.atamanczuk@gmail.com Marco Antônio Gava

Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc). Laboratório Artemis. Rua Coronel Fernandes Martins, 270, Progresso, Laguna/SC, 88790-000.

marco2antonio.garcia.gava@gmail.com RESUMO

Este trabalho resulta da pesquisa de iniciação científica em realização no Laboratório de Arquitetura - Teorias, Memórias e Histórias (Laboratório Artemis) do Curso de Arquitetura e Urbanismo, da Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc), sediado em Laguna/SC. Constitui como objeto de estudo a transformação do balneário Mar Grosso, localizado em Laguna, através da substituição da tipologia residencial: da casa térrea unifamiliar pelo apartamento em torre multifamiliar. A cidade de Laguna surge no século XVII e ocupa inicialmente a planície existente junto ao porto natural na laguna Santo Antônio dos Anjos, a oeste, abrigada pelos morros nos limites norte, sul e leste. Esse berço citadino, que coincide atualmente com a área central e o centro comercial, fortemente historicizado, é tombado pelo Iphan em 1985. O bairro Mar Grosso, por sua vez, forma-se do outro lado desses morros, ao longo do oceano Atlântico, paralelo à praia marítima: erguem-se os primeiros chalés de madeira no final do século XIX (ULYSSÉA, 1943); efetiva-se como balneário na primeira metade do século XX; e torna-se lócus de veraneio nas últimas décadas novecentistas - na Contemporaneidade, já como bairro, compõe-se de Zona Residencial (ZR2, ZR3, ZR6; LAGUNA, 2013), com moradias de ocupação permanente e de veraneio, e de Setor de Serviço e Comércio (SESC 4; LAGUNA, 2013). Esse desenvolvimento segue a faixa litorânea, desde o bairro Magalhães e desde o morro da Nalha. Assim, sobretudo para a sociedade local mais abastada, abrem-se novos loteamentos, acompanhados de infraestrutura (pavimentação de ruas, implantação de redes de energia elétrica e água potável, iluminação pública, etc.), dedicados à atividade de lazer (incluindo hotéis, bares, lanchonetes, restaurantes, etc.) e às casas térreas unifamiliares (principalmente nas linguagens art déco, neocolonial e moderna). A partir de 1970, com o advento da BR 101 e a popularização do transporte rodoviário particular, intensifica-se a ocupação do bairro Mar Grosso em direção à praia do Iró e inaugura-se o loteamento na praia do Gi (com o hotel), atrelados às ditas indústrias do turismo

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e da construção civil (BENÍCIO, 2018; LUCENA, 1998; SIMON, 2000) - mormente para os veranistas regionais enriquecidos, multiplicam-se os apartamentos e elevam-se cada vez mais as torres multifamiliares (com plantas e fachadas semelhantes, revestimento parietal frontal de pastilhas, portões de garagem e sacadas envidraçadas, ostentando churrasqueiras; recuados 1,50m dos vizinhos laterais). Deveras, acelera-se a substituição de casas térreas unifamiliares por apartamentos em torres multifamiliares, transfigurando-se, no presente, o Mar Grosso no único bairro verticalizado do município (a despeito da infraestrutura que se mantém sem a devida evolução). Ora, em decorrência das limitações de preservação impostas no Centro Tombado, liberam-se as possibilidades edilícias no Mar Grosso - sem qualquer proteção, o bairro é explorado pelos grandes empreendimentos de construtoras, ficando à mercê das demolições em prol dos ditos progresso e modernidade. Destarte, vítimas da especulação imobiliária, restam raros exemplares do casario remanescente da origem do balneário.

Palavras-chave: Laguna/SC; Mar Grosso; Balneário; Casa Térrea Unifamiliar; Apartamento em Torre Multifamiliar.

ABSTRACT

This work is the result of scientific initiation research carried out at the Architecture Laboratory - Theories, Memories and Stories (Artemis Laboratory) of the Architecture and Urbanism Course, at the State University of Santa Catarina (Udesc), based in Laguna / SC. The transformation of the Mar Grosso resort, located in Laguna, constitutes an object of study, through the replacement of the residential typology: from the single family house to the multifamily tower apartment. The city of Laguna arises in the 17th century and initially occupies the existing plain next to the natural port in the lagoon Santo Antônio dos Anjos, to the west, sheltered by the hills on the north, south and east limits. This city cradle, which currently coincides with the central area and the commercial center, heavily historicized, is listed by Iphan in 1985. The Mar Grosso neighborhood, in turn, forms on the other side of these hills, along the Atlantic Ocean, parallel to the maritime beach: the first wooden chalets are built at the end of the 19th century (ULYSSÉA, 1943); it became effective as a spa in the first half of the 20th century; and it has become a summer resort in the last nineteenth decades - in Contemporaneity, already as a neighborhood, it is made up of a Residential Zone (ZR2, ZR3, ZR6; LAGUNA, 2013), with permanent occupation and summer houses, and Service and Commerce (SESC 4; LAGUNA, 2013). This development follows the coastal strip, from the Magalhães neighborhood and from the Nalha hill. Thus, especially for the more affluent local society, new subdivisions are opened, accompanied by infrastructure (paving streets, implantation of electricity and drinking water networks, public lighting, etc.), dedicated to leisure activities (including hotels, bars, cafeterias, restaurants, etc.) and single-family single storey houses (mainly in art deco, neocolonial and modern languages). Since 1970, with the advent of BR 101 and the popularization of private road transport, the occupation of the Mar Grosso neighborhood towards Iró beach has intensified and the subdivision at Gi beach (with the hotel) opens, linked to the so-called tourism and civil construction industries (BENÍCIO, 2018; LUCENA, 1998; SIMON, 2000) - especially for the enriched regional vacationers, the apartments multiply and the multifamily towers (with plants and similar facades, front wall covering of tablets, garage gates and glassed-in balconies, with barbecue grills; 1.50m back from the side neighbors). Indeed, the replacement of single-family single-family homes by apartments in multi-family towers is accelerating, transforming, at present, the Mar Grosso into the only vertical neighborhood in the municipality (despite the infrastructure that remains without proper evolution). Now, due to the preservation limitations imposed on the Tombado Center, the building possibilities in the Mar Grosso are released - without any protection, the neighborhood is explored by the large undertakings of construction companies, being at the mercy of demolitions in favor of said progress and modernity. Thus, victims of real estate speculation, there are rare examples of the houses remaining from the origin of the resort.

