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A CONSTRUÇÃO DAS IDENTIDADES

No documento Anabela Maria de Oliveira Fernandes Vol.I (páginas 34-38)

CAPÍTULO II – ENQUADRAMENTO TEÓRICO DE PARTIDA

2.5 A CONSTRUÇÃO DAS IDENTIDADES

Parecer-nos-á uma tarefa fácil falar de nós próprios, de forma simples, sem complexos ou preâmbulos. No entanto, quando nos questionamos “quem somos?” ou “no que acreditamos?” ou “como nos relacionamos com os outros?” ou “com o mundo?”, as respostas são bastante mais complexas.

2.5.1 Identidade ou identidades?

O conceito de identidade recolhe diferentes usos sociais – sociológicos e psicológicos – surgindo como uma noção multiforme (Ruano-Borbalan, 1998) e, actualmente, amplamente trabalhada constituindo um referencial para a compreensão de múltiplos contextos: intra e inter- individuais e macro-sociais.

Acreditamos que a aquisição da identidade é um processo dinâmico que depende das interacções que vamos estabelecendo com o mundo na sua multiplicidade de relações e culturas. Que recebe a influência de factores intrapessoais (as capacidades inatas do indivíduo e as características adquiridas da personalidade), de factores interpessoais (identificações com outras pessoas) e de factores culturais (valores sociais a que uma pessoa está exposta, tanto globais quanto comunitários).

Uma identidade vivida e uma identidade atribuída, a identidade que incorpora as representações do sujeito sobre si próprio e sobre os outros e, consequentemente, é construída em permanentes interacções nas quais intervêm as próprias representações de si e a representação do outro, o olhar do outro. (Mead, 1963; Goffman, 2000, 2003; Dubar, 1997). Uma concepção de identidade, “ filiada na perspectiva interaccionistas na qual se integram os trabalhos de Mead (1963). Este autor perspectiva a acção humana como algo que se constrói na comunicação frente a frente, com os outros, na reacção significativa ao gesto simbólico e não estritamente comandada pelas normas e valores sociais impostos, reconhecendo a participação activa dos sujeitos na construção da sua identidade. “ (Costa e Silva, 2005)

Assim, a presença do outro é um elemento constitutivo da identidade, não há identidade sem alteridade (Correia, 1997, 1998), numa base de relação permanente ou de sociabilização. Uma socialização ou (alter)acção do próprio (Dodier, 1995).

Os processos de sociabilização encontram-se no quotidiano e nele podemos encontrar jogos de interacção, importância atribuída por (Goffman, 2003), um contributo significativo

para a compreensão das dinâmicas identitárias que emergem das experiências quotidianas. Aqui, podemos encontrar o cruzamento de atributos pessoais estruturais emergentes dos contextos sociais onde decorre a interacção (Mendes, 2001). É neste conjunto de processos, “ou jogo social, que podemos discernir uma procura permanente de ajustamento entre identidade social virtual – aquela que nos é atribuída pelos agentes e instituições com as quais interagimos – e identidade social real – a que resulta da imagem que construímos de nós próprios.” (Costa e Silva, 2005).

Segundo Dubar (1997), as identidades resultam de processos de identidades possíveis, em contínuos processos de negociação “a identidade não é mais do que o resultado simultaneamente estável e provisório, individual e colectivo, subjectivo e objectivo, biográfico e estrutural, dos diversos processos de socialização que, em conjunto, constroem os indivíduos e definem as instituições”. Estamos perante dois processos identitários heterogéneos: de atribuição pelos agentes e instituições que, directamente, interagem com o sujeito e de incorporação resultante da imagem que o sujeito constrói de si próprio. A identidade para si e a identidade para o outro são inseparáveis na construção da identidade social, coexistindo de forma problemática (Dubar, 1997).

Continuando na linha de pensamento de Dubar (2000), a construção da identidade é, neste sentido, um processo de transacções objectivas e subjectivas. As transacções objectivas, onde predomina a atribuição, procuram acomodar a identidade para si à identidade para o outro, e as subjectivas ou internas ao indivíduo variam entre a necessidade de manter identificações anteriores e o desejo de construir para si novas identidades no futuro (Dubar, 1997). Marcada pela dualidade, a identidade é, ao mesmo tempo, um processo biográfico (de continuidade ou de ruptura com o passado) e um processo relacional (a identidade reconhecida ou não reconhecida pelos outros) (Costa e Silva, 2005).

A dinâmica de construção da identidade profissional resulta da interacção de transacções relacionais – reconhecimento ou não reconhecimento pelos outros – e transacções biográficas, consigo próprio – ajustamentos constantes, por vezes, rupturas e reformulações do projecto futuro que possibilitem a articulação entre pretensões e oportunidades (Dubar, 1998).

Nesta investigação, consideramos relevante a perspectiva de identidade como um processo biográfico e de relação com o outro, onde se pretende abordar as questões de formação acção em contexto de trabalho.

2.5.2 Processos de socialização e identidade

Dubar (2005) entende a identidade como o resultado de um processo de socialização. A identidade depende da trajectória de vida do indivíduo e da configuração social de cada momento, em contínuos processos de sociabilização na sua vida. Considerando uma articulação entre condições objectivas e estruturas subjectivas na formação da identidade, e considera que essa mesma identidade é caracterizada pela divisão do eu.

A emergência de uma identidade para si e de uma identidade para o outro, uma análise no interior do processo de socialização (Dubar, 2005,p.136):

“Desse ponto de vista, a identidade nada mais é que o resultado a um só tempo estável e provisório, individual e colectivo, subjectivo e objectivo, biográfico e estrutural, dos diversos processos de socialização que, conjuntamente, constroem os indivíduos e definem as instituições.”

