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A ARQUITETURA DA LINGUAGEM (MODELO DE GRAMÁTICA)

No documento – PósGraduação em Letras Neolatinas (páginas 40-46)

A ARQUITETURA DA LINGUAGEM NA PERSPECTIVA GERATIVISTA

1.2 A ARQUITETURA DA LINGUAGEM (MODELO DE GRAMÁTICA)

O estudo da sintaxe das línguas é um dos focos da Teoria Gerativa, pois dessa maneira se pode estabelecer como as sintaxes das línguas refletem os aspectos linguísticos presentes na GU, ou seja, como estaria desenhado o dispositivo de aquisição da linguagem (DAL). Sabemos que o PB e o espanhol 6apresentam uma configuração diferente, no que diz respeito à sintaxe pronominal. E essa diferença se mantém tanto no preenchimento do argumento externo quanto na realização do argumento interno.

Em relação ao argumento interno, enquanto o PB tem uma preferência pelo apagamento do elemento que ocupa a posição de objeto. No espanhol, de uma maneira geral, se mantém um pronome específico para ocupar e marcar as distintas posições. Essas distinções levam em consideração a função sintática que esse elemento exerça, ou seja, se se trata de um objeto direto ou de um objeto indireto. E é nessa direção que os estudos feitos por alguns autores (Galves, 2001; González, 1994) sobre o português do Brasil e sobre falantes de PB aprendendo espanhol têm caminhado.

Essas diferenças entre línguas são significativas e de certo modo fornecem pistas de como a sintaxe dessas línguas pode estar configurada. Diferença esta encontrada mesmo entre línguas consideradas tão próximas como é o caso do PB e do espanhol, (González, 1994). A diferença entre o sistema pronominal do PB e do espanhol tem chamado a atenção nos estudos dedicados à aquisição (González, 1994; Sebold, 2005; Yokota, 2007, entre outros autores), principalmente no que diz respeito à aquisição de língua estrangeira, visto que a posição de argumento interno nessas línguas vai ser ocupada ou não por itens potencialmente diferentes. Enquanto no PB há uma preferência pela não realização fonética do argumento interno, no espanhol há

6 Embora não façamos referência a uma variedade específica do espanhol, reconhecemos que mesmo no que diz respeito ao fenômeno de cliticização há padrões específicos de algumas variedades. Para este tema, conferir Palacios (2008). 

uma tendência à realização deste argumento. E no que diz respeito ao objeto direto anafórico, essas tendências se mantêm nas duas línguas.

Na visão gerativista, a linguagem é um componente biológico, por assim dizer, um objeto natural que estaria representado fisicamente no cérebro. A Faculdade da Linguagem é um sistema autônomo, mas que assume com os outros sistemas uma interação complexa em pontos específicos. Neste sentido, observar como se organizam os constituintes entre línguas tão próximas como é o caso do PB e do espanhol pode fornecer evidências de como o desenho da Faculdade da Linguagem interfere ou não no que diz respeito à diferença do comportamento sintático entre línguas.

O primeiro pressuposto é o de que há uma faculdade de linguagem, ou seja, há uma parte da mente/cérebro que é dedicada ao conhecimento e ao uso da linguagem. Trata-se de uma função particular no corpo; é algo como um órgão da linguagem, proximamente análogo ao sistema visual, que também é dedicado a uma tarefa particular. (CHOMSKY, 2008, p. 18)

No Programa Minimalista (modelo mais atual da linguística gerativa que está dentro da teoria de princípios e parâmetros), a língua 7passa a ser concebida como um conjunto de especificações da Gramática Universal. A Teoria Gerativa, assim, exibe pressupostos inatistas e dá conta da competência linguística que um falante de uma língua natural tenha. É, precisamente, esta mudança na concepção de língua que motiva questões sobre o conteúdo da GU, perguntas sobre o que faz parte do conjunto de dados próprios da GU têm sido muito frequentes. O questionamento sobre o conteúdo da GU trouxe um novo fôlego para os estudos de aquisição de língua estrangeira, pois ao questionarmos o conteúdo da GU, também questionamos até que ponto o conteúdo da GU atua ou em que momento o conteúdo presente na GU se esgotaria.