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Keywords: Laguna / SC; Mar Grosso; Balneário; Single Family House; Apartment in Torre Multifamiliar.

1 INTRODUÇÃO

Este artigo vincula-se à ação de iniciação científica em realização no Laboratório de Arquitetura - Teorias, Memórias e Histórias (Laboratório Artemis) do Curso de Arquitetura e Urbanismo, da Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc), sediado em Laguna/SC. Este município, localizado no litoral sul de Santa Catarina, consiste na terceira cidade mais antiga do Estado, fundada oficialmente no século XVII.

O berço citadino lagunense, que coincide atualmente com a área central e o centro comercial, fortemente historicizado, é tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) em 1985, a partir da instituição da poligonal de proteção, inscrita nos Livro do Tombo Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico e no Livro do Tombo Histórico (BRASIL, 1984). No início de 1990, instala-se o Escritório Técnico do Instituto Patrimônio Histórico e Artístico Nacional em Laguna (Etec-Iphan Laguna), no Centro tombado, vinculado a 11ª Superintendência Regional de Santa Catarina (SR/Iphan-SC) (BENÍCIO et al., 2012). Assim, pela valoração histórica e paisagística, o sítio urbano inicial torna-se conhecido como Centro Histórico de Laguna e afamado como produto turístico. Por conseguinte, avulta-se seu valor e superestima-se sua consideração em detrimento dos demais bairros.

Todavia, a história da urbe lagunense não se restringe ao limite da poligonal de tombamento. A cidade como um todo é histórica - sua historicidade não se reduz a uma parte digna de reconhecimento, em menosprezo de todas as outras (ARGAN, 1993). A cidade é na sua história (ROSSI, 1995).

[...] se se quer conservar a cidade como instituição, não se pode admitir que ela conste de uma parte histórica com um valor qualitativo e de uma parte não-histórica, com caráter puramente quantitativo. Fique bem claro que o que tem e deve ter não apenas organização, mas substância histórica é a cidade em seu conjunto, antiga e moderna. (ARGAN, 1993, p. 79).

Desse modo, toma-se como objeto de pesquisa o balneário Mar Grosso, cuja delimitação refere-se à definição de área-estudo (ROSSI, 1995), compreendida por meio do fato urbano preciso, composto por um conjunto de elementos que dispõem de qualidades singulares e identitárias (dadas pela geografia, tipologia, morfologia, traçado, obras monumentais, etc.).

Destarte, define-se como área-estudo o sítio urbano originado na planície da faixa litorânea entre o oceano Atlântico, a leste, o areal e o canal da barra, a sul, e o envoltório dos morros, a oeste

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e a norte. Aí interagem os dados natural e cultural, a partir dos quais se manifestam os dados históricos e paisagísticos.

O Mar Grosso cresce paralelo à orla marítima, desde o bairro Magalhães e desde o morro da Nalha: erguem-se os primeiros chalés de madeira no final do século XIX (ULYSSÉA, 1943); efetiva-se como balneário na primeira metade do século XX; e torna-efetiva-se lócus de veraneio nas últimas décadas novecentistas - na Contemporaneidade, já como bairro, compõe-se de Zona Residencial (ZR2, ZR3, ZR6; LAGUNA, 2013) e de Setor de Serviço e Comércio (SESC 4; LAGUNA, 2013). Assim, sobretudo para a sociedade local mais abastada, abrem-se novos loteamentos, acompanhados de infraestrutura (pavimentação de ruas, implantação de redes de energia elétrica e água potável, iluminação pública, etc.), dedicados à atividade de lazer (incluindo hotéis, bares, lanchonetes, restaurantes, etc.) e às casas térreas unifamiliares (principalmente nas linguagens art déco, neocolonial e moderna). A partir de 1970, com o advento da BR 101 e a popularização do transporte rodoviário particular, intensifica-se a ocupação do bairro Mar Grosso em direção à praia do Iró e inaugura-se o loteamento na praia do Gi (com o hotel), atrelados às ditas indústrias do turismo e da construção civil (BENÍCIO, 2018; LUCENA, 1998; SIMON, 2000) - mormente para os veranistas regionais enriquecidos, multiplicam-se os apartamentos e elevam-se cada vez mais as torres (com plantas e fachadas semelhantes, revestimento parietal frontal de pastilhas, portões de garagem e sacadas envidraçadas, ostentando churrasqueiras; recuados 1,50m dos vizinhos laterais). Deveras, acelera-se a substituição de casas térreas unifamiliares por apartamentos em torres multifamiliares, transfigurando-se, no presente, o Mar Grosso no único bairro verticalizado do município (a despeito da infraestrutura que se mantém sem a devida evolução).

