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2) MÉTODO: trilhando os caminhos da pesquisa

2.5. A compreensão dos dados

Para a compreensão das narrativas me inspirei em alguns autores que seguem a abordagem fenomenológica de pesquisa, buscando com isso me aproximar da descrição do fenômeno da vivência de luto pela perda prematura da mãe, não me propondo a explicações ou interpretações. Gostaria de ressaltar a inspiração e não o seguimento estrito no que é proposto pelo método fenomenológico.

Forghieri (1993) explicita a importância de haver dois momentos em qualquer compreensão baseada no método fenomenológico, os quais são inter-relacionados e reversíveis, não havendo separação entre eles, mas sim predominância ora de um ora de outro. São eles:

1) Envolvimento existencial: em que o pesquisador coloca de lado os conhecimentos adquiridos sobre o assunto e se abre para uma vivência de modo espontâneo e experiencial; saindo de uma atitude intelectualizada, deixando fluir sua intuição, percepção e sentimentos. Estas atitudes levam a uma compreensão global, intuitiva, pré-reflexiva da vivência do entrevistado, apreendendo como este significa a situação vivida de acordo com seu próprio modo de existir.

2) Distanciamento reflexivo: após o envolvimento existencial e uma compreensão pré-reflexiva global, o pesquisador se distancia para refletir sobre esta compreensão, buscando captar e explicitar, descritivamente, o sentido ou significado daquela vivência.

Segundo Amatuzzi (1996) existem diferentes propostas metodológicas nesta abordagem, porém aponta que dentre as diversas maneiras de tratar os dados pode-se discernir uma estrutura geral:

2) Encontro dos elementos experienciais (ou unidades temáticas emergentes): estes são elementos de significado vivido que, quando articulados, expressam o significado global da vivência;

3) Síntese ou articulação final: neste momento rediz-se o fenômeno da forma como ele se mostra.

Martins e Bicudo (1994) apresentam cinco momentos importantes dentro de um processo de análise:

1) O sentido do todo: uma leitura empática, em que o pesquisador procura se aproximar do lugar do sujeito e tenta viver a experiência dele ‘como se’ fosse ele, de forma a não ser um mero espectador, mas alguém que procura chegar aos significados atribuídos vivencialmente pelo participante;

2) Discriminação das unidades de significado: uma volta ao início da leitura, que pode ocorrer tantas vezes quanto forem necessárias, colocando em evidência as diferentes unidades de significados, dentro de uma perspectiva psicológica;

3) Transformação das expressões cotidianas do sujeito em linguagem

psicológica: neste momento os achados já não são expressos na linguagem do sujeito,

mas na do pesquisador, revelando sua reflexão psicológica do que está sendo expresso; 4) Síntese das unidades de significado: transformar as unidades de significado em uma proposição consistente referente à experiência do sujeito;

5) Descrição da estrutura do fenômeno: comparar as sínteses individuais de cada participante buscando identificar o que há de comum entre elas e o que há de particular, com o intuito de obter os elementos essenciais que se apresentam como significativos da vivência de todos.

Assim, baseada nos autores acima, estruturei a compreensão dos dados deste estudo da seguinte maneira:

1) Inicialmente escutei a gravação e li várias vezes a narrativa de cada participante, procurando me envolver e entrar na sua vivência, dela me sentir próxima, ao mesmo tempo em que me esforçava para pôr ao lado meus conhecimentos, pré- conceitos e pré-análises, para chegar a uma compreensão empática, intuitiva e global de sua vivência relacionada à perda de sua mãe;

2) Em um segundo momento li lentamente e atentamente a narrativa, detendo- me em partes do relato que pudessem conter os elementos mais significativos apontados pelos participantes a partir da vivência de perda, então os assinalava e escrevia comentários ao lado. Para apreender estes elementos envolvi-me experiencialmente e distanciei-me reflexivamente, movimentos descritos por Forghieri (1993), quantas vezes percebi ser necessário na busca por alcançar este intento;

3) Em seguida, organizei e redigi os elementos significativos em categorias temáticas que foram surgindo e se estruturando a partir dos relatos dos participantes, não tendo sido estabelecidas a priori. E, seguindo estes temas, reescrevi trechos literais destacados da narrativa, apresentando logo em seguida enunciados do significado dos elementos encontrados nestes trechos, segundo minha compreensão. Este procedimento foi repetido em cada uma das entrevistas sob o título de Suas significações;

4) Comparei as análises compreensivas individuais, verificando atentamente se haviam elementos comuns e elementos especificamente particulares. Assim, estabeleci várias relações entre as vivências, compondo uma Síntese Geral;

6) Por fim, busquei estabelecer diálogos, apresentados na Discussão, envolvendo os dados dos colaboradores e o que foi produzido por outros pesquisadores e teóricos na literatura da área, com o intuito de aprofundar as reflexões.

Mesmo após este longo e trabalhoso processo de compreensão das ricas vivências relatadas neste estudo, tenho a sensação de que estas ainda teriam e têm muito

a dizer não fossem as minhas limitações e vivências anteriores. Esta proposição gera em mim uma ambigüidade de sentimentos; por um lado há uma sensação de incompletude, e mesmo de frustração, que me faz querer continuar, e continuar, e continuar ainda debruçada sobre os relatos; porém, por outro lado, sinto que cheguei a uma verdade possível para o meu olhar neste momento. Sobre isto Dartigues (2003) diz que “há tantas essências quantas significações cada espírito é capaz de produzir; isto é, tantos objetos cada percepção, cada memória, cada imaginação, cada pensamento podem se dar”.

Assim, quero abrir espaço para que o leitor olhe com outros olhos, a partir de diferentes perspectivas e ângulos, e possa enxergar as ainda inúmeras possibilidades de significações e relações que existem permeando estas profundas narrativas.