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A CONSTRUÇÃO DE SENTIDOS NA PROFISSÃO E IDENTIDADE NO TRABALHO

No documento Anabela Maria de Oliveira Fernandes Vol.I (páginas 30-34)

CAPÍTULO II – ENQUADRAMENTO TEÓRICO DE PARTIDA

2.4 A CONSTRUÇÃO DE SENTIDOS NA PROFISSÃO E IDENTIDADE NO TRABALHO

O trabalho, a actividade profissional a que cada um dedica uma parte considerável do seu tempo, a profissão, é um elemento central na definição do eu individual e social que identifica uma pessoa. (Costa e Silva, 2005).

As várias correntes filosóficas dos últimos 100 anos, associaram o conceito de profissão a questões teóricas diversas, nomeadamente, por parte de diferentes correntes da sociologia, mais concretamente, da sociologia das profissões, e designadas, habitualmente, de teorias funcionalistas (anos 30, 40 e 50), interaccionistas (anos 50 e 60) e, mais recentemente, as teorias neoweberianas e neomarxistas (anos 70).

Segundo Dubar (1997), pode-se identificar a existência de princípios éticos e deontológicos para a regulação da actividade profissional; de saber científico, garantia da

competência e da especialização de um grupo profissional, constituindo barreira de entrada indiscriminada de indivíduos para essa profissão. (Costa e Silva, 2005).

Os defensores das teorias interaccionistas distinguem-se dos funcionalistas pela valorização das interacções dinâmicas que caracterizam as profissões, considerando a biografia e a interacção como elementos importantes na análise das dinâmicas profissionais (Costa e Silva, 2005, citando Hughes, 1996), as actividades de e no trabalho “como processos subjectivamente significativos e como relações dinâmicas com os outros” (Dubar e Tripier, 1998).

Nesta investigação privilegiamos a pesquisa e a compreensão de como o sujeito se forma na acção, se é ou não sujeito da sua própria formação e se “forma” no contexto do colectivo de trabalho.

2.4.1 Contextos e formação entre pares (ou formar-se na acção)

O contexto de trabalho é determinante para os processos de formação, o adulto forma-se, enquanto sujeito da sua própria formação, em contexto (Oliveira, F., 1997),

“…integrando diferentes vivências experienciais, apropriando-se das influências externas que sobre si são exercidas, reflectindo o seu próprio percurso experiencial” (Canário, 1995)

Ao analisarmos as questões educativas, verificamos que os processos de repetição e transmissão de informações que não privilegiam a experiência prévia dos sujeitos no processo de aprendizagem, questionamento e pesquisa, colocam-se numa relação estreita de proximidade com os processos tayloristas. É necessário então passar de uma “cultura de soluções” típica do modelo de racionalidade inerente à forma escolar, a uma “cultura de problemas”, ou dito de outra forma, privilegiar as perguntas por contraposição às respostas, como propõe Crozier (1995) numa dimensão investigativa.

Se reportarmos para esta investigação o modelo que decorre da forma escolar é o processo de transmissão, diria mesmo que unidireccional, que decorre entre uma relação que se estabelece entre o professor e o aluno (turma), em que as experiências e os saberes do sujeito não são valorizadas e em que o sujeito é desprovido do seu contexto social, e onde apenas o professor/formador é detentor do saber/poder.

Nesta relação entre o saber e o poder tende-se associar o conhecimento com poder. A emergência de diferentes formas e fontes de conhecimento tendem a valorizar formas de participação, em contextos educativos, estas tendem a encontrar novas relações de poder. Como refere Amiguinho, A. (2008) “A relação com o saber é uma relação de poder, se os saberes se equivalem, as relações de poder tendem a desaparecer”.