Diante disso, constitui-se como objeto de estudo a transformação do Mar Grosso, de balneário a bairro, através da substituição da tipologia residencial, da casa térrea unifamiliar pelo apartamento em torre multifamiliar. Ademais, objetiva: caracterizar a inserção e a contextualização das obras de arquitetura residencial na estrutura do fato urbano; identificar as relações entre a arquitetura residencial e o desenvolvimento urbanístico do Mar Grosso, articulando-as à trama histórica; e examinar as imbricações entre as concepções estética, funcional, material, estrutural e ambiental e os respectivos desdobramentos na instância da urbe; e apontar as principais sobrevivências e mudanças assentadas na Contemporaneidade.

Para consecução de tais objetivos, recorre-se aos seguintes procedimentos metodológicos: pesquisa bibliográfica e iconográfica (sobre a história urbana lagunense focada no Mar Grosso e a arquitetura residencial brasileira e catarinense no mesmo período); exame de projetos arquitetônicos e urbanísticos aprovados pela Prefeitura Municipal para a área-estudo; levantamento de dados in loco (com registro fotográfico); sistematização das informações coletadas, com o cotejamento dos

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conhecimentos construídos em cada etapa; e, por fim, a análise e reflexão crítica acerca dos resultados obtidos.

O estudo da transformação do Mar Grosso, de balneário a bairro, através da substituição da tipologia residencial, da casa térrea unifamiliar pelo apartamento em torre multifamiliar, justifica-se, sobretudo, diante da constatação preliminar acerca da crescente metamorfose irrompida na área. A propósito, parte-se da hipótese do efetivo acontecimento em curso manifesto, conforme o exposto, pela multiplicação da quantidade de apartamentos e pela elevação incessante das torres - vulgariza-se a ideia de progresso e de modernidade, inclusive, de status superior e novo, atrelados ao endereço em arranha-céu.

Daí a necessidade e a premência de conhecimento das obras arquitetônicas em desaparição no Mar Grosso. Há relevância e urgência no estudo das casas térreas unifamiliares remanescentes no balneário Mar Grosso, já que tendem explicitamente à descaracterização, à destruição, ao desaparecimento e à perda irremediável e definitiva.

Ora, em decorrência das limitações de preservação impostas no Centro Tombado, liberam-se as possibilidades edilícias no Mar Grosso - sem qualquer proteção, o bairro é explorado pelos grandes empreendimentos de construtoras, ficando à mercê das demolições em prol de progresso e modernidade. Vítimas da especulação imobiliária, restam raros exemplares do casario remanescente da origem do balneário.

Apesar da ocupação mais recente do bairro Mar Grosso, remete-se à conclusão em direção à rápida transformação do estoque edificado, simultânea à verticalização e à alteração do tipo dominante: a residência unifamiliar, a casa térrea e o sobrado, é substituída pelo edifício residencial multifamiliar em altura crescente. Tal transformação é acelerada no século XXI, principalmente com a vigência do II Plano Diretor, instituído em 2013 (LAGUNA, 2013). Este expande a área permitida para construção de arranha-céus no bairro e libera mais de dez pavimentos, onde anteriormente o máximo permitido era quatro andares. Daí as irrupções bruscas do gabarito, cada vez chocantes, e a despersonalização da própria arquitetura (os novos arranha-céus podem ser lançados em qualquer cidade hodierna e praiana do litoral catarinense) - em última instância, gera-se o aumento da fragmentação da paisagem, até então tradicional e bucólica, e, assim, o pioramento da perda da identidade local.

2 DO AREAL AO BAIRRO: O BALNEÁRIO MAR GROSSO

A origem de Laguna atende o objetivo da coroa portuguesa de garantir a posse do território e explorar as riquezas da terra; atrela-se a qualidades estratégicas: local de passagem da linha imaginária do Tratado de Tordesilhas (1494); ancoradouro natural, em uma baía de águas tranquilas,

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na laguna Santo Antônio dos Anjos; via de interligação entre o porto marítimo, a laguna e as demais lagoas e rios navegáveis do Sistema Estuarino de Laguna; base extrema para o alargamento da fronteira dada pelo Tratado e centro de expansão colonizadora em direção ao sul; fundeadouro intermediário para os colonizadores lusitanos e espanhóis, em busca de ouro e prata, rumo ao rio da Prata e daí à Colônia do Santíssimo Sacramento e à Assunção; local dotado de fonte potável; porto de embarque e exportação dos bens da região, articulado à captura de pescados e ao aprisionamento de indígenas para escravização (BENÍCIO, 2018). Assim, a fundação da urbe lagunense integra-se à ocupação prioritária do litoral pelo colonizador. Logo, "[...] o porto foi, incontestavelmente, fator decisivo na prosperidade de Laguna." (ULYSSÉA, 2004, p. 48) (ver Figuras 01-02).

Contudo, os primeiros colonizadores implantam o berço citadino no sítio plano, limitado em extensão pela topografia (entre os outeiros do Peralta e do Rosário, nas extremidades meridional e setentrional), aproveitando a proteção desde os morros circundantes das invasões inimigas e dos frequentes ventos de nordeste e do extenso areal ao norte e a leste. "A praia do Mar Grosso alongava-se, num pontal da areia até quase o costão do morro que lhe ficava ao sul" (ULYSSÉA, 2004, p. 263). Ou seja, até o final do século XIX, a costa marítima é vista como natureza selvagem. Por conseguinte, o Areal é desbravado somente a partir do adensamento da área central e da ampliação da zona urbana para além dos citados morros do Centro, rumo inicialmente no Campo de Fora e no Magalhães.

