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A COMUNICAÇÃO INTERPESSOAL COM OS PACIENTES EM CUIDADOS

Diagrama 13- Comunicação como constituinte do ser humano

2.6 A COMUNICAÇÃO INTERPESSOAL COM OS PACIENTES EM CUIDADOS

A comunicação e o relacionamento interpessoal, o controle da dor e os sintomas, e o trabalho em equipe constituem a tríade-alicerce que sustenta os cuidados paliativos, destinados a melhorar a qualidade de vida dos pacientes fora de possibilidades terapêuticas de cura (ARAÚJO; SILVA, 2012). Esse discurso é reforçado no estudo de Wallen et al. (2012), os quais descrevem que a comunicação deve ser consistente a fim de individualizar o cuidado e a equipe interdisciplinar capaz de apoiar emocionalmente e de fazer-se presente, e auxiliar no manejo da dor e demais sintomas dos pacientes. Entretanto, Costa et al. (2013) relatam que os cuidados paliativos envolvem três categorias, o paciente, a família e a equipe, independentemente do nível de atenção à saúde.

Nos cuidados paliativos, a comunicação é um dos elementos fundamentais, pois proporciona uma assistência de qualidade para os pacientes e seus familiares, e uma interação com a própria equipe que presta atendimento (GUO; JACELON; MARQUARD, 2012; ANDRADE; COSTA; LOPES, 2013).

Os pacientes com doença grave geralmente compreendem o seu diagnóstico, mas não o prognóstico ou prováveis resultados do tratamento (GRAINGER et al., 2010; MOIR et al., 2015). Embora os médicos informem aos pacientes sobre os objetivos do tratamento, muitos deles concentram suas conversas em escolhas de procedimentos – como ressuscitação ou inserção de cateteres – e não sobre os objetivos, valores, desejos que constituem a base de um paciente devidamente informado (BERNACKI et al., 2015). Além disso, esquivam-se de falar sobre a expectativa de vida, a morte iminente, alternativas de tratamento, bem como o impacto da terapêutica sobre a sua qualidade de vida (GRAINGER et al., 2010; MOIR et al., 2015).

Vale ressaltar que não existem evidências de que a comunicação sobre questões de fim de vida aumentam a angústia e o sofrimento do paciente (BERNACKI et al., 2015). Em contrapartida, Wentlandt et al. (2012) relatam que não é conveniente a preparação de fim de vida para os pacientes que passam por períodos de exacerbação dos sintomas e deficiência funcional, em razão de eles requererem tempo e energia para a “viagem” em direção à morte.

Porém, para os membros da família, é importante o conhecimento de fim de vida de seu ente querido, a fim de antecipar processos burocráticos, como os de prática juridica e financeira.

Diante de uma doença fora de possibilidades terapêuticas de cura, é imprescindível assegurar ao paciente e a seu familiar a esperança. A cura muitas vezes não é possível, contudo, a equipe jamais deve desistir do paciente. Devem juntos trilhar um caminho para o alívio do sofrimento (KÜLBER- ROSS, 2008).

Muitos profissionais da área de Oncologia relatam dificuldades em discutir a transição do tratamento curativo do câncer para cuidados paliativos (MACK et al., 2012). Existem inúmeras barreiras para o encaminhamento dos pacientes para os cuidados paliativos, visto o equívoco de que essa modalidade de tratamento se destina apenas para os pacientes no final da vida (HUI et al., 2015).Os princípios que orientam os cuidados paliativos recomendam que essas discussões ocorram quando a doença ainda exibe um comportamento estável, inclusive em nível ambulatorial (EPSTEIN, 2014). Lamentavelmente, constata-se que essas discussões não têm sido a prática da equipe interdisciplinar, e têm ocorrido na fase aguda da doença, quando o paciente necessita de hospitalização e está próximo à morte, ou incapaz de tomar decisões por si mesmo (MACK et al., 2012).

A maioria dos membros da equipe sinaliza a comunicação como algo desafiador na interação com pacientes em cuidados paliativos e seus familiares. Este fato é atribuído aos próprios medos dos profissionais em relação à morte e ao sofrimento, ao julgamento prévio de como o paciente vai reagir frente ao diagnóstico da doença, à falta de tempo e capacitação, e à complexa interação com o paciente em estágio final (PETERSON; CARVALHO, 2011). A equipe interdisciplinar pode se perceber impotente e de presumir falhas nos seus atendimentos, ocasionando stress e elevados índices de Burnout (BUSS et al., 2011; GRAMLING et al., 2013; WARNOCK, 2014; HUI et al., 2015). Consequentemente a esse comportamento, adota-se um mecanismo de autodefesa, de distanciamento do profissional com o paciente e o familiar, evita-se abordar o prognóstico, adotando-se tratamentos desnecessários e arriscados (BUSS et al., 2011), bem como ocasionando desentendimentos entre os membros da equipe (WARNOCK, 2014). A atitude de distanciamento dos profissionais do paciente e familiar é compreendida pela literatura como construção de uma couraça ou mecanismo de autodefesa, necessários à proteção contra sentimentos indesejáveis acerca da morte (PEREIRA, 2008; PETERSON; CARVALHO, 2011; BUSS et al., 2011; GRAMLING et al., 2013).

