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1 AS NOTÍCIAS: CONSTRUÇÃO E VEICULAÇÃO

1.2 A CONSTRUÇÃO DO IMAGINÁRIO

1.2.2 Ídolos e heróis

percebe. Sem a padronização, sem os estereótipos, sem a rotina dos julgamentos, sem a razoável rudeza na desconsideração da sutileza, o editor morreria de excitação (LIPPMANN, 2008,p. 299-300).

Outro fator importante para cativar a audiência, segundo Lippmann (2008), é que o leitor precisa sentir-se dentro da notícia, participar nela, “da mesma forma como participa no drama, por identificação pessoal. (...) da mesma forma o leitor entra notícia adentro. Para conseguir entrar ele precisa encontrar um gancho familiar na estória, e isso lhe é fornecido pelo uso de estereótipos”. Histórias que despertam sensações facilmente identificáveis através dos estereótipos encontram sucesso no público mais rapidamente, por provocarem a identificação.

1.2.2 Ídolos e heróis

Um dos tipos mais recorrentes de estereótipos são os que se referem a algum tipo de admiração ou idolatria. Francisco Rüdiger descreve o processo de sucesso na antigüidade como a busca da distinção dos homens por seus feitos e obras, que os faria alcançar a glória e “conquistar a imortalidade aos olhos de sua espécie” (2000). Porém, na era contemporânea, o conceito de sucesso foi rebaixado e tornou-se mais mundano, tendo como objetivo maior a busca de popularidade.

A glória era baseada no juízo, na valorização feita pelos outros dos atos de um homem, se estes eram ou não extraordinários. A popularidade com que se está acostumado hoje está relacionada à impressão causada por atributos pessoais, como beleza, simpatia ou força, por exemplo. “A passagem da fama à celebridade situa-se no momento em que essa impressão passa a ser objeto de confecção pelas engrenagens coletivas e anônimas da indústria cultural” (RÜDIGER, 2000, p.32).

Edgar Morin, no livro As estrelas: mito e sedução no cinema, identifica o processo de surgimento de estrelas como uma fábrica, que produz, monta e lança “novos talentos”: “(...) uma autêntica produção em série absorve belas moças descobertas pelo talent scout, racionaliza, uniformiza, seleciona, se descarta das peças defeituosas, burila, monta, dá forma, lustra e enfeita – isto é, faz estrelas” (MORIN,

1989, p.75).

O francês também afirma que somente por fazer parte de um meio utilizado pela indústria cultural, o cinema, é possível a existência do estrelato: “É na medida em que o ator de cinema não é ator teatral que a estrela se torna possível” (MORIN, 1989, p.80). No teatro, com apresentações únicas, mesmo feitas com o mesmo elenco da mesma maneira são sempre diferentes, a estrela e a reprodução de sua imagem não funcionariam como num procedimento industrial como o do cinema.

Rüdiger assegura que “os heróis faziam-se por conta própria”, e as “celebridades são criação da mídia”. Enquanto o herói era formado pelos mitos, as celebridades são resultados da fofoca, das revistas, dos jornais, das imagens da TV e do cinema, como bom exemplo as estrelas de Hollywood. Morin afirma que “ser reconhecido como homem é, antes de mais nada, ver reconhecido o direito de imitar os deuses” (MORIN, 1989, 21), de sentir-se como as estrelas. É na imprensa que surge a celebridade, na década de 50, nos Estados Unidos (BOORSTING apud RÜDIGER, 2002).

Para Daniel Boorsting, as celebridades “são simples nomes que, feitos pela mídia, passam em seguida a ser notícia por si mesmos. Celebridades são os seres humanos como pseudo-evento.” O destaque oferecido aos relacionamentos das estrelas, suas casas, seus hobbies, suas viagens, sua vida, são a pauta desse tipo de cobertura. A criação de um personagem maior que o artista, que explora e aproveita uma imagem com seu melhor ângulo, supervalorizando suas qualidades e transformando este ser em molde a ser seguido.

Para Lang-Lang, uma pessoa pode se destacar por emergir no centro de emoções comuns – ou na visão de Lippmann, estereótipos comuns. Segundo os autores, existem quatro diferentes posições de espírito que podem destacar uma pessoa: “admiração, compaixão, ridículo e vilificação” (LANG-LANG, 1978, p.2). Nessa concepção, os traços de união coletiva considerados positivos (admiração e compaixão) são os traços que denominam ídolos.

A idolatria coletiva pode apresentar-se sob diferentes formas. Pessoas existem que despertaram a admiração pública por efeitos extraordinários realmente praticados ou a elas atribuídos. A adulação coletiva define o herói. Este fato inclui também o santo que simboliza mais virtudes que realizações (LANG-LANG, 1978, p.3).