Continuando em torno da análise conceptual de Dubar, as construções das identidades sociais fundamentam-se na articulação entre as duas transacções. A identidade social é resultado da interacção entre um processo sincrónico, relacionado às condições objectivas dos sistemas de acção, e um processo diacrónico, que implica a subjectividade de estruturas internas. Segundo Dubar (2005,p.140):

“A construção das identidades se realiza, pois, na articulação entre os sistemas de acção, que propõem identidades virtuais, e as trajectórias vividas, no interior das quais se forjam as identidades “reais” às quais os indivíduos aderem.”

É nesta articulação, “entre estruturas objectivas (identidade visada, virtual, que se quer ter) e estruturas internalizadas (identidade herdada, real), que pode resultar em continuidade ou em ruptura. Na continuidade, as metas coincidem e ocorre reforço mútuo entre as estruturas. Na ruptura, o desacordo entre o que se pensa sobre si e o que se deseja ser implica conversões subjectivas que ajustam as estruturas interiores a novas configurações” (Costa e Silva, 2005).

CAPÍTULO III – A METODOLOGIA

Ao procedermos a um trabalho de investigação temos consciência que são várias as opções que se integram no âmbito dos pressupostos metodológicos e que representam o acesso à informação e à construção do conhecimento.

Recorremos desta forma a autores que aprofundaram conhecimento e desenvolveram um quadro conceptual para a abordagem aos processos de formação - acção decorrente das práticas na acção (laboral), das aprendizagens em contexto de trabalho em equipa e dos processos de emergência de identidades profissionais.

Considerámos, de igual forma, que as questões e os objectivos suscitados pelo nosso estudo se integram no paradigma de pesquisa qualitativa, uma vez que a nossa pesquisa consiste em compreender aprofundadamente os diferentes elementos que caracterizam a formação – acção praticadas pelos elementos que compõem a equipa de coordenação da DAC, no âmbito da Acção Cultural. Assim, pretendemos ao seleccionar o nosso objecto de estudo, estudá-lo em profundidade, fazendo sobressair as relações e inter-relações que se verificam nas diferentes ideias expressas pelos elementos que vivenciam o nosso objecto campo de estudo, de forma a compreende-lo na sua essência.

Segundo Bogdan & Biklen (1994) considera-se que as características comuns na investigação qualitativa estão relacionadas com:

• a natureza descritiva da investigação;

• a importância do significado; a existência de uma valorização dos processos relativamente aos produtos ou resultados;

• as formas indutivas como os dados são analisados e a sua relevância para o investigador, assim como a importância da recolha de dados a partir do ambiente natural.

Consideramos que a presença e o afastamento crítico, o olhar objectivo da investigadora em relação ao estudo, pode evidenciar uma mais-valia resultante da proximidade com o estudo, aprofundando a abordagem científica

A investigação que pretendemos desenvolver centra-se na acção desenvolvida pela Equipa de Coordenação da DAC, no período de 2007 a 2010, particularmente sobre os processos de formação - acção dos elementos que compõem esta equipa, inserida num contexto muito específico, a Acção Cultural. Optámos desta forma pelo estudo de caso,

“um estudo de caso caracteriza-se, primordialmente, por incidir numa entidade bem definida, como um programa, uma instituição, um sistema educativo, uma pessoa ou uma unidade social. Visa conhecer em profundidade o seu “como” e os seus “porquês”, fazendo justiça à sua unidade e identidade próprias. Assume-se como uma investigação particularística, procurando descobrir o que há de mais essencial e característico”. Ponte (1994; p.3)

Esta opção infere uma análise em diferentes quadros de investigação.

- Para Bogdan & Bilken (1994; p.84), o estudo de caso “consiste na observação detalhada de um contexto, ou individuo, de uma única fonte de documentos ou de um acontecimento específico”;

- Yin (2005; p.32) define o estudo de caso como uma “ metodologia de investigação empírica que estuda um fenómeno contemporâneo dentro do seu contexto de vida real, especialmente quando os limites entre o fenómeno e o contexto não estão claramente definidos”;

- Para Afonso (2005; p.71), o estudo de caso “conhecimento aprofundado de uma situação concreta no que ela tem de específico e único. (…) o que interessa é a análise de uma situação singular justamente no sentido de documentar essa singularidade”.

Acreditamos que esta equipa de coordenação, inserida num contexto específico de Acção Cultural e de colectivos de trabalho, poder-nos-á proporcionar as condições necessárias a tornar o fenómeno em estudo numa situação única em muitos aspectos, rica na quantidade de detalhes específicos que lhe estão associados e dessa forma a torna-lo singular. Trata-se de um estudo, que de acordo com Stake (1995; p.3), intrínseco do investigador no caso “We are interested in it, (…) because we need to learn about that particular case” .

Pretendemos conhecer a realidade tal como ela é pelo «olhar» dos elementos que nela participam, directamente, bem como o sentido que atribuem às situações e às acções que vivenciam. Utilizamos, dessa forma, uma metodologia descritiva e interpretativa que nos permitirá compreender e analisar o objecto de investigação.

A nossa investigação insere-se numa visão holística, uma vez que pretende a apreensão e compreensão do objecto de estudo na sua globalidade e, nesse sentido, propomo-nos a observar, compreender, analisar e valorizar o processo tal como decorre.

No documento Anabela Maria de Oliveira Fernandes Vol.I (páginas 34-38)