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A notícia jornalística quase sempre é compreendida como um texto expositivo onde os fatos se apresentam por ordem de importância e relevância. No entanto, o texto noticioso pode também ser enquadrado como narrativa e como discurso, quando as noções de narrativa são mais abrangentes que no sentido épico (SILVA, 2007).

Para Motta (2012), a narrativa retornou definitivamente à cena cultural. No ambiente midiático ela se consolidou com as novas tecnologias e a aceleração da produção de filmes, telenovelas, reportagens, anúncios, histórias em quadrinho, romances, reportagens, biografias, romances-históricos, peças teatrais e inúmeros outros tipos de relatos da industrial cultural. Simultaneamente, ela proliferou na web

através de blogs e redes sociais onde os diários personalizados e revelações íntimas se alastraram. É o que Thompson (1998) chamou de ‘historicidade e mundanidade mediadas’: nosso sentido de passado e pertença ficou cada vez mais dependente da expansão e de reservatórios de formas simbólicas mediadas.

Figura 01 - Capa “Operação Mãos Sujas” - Edição 2398 – 5 de novembro de 2014

Fonte: Revista Veja (Print retirado do app de leitor de revistas GoRead) A capa da revista destaca o juiz como elemento principal da capa e destaca no bigode da chamada, o papel do então Juiz, Sérgio Moro no caso do Petrolão. A revista faz uma comparação a investigação brasileira a uma das maiores investigações realizadas na Itália denominada “Operação Mãos-Sujas”. A capa da revista traz no seu elemento narrativo por meio do texto a informação de que existe articulações que atuam para tirar de cena o juiz Sérgio Moro como responsável pelo processo.

Ao se analisar os elementos presentes na capa, torna-se perceptível a narrativa de que Sérgio Moro é o principal responsável pela operação em que se investiga um escândalo de corrupção. E que existem pessoas envolvidas que atuam para tirar de cena o magistrado. Nesta

edição é perceptível a construção de Moro como uma pessoa que vem combatendo o mal que atinge o país. Ao abordar que existe uma articulação para impedir o juiz, a revista coloca dois lados nessa história: o bem e o mal. Se existe um lado em que atua para combater a ação do juiz Moro, este é apresentado de forma negativa e o personagem em destaque ganha uma imagem positiva, com valores assimilados a figura do herói.

Figura 02 - Capa “Ele salvou o ano” - Edição 2458 – 30 de dezembro de 2015

Fonte: Revista Veja (Print retirado do app de leitor de revistas GoRead) A capa do especial de 2015 em que se dedica a uma retrospectiva dos principais acontecimentos daquele ano e coloca novamente a figura de Sérgio Moro em destaque ocupando a grande maioria do espaço gráfico da capa. A chamada da matéria é uma frase de impacto. Esse recurso textual traz consigo uma compreensão de heroísmo, ao apontar que o juiz foi responsável por salvar o ano. O bigode da chamada descreve que a revista pesquisou as mais de 300 sentenças aplicadas pelo juiz e afirma descobrir as raízes de determinação e eficiência de

Moro e o coloca como a primeira esperança real para vencer a corrupção.

Novamente, o recurso narrativo de apresentar a imagem de Moro como alguém capaz de livrar o Brasil da corrupção se faz presente na revista. Ao investigar as mais de 300 sentenças e afirmar que encontrou a motivação principal da ação do juiz frente as investigações da Lava- Jato, a Veja apresenta a ação do juiz como eficaz no combate ao grande mal do país. Está presente um juízo de valor escondido nas entrelinhas principalmente ao enfatizar por meio do uso de hipérbole que dos tantos fatos ocorridos no ano de 2015, Sérgio Moro é o principal personagem de tantos acontecimentos.