Quando o paciente não é devidamente informado pela equipe sobre sua doença, tratamento e prognóstico, surgem diversas consequências. Dentre elas, podem-se destacar que

os pacientes: recebem tratamentos agressivos e inadequados; não compreendem os objetivos do tratamento e ficam insatisfeitos com os resultados; percebem a incoerência entre as situações vivenciadas e as informações recebidas, gerando um falso otimismo; não participam na tomada de decisões e propostas terapêuticas; são envolvidos por um alto nível de estresse e ansiedade em se preocupar com o desconhecido; limitam-se ao convívio com os familiares e seus amigos quando em condição de estabilidade da doença; não se permitem a discussão de fim de vida e de colocarem seus assuntos em ordem; perdem o vínculo de confiança entre a equipe e familiares, e com isso acontece o afastamento entre eles. Também ocorre a divergência de opiniões sobre os objetivos do tratamento (WARNOCK, 2014), além de se interpretar o fato como falta de cuidado, percepção de abandono e de morte iminente (BUSS

et al., 2011).

Os pacientes mais jovens são menos propensos a esperar um diagnóstico de doença terminal ou de encontrar significado frente a tal adversidade (WENTLANDT et al.,2012), pois essa fase é marcada pelo dinamismo, criatividade, é o “pico” da vida (KOVÁCS, 1992). Conhecer a experiência de vida desses pacientes pode conduzir a cuidados que contribuam para uma assistência no processo de aceitação da doença e também da morte (WENTLANDT et al.,2012).

O estudo realizado por Geovanini e Braz (2013) teve a pretensão de avaliar os principais conflitos éticos vividos por oncologistas, referentes à comunicação do diagnóstico e prognóstico de câncer ao paciente e seus familiares. Os principais conflitos citados foram: o emprego da verdade na comunicação, a imprevisibilidade das consequências da informação da má notícia sobre os pacientes e familiares, e o manejo das emoções. Segundo o mesmo autor, esses conflitos fazem com que os profissionais adotem um comportamento paternalista e protetor com o paciente e familiar, substituindo o exercício ético da autonomia e beneficência pela obstinação terapêutica.

Por longos anos, prevaleceu o ocultamento da verdade para os pacientes com o diagnóstico de câncer, predominando a mentira, o silêncio, pois os profissionais acreditavam que isso seria moralmente correto e preservaria a integridade do paciente (GEOVANINI; BRAZ, 2013; RODRIGUEZ, 2014). Ainda nos dias de hoje se faz presente esse tipo de comportamento relacional. Porém, com a evolução da sociedade, tecnologias de informação inovadoras e de fácil acesso, desenvolvimento das ciências médicas, e a presença da bioética, a omissão da verdade foi substituída por valores e regras morais aliados a autonomia, respeito aos direitos do paciente, reforçados no Código de Ética Médica Brasileiro de 2010 (GEOVANINI; BRAZ, 2013).

O relacionamento médico-paciente tem sofrido modificações devido à busca incessante por diagnósticos mais precisos e intervenções de cura. O restabelecimento da saúde tornou-se uma meta, tanto para o paciente como para o médico. Mesmo frente a doenças graves e com possibilidades de cura, a pessoa enfrenta riscos de morte, dado que nenhuma intervenção médica apresenta 100% de eficácia (SANTOS, 2009).

Do ponto de vista dos pacientes e familiares, os cuidados de alta qualidade ocorrem quando a equipe controla os sintomas físicos, ajuda a amenizar o sofrimento emocional, apoia a tomada de decisão compartilhada, coordena o cuidado tranquilamente, proporciona informação adequada, e trata o paciente terminal com respeito e bondade (GUO; JACELON; MARQUARD, 2012).

No ambiente hospitalar, os interlocutores no processo de comunicação não são todos iguais, e os profissionais de saúde apresentam mais “poder” do que os pacientes ou seus familiares. Esse “poder” é derivado do status e autoridade que os médicos em particular ocupam na instituição hospitalar e sociedade. Geralmente a conversa é liderada pelos profissionais, e os pacientes e familiares são muitas vezes vistos como os receptores passivos de informação, e não como participantes ativos para uma discussão partilhada (CASWELL et

al., 2015).

Os pacientes, após serem comunicados sobre o diagnóstico de câncer, esperam receber, dos profissionais de saúde e de seus familiares, ajuda e momentos de escuta para expressarem suas ansiedades, medos, incertezas e obterem informações necessárias para participarem do processo decisório (PETERSON; CARVALHO, 2011). Além disso, desejam também: estabelecer vínculos de confiança com a equipe que presta cuidado, receber assistência e tratamentos de maneira que preservem sua dignidade, meios de aliviar os sintomas, a presença de pessoas próximas as quais são importantes para o paciente, contar com a disponibilidade de uma equipe interdisciplinar para discutir sobre a doença, responder questionamentos através de uma linguagem acessível, compreensível e verdadeira (MUNHOZ

et al., 2014).