Esse traço de união varia de acordo com o grupo que o utiliza, e sendo assim, uma pessoa pode ser, simultaneamente, um ídolo e um vilão. “A lenda estabiliza a imagem e a emoção correspondente cristaliza-se em culto” (LANG-LANG, 1978, p.4). Segundo os autores, no caso do artista, este pode ser rotulado com diferentes estereótipos e receber diversas reações do público.

Os meios de comunicação seriam excelentes facilitadores na construção da imagem de ídolos, segundo Lang-Lang. Para os autores a divulgação de massa auxilia na identificação e na fixação da imagem a ser distribuída. Porém, da mesma maneira em que se alcança a fama, o desaparecimento pode ocorrer na mesma velocidade e impacto:

Uma imagem mais ou menos definida do objeto central – o que é e o que fez – é divulgada e aceita pelo público. No grupo pequeno, esta imagem floresce através do rumor, da fofoca e do ridículo espontâneo. Em maior escala, a propaganda, as relações públicas, e a exploração jornalística do sentimento público facilitam a divulgação e a fixação da imagem. Reputações legendárias são assim fabricadas mas rapidamente esquecidas quando o herói do momento, o homem da semana, o malfeitor do ano depois de servirem aos objetivos para os quais foram forjados, tornam-se desnecessários. Mas enquanto permanecem em cartaz sua história é propriedade pública, seu nome corre de boca em boca e ele desfruta de considerável notoriedade (LANG-LANG, 1978, p.18-19).

Essa imagem divulgada normalmente não condiz com as características realmente atribuídas ao personagem. Os autores defendem que é necessário que se desperte a fantasia do público, evocando sentimentos adequados e valorizados. Para eles, “o herói de um culto é a personificação de um ideal” (LANG-LANG, 1978, p.19). É descartada a necessidade de proximidade física ou geográfica com o ídolo, e por muitas vezes, heróis despertam simpatia e idolatria maior em pessoas muito distantes de sua realidade retratada. Para Lang-Lang, a alta visibilidade é crucial nessa “coroação”, como a sua aparência: “A imaginação pública mais facilmente na aparência de uma pessoa do que em seu comportamento. (...) quanto mais fácil for representar uma pessoa por um traço que lhe seja peculiar ou um aspecto característico de seu papel, tanto mais facilmente esta pessoa pode ser dramatizada como traço de união” (LANG-LANG,

1978, p.20).

Tudo que possa destacar ou ressaltar o ídolo é uma vantagem na conquista de fiéis. Um dos pontos destaque é a forma de desvio. O ato de afrontar, ousar, ser especial ou diferente é o que materializa o extraordinário. A fórmula de idolatria para Lang-Lang é de 10% para a pessoa amada e 90% na que ama. Sob esse aspecto, a escolha de ídolos reflete considerações além dos desejos do indivíduo que se apaixona. “Cada sociedade, em cada época, cria ídolos à sua própria imagem e estes personificam seus ideais” (LANG-LANG, 1978, p.22). Assim como no classicismo o herói era uma figura mitológica, na idade média os heróis eram os santos e mártires, e no renascimento pôs o homem culto no altar. No século XX o ídolo está freqüentemente relacionado à estrela do cinema, da música, etc, graças à divulgação dos meios de comunicação em massa. Os meios “projetaram seus próprios estereótipos de ídolos populares. Sem dúvida que, até certo ponto, eles refletem mudanças de atitudes do público; por outro lado, contudo, os próprios meios de comunicação contribuem para tais mudanças” (LANG-LANG, 1978, p.24).

Certos interesses são, muitas vezes, os responsáveis pelos sentimentos públicos sobre as qualidades positivas ou negativas de determinada pessoa. Na realidade, a ascensão de um ídolo popular, com freqüência, é cuidadosamente planejada e a imagem correspondente deliberadamente cultivada. Neste caso, a imagem não é um fim em si mesma; a partir do momento em que a pessoa se encontra na posição desejada – muito alta ou muito baixa – sua imagem pode servir a outras causas. Os astros de cinema – um tipo de herói moderno – vendem não apenas os filmes nos quais trabalham; também vendem produtos comerciais, caridade e bônus de guerra (LANG-LANG, 1978, p.21-22).

Assim, os ídolos deixam de ser exemplos a se admirar e serem seguidos para tornarem-se garotos-propaganda de idéias, atitudes e produtos, utilizando uma imagem que se modifica e se adapta as necessidades de tempos em tempos.

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