• Nenhum resultado encontrado

2.1 PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO

2.2.2 A Abordagem Biológica

Os biólogos e neurofisiologistas Humberto Maturana e Francisco Varela provam, em “De Máquinas e Seres Vivos” (1997), que os sistemas vivos são organizacionalmente fechados, realizam interação autônoma e só têm como referência eles mesmos.

Para Maturana e Varela a interação com o meio ambiente só é possível em função da estrutura do sistema vivo, que, por sua vez, só percebe o meio ambiente onde se encontra em função da sua própria estrutura organizacional, ou seja, como parte de si próprio, e, portanto, fechado, adaptando-se, ou não, às variações externas também em decorrência da sua estrutura, estabelecendo a teoria da autopoiesis, que explica a capacidade dos sistemas vivos se autocriarem ou auto-renovarem.

No entanto eles não vêem os sistemas viventes isolados das relações com o exterior, seja com outros sistemas vivos (autopoiéticos), ou não (alopoiéticos), com os quais mantém um acoplamento estrutural, viabilizado segundo condicionantes da sua própria estrutura orgânica, um permanente estado de transformações ontogênicas (mais comumente), e/ou epigênicas (mais raramente).

Negam a teoria darwiniana de seleção natural das espécies, onde os seres mais capazes sobrevivem pela adaptação ao meio, e propõem uma nova concepção da evolução das máquinas vivas: a deriva natural, onde em função do

acaso, os organismos viventes desenvolvem-se, ou não, segundo as suas possibilidades momentâneas de se adaptarem às mudanças que o meio ambiente oferece, sendo que essas possibilidades estão determinadas pela estrutura do sistema vivo.

Para eles os sistemas vivos se caracterizam principalmente pela autonomia, pela circularidade e pela auto-referência. Os subsistemas e/ou os elementos de um sistema vivo possuem íntima inter-relação, o que faz com que quando ocorra a mudança em um deles, todos os demais tenham também que mudar para uma nova estrutura, o que constitui a circularidade.

Todas as mudanças que os seres vivos assumem têm por objetivo a manutenção da sua organização estrutural que “não pode entrar em interações que não estejam especificadas dentro do padrão de relações que definem a sua organização” Morgan (1996, p. 242), o que coloca, dessa forma, o meio ambiente, ou o ambiente percebido, como parte do próprio organismo.

A autonomia dos sistemas viventes tem a finalidade de perpetuar o organismo, e, portanto, a preservação da espécie.

Se acontecer a impossibilidade da adaptação do sistema vivo a mudanças externas dada a sua capacidade estrutural de adaptação, a circularidade é rompida e o sistema morre.

Para Maturana nas empresas acontecem relações de trabalho que não passam de “acordos de produção nos quais o central é o produto, não os seres humanos que o produzem. Por isso, “as relações de trabalho não são relações sociais”.

“O fato de que isso seja assim é o que justifica a negação do humano nas relações de trabalho: ser humano em uma relação de trabalho é uma impertinência. O fato de que as relações de trabalho não sejam relações sociais torna possível a troca dos trabalhadores humanos por autômatos e a utilização humana no desconhecimento do humano, que os trabalhadores ignorantes desta situação vivenciam como exploração” (MATURANA, 1998a, p.75).

No entanto “se um sistema vivente sofre interações plásticas (ou seja, aquelas em que o organismo realiza mudanças estruturais tais que continua o seu viver no meio perturbador, já com uma estrutura diferente daquela anterior à interação, com um âmbito de mudanças de estado diferente e com um domínio de perturbações diferente), recorrentes com entidades de seu meio externo, viventes ou não – viventes, e com seus próprios estados (sem meio externo) ao longo de sua ontogenia, sofre mudanças em seu domínio de estados e em seu domínio de perturbações especificado por sua estrutura, porém constituinte de sua história de interações” (MATURANA; GUILOFF,1998, p. 18).

Segundo Maturana e Varela (1997), as sociedades são sistemas autopoiéticos de ordem superior, onde ocorrem configurações particulares de relações consensuais (sociais) entre seus componentes humanos. Um sistema social particular qualquer é distinto dos demais justamente pela sua configuração particular e a sua estabilidade depende, necessariamente, da estabilidade dos domínios de comportamento de seus membros individuais (MATURANA,1998a).