Saul Ulysséa (1943, p. 81), em Laguna de 1880, informa o uso das areias do Mar Grosso para fins de lazer pelos lagunenses, para realização de corridas de cavalo; bem como descreve o caminho ao Mar Grosso, desde o largo da Carioca, passando pelo morro da Nalha e chegando à praia, com cerca de 4 metros de largura, sendo que "[...] do lado direito não existia edificação alguma até o Mar Grosso e do lado esquerdo logo no princípio da estrada, duas casas próximas. [...] Daí até o Mar Grosso não existia edificação alguma." Desde a rua Voluntário Benevides, em direção ao Mar Grosso, a partir da rua Ulysséa

[...] até o alto do morro não havia edificação alguma.

No alto do morro um grande pasto cercado tendo ao centro uma pequena casa pertencente ao sr. Manoel Pinho.

No cume do Morro do Cemitério, havia um pequeno cemitério, cercado de tábuas [...]. (ULYSSÉA, 1943, p. 82).

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Figura 01 - Laguna e seu contexto geográfico.

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Figura 02 - Entrada de Laguna por Debret em 1827. Barra de acesso

à laguna Santo Antônio dos Anjos. Explicita-se a natureza exposta de modo "selvagem", com morros e dunas, sem a visualização do berço citadino lagunense.

Fonte: BANDEIRA; LAGO, 2008.

Ulysséa (1943, p. 6-14) descreve o Magalhães, outro acesso ao Mar Grosso, com pouquíssimas casas de melhor condição, vários casebres e muitos terrenos baldios. Aí não havia nivelamento, nem asseio; e moravam pescadores e marinheiros, alguns valentões e desordeiros - gente mais humilde, conhecida pelos moradores do Centro como "caboclos". Em contraposição a essa visão desprestigiada do Magalhães, no Mar Grosso começam a surgir as casas de veraneio de "dr." e "sr.". Esclarece-se que os casarões de classes abastadas, residências permanentes, localizam-se no Centro, entre a Igreja Matriz de Santo Antônio dos Anjos e a Casa de Câmara e Cadeia.

Somente seis casas existiam na praia balneária do Mar Grosso e morro próximo. Uma no fim da estrada, pertencente ao dr. Manoel Fonseca Galvão, juiz de direito, outra próxima à primeira pedreira beirando a praia, de propriedade do sr. Francisco Maria da

Silva, administrador da Mesa de Rendas Gerais e outra junta à pedreira, de propriedade do comerciante João de Sousa Guimarães.

Mais três casas, uma no morro, fronteira à Pedra do Iró, do sr. João Tomaz de Oliveira,

coberta de zinco liso, pintada de vermelho. Outra na fralda do morro do Iró, pertencente a Pinto de Ulysséa e mais acima a do sr. Manoel Alano Fernandes Lima.

Não havia as avenidas Costa Carneiro e Bicalho.

[...] A praia do Mar Grosso começa na Pedra do Iró onde havia uma pequena estrada que dava acesso ao morro e ia até muito além do atual molhe, formando um pontal. (ULYSSÉA, 1943, p. 83; grifo nosso).

Ruben Ulysséa (2004), em Laguna: Memória Histórica, cita o início da construção do quebra-mar em 1903 e a existência de transporte público urbano recém inaugurado (em 1947) através de linha de ônibus entre a "cidade" (Centro) e os arrabaldes do Magalhães e Mar Grosso. Através de crônicas publicadas originalmente no jornal lagunense A Cidade em 1927 - "Mar Grosso Futuro", "O Prosaísmo da Civilização" e "As Novas Construções no Mar Grosso" -, Ulysséa (2004, p. 220-225) celebra as pretensões da Prefeitura em prol da modernização do balneário Mar Grosso, incluindo "[...]

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uma série de construções necessárias ao nosso conforto de homens modernos." (ULYSSÉA, 2004, p. 222).

No próximo verão nosso poético Mar Grosso terá o aspecto de um balneário moderno.

Essa praia que se estende numa curva de seio, da raiz do molhe à ponta do Iró, terá ares de

praia elegante. Lembrará vagamente Copacabana e as praias norte-americanas do Pacífico.

Exagero? Talvez. Mas o fato é que a Municipalidade está disposta a transformar, na

próxima estação de banhos, esse arrabalde em que se dão bem os espíritos contemplativos e os amantes da solidão, num balneário moderno e concorrido.

Pelas informações colhidas por nós, ontem, é plano do nosso prefeito mandar abrir uma

outra estrada, em aclive suave, que dê acesso aos veículos da praia para a avenida Costa Carneiro, construir uma estrada, margeando os trilhos da pequena via férrea da

comissão do porto [Getúlio Vargas cria o porto carvoeiro em 1939, concluído em 1943; a principal atividade portuária é relocada do porto no Centro para o porto no Magalhães, no canal da barra (BENÍCIO, 2018, p. 126)], ligando a praia à praça Polydoro Santiago e

mandar edificar à beira-mar uma dúzia de pequenas casinhas, destinadas a servir os banhistas. Além disso, soubemos, ainda, facilitará no que da Municipalidade depender, a

construção por particular, de um hotel balneário [Hotel Balneário construído por Paulo Calil anos depois] nesse pitoresco retiro de veranistas.

A transformação por que vai passando o Mar Grosso é simplesmente brusca. O ano atrasado iluminaram-no a luz elétrica, neste verão serviram-no com uma linha de auto-ônibus, na próxima estação de banhos será dotado com apreciável número de melhoramentos.

