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A camada limítrofe planetária

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Capítulo 2 Recursos hídricos em regiões semiáridas

3.2 A camada limítrofe planetária

3.3.1 Em termos de flutuações turbulentas 3.3.2 Em termos de variáveis médias 3.4 Evaporação via balanço de energia 3.5 Evaporação via modelos combinados 3.6 Tanques de evaporação

3.7 Considerações finais Referências bibliográficas

Aureo S. de Oliveira1, Francisco A. de C. Pereira1,

Greice X. S. Oliveira1 & Valéria P. Borges2

1 Universidade Federal do Recôncavo da Bahia

2 Universidade Federal de Campina Grande

Capítulo 3

Recursos hídricos em regiões semiáridas: Estudos e aplicações ISBN 978-85-64265-03-5

2012

4 6 Aureo S. de Oliveira et al.

Evaporação da água de reservatórios:

Medição e estimativa por métodos

micrometeorológicos

3.1 INTRODUÇÃO

O estudo da evaporação da água diretamente de reservatórios (açudes, barragens, lagos e tanques de armazenamento) é de especial importância em regiões áridas e semiáridas, entre elas o Nordeste Brasileiro, onde altas taxas evaporativas contrastam com crescentes demandas de água para abastecimento doméstico, industrial, produção vegetal e animal, entre outros fins.

A taxa de evaporação (quantidade de água evaporada por unidade de área e de tempo) é uma estimativa necessária quando se trata de regular a oferta de água, face as diferentes demandas. O conhecimento da evaporação é variável relevante, por exemplo, em estudos de planejamento da irrigação, manejo de reservatórios, hidrologia urbana e modelagem da disponibilidade de água superficial e subterrânea (Jensen, 2010). Em reservatórios de água em que se tenha controle fácil das vazões de entrada e saída bem como da lâmina d’água precipitada, o conhecimento da evaporação permite estimar com precisão as perdas por percolação profunda no fundo do reservatório (Tanny et al., 2008). Outro aspecto que torna relevante a avaliação da evaporação é o fato de que no contexto do ciclo hidrológico, ao entrar na fase de evaporação a água se torna indisponível e não pode mais ser recuperada (Brutsaert, 1982). As consequências para o planejamento e manejo dos recursos hídricos, são evidentes.

Quantificar a água evaporada de reservatórios não é uma tarefa fácil. O uso de tanques de evaporação foi no passado, e ainda é, uma das principais ferramentas para esse fim. Em muitos países, inclusive nos Estados Unidos, o tanque Classe A ainda é parte integrante da rotina de órgãos oficiais de controle e regulação da oferta de água (Jensen, 2010). No entanto, devido às suas desvantagens os tanques evaporimétricos vêem dando lugar a métodos mais sofisticados e de custo relativamente baixo, graças aos modernos sistemas eletrônicos de coleta e armazenamento de dados.

Brutsaert (2010) classificou os métodos de estudo da evaporação da água em dois grupos principais: (a) nos métodos de transferência de massa ou aerodinâmicos, que consistem primariamente na descrição dos mecanismos de transporte de vapor

4 7 Evaporação da água de reservatórios: Medição e estimativa por métodos micrometeorológicos d’água (vpd) no ar próximo à superfície e (b) nos métodos energéticos, que focalizam nos aspectos de suprimento de energia do fenômeno da evaporação. Outro grupo (c) consiste dos métodos de balanço de massa, fundamentado no princípio de conservação da matéria.

Brutsaert (2010) sugere que se dê preferência aos métodos do grupo (a), visto que descrevem, de forma mais direta, os mecanismos de transporte de vpd. Os métodos dos grupos (b) e (c) são técnicas de obtenção indireta da evaporação da água. Lembra o autor, no entanto, que a distinção entre métodos dos grupos (a) e (b) não é absoluta já que, na prática, não há como separar o transporte de massa do de energia sendo comum, portanto, estudos combinarem técnicas dos dois métodos, a exemplo de Allen & Tasumi (2005). Os métodos do grupo (c) apesar de conceitualmente serem os mais interessantes são, na prática, de difícil aplicação e os sujeitos a erros mais expressivos no fechamento do balanço, devido às dificuldades inerentes à estimativa e/ou medição independente de todos os componentes do ciclo hidrológico (Brutsaert, 2010).

A seleção da melhor técnica para uma situação em particular é, em grande parte, função da disponibilidade de dados, tipo ou tamanho da massa hídrica (espelho d’água e profundidade) e da precisão exigida na determinação da evaporação (Jensen, 2010). O objetivo do presente capítulo é rever alguns aspectos da teoria dos métodos meteorológicos (aerodinâmicos e energéticos) de medição e estimativa da evaporação da água a partir de superfícies livres, com destaque para alguns exemplos de aplicação.

3.2 A CAMADA LIMÍTROFE PLANETÁRIA

A evaporação da água de reservatórios e de outras superfícies ocorre numa região da atmosfera conhecida como camada limítrofe planetária (CLP). Na literatura de micrometeorologia e ciências atmosféricas são muitos os autores que descrevem as características da CLP em termos de estratificação e dinâmica, a exemplo de Stull (1988), Brutsaert (1982, 2010), Arya (2001), Wallace & Hobbs (2006) e Wyngaard (2010), só para citar alguns.