Em um sentido biológico específico, viver num sistema social, numa cultura, ou em sistemas políticos diferentes não é a mesma coisa.

“Cada mundo social, cada cultura abre espaços epigênicos diferentes e os seres humanos que surgem neles são estrutural e biologicamente diferentes. Daí a nossa responsabilidade social fundamental; na medida em que contribuímos com nossa conduta cotidiana para constituir o mundo social que compartilhamos com outros seres humanos como também o meio no qual vivemos, contribuímos para a sua epigênese, e, portanto, à configuração dos aspectos e características que surgem neles e em nós, e que contribuem para construir nosso acontecer social” (MATURANA & LUZORO,1998, p. 53).

Portanto é admissível que possam existir, ou que se possa construir empresas sociais, nas quais o trabalho tenha um sentido social, onde haja identificação dos funcionários com o sentido social da empresa, onde eles sintam satisfação em trabalhar, onde haja justiça, respeito, honestidade e colaboração Maturana (1995), realizando-se como seres humanos no domínio da linguagem.

Para Fialho (mimeo a, p. 5), “Organizations, visualized as entities with individuality and personality, turn ergonomic focus from the old paradigms associated to productivity to a holistic approach that incorporates not only the old taylorist perceptions but also the more updated research in anthropotecnology adding, to this binomial a third factor, the environment inside which the organization develops its autopoiesis.”

“Organizations are higher order autopoietic entities consisting of inanimate objects, auto and alopoietic machines and human beings. Santos and Fialho (1993 – “Anthropotechnology, Autopoiesis and the Work of Jean Piaget”), proposed that organizations, as a set of individuals, equipment and installations can be understood as psychological entities where the productivity of the organization and the quality of life of its employees have to surrender to a third factor, the need of adapting to the environment.”

“The cognitivist modeling of organizations, treated as autopoietic entities, allows a dynamic analysis of its performance inside the environment where its ontogenesys takes place. This new proposal extends the amplitude of ergonomics. Constructivism makes justice to the reflexive dimension of the cognitive sciences pointing to an eco-ergonomic approach.”

“A atenção volta-se, então, para os processos através dos quais os sistemas tentam manter a identidade ignorando ou neutralizando flutuações ameaçadoras e para a maneira pela qual as variações podem levar ao surgimento de novas formas de organização” (MORGAN,1995, p. 245).

Da aleatoriedade das interações surgem novas formas de organização que geram novas relações no sistema, novos padrões de ordenamento e de estabilidade, às vezes transformando todo o sistema de atividade, mas, outras vezes, levando-os à inviabilidade.

A leitura da empresa como um sistema autopoiético conduz à conclusão que o conjunto de seres humanos que nela atuam cria uma “entidade” própria da empresa, uma espécie de “psique” peculiar, que “viverá” em permanente transformação, ajustando-se pelo conhecimento adquirido da sua realidade através da objetividade entre parênteses, ou seja, aceitando que a única validação possível de um problema é a dinâmica social que o constitui Mendez e Maturana (1995), através do uso da linguagem, moldando o próprio futuro.

Segundo Morgan (1996), a teoria da autopoiesis utilizada como metáfora de leitura de uma empresa permite perceber que a sua interpretação do meio ambiente reflete sempre a sua auto-imagem, a qual tenta preservar e que a compreensão da posição atual da empresa passa, necessariamente, pelo conhecimento da sua história, dos fatores determinantes da sua identidade e das suas relações com o exterior. Para entender o seu ambiente uma organização precisa, antes, entender a si mesma.

É fundamental entender que uma organização é feita por pessoas, que precisam saber quem são, o que fazem, e para que fazem o seu trabalho. Como o ambiente não é um campo independente contra o qual se luta, o processo de autoconhecimento conduz à evolução constante de uma sabedoria sistêmica que coloca o instrumental para o acoplamento estrutural com o meio, a evolução conjunta com o sistema mais amplo.