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estratégias individuais e coletivas no processo de diferenciação e luta por reconhecimento social

TRABALHADORAS DE CRECHE DO CONJUNTO DO MLPC

1.1 Fluxos de conhecimento e reconhecimento externo: condições do auto reconhecimento

1.1.6 Rede Nacional de Educação Infantil

A realização do Encontro Nacional proporcionou a mobilização não apenas de profissionais de creches de diversos Estados do Brasil, como também a articulação de instituições envolvidas com a questão da creche. Mesmo não tendo se consolidado, a iniciativa de constituir uma Rede Nacional de Educação Infantil foi uma ação importante no contexto de organização dos organismos populares e ONGs ligadas à educação da criança pequena, em cujo processo se evidencia um aprofundamento da diferenciação entre os diversos segmentos que compunham as creches. Em 26 de junho de 1995, quase um ano após o Encontro Nacional, realizou-se no Rio de Janeiro uma reunião da Comissão Organizadora do Encontro Nacional de Educadores de Creches e

Pré-escolas129. Em seu relatório, menciona-se a possibilidade da criação de uma Rede Nacional de Educação Infantil. Dessa reunião participaram as seguintes instituições: AMEPPE/MG, MLPC/MG, Assessoria 5/PE, Fundação Fé e Alegria, Articulação de creches de São Gonçalo, Serviço Alemão de Cooperação Técnica e Social (SACTES), Instituto de Políticas Alternativas para o Cone Sul (PACS) e, como convidada, Wanda Engel, então secretária de Desenvolvimento Social do Rio de Janeiro, apresentada no referido documento como oriunda da área da Educação e de ONGs.

129 Relatório da reunião da Comissão Organizadora do Encontro Nacional de Educadores de Creches e Pré-escolas Comunitárias, realizada no Rio de Janeiro, em 26 de junho de 1995, 11p.

Essas instituições chegaram a elaborar uma Carta de Princípios para a Rede

Nacional de Educação Infantil, cujos objetivos foram assim definidos:

Objetivos da rede:

Desenvolver ações que visem à garantia do direito das crianças de 0 a 6 anos à educação, conforme expresso na Constituição Federal; intervir no campo das políticas de educação da criança de 0 a 6 anos; divulgar o direito à educação da criança de 0 a 6 anos.

Objetivo específico:

Lutar pela formação e profissionalização dos educadores de creche e pré-escola (regulamentação da profissão).130

Em suas “Linhas de Ação”, propõe-se:

1. Formação/profissionalização do educador de creche e pré-escola; 2.Políticas de atendimento (formação, alimentação, salário, equipamentos, material pedagógico, supervisão, fiscalização, etc.); 3. Comunicação/organização interna; 4. Articulação externa e política.131

Verifica-se que, mesmo se autodenominando rede de Educação Infantil, a ênfase foi colocada sobre a questão da profissionalização, seja pela centralidade que ela adquire em razão das definições legais, seja porque as instituições envolvidas passaram a tomar essa dimensão de modo mais agressivo, ao que parece, a partir do Encontro Nacional de Educadoras.

A síntese do relato das instituições de Belo Horizonte (AMEPPE, MLPC E SACTES132), informa que houve avaliações em algumas creches, a partir das quais iniciou-se “um processo de discussão sobre quem o MLPC representa: se as educadoras, as direções das creches ou as instituições”.133 Desencadeou-se um processo de diferenciação dos segmentos, o que parecia ser um dos objetivos do Encontro Nacional, conforme mencionei anteriormente. É importante ter em mente que a articulação das instituições que possibilitou a realização do Encontro é também uma “resposta” ao momento político que caminhava para a regulamentação do setor, bem como uma

130

REDE NACIONAL DE EDUCAÇÃO INFANTIL: Carta de Princípios, [s.d.]. 131 REDE NACIONAL DE EDUCAÇÃO INFANTIL: Carta de Princípios, [s.d.].

132 A representante do SACTES, Birgit Alex, atuava como assessora do MLPC/BH, como parte do apoio prestado por essa instituição alemã ao movimento.

133 Relatório da reunião da Comissão Organizadora do Encontro Nacional de Educadores de Creches e Pré-escolas Comunitárias, realizada no Rio de Janeiro, em 26 de junho de 1995, p. 9.

conseqüência de um processo de reflexão nascido da própria luta por creches de maneira geral, em que a questão do pagamento de pessoal e demais questões trabalhistas sempre estiveram presentes. É preciso lembrar também que houve, naquele momento, capacidade financeira, técnica e política das instituições envolvidas, especialmente das ONGs de apoio, para se articularem e promover a articulação nacional em torno da questão do profissional, seguindo-se uma tendência entre os movimentos populares de se constituírem em redes movimentalistas (DOÍMO, 1993; SCHERER-WARREN, 1993).

Essa articulação parece ter funcionado como forma de assegurar às creches e ao MLPC, bem como às educadoras: oportunidade de acesso a informações sobre o processo de regulamentação da área, bem como da construção de uma possível política para o setor; espaço e oportunidade para se envolverem no debate mais amplo da política de Educação Infantil; e condições de registro e sistematização da própria ação, uma vez que foram produzidos documentos importantes a partir desse processo, procedimento considerado fundamental na constituição do chamado campo da educação popular (DOÍMO,1993). Além disso, evidencia-se a intenção de produzir maior visibilidade para a questão da creche e do profissional.

O questionamento entre as creches e profissionais de creche de Belo Horizonte, relatado no referido relatório (junho de 1995), a respeito do segmento representado pelo MLPC evidencia o início de uma diferenciação entre os diversos segmentos envolvidos. O MLPC, até então, tido como o porta-voz das creches, vê-se diante de uma problemática antiga – as condições de trabalho das profissionais das creches –, mas revestida de um sentido novo: trata-se agora de uma definição mais clara dos diversos lugares existentes em cada instituição, o que revela a complexidade das relações sob a denominação creche comunitária.

O que vamos ver em seguida é que, em Belo Horizonte, seguiu-se um processo de organização das educadoras que culminou na criação do Grupo de Apoio à Profissionalização do Educador Infantil (GAPEI), sobre o qual pretendo discorrer em seguida, a partir da qual as tensões entre esses segmentos vão permitir explicitar os sentidos distintos atribuídos às creches comunitárias, bem como as ambigüidades do seu caráter comunitário.

2 AS PROFISSIONAIS DE CRECHE: experiência social

2.1 GAPEI: o MLPC como possibilidade (recurso) para o início do processo de