Figura 03: Capa “O complô para calar a Lava-Jato” - Edição 2458 – 30 de dezembro de 2015

Fonte: Revista Veja (Print retirado do app de leitor de revistas GoRead) Esta edição traz um comportamento diferente das duas edições anteriores. A figura de Moro não abandona a presença principal na capa, mas a imagem do seu rosto é colocada em um contexto que faz compreender que o juiz sofre algum tipo de censura. O magistrado é representado com uma fita que tampa a sua boca e ao se relacionar com

a chamada principal, “O complô para calar a Lava-Jato” a revista combina os dois elementos para justificar a sua narrativa. O bigode da chamada destaca que a liderança para impedir os avanços da Lava-Jato, são políticos do (P)MDB.

Nessa edição, a revista repete um padrão de que existem forças que querem calar a ação de Sérgio Moro na Lava-Jato. Ao trazer uma fita na boca do então juiz, a narrativa reforça a articulação para impedir a atuação do magistrado na maior operação contra a corrupção do país. Na luta do bem contra o mal, aqueles que querem impedir o bem são os vilões e aquele que sofre com essas ações representa a figura do herói. A figura de Moro novamente é enaltecida como alguém que representa o bem.

Figura 04 - Capa “O primeiro encontro cara a cara” - Edição 2529 – 10 de maio de 2017

Fonte: Revista Veja (Print retirado do app de leitor de revistas GoRead) Um dos momentos mais aguardados dentro da dramaticidade midiática criada sobre a Lava-Jato foi o primeiro depoimento do ex- presidente Lula ao juiz Sérgio Moro. O fato em si quando acontece já existia no ideário da população brasileira o envolvimento de Luiz Inácio

em esquemas de corrupção com empreiteiras. O primeiro encontro apresentado pela revista é como um duelo. O efeito do embate Moro x Lula é utilizado de forma estratégica pela revista para dar elementos a um embate. O depoimento do petista é algo que foi espetacularizado e novamente a Veja traz a construção narrativa de um duelo entre dois lados.

Nas linhas abaixo das imagens vetorizadas em história de quadrinhos de ambos dois fatos compõem a narrativa. A primeira é uma análise da libertação de José Dirceu como algo benéfico à Operação. Os elementos gráficos ganham menos destaque ao se comparar com o que está em seu oposto. Abaixo da figura de Lula, está presente uma outra informação relacionada ao depoimento de Renato Duque relatando que o ex-presidente o orientou a fechar uma conta na suíça. Essa informação ganha maior destaque.

A revista traz mais elementos para criar o espetáculo do depoimento como uma luta. Ao apresentar os dois personagens como lutadores mascarados, a Veja cria uma narrativa de duelo entre um herói e um vilão. No lado esquerdo da capa a figura de Moro. Já no lado direito, a figura de Lula. Ao analisar todos os elementos textuais e imagéticos presentes, a capa apresenta uma neutralidade, mas associa Lula a alguém que ao pedir o fechamento da suposta conta na Suíça, alguém que gostaria de esconder algo. E dá a sugestão de que Lula é o antagonista da história, deixando assim uma compreensão mais detalhada ao leitor.

Figura 05 - Capa “A pirueta de Moro” - Edição 2529 – 10 de maio de 2017

Fonte: Revista Veja (Print retirado do app de leitor de revistas GoRead) Se nas três primeiras capas a imagem de Sérgio Moro é apresentada em aspectos positivos, na capa desta edição, a revista modifica o padrão que foi repetido anteriormente. A imagem de Moro é elemento principal da capa, todavia a chamada da matéria coloca ação do juiz como algo acrobático. A frase de impacto “A Pirueta de Moro” está relacionada a aceitação do magistrado ao convite do então o presidente eleito, Jair Bolsonaro para ocupar a pasta do Ministério da Justiça. Moro é colocado com o dedo indicador na boca, aparentemente fazendo sinal de silêncio.

