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2.1-A Conjuntura Económico-financeira nos últimos 4 anos.

No documento Modelo de rating interno. (páginas 37-41)

Diante de um cenário de turbulências e incertezas fica cada vez mais evidente a necessidade de mensuração fidedigna do risco inerente a qualquer empresa. Num passado não muito distante, quando existia crédito abundante, esta avaliação era muitas das vezes negligenciada já que um controle rígido era considerado conservador e avesso às oportunidades de negócio, a ordem era investir ou emprestar no caso de instituições financeiras, estas com o objetivo premente de ganhar quota de mercado.

É de salientar contudo que o referido no parágrafo anterior não se aplicará tanto se falarmos de concessão de crédito à economia real, nomeadamente no que respeita ao financiamento das chamadas Microempresas e PME, que na globalidade representam mais de 99% do total de empresas existentes na nossa economia. Nesta vertente da atividade do sistema financeiro nacional, que digamos é o seu core business, o sistema não atuou com a irracionalidade verificada nos investimentos inscritos nos ativos financeiros dos bancos, e ainda mais grave (por não se encontrarem inscritos nos seus balanços) pelos investimentos realizados ao nível dos produtos derivados. Chamou-se a este fenómeno economia de papel, que em nada se relaciona com a economia real, não existindo relação direta entre a verdadeira riqueza produzida e nível de vida atingido. Para além de atacar a excessiva financeirização da economia, a necessidade de regulamentação do sistema financeiro como forma de combater a concentração de ativos financeiros nos balanços dos bancos parece ser uma ação que poderia ser levada em consideração pelos reguladores e supervisores, facto que teria a virtude de concentrar a atividade creditícia dos bancos no seu core que não é mais do que conceder crédito à economia real, ou seja, ampliar a fluidez do crédito voltado para o desenvolvimento sustentável.

Parece ser indiscutível que este tipo de regulação não se verificou, e embora se defenda que a sofisticação do mercado de capitais, cujo expoente máximo foram os bancos de investimento dos

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Estados Unidos da América (EUA), com a construção de instrumentos financeiros complexos como Assets Backed Securities (ABS), Mortgage Backed Securities (MBS) e Collateralized Debt

Obligations (CDO), tenha permitido que dinheiro tenha chegado a todo o lado, certo é que se

perdeu o controlo da qualidade dos ativos subjacentes por via da elevada alavancagem, assim como determinou que os bancos inscrevessem nos seus balanços a título de ativos financeiros montantes colossais, retirando disponibilidades da economia real que não puderam ser levantados. Trata-se de uma análise mais macro dado que em abono da verdade o sistema financeiro português, porventura devido à sua reduzida sofisticação, não se aventurou em investimentos dessa natureza, sendo praticamente inexistentes nos seus balanços. Pode-se afirmar que para a banca portuguesa, o problema surge (para além do nosso desajustado e crónico modelo económico) com o encerramento dos mercados financeiros interbancários onde normalmente financiava a sua atividade, facto que se verifica na sequência da denominada crise do sub-prime e mais objetivamente após a falência do banco de investimentos norte-americano Lehman Brothers em setembro de 2008. Para além deste fenómeno, para agravar toda esta envolvente, surge a questão da crise das dívidas soberanas europeias que se juntou ao nosso grave desequilíbrio económico, com crescimentos anémicos na última década, défices públicos constantes e elevados, bem como pela deficitária balança de pagamentos com o exterior. Face à deterioração do risco da república e à fuga dos grandes investidores internacionais, a banca nacional “quase” que foi obrigada a tomar muita divida pública portuguesa, facto que secou ainda mais a nossa economia.

Na realidade, as atuais crises de liquidez e das dívidas soberanas europeias, são uma consequência de um processo evolutivo dos mercados ao longo dos últimos 20 anos. O sistema financeiro evoluiu, e conforme já referido, sofisticou-se nos produtos que entretanto foi formatando, o que permitiu alavancar o crédito em geral e, consequentemente, a atividade económica.

Definindo-se como efeito produzido pelo período de tempo no qual o custo do capital de uma empresa é inferior à rentabilidade dos capitais próprios desta empresa, o efeito de alavancagem permanecerá enquanto for possível aumentar a rentabilidade dos capitais próprios da empresa através do endividamento da mesma, utilizando capital de terceiros (capitais alheios). Em boa

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verdade, foi isto que se foi verificando ano após ano, sempre no pressuposto de que o valor dos ativos que sustentavam as operações de titularização (na sua quase totalidade imóveis, mas também outros ativos como créditos sobre empresas e famílias, cartões de crédito, etc), nunca deixariam de crescer e, portanto, na ótica dos bancos e dos proprietários, o ativo cobriria sempre o passivo. Com isto, não se deve concluir que a alavancagem é negativa, já que a tomada de fundos de terceiros (desde que bem geridos e aplicados) potencia a rendibilidade. Aliás, consideramos este conceito económico como variável explicativa no modelo de rating interno aqui desenvolvido.

