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Ações do Poder Público municipal direcionadas às profissionais de creche

estratégias individuais e coletivas no processo de diferenciação e luta por reconhecimento social

TRABALHADORAS DE CRECHE DO CONJUNTO DO MLPC

1.1 Fluxos de conhecimento e reconhecimento externo: condições do auto reconhecimento

1.1.4 Ações do Poder Público municipal direcionadas às profissionais de creche

De acordo com Vieira (1998, p.37), é a partir de 1993 que as intervenções da Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) nas creches conveniadas se fazem mais visíveis. A autora toma como marco o diagnóstico a respeito do atendimento em creches na cidade,

102 AMEPPE. Acontecer: uma experiência de formação em serviço de profissionais de educação infantil. 1997, p. 10.

realizado pelo Instituto de Recursos Humanos João Pinheiro, encomendado pela Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social (SMDS). Os resultados revelaram um quadro crítico de atendimento, o que confirmava outras avaliações já existentes103. A precariedade referia-se tanto às condições físicas e materiais quanto aos recursos humanos. Nesse caso, o estudo encontrou 34% das profissionais que atuavam com crianças (educadoras) que não haviam completado sequer o Ensino Fundamental. Com base nesses dados, a PBH inicia um investimento na formação dessas profissionais, contando com a parceria de outras instituições. Até aquela data, 1993, as relações da Prefeitura de Belo Horizonte com as creches conveniadas eram estabelecidas pela Secretaria de Desenvolvimento Social, inexistindo, na estrutura da Secretaria de Educação (SMED), instâncias voltadas para esse atendimento.

Uma importante iniciativa foi o Projeto Formação do Educador Infantil de Belo

Horizonte, que desencadeou um processo de discussão sobre a necessidade da criação

dessas instâncias voltadas para a Educação Infantil: o Centro de Aperfeiçoamento dos Profissionais da Educação (CAPE), da Secretaria Municipal de Educação (SMED) selecionou professores da rede municipal para compor um grupo de trabalho dedicado especificamente à Educação Infantil; outro grupo de trabalho foi criado vinculado à Coordenação de Política Pedagógica (CPP) da SMED; foram criados, ainda, em novembro de 1995, os Centros de Educação Infantil (CEI), para apoio pedagógico a creches e pré-escolas (FUNDAÇÃO CARLOS CHAGAS, 1997; VIEIRA, 1998).

O Projeto Formação do Educador Infantil de Belo Horizonte (PFEIBH), proposto pela Equipe de Creches da Fundação Carlos Chagas/SP, caracterizava-se por intervir nos diversos segmentos do atendimento em creches conveniadas, prevendo a formação de técnicos de instituições públicas e privadas sem fins lucrativos, bem como de educadores, coordenadores e dirigentes de creches. O projeto consistiu de três grupos de trabalho: um dedicado a planejar, organizar e implementar ações de supervisão às creches conveniadas; outro, à elaboração do projeto de criação de um curso supletivo de primeiro grau (5ª a 8ª série) com qualificação profissional para as profissionais das creches conveniadas com a PBH; e o terceiro, que tomou sob sua responsabilidade pensar as questões curriculares para a Educação Infantil, o qual deveria subsidiar as

103 A AMEPPE havia realizado diagnóstico anteriormente, com resultados próximos aos encontrados pelo estudo do IRHJP (DIAS; FARIA FILHO, 1990).

ações dos dois outros grupos. Havia ainda a intenção clara de, mesmo contando com a parceria de outras instituições atuantes na cidade, como a AMEPPE e o IRHJP, intervir nas estruturas das secretarias da Prefeitura de Belo Horizonte, especialmente na SMED, promovendo a institucionalização das ações desta secretaria nas creches conveniadas.

A criação do curso supletivo, em fevereiro de 1995,104 acabou consumindo boa parte dos investimentos das instituições parceiras em decorrência da intenção de se criar um projeto de formação que assegurasse o caráter profissional da atividade, até então sem qualquer regulamentação por parte dos órgãos normativos da Educação. O acompanhamento do curso supletivo por parte do MLPC105 foi importante para o desvendamento de uma nova linguagem, bem como de novas instâncias normativas e reguladoras das ações das creches e de suas profissionais. Desde o início, a intenção dos proponentes do projeto era de que o curso de formação profissional criado fosse reconhecido, com o propósito de romper com o caráter assistemático da formação para o trabalho em creches oferecida a esse segmento. A apresentação do projeto de criação do curso Supletivo106 ao Conselho Estadual de Educação de Minas Gerais visou conferir caráter de reconhecimento da formação profissional, ainda que em nível de Primeiro Grau107. Nesse processo, foi possível ao movimento entrar em contato com esse universo da normalização no âmbito educacional, o que colidia com as formas de

104 Todo o processo de criação, aprovação e implementação do curso supletivo encontra-se em: FUNDAÇÃO CARLOS CHAGAS: 1997. Para uma análise da repercussão sobre as educadoras que participaram desse projeto, ver SILVA, 1999; 2001.

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Em reunião em 17/5/95, o MLPC formulou aos representantes das instituições parceiras a demanda de sua participação no Projeto (PROJETO FORMAÇÃO DO EDUCADOR INFANTIL. Ajuda-Memória, 17/5/95). Houve outra reunião realizada em 26/5/95, cuja pauta era a definição de formas de participação do MLPC no projeto, como Fórum de Coordenadores de Creches, que possuíam trabalhadoras freqüentando o curso supletivo. Montou-se uma pauta de encontros MLPC/Projeto com temas a discutir. Dessa forma, o projeto criou uma instância de legitimação de suas ações sem, no entanto, proporcionar uma participação do MLPC nas instâncias de decisão. Além disso, esse Fórum constituía-se, também, espaço de formação de dirigentes/coordenadores, bem como para as necessárias negociações para a facilitação da freqüência das alunas ao curso.

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PREFEITURA DE BELO HORIZONTE, Proposta ao Conselho Estadual de Educação de Minas Gerais para a criação do curso regular para qualificação profissional do educador infantil de creche/similar, integrado a curso supletivo de ensino fundamental (5ª a 8ª série), 1995.

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A opção pela proposição da formação em nível de Primeiro Grau apresentava a dificuldade imposta pela LDB em vigor, que não reconhecia a formação profissional nesse nível de ensino. No entanto, o projeto se sustentou com base nos dados de escolaridade das trabalhadoras de creche que indicavam um grande contingente de profissionais (34%) que não possuíam esse nível de escolaridade. Mas desde o início as instituições responsáveis defendiam o Ensino Médio (na época Segundo Grau) como escolaridade mínima para os profissionais de creche (FUNDAÇÃO CARLOS CHAGAS, 1997).

encaminhamento de seus interesses até então, já que eram feitas sob argumentos políticos (SILVA, 2002).

O supletivo tornou-se, então, importante espaço de reflexão, uma vez que colocava como questão central o reconhecimento de que a atividade com as crianças nas creches deveria ser exercida por profissionais qualificados e reconhecidos. Desenvolvido por um período de dois anos e meio, esse curso permitiu contato permanente de grande número de educadoras de diversas creches da cidade, ampliando- lhes a visão de sua atividade. Tudo isso parece ter contribuído para um sentimento de maior valorização dessas profissionais, ao mesmo tempo em que tornou ainda mais evidentes as suas precárias condições de trabalho e de remuneração (SILVA, 1999; 2001).

1.1.5 Encontro Nacional de Educadoras de creches comunitárias e filantrópicas –