A Faculdade da Linguagem se ajustou ao modelo mais econômico proposto por Chomsky (1995) e que colabora, ainda mais, para afirmar a proposta de caráter inatista dos gerativistas. No Programa Minimalista (doravante PM), há uma arquitetura mais enxuta e restrita para a Faculdade da Linguagem, os princípios estabelecidos são mais gerais e os parâmetros são definidos a partir do conteúdo presente no léxico. No bojo das novidades trazidas pelo PM, está uma arquitetura da linguagem que reflete a

atualização do modelo de gramática, que gera apenas o que for conceptualmente motivado. Isto não quer dizer que certos tipos de análises linguísticas (sentenças) sejam excluídas do leque de opções. Isto sugere, apenas, que não foram motivadas e, por isso, não foram executadas pelo sistema computacional.

O objetivo do Programa Minimalista é reduzir ao máximo as unidades, níveis, operações e princípios e representar um modelo de Faculdade da Linguagem mais elegante que responda às condições de bom desenho da linguagem8, (Chomsky, 1998; 2008). No PM, os níveis de representação devem ser conceptualmente motivados em relação às interfaces9 do sistema computacional com os outros módulos cognitivos. Nessa mesma direção, os princípios linguísticos obedecem à lei de economia e às condições de legibilidade, o que de certa forma legitima que apenas sentenças que obedeçam às condições de boa formação sejam geradas e realizadas. Neste momento da teoria, os níveis de representação são especificados e limitados pela GU, a saber: Forma Fonológica (FF) e Forma Lógica (FL). Tais níveis de representação são interfaces do sistema computacional que relacionam o módulo da linguagem com os outros módulos cognitivos.

A Faculdade de Linguagem tem de interagir com esses sistemas, de outro modo não tem nenhuma utilidade. Assim, podemos perguntar: ela é bem projetada para a interação com esses sistemas? Então você tem um conjunto diferente de condições. E de fato a única condição que surge nitidamente é que, visto que a linguagem é essencialmente um sistema de informação, as informações que ela armazena devem estar acessíveis a esses sistemas, essa é a única condição. (Chomsky, 2006: 133) A informação de um determinado item é interpretada pela faculdade da linguagem gerando, assim, uma representação na Forma Fonológica e na Forma Lógica. As sentenças são geradas por procedimentos autônomos interligados à mente do falante, sobre a qual não exercemos nenhum comando consciente. Entender como poderiam se dar tais procedimentos e desenhar os prováveis caminhos que um item precisa percorrer para que a sentença convirja com sucesso, isto é, seja gerada e produzida pelo sistema computacional pode oferecer novos caminhos nas pesquisas sobre aquisição de linguagem. E por sua vez, este entendimento poderá oferecer pistas

8 A arquitetura da linguagem deve dar conta das estrutura para gerar uma língua natural, sem que haja nenhum esforço consciente por parte do falante. “O órgão da linguagem se insere num sistema da mente que tem uma certa arquitetura, e mantém relações de interface com esse sistema”, Chomsky (2008; p.p. 35 -36).

9 Termo derivado do inglês interface que na informática faz referência aos canais e circuitos associados

para analisar de modo mais concreto o funcionamento do processo de aquisição, seja de língua materna seja de língua estrangeira.

Há diferenças importantes em relação à composição do sistema pronominal do PB e do espanhol, principalmente, no que diz respeito ao sistema pronominal de 3a pessoa. Sendo assim, a sintaxe do aprendiz de espanhol falante de PB resultaria da interpretação de dois sistemas pronominais que tem caminhado de formas diferentes, ou seja, o aprendiz viria com sistema pronominal do PB que apresenta uma preferência pelo apagamento do objeto direto de 3a pessoa (GALVES, 2001; CYRINO,1995) em direção ao sistema pronominal do espanhol no qual há uma preferência pela realização do objeto direto de 3a pessoa (Fanjul, 1999).

A aquisição do sistema pronominal do espanhol, em relação ao sistema pronominal do PB, pelo sistema computacional poderia ser conflituosa, já que o sistema do espanhol apresenta uma tendência à realização do objeto enquanto o PB, ao contrário, apresenta uma preferência pelo apagamento desse objeto. Em relação ao objeto direto no PB, Galves (2001) afirma que os clíticos, responsáveis pela realização do objeto de 3a pessoa, não estariam mais presentes na gramática nuclear do PB (ou seja, a língua materna deste aprendiz). A ausência do clítico como item poderia gerar um conflito no sistema do aprendiz já que ele deveria recorrer a outros recursos para gerar sentenças que convirjam com as propriedades recursivas do espanhol.

