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SOBRE O PAPEL DO INPUT NA AQUISIÇÃO

No documento – PósGraduação em Letras Neolatinas (páginas 82-89)

Input > GU > Língua estrangeira

2.4 SOBRE O PAPEL DO INPUT NA AQUISIÇÃO

Input é um termo em inglês que dentro da linguística gerativa ganhou grande importância. Esse termo significaria em português (tradução livre) dados de entrada que por sua vez é considerado antônimo de output (tradução livre) que significa dados de saída. Na linguística, o input pode ser considerado aquilo que o indivíduo recebe do meio linguístico a que este foi exposto. O output, por outro lado, estaria ralacionado à produção do falante no meio ao qual este pertença. Se pensarmos nas quatro habilidades que praticamos numa língua (ler, escrever, falar e ouvir) veremos que ler e ouvir podem ser atividades relacionadas ao input, ao passo que falar e escrever poderiam estar relacionadas ao output. Cabe ainda ressaltar que, dentro do conjunto dados recebidos pelo falante, há nesse conjunto de dados uma porção de dados que o falante realmente leva em consideração. A porção de dados que o falante, no nosso caso aprendiz, trata com relevância é chamado de intake, segundo define Schmidt (1990, p. 4) intake é “a porção do input que o aprendiz nota”.

Nesse sentido, a aquisição de língua estrangeira pode ser considerada guiada pelos dados que o aprendiz percebe no input da LE (a língua-alvo a ser adquirida) e pela importância dada pelo aprendiz a esse input. Grande parte desses estudos reconhece que os aprendizes percebem mais acuradamente palavras de alta frequência do que palavras menos frequentes na língua (Zimmer, 2004). Isto pode indicar que a produtividade do dado à ser fixado também será um fator levado em conta no momento da aquisição da LE.

O input é a maneira pela qual o aprendiz acessa a língua estrangeira seja através do material escrito seja através de material oral, dentre outras, segundo Vanpatten (2004). Portanto, o input desempenha papel importante no processo de aquisição, o que nos faz refletir sobre o cuidado especial que este deve receber, pois o desenho que a aquisição de língua estrangeira tomará, dependerá também deste input.

A tese inatista foi construída a partir do contra-argumento à proposta behaviorista, tendo em vista que a criança é exposta aos dados do meio linguístico que, por vezes, podem ser degenerados, marcados por interrupções, etc, como vimos quando falamos da pobreza de estímulo ou problema de Platão. O input na aquisição de linguagem de viés genativista é além do que consideramos dado de entrada é o “gatilho” para que a aquisição ocorra guiada pela GU. É no input que estão dispostas as informações necessárias para que a gramática universal (GU) seja particularizada e se transforme em uma gramática particular.

O sucesso na aquisição de uma língua, seja materna seja estrangeira não depende somente do acesso à GU. O papel da gramática universal é de disponibilizar várias possibilidades para fixação de um parâmetro, que o falante (no nosso caso, aprendiz de língua estrangeira) precisa considerar, antes de se decidir por uma delas, como afirma Ionin (2003). De acordo com White (2004), os parâmetros fornecem pistas aos falantes sobre quais serão as possibilidades disponíveis à seleção, ou seja, os parâmetros restringem drasticamente o leque de opções disponíveis a ser considerado para a fixação deste. A fixação de um parâmetro qualquer está condicionada à produtividade de itens referente ao parâmetro no input. A fixação do parâmetro se daria, portanto, por meio da regularidade do item a ser fixado como afirmou Zimmer em 2004.

Consideraremos, agora, a influência do input na aquisição de língua estrangeira. O input desempenha o papel determinante na escolha entre os possíveis valores propostos pela GU. O input recebido pode determinar que o valor do parâmetro fixado o que de certa maneira pode sere relevante na aquisição de língua estrangeira, ou seja, o input fornece pistas necessárias que guiam o falante a escolher entre vários valores possíveis o valor a ser fixado naquela língua que pode ser a sua língua materna ou a sua língua estrangeira.

Levando em consideração o que foi descrito em White (2004) sobre a aquisição, existe um conjunto de propriedades sintáticas, morfológicas, semânticas e pragmáticas que o falante precisa descobrir através da exposição à língua. Os dados vão fornecer evidências suficientes para que o falante construa a gramática mesmo no caso da língua estrangeira.

Ao fixar um determinado valor paramétrico, o indivíduo necessita formular uma generalização baseada em várias pistas fornecidas pelo input, de acordo com Ionin (2003). Contudo, levando em consideração que algumas pistas têm interpretação ambígua, os falantes de língua estrangeira terão dificuldade em construir uma generalização no que diz respeito às construções ambíguas. Isto pode sugerir que algumas pistas do input são mais fáceis de avaliar do que outras. Ionin (2003) sugere que apesar de aprendizes de língua estrangeira terem acesso direto a todos os princípios e parâmetros da GU, a capacidade de avaliação, generalização e processamento do input diminui em comparação com os falantes de língua materna.