Que se intensifique a construção de casas, beirando a praia e as estradas, porque o Mar Grosso moderno há de atrair forasteiros do interior e mesmo da capital do Estado.

(ULYSSÉA, 2004, p. 220; grifo nosso).

Nelas Ruben Ulysséa (2004, p. 222) também registra o embate entre uma dita "maioria" de lagunenses que desejam o "progresso" do balneário, e consequentemente a sua urbanização, e aqueles que defendem o "poético arrabalde". Já no início do século XX, há a intenção de preponderância do construído sobre o natural - de domesticação do selvagem.

A civilização é inimiga feroz da poesia e da serenidade, logo a proporção que o pitoresco

arrabalde se for enchendo de elementos vinculados intimamente ao progresso, irá perdendo aquele seu primitivo aspecto de retiro poético e assumindo ares de balneário movimentado, onde o marulho das vagas é abafado pelo berro estridente do "klaxon" e o

cheiro iodado da maresia é vencido pelo cheiro forte da gasolina queimada.

A instalação da luz elétrica já aborreceu a muita gente que ali gostava de passear à luz

natural da lua cheia.

Depois foram os automóveis e os ônibus. Quantas pessoas não olharam com maus olhos

para esses veículos que, cheios de passeantes, foram como uma proibição terminante ao conforto dos tamancos e dos grandes chapéus de tiririca!...

A conversão do Mar Grosso em balneário elegante não contenta a todos. E nem é

possível, dada a diversidade de temperamentos. Os românticos são pelo Mar Grosso

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vontade, dentro de amplos tamancos, juntando conchinhas ou espantando o gado que pastava o limo, com uma grande vara cortada ao matagal dos fundos da casa. Os esnobes são pelo

Mar Grosso do futuro, com postos salva-vidas à praia, casinhas para a troca de roupa erguidas em linha sobre as dunas, banhistas com maiôs justos levando no braço o roupão

de feltro, automóveis a correrem na praia e melindrosas sentadas sobre a areia em grupos, projetando uma "soirée" para depois das nove.

É difícil contentar a todos, mas a Municipalidade realizando o seu projeto contenta a

maioria. (ULYSSÉA, 2004, p. 222-223; grifo nosso).

Ruben Ulysséa (2004, p. 223-224) ainda rebate a falada crise de falta de terreno para novas construções - novos chalés de madeira -, considerando que os vinte lotes em que foi dividido o terreno marginal da avenida Bicalho já estavam concedidos. Inclusive, propõe ao citado prefeito Cabral um plano urbano caracterizado por "boa ordem construtiva" e "economia de espaço" e a aquisição de terrenos públicos por particulares para novas edificações.

O governo municipal, se quiser, poderá transformar o vasto campo que se estende da

Lagoa Preta ao Pontal numa elegante vilazinha, a feição de Ipanema ou Leblon. É um

pouco arrojada a comparação, mas com isso queremos apenas apresentar um modelo,

para que sirva de base ao empreendimento que sugerimos à Municipalidade.

É bastante que o governo do município mande traçar ruas nesse amplo terreno, dividindo o mesmo em lotes, pequenos, já se vê. Com o tempo, a proporção que ali se for edificando, obedecendo a determinado projeto, virá como que emergindo daquele solo

arenoso, um outro arrabalde, mais elegante, com ruas retas, uma praça, talvez, e com a

vantagem de estar situado muito próximo da estrada para automóveis que se projeta construir.

Além disso, a construção de uma vila nesse local é de uma vultosa utilidade aos melhoramentos do porto. Isso porque firma definitivamente as areias móveis, o que ora se procura fazer por meio de plantações e linha de estacas na crista dos cômoros.

A primeira vista parecerá que estamos a conceber um plano grandioso, cuja realização está longe de ser custeada pelos cofres municipais. Engano. À Municipalidade caberá apenas o

encargo do traçado da vila futura e o controle das edificações. E se isso acarretar despesas serão de sobejo cobertas com as taxas de requisições dos lotes de terrenos.

(ULYSSÉA, 2004, p. 224; grifo nosso).

O mesmo Ruben Ulysséa (2004, p. 302-304), na crônica "Os Galos Não Cantam Mais... II", publicada no jornal Semanário de Notícias em 1977, rememora seus escritos de 1927 sobre o Mar Grosso e se reconhece como "pai" da ideia do mencionado plano urbano, além de cotejar os tempos passado e presente.

Nos anos da nossa infância, ali perto da Lagoa Preta [pedreira de extração de pedras para a execução dos molhes da barra] para os lados do mar, estendia-se, plano e desolado, o chamado Campo do Magalhães. Nele não havia sequer um rancho de pescadores. Sobre

ele hoje se estende a avenida João Pinho, com as suas casas modernas, e o Campo de Aviação [aeroporto, com estação de embarque e desembarque na atual sede da Apae], além

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do "Ravena", das construções do porto pesqueiro e do bairro do Pontal. (ULYSSÉA, 2004,

p. 304; grifo nosso).

Nas descrições do Mar Grosso feitas pelos Ulysséa (1943; 2004), destacam-se as construções do decorrer do século XX, dos chalés de madeira dos primórdios às casas modernas dos anos 1970; e a intensificação da urbanização do balneário a partir de 1950. Até então, a ocupação rarefeita restringia-se aos chalés, localizados na faixa de terra entre as encostas dos morros e as dunas, que não dispunham de redes de infraestrutura (energia elétrica, água potável, iluminação pública, vias pavimentas, etc.). "A zona balneária do Mar Grosso teve que receber incentivos para a sua ocupação efetiva." (LUCENA, 1998, p. 49).