A CLP é a parte inferior da atmosfera na qual a natureza e as propriedades da superfície afetam diretamente a turbulência do ar (Brutsaert, 1982). Ela se forma em resposta às interações entre a atmosfera e a superfície subjacente (terra ou água) durante períodos de tempo de algumas horas a aproximadamente um dia (Arya, 2001). Em escalas maiores de tempo essas interações podem ir além do limite superior da CLP e alcançar toda a profundidade da troposfera.

A espessura da CLP sobre os continentes varia consideravelmente de dezenas de metros a vários quilômetros, e depende, sobremaneira, das taxas de aquecimento diurno e resfriamento noturno da superfície. Segundo Arya (2001), a espessura da CLP no verão e sobre superfície de solo seco pode variar de menos de 100 m na parte da manhã a vários quilômetros no final da tarde. Por outro lado, sobre extensas superfícies hídricas (lagos, mares e oceanos), as oscilações diurnas da CLP são menos pronunciadas, haja vista que a água sofre menor variação de temperatura

4 8 Aureo S. de Oliveira et al. devido à maior capacidade calórica. Em sua concepção mais simples pode-se, portanto, imaginar a CLP com uma camada de influência que se expande e se contrai num ritmo padronizado em resposta ao ciclo diário do Sol (Oke, 1995).

Os autores são unânimes em reconhecer essa relação de causa e efeito entre a dinâmica vertical da CLP e o ciclo de aquecimento e resfriamento da superfície planetária. Em termos de estratificação, porém, há discordância apenas nos detalhes e os autores dividem a CLP em três camadas principais. A partir da superfície tem-se a subcamada interfacial ou camada de rugosidade (roughness layer); em seguida uma região interna ou camada superficial (surface layer) e no limite superior, a região externa (outer layer).

Segundo Brutsaert (2010), assume-se que acima da CLP domina a atmosfera livre onde o vento é mais influenciado pelos gradientes horizontais de pressão e movimento de rotação da Terra e menos pelos efeitos da fricção com a superfície planetária. Zonas de transição e eventuais superposições entre as camadas podem ocorrer, pois em se tratando de dinâmica de fluidos não se deve esperar mudanças abruptas nem limites rígidos. Por apresentar maior riqueza de detalhes, a Figura 3.1 adaptada de Brutsaert (2010), ilustra a estratificação da CLP para os propósitos deste capítulo.

Na região externa da CLP o movimento do ar é quase que independente da natureza da superfície e mais influenciado pelas correntes de ar da atmosfera superior (Brutsaert, 1982). Nela não somente os efeitos de gradientes de pressão sobre o deslocamento

Figura 3.1 Subcamadas da camada limítrofe planetária Adaptado de Brutsaert, 2010

4 9 Evaporação da água de reservatórios: Medição e estimativa por métodos micrometeorológicos do ar são relevantes como também a força de Coriolis, devido à rotação da Terra. Esses efeitos são menos pronunciados sob condições de atmosfera instável caracterizada por turbulência convectiva termal. Neste caso específico a região externa é denominada camada de mistura ou camada de convecção (mixed or convection

layer) (Garratt, 1992; Brutsaert, 1982).

Diferente do que ocorre na camada externa, na região interna ou camada atmosférica superficial (CAS) o movimento do ar é fortemente influenciado pelas características da superfície. Brutsaert (2010) sugere que a espessura da CAS é equivalente a 1/10 da CLP. Por outro lado, como se vê da Figura 3.1, a CAS não se estende até a superfície, ficando seu limite inferior definido por 30/u* no caso de superfície lisa e 3 a 5ho, no caso de superfície rugosa, sendo  a viscosidade do ar, ho a altura típica (média) dos elementos de rugosidade e u* a velocidade de fricção do vento.

Diferente de outros autores, Brutsaert (1982, 2010) reconhece o que denomina de subcamada dinâmica na porção inferior da CAS. Predomina nesta camada o regime turbulento e os perfis de velocidade média do vento e de outras propriedades do ar (temperatura, umidade específica, concentração de gases, etc.) são funções logarítmicas da altura.

Em contato direto com a superfície e seus elementos está a subcamada interfacial. Nesta subcamada o movimento do ar é altamente irregular (Oke, 1995) e definitivamente relacionado à natureza (tamanho, espaçamento, contorno, permeabilidade, arquitetura, etc.) dos elementos de rugosidade da superfície. Sobre superfícies “lisas” (neve, água líquida em ventos calmos, gelo plano, etc.) sua espessura é da ordem de 5/u* ou ho, no caso de superfícies rugosas (Brutsaert, 2010).

Oke (1995) ainda considera, no caso extremo (limite inferior da subcamada interfacial), a existência de uma subcamada laminar não turbulenta, de alguns milímetros, que adere a todas as superfícies e estabelece uma zona tampão entre a superfície e o ambiente de livre difusão mais acima. Nesta camada o transporte de massa e energia se dá por difusão e os coeficientes de difusividade molecular, não são negligíveis como no fluxo turbulento (Brutsaert, 1982), e, portanto, devem ser levados em conta na parametrização dos fluxos.

Uma característica dominante da CLP diz respeito à habilidade da turbulência em misturar e transportar massa, calor e momentum verticalmente (Arya, 2001), e uma das principais razões para o estudo da CLP é quantificar os fluxos associados e a variação de altura dos fluxos através da espessura total da camada limítrofe (Garratt, 1992).

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