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Capítulo 2 – Os processos de integração Europeu e Sul-Americano

2.1 A União Europeia pelo trajeto Alemão

2.1.1 A vocação integracionista europeia

Os primeiros passos em direção a uma integração regional foram dados em 1944, quando, ao fim da Segunda Guerra Mundial, Bélgica, Holanda e Luxemburgo assinaram uma convenção aduaneira chamada de Benelux. Acertada através de um acordo monetário assinado em 1943, sua principal função era eliminar as barreiras alfandegárias da região e estimular o comércio, formando uma União Aduaneira (BENELUX, 2018; CARVALHO, 2002).

A Alemanha no pós-Segunda Guerra em 1945 encontrava-se destruída. Nem os Aliados tinham certeza do futuro alemão e acharam que seria melhor dividi-la em zonas de ocupação: os Estados Unidos ocuparam ao sul, a França a oeste, a Grã-Bretanha ao norte e ao leste o controle ficou com a União Soviética. Foi apenas em 1949 que os territórios ocupados pela França, Estados Unidos e Grã-Bretanha fundaram no mês de maio a República Federal da Alemanha (RFA) – a Alemanha Ocidental – e em outubro, como uma resposta soviética, foi fundada a República Democrática Alemã (RDA) – a Alemanha Oriental. Enquanto a RDA fazia parte do bloco soviético e tinha um padrão de desenvolvimento bem diferente, a RFA apresentava impressionante recuperação econômica e passava a ser readmitida à comunidade de nações e a adentrar nos processos de integração que estavam surgindo (FULBROOK, 2016). Em meio as lutas pela paz mundial e os primeiros passos no sentido da integração, surge o nome de Jean Monnet, um estudioso notório francês que, mesmo nunca tendo sido eleito, era bem relacionado dentro dos governos europeus e é conhecido hoje como o pai da integração europeia. Em 1950, conseguiu influenciar Robert Schuman, o então Ministro dos Negócios Estrangeiros francês, a colocar toda a produção de aço e do carvão sob uma autoridade comum (CALEGARI, 2009; KERBER, 2001; OLIVEIRA, 2002).

Este plano, denominado de Plano Schuman, já reunia as principais caraterísticas do projeto que criou a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço (CECA). Formada oficialmente em 1951, através do Tratado de Paris, a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço teve além da assinatura da Bélgica, da Holanda e de Luxemburgo (os países do Benelux), a adesão da recém-criada República Federal da Alemanha, da França e da Itália. A comunidade em 1953 já havia eliminado os tributos e, portanto, havia estabelecido uma Área de Livre Comércio para o Carvão e o Aço (CALEGARI, 2009; APPLEYARD; FIELD; COBB, 2010; OLIVEIRA, 2002).

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Dada a importância estratégica do carvão e do aço, estes foram o centro de várias guerras entre a França e a Alemanha. Deste modo, gerir estes recursos em comum e reinserir a Alemanha numa comunidade sólida consistiu em uma ideia inteligente. Foi a primeira tentativa de uma aproximação funcional europeia. Nada mais era do que o primeiro passo dado para a Europa alcançar níveis mais intensos de integração, segundo a teoria funcionalista desenvolvida por Mitrany (KERBER, 2001; CALEGARI, 2009).

Em 1957, estes mesmos seis Estados resolveram deixar as relações mais próximas com a criação de um Mercado comum. Com os dois Tratados assinados em Roma, constituíram a Comunidade Econômica Europeia (CEE) e a Comunidade Europeia da Energia Atômica (CEEA), mais conhecida como Euratom (D’ARCY, 2002; CALEGARI, 2009; UNIÃO EUROPEIA, 2018a).

A Euratom surgiu para cooperação conjunta no segmento de energia atômica. Estes dois tratados em conjunto com o Tratado de Paris de 1951, formaram a constituição da Comunidade Europeia. A intenção era formar um mercado integrado para livre circulação de mercadorias, serviços, capital e pessoas (APPLEYARD; FIELD; COBB, 2010). A perspectiva teórica do Neofuncionalismo surgiu, no fim dos 1950 e início dos anos 1960, com a tentativa de explicar os avanços que aconteciam no processo de integração europeu, através do início setorial da CECA que, por meio dos efeitos do spillover, se transformou em CEE (SZUCKO, 2017).