Sabemos que os estudos sobre a aquisição do espanhol por aprendizes apresentam algumas lacunas, mas sabemos, também que os estudos têm avançado consideravelmente. Percebemos também, não só por meio deste estudo mas por estudos anteriores como os de González (1994) e de Sebold (2005), que o sistema pronominal deste aprendiz vai se ampliando e por vezes se aproximando da língua estrangeira e se afastando da língua materna, no que diz respeito às interferências.10

Assim sendo, entender o sistema computacional nos fonecerá evidências mais concretas no que diz respeito à computação do sistema pronominal da língua estrangeira de aprendizes de espanhol falantes de PB, o que de acordo com Chomsky (2006) é entender que certos aspectos da mente/cérebro podem ser proveitosos quando estudados tendo em vista o modelo de regra dos sistemas computacionais que além de formar, também modificam as representações pelas quais são interpretadas no sistema

computacional.

O léxico foi definido e redefinido muitas vezes com o progresso da Teoria Gerativa. Uma definição bem comum entre os autores é a que apresenta o léxico como um conjunto de entradas, como um dicionário mental, ou até mesmo como inventário linguístico que se ampliaria indefinidamente, segundo Corrêa (2006).

Na versão Minimalista, o léxico comporta toda a informação de uma dada língua e o sistema computacional é sensível ao conteúdo do léxico, isto é, o léxico possui todo o conteúdo para “alimentar” o sistema computacional. Os itens contidos no léxico constituem conjuntos de traços que manifestam as propriedades fonéticas, semânticas e sintáticas. Os traços formais representam características do tipo: gênero, número, pessoa, caso e etc.

A mudança mais aparente entre os modelos de representação da gramática do P&P e PM foi a forma operacional das derivações. Em relação ao modelo de P&P, houve um abandono dos níveis de representações estruturais D (estrutura profunda) e S (estrutura de superfície)11. No Programa Minimalista, os princípios obedecem à lei de economia e das condições de legibilidade, os parâmetros abrigam os traços que desenham o comportamento de uma língua particular. Neste momento da teoria, os níveis de representação são especificados pela GU, a saber: Forma Fonética (FF) e Forma Lógica (FL). Tais níveis de representação são interfaces do sistema computacional que relacionam o módulo da linguagem com os outros módulos cognitivos.

No PM, há uma arquitetura mais enxuta e restrita para a Faculdade da Linguagem, os princípios estabelecidos são mais gerais e os parâmetros são definidos a partir do conteúdo presente no léxico. A partir desse modelo mais econômico do PM, no qual tudo o que for gerado precisa, necessariamente, estar dentro do escopo conceptual de motivação, são excluídas as redundâncias e se otimiza a Faculdade da Linguagem, ou seja, a linguagem é entendida por meio de operações que tornam o sistema computacional linguístico mais “leve”.

11 Das iniciais em inglês Deep e Surface. 

Adaptados de Eguren & Soriano (2004)

Visualizamos que a mudança no design da Faculdade da Linguagem do modelo de gramática, presente no P&P para o PM, colaborou para uma Teoria de Linguagem mais eficaz baseada em um programa enxuto pautado na economia das operações linguísticas. As descrições estruturais produzidas pela língua-I dão origem a um complexo conjunto de propriedades linguísticas que são pontecializadas nas operações executadas pelo sistema computacional. Nesse complexo, incluímos as propriedades semânticas, sintáticas e fonéticas.

O léxico se torna protagonista no novo desenho da Faculdade da Linguagem, já que é nele que está alojada toda a informação paramétrica peculiar de uma dada língua e o sistema computacional é sensível a essa informação. Nessa nova fase da Teoria, a partir das propriedades idiossincráticas, há também um enriquecimento do léxico que recebe o papel de especificar e selecionar os itens devem entrar no sistema computacional. Atualmente se entende que a derivação de uma expressão linguística vai compreender a escolha de itens do léxico e a "computação" 12deste, que constrói um par para a representação nas interfaces FF e FL, ou seja, todo o conteúdo enviado para a FF deverá ser enviado para a FL, de modo que esse conteúdo seja legível, isto é, interpretável pelos dois sistemas simultaneamente.

12 Termo utilizado pela matemática e pala ciência da computação. Na Teoria Gerativa, computação é uma operação realizada através de regras práticas preestabelecidas.

Figura 2  Figura 3 

Sobre o envio e leitura de conteúdo, estamos tratando, aqui, da leitura e interpretação deste conteúdo e não somente da produção linguística que pode ser verificada através da realização fonológica. O modelo da gramática, de língua e o próprio desenho da Faculdade da Linguagem se configuram, então, como um modelo mais econômico, eficaz e dinâmico de computação linguística (Chomsky, 1995, entre outros).

No documento – PósGraduação em Letras Neolatinas (páginas 40-46)