Na verdade, essa criatividade dos bancos, nomeadamente de investimento, gerou liquidez em abundância e contribuiu para o crescimento económico. O busílis da questão assentou no facto dos colaterais dessas emissões, ou seja, os ativos subjacentes a essas operações de titularização (ou securitização), não terem sido numa primeira fase avaliados com a devida margem de segurança e, seguidamente, não ter sido levado em consideração que se estava perante uma bolha especulativa no mercado imobiliário, que caso rebentasse, como veio a acontecer, a desvalorização dos preços de mercado seria inevitável, penalizando todos os agentes económicos envolvidos – proprietários, bancos comerciais, intermediários, bancos de investimento e todos os investidores portadores desses títulos. A acrescer a estes factos, surgiu um dado que em grande parte contribuiu para o despoletar desta crise – o massivo incumprimento do quadro de amortização dos seus empréstimos por parte de quem tinha contraído os empréstimos. A partir daqui, o efeito foi o idêntico a uma bola de neve que vai aumentando de tamanho enquanto vai rodando.

O contágio à Europa que redundaram nas crises atrás referidas, deveu-se ao facto dos mercados estarem interligados e haver bancos e fundos europeus com investimentos em produtos das instituições norte-americanas que operavam no segmento subprime. Conforme escreveu Branco (Expresso, 13.10.2008), “metaforicamente, pode aqui aplicar-se o princípio dos vasos comunicantes, que não é mais que um dos princípios da física que o homem aprendeu a utilizar em seu favor; exemplo, a distribuição da água nas casas através de um sistema de tubos, a partir de depósitos. Assim também é no sistema financeiro: os depósitos são os bancos, os mercados são os tubos e a água é o dinheiro. Com o desenvolvimento económico, o sistema financeiro foi

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estabelecendo uma tubagem cada vez mais interligada à escala global. Foi positivo porque facilitou a entrada de dinheiro aonde ele era necessário. Porém, com tantos depósitos e tubos, foi- se tornando cada vez mais difícil identificar aqueles que, acumulavam mais resíduos ou porque principiassem a ter buracos, não asseguravam a sua função. Assim, quando se descobriram alguns depósitos (bancos) vazios e o dinheiro começou a escassear em alguns pontos do sistema, o alerta foi dado. Havendo dificuldades na obtenção de liquidez, os bombeiros do sistema – os bancos centrais – tomam medidas de emergência, mais concretamente injetando liquidez no sistema. Tem de se limpar, reparar e substituir alguns depósitos e tubos, requerendo a coordenação de todos os canalizadores envolvidos – mais concretamente os governos e as entidades reguladoras do sistema. Tal como em período de falta ou deficiente distribuição de água, o sistema só piorará se se aumentar de forma despropositada o dinheiro que dele se retira”. Repare-se que uma crise que começou (2ºsemestre de 2007) como uma crise financeira, rapidamente passou a económica, para se transformar em alguns casos em crise social e finalmente política. O exemplo mais flagrante e bem atual será o caso da Grécia. E um dos principais problemas é que a história mostra que a origem de grande parte dos conflitos mundiais teve uma matriz económica.

A crise financeira gerou falta de confiança, nomeadamente ao nível do mercado monetário interbancário que pura e simplesmente está completamente parado no que respeita ao nosso sistema financeiro. Como é sabido, o sistema financeiro funciona na base da confiança, e na sua ausência, o problema instala-se. A palavra mágica é de facto “confiança”.

Na realidade, a confiança é o fator chave em qualquer economia. A confiança é um produto que não está à venda no mercado. É algo que demora muitos anos a construir, mas que se esfuma em pouco tempo. Para o mercado de crédito funcionar, é necessário que todos os atores estejam tranquilos e confiantes, cenário que não se verifica. Os bancos que diariamente deveriam negociar os seus fundos excedentários, não o fazem precisamente pela tremenda falta de confiança que inundou o mercado, assim como poderiam estar a ceder fundos de que podem vir a necessitar.

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Neste contexto, o Banco Central Europeu (BCE) tem vindo a intervir no mercado cedendo liquidez. Os bancos solicitam ao BCE o empréstimo de determinado montante para fazer face às necessidades de liquidez. O BCE analisa a gravidade da situação e, em caso positivo, faz o empréstimo com uma taxa de juro baixa, que se situa normalmente um pouco acima da taxa diretora. O BCE, com a injeção de capital, tem como objetivo assegurar as condições normais dos mercados, onde se sentem tensões na oferta de liquidez da zona euro.

Neste contexto, a atividade creditícia referente à economia real e mais especificamente às pequenas empresas, ressente-se, levando os bancos a retraírem-se e a analisarem as operações de crédito de uma forma mais cuidada, embora seja de salientar que os bancos sempre aferiram os riscos das empresas de uma forma mais ou menos pragmática, não havendo muita matéria a acrescentar aos modelos que as instituições financeiras utilizaram nestes últimos anos. A evolução das tecnologias de informação ajudaram a modelar e a diminuir as margens de erro. A inclusão, ao longo destes últimos anos, de variáveis qualitativas e externas (sectoriais e macroeconómicas), será porventura os factos mais relevantes na evolução dos modelos.

No documento Modelo de rating interno. (páginas 37-41)