Estabelecendo um campo de comparação entre o campo educativo não formal e o contexto de trabalho desta investigação pretende-se verificar se existe um campo de trabalho educativo, e não escolar, de espaço para a aprendizagem baseada na experiência do sujeito, valorizando o processo reciprocamente (sujeitos e contextos sociais, culturais, históricos, …), onde a educação não consiste em treinar as pessoas/sujeitos a dar respostas certas mas sim ajudar a formar “solucionadores de problemas”. Tempo de participação e qualificação, de exercício de cidadania.

Paradoxalmente, e infelizmente, continuamos a assistir no domínio da formação de adultos, em contextos de interacção ou não, que a estratégia de formação é concebida à luz do modelo escolar, o mesmo utilizado como modelo dominante na educação das crianças, jovens e adolescentes. Um processo centrado nas fases do ciclo formativo, desde o levantamento das necessidades, planeamento, concepção de programas e instrumentos, organização das actividades, desenvolvimento, acompanhamento e avaliação das actividades formativas.

Desta forma, a acção educativa dá lugar a momentos de transmissão de informação, num quadro de situações formais e assimétricas “em que alguém sabe transfere sabedoria para alguém que não sabe” (Canário, R., 1995).

Esta lógica escolarizada da formação permite verificar, por um lado, que a formação é reduzida a uma aprendizagem de competências e de conhecimentos e, por outro, que tende a esquecer experiências de vida e percursos pessoais que permitiram diversas aprendizagens em diferentes contextos.

Numa outra lógica de formação, o processo formativo é centrado em quem se forma, em processos de aprendizagem entre pares, em momentos formais e informais, como refere Dominicé, P. (1984), “…a formação é um espaço de socialização e está marcada pelos contextos institucionais, profissionais, socioculturais e económicos, em que cada indivíduo vive.”

Os processos formativos tendem a ser complexos, o que torna essencial não perder de vista as formas como se apropriam espaços e tempos educativos e a forma como reflectem e

interagem com a sua história e percurso de vida. “ A formação é infinitamente mais global e complexa: constrói-se ao longo de toda uma trajectória de vida e passa por fases e etapas que é ilusório pretender “queimar””. Nóvoa, A. (1988).

Trata-se também de “um processo autogerido que se prolonga por toda a vida e que tem lugar nas múltiplas situações do quotidiano”. Oliveira, F. (1997).

Refira-se, então, que “é possível encarar um estabelecimento de ensino como qualquer outro contexto de trabalho, como um lugar onde os actores realizam “aprendizagens informais” (Pain), ou ainda como um contexto de “socialização profissional” (Lesne e Minvielle) “. (Oliveira, F., 1997).

Valorizar-se-á o ambiente de trabalho, o seu valor formativo e potencial de acção colectiva que mobiliza a formação, a qualificação profissional e as formas de participação na equipa em questão?

2.4.2 O sentido do trabalho e a emergência das identidades

A relação que se pode estabelecer entre o trabalho e o sentido vivido pelos indivíduos (de forma subjectiva) é fundamental para a compreensão das dinâmicas subjacentes à construção das suas experiências estreitamente associadas às questões da identidade e de pertença (Dubar, 1997).

O sentido vivido do/no trabalho é um sentido que decorre da experiência concreta de cada indivíduo, experiência que associa o ‘contexto sincrónico’ (organização do trabalho e relações sociais de trabalho no momento actual) e o ‘contexto diacrónico’ (história do sujeito e a forma como o contexto actual se articula com o seu passado) (Martins, A., 2010).

Estão presentes as dimensões do eu, do reconhecimento pelo outro, em processos de sociabilização.

“A construção do sentido do trabalho inclui, assim, o conteúdo do trabalho e as condições disponíveis (por parte da organização e do(a) trabalhador(a)) para a sua realização, bem como a identificação com a actividade que possibilite a realização pessoal e profissional como condição de reconhecimento no ofício (por si próprio, que inclui o reconhecimento pelos colegas de trabalho, pelos superiores hierárquicos e pelos clientes ou destinatários da sua acção). “ (Costa e Silva, 2005)

No documento Anabela Maria de Oliveira Fernandes Vol.I (páginas 30-34)