Sobre os problemas na interpretação do input, White (1989, p. 6) traz exemplos do inglês no que diz respeito à contração da forma want to em wanna. O conhecimento linguístico do falante de inglês deve prever a análise de que há a possibilidade de contração e quando a contração não é possível da forma want to em wanna sem nenhum esforço.

I. a. I want to go45 b. I wanna go

II a. Who do you want to feed the dog? b. *Who do you wanna feed the dog?

Falantes de inglês têm incluído em seu conhecimento que contrações como em b não são possíveis e levam à agramaticalidade da sentença. A possibilidade da contração do want to em wanna é explicada através do movimento de traços como “wh”. Resumidamente, nos casos em que a contração é possível não há vestígio entre o what e o to, ao passo que, a impossibilidade da contração é o resultado de intervenção de um traço entre what e to. Obviamente nenhuma dessas informações é fornecida pelo input, a informação que o movimento do traço de “wh” deixa um vestígio que bloqueia a operação de contração, isto parece se tratar do conhecimento tácito fornecido pela GU. E para o aprendiz, fórmulas como as de contração parecem ser mais difíceis de

45 Tradução:

I. a. Eu quero ir b. Eu quero ir

II. a. Quem de vocês quer alimentar o cachorro? b. * Quem você quer alimentar o cachorro? 

deduzir apenas da informação extraída do input. Isso pode indicar que ao realizar esses tipos de operações o aprendiz precise acessar os recursos da GU, se estamos falando de uma aprendiz de inglês falante de PB, já que está informação de contração verbal não faz parte da gramática nuclear do PB.

E ainda sobre o input, a aquisição de linguagem se daria gradualmente, segundo Krashen (1987), isto supõe que o falante extraia do input as informações de modo progressivo que condiziria com o estado da sua língua em um dado momento. Nesse processo, a aquisição de algumas formas (entonação, plural etc.) seria mais rápida, e outras (flexões verbais, concordância, etc.) demorariam mais. Para que a fixação do dado presente no input ocorra, o input precisa apresentar informações além do estágio atual no qual se encontra o aprendiz. Se um aprendiz está no estágio inicial, ele precisa ser exposto a um input que pertença a um nível inicial+1. Esse input levaria a uma aquisição da língua estrangeira (LE), que seria acessado pela GU para dar seguimento à aquisição da língua estrangeira conforme a hipótese 3 desenvolvida nos estudos de White (2004).

A fixação dos dados presentes no input da LE pode ser responsável pela realização de tal dado na produção do aprendiz, mas o processamento da língua estrangeira não ocorre de forma isolada, se desenvolve em conjunto com fatores de ordem social, cultural e emocional, que podem inibir ou facilitar a aquisição, segundo Vanpatten (2004). E ainda de acordo com esse mesmo autor, a hipótese do input defende que o foco deve estar na mensagem e na comunicação. O falante que está adquirindo uma nova língua não se preocupa com a estrutura ou a forma da nova língua, mas sim com o uso que se faz desta. Por essa razão, o input deve ser compreensível e deve ser oferecido em quantidade suficiente, em um ambiente favorável à aquisição. A hipótese do input, no processo de aquisição, explicaria como o aprendiz adquire uma língua estrangeira. Desse modo, podemos entender que a partir da exposição aos insumos de língua o aprendiz construirá a sua gramática particular.

O input disponível para um aprendiz parece ser insuficiente para que a partir dele se construa a totalidade do sistema da língua, pois o input a que o aprendiz – de língua materna ou língua estrangeira – é exposto está marcado por interrupções, hesitações, ausência de explicitação da instrução, incluindo frases agramaticais e formas parciais.

No caso da nossa dissertação, na qual investigamos o sistema pronominal anafórico do aprendiz de espanhol falante de PB, em relação ao preenchimento ou não da posição do objeto direto anafórico, ou seja, a posição do objeto direto retomado ou não, como veremos mais adiante, de acordo com Galves (2001), Duarte (1989, 1995), Cyrino (1995) e Kato (2000) entre outros autores, a seleção deste elemento pode estar relacionada à animacidade do antecdente. E ainda segundo esses autores o falante de PB não teria como elemento produtivo em sua fala oral o pronome átono (clítico) de terceira pessoa, ou seja, a gramática nuclear do PB não geraria mas está informação na aquisição de língua materna.

Desse modo, o aprendiz de espanhol falante de PB não estaria mais sensibilizado a retomar o objeto direto por pronomes clíticos. A gramática nuclear estaria tensionada por mudanças no sistema pronominal de terceira pessoa, principalmente em relação à opção pela realização por clíticos. O sistema do português, atualmente, estaria selecionando a realização por sintagma nominal ou o apagamento na posição correspondente ao objeto direto. Por outro lado, o sistema do espanhol possibilitaria o preenchimento do objeto direto pelos pronomes clíticos, embora como será mostrado a frente, algumas gramáticas do espanhol estariam alargando algumas funções e a seleção de clíticos para retomar a terceira pessoa estaria condicionada em algumas gramáticas, como a do espanhol do Paraguai e de Quito.