Em 1955, com a aprovação de um loteamento, pela Prefeitura Municipal, este foi doado à Associação do Ravena Cassino Hotel, que iniciava sua construção, mas, por problemas políticos e econômicos, tiveram as obras interrompidas. Em 1969, com uma nova concorrência pública para a construção de outro hotel na praia, cujo terreno seria doado pelo município, é que se reiniciam os primeiros investimentos do Estado naquela área. (LUCENA, 1998, p. 50).

Enfim, a urbanização do Mar Grosso acelera-se a partir de 1970 e, sobretudo, do tombamento do Centro em 1985. Com isso, ocorre ampla valorização imobiliária do balneário, vocacionado ao turismo (com atividades de lazer e serviços, incluindo hotéis, restaurantes, bares, etc.) e à habitação (com moradias de veraneio e permanentes) (LUCENA, 1998). Daí a transformação urbanística e arquitetônica bastante intensa e rápida - daí a substituição do legado dos primeiros tempos, dos chalés de madeira dos primórdios do Areal (ver Quadros 01 e 02).

3 DOS CHALÉS DE MADEIRA ÀS CASAS MODERNAS

Conforme o exposto, as primeiras moradas de veraneio são construídas no arrabalde do Mar Grosso na virada dos séculos XIX-XX, pelas famílias mais abastadas de Laguna. Essas moradas são locadas no caminho ao Mar Grosso, desde o largo da Carioca, pelo morro da Nalha, onde passam atualmente as vias Júlia Nascimento e Costa Carneiro. Aí se erguem os primeiros chalés que, apesar de pertencerem à aristocracia, são executados em madeira, incluindo estrutura, piso, vedação, forro e esquadrias; excetua-se geralmente a fundação, feita em alvenaria de pedras, a fim de impedir o contato da madeira com o chão, evitando seu apodrecimento; e de adequar-se ao terreno em encosta de morro, promovendo o nivelamento do solo em um plano horizontal e a contenção de aterro/recorte de terra.

Ademais, esses primeiros chalés são caracterizados pela implantação solta no lote, com recuos frontal, laterais e de fundos, aproveitando iluminação, insolação e ventilação naturais através da

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presença de janelas em todos os cômodos (não há alcovas), oferecendo melhor qualidade ambiental e favorecendo a saúde dos moradores; bem como por telhado aparente composto por duas águas, cumeeira perpendicular à fachada frontal (coincidente com o eixo de simetria que rege a composição dessa face), beiral arrematado por lambrequins e, nos casos mais ricos, ornamentação com pináculos. De modo geral, não são providos de fossa séptica, nem instalações sanitárias - raramente o banheiro é feito junto à construção inicial.

Quadro 01 - Balneário Mar Grosso na primeira metade do século XX.

Laguna e bairros (1938). Fonte: Simon, 2000, p. 57. Laguna e bairros (1957). Fonte: Simon, 2000, p. 58.

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Laguna e bairros (1965). Fonte: Simon, 2000, p. 58. Laguna e bairros (1978). Fonte: Simon, 2000, p. 59.

Quadro 02 - Balneário Mar Grosso na primeira metade do século XX.

Centro e Mar Grosso na década de 1950. Fonte: Garibaldi II, 2017.

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Mar Grosso, desde o morro da Glória, em 1978. Aeroporto e molhes da barra.

Santa de costas para o litoral marítimo e

o Mar Grosso e de frente para o Centro, abençoando a "cidade".

Fonte: Laguna - Ontem e Hoje, 2017.

Mar Grosso. Fonte: Viana, 2011.

Mar Grosso e morro da Glória. Avião Taba decolando do aeroporto. Fonte: Garibaldi II, 2017.

Mar Grosso. Fonte: Viana, 2011.

Mar Grosso na década de 1930.

Fonte: Cittadin, 2010, p.130. Mar Grosso por volta de 1940. Fonte: Garibaldi II, 2017.

A propósito, a funcionalidade da morada é disposta na seguinte organização de cômodos: sociais (sala de estar, às vezes também sala de jantar) na frente; íntimos (dois ou três quartos, excepcionalmente mais quartos) no meio; e serviços (cozinha, despensa) no fundo.

Ressalta-se que esses primeiros chalés se apresentam bastante singelos e contidos visualmente, com caracteres remanescentes do Ecletismo tardio, ainda praticado nas primeiras décadas do século XX em Laguna. A disposição desses chalés aproximadamente em linha, acompanhando a geografia, entre morros e dunas, configura um conjunto homogêneo e uniforme. Destarte, no bucólico arrabalde, esses chalés são considerados refúgios (em relação às obrigações diárias, à rotina de trabalho, etc.), nos quais se encontra a tranquilidade (em relação ao trânsito de pessoas e veículos, aos barulhos, etc. do Centro urbano) e a "cura" das "moléstias" do corpo e da alma (ver Quadro 03).

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A partir de 1950, conforme o exposto, o Mar Grosso é objeto de profunda transformação - também as moradas de veraneio são modificadas. Com a abertura das atuais avenidas João Pinho e Senador Galotti e de novos loteamentos, avançando em direção ao mar, são postos à venda novos terrenos. A localização de cada loteamento está diretamente relacionada ao perfil socioeconômico da clientela desses empreendimentos imobiliários: no loteamento Willy Rodrigues, no centro do bairro, concentra-se o desenvolvimento urbano e as famílias mais abastadas da sociedade lagunense; no loteamento Vila Portuária, na extrema sul da praia, próxima aos molhes, insere-se a população menos favorecida, principalmente os trabalhadores do Porto de Laguna.

