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Capítulo 3 – Duas Potências, duas Organizações: que hegemonia?

3.3 O protagonismo comparado da Alemanha e do Brasil

3.3.2 Âmbito econômico – da Política Externa

Aqui reside o foco do governo alemão dos anos 2000 a 2015. Se o país deu pauta às exportações foi devido ao Euro ser melhor moeda que o Marco dentro de todo contexto e as condições favoráveis à exportação – e ainda mais para dentro da União Europeia, onde tornou- se, conforme Kundnani (2015, p. 79), “a China da Europa”. Se em termos percentuais o crescimento foi surpreendente com o início do Tratado de Maastricht (1992) até os anos 2000, de 2000 a 2015 houve crescimento nos valores absolutos e manutenção em termos relativos: dos 257 bilhões de dólares em exportações destinados a União Europeia no ano de 2000, o valor aumentou para 735 bilhões no ano de 2015. Em medida de proporção, de 2000 a 2015, estes valores se mantiveram, em média, em 57,4% do total de exportações alemãs que foram destinadas à UE, conforme dados do Observatório da Complexidade Econômica (OEC, 2018).

A reação alemã perante a crise financeira mundial de 2008 apenas trouxe mais à tona que a Alemanha não atuaria mais apenas através do viés institucional. A relutância do Estado em transformar seu superávit fiscal em um déficit através de estímulos começava a sugerir que a Alemanha não estava mais sendo uma parceria tão exitosa assim – algo que a chanceler Merkel queria de todas as formas evitar. Mas a localização alemã torna uma ilusão pensar que de alguma forma ela deixaria a Europa para trás, mesmo que por ser o destino do seu mercado de exportador e para manter baixo o valor de sua moeda. O abandono do euro tornaria a Alemanha ainda mais forte; fato que, como consequência, tornaria suas exportações menos competitivas em qualquer lugar do mundo (CHANDLER, 2010; KUNDNANI, 2015).

Passando a atuar sozinha em certos momentos, o multilateralismo alemão não deixou de existir. Para Bulmer e Paterson (2010) e Janning e Möller (2016), não houve um abandono da abordagem multilateral na Política Externa alemã, apenas uma opção calculada do governo sobre quando utilizar cada instituição, de acordo com seus interesses, e não mais apenas se utilizar do formato do multilateralismo – e, se necessário, atuando sozinho. O reforço econômico alemão só aumentou o poder de barganha como mecanismo para projeção de poder da Alemanha dentro da União Europeia. É a utilização do multilateralismo “ma non troppo”32 – até para fins de comparação com o caso brasileiro.

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De mesmo modo se comportou o Brasil nestes anos: se por um lado passou a dar importância as questões políticas e sociais através de instituições no Mercosul, e apenas trouxe como perspectiva a retomada dos fundamentos do bloco – em questões institucionais nas pautas de comércio e investimentos –, não deixou de lado sua pauta exportadora (ALMEIDA, 2016). De modo geral, as exportações brasileiras saltaram da cifra de 55 bilhões de dólares em 2000 para 256 bilhões de dólares, em 2011, e com a retração da economia brasileira, apresentaram os valores de 191 bilhões de dólares no ano de 2015, conforme dados do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC) do governo brasileiro, através do portal Aliceweb (2018). Mesmo assim, ainda de acordo com os dados do MDIC, as exportações direcionadas a países do Mercosul representaram em média neste período 10% dos valores totais do Brasil: subindo de 7,7 bilhões de dólares, nos anos 2000, para 20,9 bilhões de dólares em 2015, tendo atingido em 2013 a cifra de 29,5 bilhões de dólares.

Diferente do caso europeu, o Mercosul, ao não apresentar uma moeda comum, deixa o próprio esquema de integração fortemente influenciável por eventuais baixas do dólar – que reduz a competitividade dos produtos da exportação sul-americana. Porém, há de se destacar que variações na cotação do Real brasileiro, sendo a moeda mais valorizada da região, já influenciou em outros momentos no cenário regional – vide a crise experimentada pela Argentina de 1998 até quase 2003 (SCHENONI, 2014; FARIA, 2009).

O Brasil de Lula também se utilizou do multilateralismo para encarar o mundo de interdependência econômica – também já adentrando no posicionamento brasileiro frente o cenário internacional. Ou seja, buscou melhorar as relações com Estados emergentes de modo a superar as assimetrias e assim alcançar melhores projeções no cenário internacional, bem como dar foco à região. E, assim como o governo de Merkel na Alemanha, uma postura reativa foi assumida perante a maioria das situações envolvendo países sul-americanos – ao contrário do que se esperava da potência na região, tanto do Brasil quanto da Alemanha (CERVO, 2008; VEIGA; RIOS, 2011).

Já com Dilma Rousseff (entre os anos de 2011 e 2015), o foco tornou-se ainda maior no que tange ao multilateralismo da política externa brasileira (principalmente através da consolidação dos BRICS, iniciada já nos governos Lula) e se distraiu em meio as crises políticas internas e os resquícios da crise norte-americana de 2008 com as quais sofria o Brasil (COOPER; STUBBS, 2017).

Assim como já fora no caso alemão, o destino das exportações brasileiras para a China teve um aumento percentual considerável – de 1,9%, em 2000, para 18,6% em 2015 – como

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visto no ponto 3.2.3. Concomitantemente, houve uma diminuição do percentual das exportações destinadas aos Estados Unidos – de 23,9% nos anos 2000, para 12,6% em 2015 – demonstrando, assim, a variação de opções que mostrou o governo brasileiro através do multilateralismo econômico e sua pauta voltada para as exportações.

Pode-se dizer que há uma diferença nas exportações da Alemanha e do Brasil e ela se encontra na pauta dos produtos: de acordo com dados do Observatório da Complexidade Econômica (OEC, 2018), a Alemanha tem o maior percentual representado por bens finais (como automóveis, que representaram 12%, e medicamentos embalados, com 4% das exportações totais da Alemanha) e maquinário (peças de automóveis e outros equipamentos, que chegaram a representar 29%) em 2015.

Já o Brasil esteve com pauta da exportação voltada a bens primários, as commodities, que representaram mais de 35% das exportações brasileiras – entre as principais a soja, 11%, o petróleo, 6,4%, o minério de ferro, 5,5% e o café, representando 3% das exportações brasileiras de 2015 (OEC, 2018). Neste cenário, mais do que o percentual que representou o Mercosul para as exportações brasileiras, o destaque vai para a importância do mercado econômico do processo de integração para o escoamento dos manufaturados do Brasil – como visto no ponto 3.2.3.