Foi com a construção da CEE que a República Federal da Alemanha pode novamente adentrar aos ideais comunitários e pôde viver os seus melhores momentos:

A emergência da CEE nos anos 50, permitiu à RFA construir uma nova identidade europeia-ocidental, federal e nacional, e reencontrar pouco a pouco, com o aval dos seus vizinhos e parceiros, os seus direitos de soberania que lhe tinham sido negados em 1945. Foi no seio da comunidade que, a Alemanha conseguiu viver os “anos mais honrosos” da sua história contemporânea, um dado que marcou o interesse desse Estado em favor do aprofundamento da comunidade (GOMES, 1997, p. 201). Levando em consideração o desenvolvimento econômico das três comunidades (que em um primeiro momento atuavam separadas e depois formavam a Comunidade Europeia), Soder (1995) classifica-as em três etapas até o ano de 1992: (1) até o início da década de 1970; (2) até 1985; e (3) a partir do Ato Único Europeu. A primeira fase foi marcada pelo progresso na criação da União Aduaneira, quando em 1966 estavam retiradas todas as barreiras alfandegárias para todos os produtos mercantis e os Estados passaram a administrar conjuntamente a produção alimentar, o que marcou a década de 1960 com altos índices de crescimento econômico. Desde o ano de 1962, quando passou a ser chamada de Parlamento Europeu, a

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Assembleia Europeia é uma das conquistas deste período, porém, as eleições diretas, conforme estabelecia o Tratado de Roma, só foram adotadas em 1974 (SODER, 1995; UNIÃO EUROPEIA, 2018a).

Em 1965, Bélgica, França, Itália, Luxemburgo, Holanda e Alemanha Ocidental, assinaram o Tratado de Fusão, acordo firmado para unir as três comunidades (CEE, Euratom e CECA) em uma comissão única e em um único conselho. O tratado que entrou em vigor em 1967 instituía assim a Comissão Europeia e o Conselho das Comunidades Europeias (UNIÃO EUROPEIA, 1967).

A segunda fase vai até a resolução dos chefes de governo, de 1985, para incrementar a Comunidade com a criação do Mercado Comum Interno. Este período foi caracterizado por crises, progressos e retrocessos. Mesmo com algumas crises conjunturais, a CEE se manteve e continuou seu processo de expansão com a adesão de novos Estados europeus: em 1973, com a inclusão da Dinamarca, Irlanda e o Reino Unido; em 1981, com a Grécia; e em 1986, com Espanha e Portugal (SODER, 1995; LOHBAUER, 2008; APPLEYARD; FIELD; COBB, 2010).

Deste modo, a Comunidade Europeia que começou com seis integrantes, passou a ter 12, e além deste crescimento quantitativo, podemos destacar o qualitativo, no aprimoramento de suas instituições, almejando suas próprias receitas a partir de 1970, com a política externa comum e, em 1978, com o começo de um Sistema Monetário Comum. A Europa dos Doze deu novas proporções à Comunidade Europeia, pois com o processo de unificação e a adesão dos novos Estados, o bloco ficou com uma população semelhante à dos EUA somada à população do Japão (SODER, 1995; LOHBAUER, 2008).

Para que fossem alcançados os altos objetivos impostos nos Tratados, os Estados-parte renunciaram parte de suas soberanias em razão de um órgão maior, uma organização de competência supranacional, com poderes próprios e com uma difícil missão de unir seus integrantes (KERBER, 2001). Apesar de a integração ser em seu primeiro momento pautada por questões mais econômicas, a institucionalização do bloco acarretava em uma maior unidade política. A maior dificuldade dos países membros sempre foi a perda de parte da soberania e transferi-la a órgãos supranacionais, além da burocracia inerente ao processo e a busca por soluções para a harmonização da economia (LOHBAUER, 2008).

A falta de um espírito europeu comum e a grande quantidade de regulamentos, criados por burocratas e parlamentares com poder limitado, trouxeram uma tendência de desconfiança em relação a CEE. O fim deste período de crises e retrocessos começou a se desenhar com o

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Ato Único Europeu, demonstrando o desejo de remoção dos obstáculos que ainda se apresentavam entre os Tratados de Roma, dando assim início a terceira fase (LOHBAUER, 2008; D’ARCY, 2002).