Nesses loteamentos, multiplicam-se as casas ditas "modernas", nas linguagens art déco, neocolonial e moderna, executadas em madeira ou em alvenaria de tijolos de barro, com fundação em alvenaria de pedras; implantadas de modo solto no lote (com testada larga), em meio a recuos ajardinados, aproveitando iluminação, insolação e ventilação naturais através da presença de janelas em todos os cômodos (outrossim, não há alcovas); e cobertas por telhado composto por duas ou mais águas, com cumeeira desencontrada ou calha central (telhado borboleta). Destacam-se os planos inclinados, dados por paredes ou apoios estruturais. Agora, são providos de fossa séptica e instalações sanitárias; revestimento impermeabilizado em cozinha e banheiro (até a altura de 1,50m); e instalação elétrica embutida. O banheiro passa a integrar a morada, junto à cozinha, locado no fundo; também se adicionam garagem (na lateral) e varanda ou alpendre (na frente) - tais espaços permitem o estar e o lazer da família. A funcionalidade da morada é melhorada e rigorosamente setorizada, permanecendo os cômodos sociais na frente, íntimos no meio e de serviços no fundo.

Quadro 03 - Moradas de veraneio no balneário Mar Grosso do ciclo da madeira (do século XIX à primeira metade do século XX).

Projeto de casa de madeira, 1926, para Oliveira. Entrada lateral através de alpendre.

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Projeto de casa, chalé de madeira, 1933, para Rollin Cabral.

Fonte: Viana, 2011.

Mar Grosso, 1912. Fonte: Viana, 2011.

Projeto de casa, chalé de madeira, sem data e proprietário.

Fonte: Viana, 2011.

Mar Grosso, por volta de 1920. Fonte: Garibaldi II, 2017.

Casa, chalé de madeira, na Costa Carneiro, 2019. Remanescente em risco de demolição. Fonte: Acervo dos autores, 2019.

A partir de 1960, torna-se inusual a construção em madeira. Aliás, algumas moradas feitas em madeira têm suas vedações externas substituídas por alvenaria de tijolos de barro. Ademais, altera-se a funcionalidade das moradas: conservam-se os cômodos sociais na frente, a cozinha assume o meio e os íntimos ficam no fundo. Considerando os projetos aprovados pela Prefeitura Municipal nesse período, ocorre um maior número de aprovações de processos de casa para o balneário, nos loteamentos Willy Rodrigues e Vila Portuária; mantém-se, em geral, a autoria em relação aos projetos para os demais bairros da cidade. Destacam-se o construtor Antônio Duarte e o projetista Antônio Faísca (ver Quadro 04).

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4 DOS PRIMEIROS EDIFICIOS MULTIFAMILIARES AOS ARRANHA-CÉUS

A partir da década de 1970, deflagra-se a construção em massa de edifícios residenciais multifamiliares, de quatro pavimentos, o que provoca grande quantidade de demolições de casas térreas unifamiliares, a fim de se disponibilizar terrenos livres para a verticalização do bairro. Um dos primeiros edifícios de quatro pavimentos apresenta função de hotel (com 27 unidades habitacionais) e insere-se na avenida Senador Galotti, no Loteamento Willy Rodrigues.

Esclarece-se que em planta, esses edifícios residenciais multifamiliares reproduzem a sequência de cômodos típica da casa térrea unifamiliar, mas com área total construída reduzida. Assim, essa planta é repetida nos vários andares e, recorrentemente, replicada, com mais ou menos exatidão, nos distintos empreendimentos de construtoras diferentes. Destaca-se a destinação do pavimento térreo para uso de garagem (reduzindo a face térrea pública à sucessão de portões de garagem, além de depósitos de lixo e gás); e a "suspensão" da varanda ou do alpendre da antiga casa com a criação da sacada, privativa por apartamento, voltada ao logradouro público. Ademais, as paredes de madeira ou de alvenaria, revestidas com pedras naturais ou tijoletas cerâmicas, são "modernizadas", trocadas por pastilhas cerâmicas 10x10 - tratamento "exclusivo" às fachadas frontais (laterais e fundos recebem apenas pintura de cor única, geralmente, branca ou bege)

Em concomitância, na década de 1970, a Prefeitura Municipal promulga o I Plano Diretor, que passa a exigir 1,5m de recuos laterais, a partir do primeiro andar (permite a ocupação total do terreno no pavimento térreo e sobreloja). Nos anos 1990, as casas que sobreviveram às demolições dos anos 1970 e 1980, não raro são descaracterizadas ou desaparecem atrás de fachadas "novas", seguindo o modismo da vez - até que seja efetivada a demolição para liberar o terreno para nova torre.

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Quadro 04 - Moradas de veraneio no balneário Mar Grosso.

Edificado no endereço.

Fonte: Acervo dos autores, 2019.

Projeto de casa no loteamento Willy Rodrigues, 1968, para Ungaretti.

Autoria do construtor Antônio Duarte. Uma das primeiras casas com: varanda com laje de concreto armado; platibanda; janelões de ferro; e cozinha no meio da morada.

Fonte: Viana, 2011.

Projeto de casa de madeira com telhado borboleta, no calçadão do Mar Grosso, atual rua Tubarão, 1960, para Bossle.

Demolida.

Fonte: Viana, 2011.

Projeto de casa,

na rua Claribalte Galvão, no loteamento Vila Portuária, 1969,

para Nilton Batista da Silva.