Nesta dissertação, assumimos que no processo de aquisição de língua estrangeira o aprendiz acessaria os traços disponíveis em sua língua materna, porém o sistema de clíticos – que é o escopo desta pesquisa, já não estaria disponível, o que impediria o acesso a este traço através da língua materna do aprendiz. Isso evidenciaria uma aquisição dos traços da língua estrangeira a partir da GU, segundo White (1989). O aprendiz acessaria um dispositivo mais primário, que abarcaria os princípios universais de todas as línguas naturais. Contudo, esse aprendiz deve receber o input necessário para que haja a ativação de tal traço.

Ainda no que diz respeito a esta dissertação, aprendizes de espanhol falantes de PB podem realizar o clítico na posição de argumento interno quando este traço for motivado, ou seja, quando este traço estiver no input. A produtividade deste item no input ativaria a seleção do clítico como estratégia de realização para os aprendizes. Levando em consideração o que foi proposto por Sigurðsson, é significativo que aprendizes produzam clíticos em língua estrangeira, isto pode indicar que eles já

começaram a reorganizar os traços referentes à cliticização, acessando os traços disponíveis na GU. Para que a seleção do traço de clítico ocorra, o traço precisaria estar evidente no input que o aprendiz recebe, entretanto não será possível em nossa análise mensurar a relevância do input por meio dos nossos testes, o que distanciaría- nos do escopo desta dissertação.

Com relação às questões referentes à restrição da GU no processo de aquisição de língua estrangeira, nos preocupamos, nesta pesquisa, mais especificamente, com os tipos de realização de objeto direto de 3a pessoa, que está presente tanto em língua materna quanto em língua estrangeira. Para a diferenciação dos elementos que ocupam a posição de argumento interno com a função de objeto direto, recorremos a proposta de Chomsky (1996) sobre os diferentes itens referenciais que fazem parte do escopo de uma língua natural. É necessário fazer tal diferenciação uma vez que os elementos que ocupam a posição de objeto direto na realização são de naturezas diferentes. Esses itens são categorizados a partir do modo como se estabelecem na referência. São estes os nomes, as anáforas, os pronomes e as expressões referenciais. Sabemos que há diferentes itens que assumem a função de objeto direto tanto no PB quanto no espanhol. São estes clíticos, pronomes átonos, pronomes lexicais e o apagamento, que quando assumem a função de objeto podem ocupar ou não a posição de argumento interno, podendo ser interpretado de maneiras diferentes pelo sistema computacional.

É significativo que na produção de aprendizes de espanhol falantes de PB apareçam outras estratégias além daquelas que são as mais produtivas em sua língua materna46. Isto nos faz pensar sobre a questão que envolve a possibilidade de acesso às restrições contidas na GU. Sendo assim, a GU também seria a responsável por gerenciar a aquisição de língua estrangeira, ou seja, os dados referentes à língua estrangeira estariam restringidos pelos princípios presentes na GU. E por esta razão, seria possível realizar as estratégias de realização da língua estrangeira, além das estratégias de realização referentes à língua materna. Dados como os de C “la niña compró un libro para regalarlo a su hermana” podem apontar para a existência de outros recursos que se somariam aos recursos da língua materna na gramática da língua estrangeira, isto é, o recurso linguístico da realização de objeto direto pelo clítico. Isto

46 Para maiores informações, conferir os resultados e a discussão da pesquisa de Sebold em sua tese de doutorado que foi defendida em 2005.

significa que o aprendiz realiza um item linguístico na posição em que, preferencialmente, ele apagaria em língua materna. O preenchimento pelo clítico na posição de objeto direto se estenderia da produção escrita, na qual se espera que haja algumas ocorrências, até a produção oral na qual se espera uma menor produtividade dos clíticos.

dois pontos fundamentais nos quais o nosso trabalho está centrado. O primeiro é no pressuposto de que os falantes de uma língua estrangeira podem ter acesso aos dados da GU para dar conta do que a gramática da língua materna não prevê. Partimos das ocorrências de realização por clítico nas produções de falantes de PB aprendizes de espanhol. E para entender a possiblidade de realização do clítico na posição de objeto direto anafórico nos apoiamos nos estudos de White (2004). Levando em consideração isso, no âmbito do presente estudo, assumiremos a posição de acesso a todos os princípios da GU.

Outro ponto a ser considerado nesta dissertação é que existam dados que demonstram a possibilidade de transferência de valores paramétricos de alguns domínios da língua materna – é o caso das estratégias de realização de objeto direto que têm a elipse do item pronominal, assim como a capacidade de reorganização de valores – é o caso da seleção dos clíticos pelos falantes de PB aprendizes de espanhol. No caso de aprendizes de espanhol falantes de PB, estes teriam disponíveis tanto as estratégias produtivas na sua língua materna quanto as estratégias disponíveis na língua estrangeira por meio do input e da possibilidade de acesso aos dados da GU.

CAPÍTULO 3

O SISTEMA PRONOMINAL DE TERCEIRA PESSOA DO

No documento – PósGraduação em Letras Neolatinas (páginas 82-89)