Ao associar a chamada da capa com a imagem, a revista permite construir uma narrativa que o juiz procura esconder ou silenciar alguma ação cometida por ele. A compreensão se torna completa ao ler o bigode. “A convite de Bolsonaro, o juiz faz um movimento arriscado e troca a Lava-Jato pela política. O uso do verbo “arriscado” traz consigo um julgamento de que a escolha feita é um risco para a imagem do juiz que foi colocado pela própria revista como um ator principal na luta contra a corrupção. A troca de Moro pelo Ministério da Justiça à

compreensão da capa da revista apresenta consigo um sentido de que a opção do magistrado pode ser um engano.

Figura 06 - Capa “Desmoronando” - Edição 2639 – 19 de junho de 2019

Fonte: Revista Veja (Print retirado do app de leitor de revistas GoRead) A capa dessa edição muda totalmente toda a cobertura e narrativa construída pela revista ante a imagem de Sérgio Moro. Após fechar uma parceria com o site The Intercept Brasil, a edição da revista aponta que os diálogos da Vaza Jato, obtidas pelo jornalista Glenn Greenwald, revelam que o então juiz transgrediu um princípio da Justiça do julgador ser isento perante a análise dos casos.

Os vazamentos de conversas obtidas pelo The Intercept indicam um comportamento ilegal e imoral por parte de Moro ao trocar informações com os procuradores da Lava-Jato em Curitiba relacionados a casos investigados a operação. Através de um grupo no aplicativo de mensagens instantâneas Telegram; Moro, Deltan Dellagnol e procuradores do MP em Curitiba discutiam caminhos de operações deflagradas, condução de estratégias para construção de inquéritos e

peças processuais, relacionamento com a mídia em liberações de informações das investigações entre outras atividades.

A figura do então juiz é representada por meio de um busto em concreto que está se desfazendo. O verbo “Desmoronando” título da matéria denota que tais vazamentos depõem contra a imagem de Sérgio Moro, que em muitos momentos foi apresentada pela própria revista como “o grande herói da Lava-Jato”. Ao apresentar um busto do magistrado se deteriorando, a revista reforça um tom negativo e de desconstrução de Moro. O bigode “Diálogos comprometedores com o Ministério Público, com claras transgressões à lei, desconstroem a imagem de Sérgio Moro, o grande herói da Lava-Jato”.

A revista depõe por meio das expressões “diálogos comprometedores”, “transgressões à Lei”, “desconstroem a imagem”. Essas expressões utilizadas pela Veja revelam um ato negativo daquele que era responsável pela aplicabilidade da mesma apontando comportamentos contraditórios ao que ele apresentava publicamente. Moro expõe, segundo a revista, uma outra imagem e a sua ação, juntamente com o Ministério Público, por meio dos diálogos revela o arquétipo do vilão que representa o que é errado, injusto, controverso, que foge dos princípios morais e éticos.

Figura 07 - Capa “Justiça com as próprias mãos” - Edição 2642 – 10 de julho de 2019

Fonte: Revista Veja (Print retirado do app de leitor de revistas GoRead) Talvez esta seja uma das capas mais significativas da revista ligadas a Sérgio Moro. Na capa da edição, a veja traz a figura do juiz desequilibrando a balança com suas próprias mãos. Ela se torna peculiar e repleta de significados, especialmente, pela balança ser o símbolo da Justiça. A mão direita do então juiz é utilizada para desequilibrar um lado dos pratos. Soma se a isso a chamada da matéria “Justiça com as próprias mãos”. A frase de efeito revela um ato transgressor por parte do juiz. Após a parceria com o The Intercept, a revista traz essa reportagem exclusiva, o que é indicado na chamada.