Autoria do construtor Antônio Duarte. Fonte: Viana, 2011.

Restaurante Caiçara, aproximadamente em 1960.

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No século XXI, lançam-se muitos empreendimentos que ultrapassam os quatro pavimentos. Em 2013, a Prefeitura Municipal institui o II Plano Diretor, que, conforme o exposto, divide o Mar Grosso em diversas zonas, permitindo em algumas a construção de até dezesseis pavimentos. Erguem-se arranha-céus cada vez mais altos, com apartamentos cada vez menores, destinados a uma clientela cada vez mais restrita: frequentemente, observam-se plantas mal resolvidas em implantações problemáticas, sobretudo desde a consideração do melhor conforto ambiental - as unidades habitacionais carecem de iluminação, insolação, ventilação, inclusive de privacidade (recuos laterais mínimos, semelhanças de implantação e planta levam ao alinhamento de janelas entre edifícios diferentes, por exemplo). Em comum, ostentam as sacadas com churrasqueiras, em espaços nomeados "gourmet", escancarados através de aberturas com envidraçamento panorâmico (ver Quadro 05).

Diante do exposto, questiona-se: onde reside o bucólico balneário dos primórdios no agitado bairro da Contemporaneidade?

A verticalização do edificado no balneário Mar Grosso foi acompanhada da elevação da qualidade do espaço arquitetônico, urbanístico e paisagístico? Foi acompanhada da subida da qualidade de vida para o lagunense?

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Quadro 05 - Mar Grosso, sob princípio da verticalização do bairro.

Edificado atualmente no endereço. Fonte: Acervo dos autores, 2019.

Hotel Balneário. Fonte: Viana, 2011. Projeto de hotel, para Ângelo Machado, 1973;

um dos primeiros em altura do bairro. Fonte: Viana, 2011.

Mar Grosso norte na década de 1970. Fonte: Cittadin, 2010.

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Mar Grosso Sul na década de 1970. Fonte: Viana, 2011.

REFERÊNCIAS

ARGAN, Giulio. História da arte como história da cidade. São Paulo: Martins Fontes, 1993.

BANDEIRA, Julio; LAGO, Pedro. Debret e o Brasil: obra completa 1816-1831. 2. ed. Rio de Janeiro: Capivara, 2008.

BENÍCIO, Danielle. Laguna, arquitetura novecentista e preservação do patrimônio: entre a conservação e a invenção. 2018. Tese (Doutorado em Artes Visuais) - Universidade do Estado de Santa Catarina, Florianópolis, 2018.

BENÍCIO, Danielle et al. Acervo de processos do Escritório Técnico do Iphan em Laguna: aprovação rumo à proteção? In: FÓRUM MESTRES E CONSELHEIROS: TURISMO, PATRIMÔNIO E DESENVOLVIMENTO LOCAL, 4., 2012, Belo Horizonte. Anais... Belo Horizonte: UFMG, 2012. BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Secretária da Cultura. Subsecretaria do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. Processo 1122-T-84: Conjunto Centro Histórico de Laguna - Santa Catarina. Rio de Janeiro: 1984. Disponível em: http://acervodigital.iphan. gov.br/xmlui/handle/123456789/4800?discover?rpp=10&etal=0&query=laguna#page/1/ mode/1up. Acesso em: 06 jul. 2016.

CITTADIN, Ana Paula. Laguna: paisagem e preservação. 2010. Dissertação (Mestrado em Arquitetura e Urbanismo) - Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2010.

GARIBALDI II, Anita. Laguna Memórias II. Fotos. Laguna: 2017. Disponível em: https://www.facebook.com/profile.php?id=100010453653778&sk=photos&collection_token= 100010453653778%3A2305272732%3A5&lst=100004078862125%3A100010453653778%3A149 5946536. Acesso em: 29 mar. 2017.

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LAGUNA. Prefeitura Municipal de Laguna. Lei complementar n. 268, de 11 de dezembro de 2013: institui o Plano Diretor Municipal, estabelece objetivos, diretrizes e instrumentos para as ações de planejamento no município de Laguna e dá outras providências. Laguna: 2013. Disponível em: https://leismunicipais.com.br/plano-diretor-laguna-sc. Acesso em: 20 nov. 2019.

LAGUNA - ONTEM E HOJE. Fotos. Laguna: 2017. Disponível em: https://www. facebook.com/pg/29.12.13.LOH/photos/?ref=page_internal. Acesso em: 29 mar. 2017.

LUCENA, Liliane. Laguna: de ontem a hoje - espaços públicos e vida urbana. 1998. Dissertação (Mestrado em Geografia) - Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 1998.

ROSSI, Aldo. A arquitetura da cidade. São Paulo: Martins Fontes, 1995.

SIMON, Lilian. Documentação e monitoramento de sítios urbanos históricos com apoio do cadastro técnico multifinalitário e da fotogrametria digital: estudo de caso - Laguna. 2000. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil) - Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2000. ULYSSÉA, Ruben. Laguna: memória histórica. Laguna: Letrativa, 2004.

ULYSSÉA, Saul. A Laguna de 1880. Laguna: IOESC, 1943.

VIANA, Alice (Coord.). Memórias de Laguna. 2011. Projeto de Extensão (Extensão em Arquitetura e Urbanismo) - Universidade do Estado de Santa Catarina, Laguna, 2011. CD-ROM.

Imagem

Figura 01 - Laguna e seu contexto geográfico.
Figura 02 - Entrada de Laguna por Debret em 1827. Barra de acesso

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