O bigode “Diálogos inéditos mostram que Sérgio Moro cometeu irregularidades, desequilibrando a balança em favor da acusação nos processos da Lava-Jato”. Novamente existem elementos textuais e não textuais que vão de contra a imagem do herói criada pela revista. A figura imagética de Moro desequilibrando a balança e as expressões “cometeu irregularidades”, “desequilibrando a balança em favor da acusação” são elementos utilizados para conduzir a uma narrativa negativa a ação do juiz à frente da Lava-Jato. Moro por muito tempo ocupou o ideário da

grande maioria da população brasileira como um herói contra a corrupção, mas, após os vazamentos da Vaza-Jato, foi desvelado a seu não limite aos códigos morais. A seu descumprimento do entendimento ético se alicerça em uma ideologia de justiça distorcida, aquele que a faz a qualquer custo, sem preocupar com a moralidade dos seus atos.

Figura 08 - Capa “Brasília é cheia de intrigas” - Edição 2655 – 10 de outubro de 2019

Fonte: Revista Veja (Print retirado do app de leitor de revistas GoRead) A edição de outubro de 2019 coloca mais uma vez a figura de Moro em destaque. A revista traz uma chamada revelando os bastidores de Brasília a partir da visão do então ministro. A imagem que ilustra a capa é de Moro sentado em uma cadeira colocado a margem esquerda da capa. Ao lado está em aspas uma chamada “Brasília é cheia de intrigas”. O subtítulo resume a entrevista que compõe a edição. Segundo o material, o Sergio Moro revela que não será candidato em 2022 e revela sobre sua relação com o presidente Bolsonaro. O mesmo também fala sobre a libertação de Lula após o STF revogarem as prisões em segunda instância e sobre os vazamentos das mensagens ligadas a Lava- Jato.

Ao analisarmos a imagem do ex-juiz, temos a sua figura sentada em uma cadeira em um espaço com fundo em uma parede em tons de cinza escuro. O fato de Moro estar mais posicionado à margem esquerda e a chamada colocada a direita, permite uma compreensão de que ele está de fora ou não se encaixa dentro dos bastidores de Brasília. A utilização de um fundo em tons escuros leva a uma compreensão de que o centro político do país possui muito mais a esconder do que a revelar. Tal análise se afirma pela chamada que compõe toda a capa e completa o enredo apresentado ao leitor.

Figura 08 - Capa “Não sou mentiroso” - Edição 2685 – 06 de maio de 2020

Fonte: Revista Veja (Print retirado do app de leitor de revistas GoRead) A última capa analisada em que a figura de Sérgio Moro é capa da revista Veja foi a edição de 06 de maio de 2020. Essa edição está ligada aos desdobramentos da saída do agora, ex-ministro da pasta da Justiça

e Segurança Pública, após acusar o presidente Bolsonaro de interferir na Polícia Federal com a demissão de Valeixo, o então diretor-geral da PF.

Novamente uma fala de Moro é utilizada como chamada para a capa. “Não sou mentiroso” é uma resposta dele para uma declaração do presidente que o acusou de inventar sobre as acusações a ele dirigidas em coletiva de imprensa realizada para comunicar o seu rompimento e desligamento com o governo de Bolsonaro. O subtítulo chama a atenção para uma entrevista exclusiva com o ex-ministro que afirma que apresentará ao STF provas das acusações contra o chefe do Executivo nacional e declara que não houve por parte do atual governo uma prioridade no combate de corrupção.

A composição da capa traz a figura de Moro em destaque e ao fundo o reflexo da sua imagem como um espelho ao fundo. A expressão séria com um olhar firme dialoga com a afirmação apresentada e assim indica que o ex-juiz é uma pessoa séria. Por meio da relação do subtítulo e dos demais elementos que ocupam a capa, a Veja novamente dá credibilidade ao magistrado, especialmente por o mesmo trazer revelações sobre os bastidores do governo. Como todas as capas da revista, o contexto em que elas foram lançadas se relacionam com o contexto do momento e há por parte da imprensa uma relação conflituosa com o presidente que constantemente tem atacado toda a atividade jornalística e veículos de imprensa como a Globo, a Folha de S. Paulo e a própria Veja.