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2.1 Análise de discurso crítica

2.2.2 A construção discursiva da (in)evitabilidade

A ontologia estratificada do RC, para além de nos informar sobre os diferentes níveis dos com- ponentes ontológicos, mapeia os meios pelos quais a mudança social pode ser promovida. Já ob- servei que o mesmo potencial constrangedor, oferece abertura pelos recursos que se podem bus- car nele. Nessa perspectiva, é possível à agência individual tomar recursos e devolver para a es- trutura informações que podem levar à continuidade, pela reprodução dessas estruturas, ou à transformação, por meio da contestação de rearticulação no potencial da estrutura. Há, assim, poderes causais que por meio dos quais a permanência ou a mudança ocorrem. A esse respeito, Resende (2008, p. 91) observa que:

Assim como discursos contextualmente localizados podem ser explicados em termos causais, podem também ser identificados como tendo poderes causais em eventos. É isso o que justifica a perspectiva de relação dialética entre linguagem e sociedade, rei- vindicada pela ADC e nem sempre claramente formulada: aspectos discursivos de prá- ticas sociais, como representações discursivas de eventos e práticas, podem ter efeitos causais na sociedade; podem, por exemplo, legitimar certos modos de ação ou ser uti- lizadas como base para construções identitárias. Por outro lado, a colonização de dife- rentes práticas sociais por certas representações discursivas e sua presença em diferen- tes tipos de texto, e a configuração de ordens do discurso em práticas particulares são também resultados de poderes causais, no sentido de que a organização dos elementos discursivos em práticas é socialmente estruturada.

Assim, o conceito de redes de ordens de discurso pode contribuir para a compreensão de como determinadas formas específicas a determinadas práticas podem espraiar-se pelo sistema social, colonizando outras áreas, ou campos sociais (BOURDIEU, 2011). É o que ocorre com as ordens de violação que a partir da força das ordens discursivas associadas ao capital, ao dinheiro em estado puro (SANTOS, 2011), colonizam outras ordens discursivas, transformando o especí- fico de uma área em comum a todo o sistema. Nesse sentido, também na instância discursiva a violência sistêmica se materializa.

Outro ponto que deve ser debatido é que o potencial de mudança, mapeado no ‘Modelo Transformacional da Atividade Social’ é o que justifica a viabilidade crítica propositiva de nossas investigações. Tendo em vista que para além de gerar epistemologias restritas ao universo da ci- ência, as investigações discursivas em ADC devem transpor as barreiras auto impostas pela tradi- ção e informar ao conjunto social com recursos que possam ser usados para a superação de blo- queios na agência e, assim, contribuir para essa mudança. Nessa perspectiva:

A destruição deste poder de imposição simbólico radicado no desconhecimento supõe a tomada de consciência do arbitrário, que dizer, a revelação da verdade objectiva e o aniquilamento da crença: é na medida em que o discurso heterodoxo destrói as falsas evidencias da ortodoxia, restauração fictícia da doxa, e lhe neutraliza o poder de des- mobilização, que ele encerra um poder simbólico de mobilização e de subversão, poder de tornar actual o poder potencial das classes dominadas. (BOURDIEU, 2011, p.15, grifos originais)

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73 Bourdieu, que tem um extenso trabalho sobre o papel da/o intelectual, nos aponta a pos- sibilidade de ruptura da ordem hegemônica por meio de “discursos heterodoxos”, ou como refe- rirei neste trabalho, discursos contra-hegemônicos e discursos contra-ideológicos. Por meio da atividade discursiva, é possível promover a tomada de consciência sobre os poderes causais que são abstratos, mas cujos efeitos matérias são possíveis de apreender. Nesse particular, as ferra- mentas de que dispomos em ADC, contribuem para evidenciar o arranjo de forças articulado nas práticas que focalizamos por meio dos textos que nos fornecem a materialidade necessária para erigirmos críticas explanatórias.

Como observado na Seção 1.1, a perversidade sistêmica se constrói, também, por meio da ação discursiva. Neste sentido, o domínio de recursos simbólicos permite a produção de signi- ficados que têm efeitos sociais potenciais e em uma cadeia exitosa, contribuem para a sustenta- ção de ordens hegemônicas. Fairclough (2003) observa que a linguagem, como parte indissociá- vel da vida social, é afetada pelos movimentos de readaptação do capitalismo, dos quais deve-se ressaltar a tecnologização dos diferentes momentos da vida social, que acarreta a especialização dos discursos na sociedade – criando feudos simbólicos, em que cada assunto da vida deve ser/só pode ser tratado de forma sistematizada por profissionais específicos de cada área. Isso, levado às últimas consequências, alija pessoas que não detêm os recursos necessários para acessar esses co- nhecimentos, de poder (Fairclough, 2007p. 132).

Nesse sentido, Chauí (2008 [1980], p. 87) retoma a reflexão sobre os intelectuais ideólo- gos que “Estão encarregados, por meio da sistematização das ideias, de transformar as ilusões da classe dominante (isto é, a visão que a classe dominante tem de si mesma e da sociedade em re- presentações coletivas ou universais”. Assim, atores sociais que têm acesso a determinados recur- sos materiais e simbólicos operam na formulação de discursos que respondem e sustentam “a coerência ideológica”, na produção de silêncios e lacunas que, em uma contradição inerente, são a base sobre qual se erige essa “ideologia coerente” (CHAUÍ, 2008 [1980], pp. 109-110).

A coerência de que trata, evidentemente, é estabelecida em relação aos objetivos e inte- resses hegemônicos, que assenta na/pela esfera discursiva posições-práticas a serem ocupadas. Essas posições sociais nas práticas são formuladas com o objetivo de descolar a ideia (de domi- nação e exploração ) da prática (de dominação e exploração). Sob essa ótica, ainda conforme nos ensina Chauí (2008 [1980], p. 104):

Examinando a maneira como o modelo da Organização se difunde e se espalha por todas as instituições sociais e por todas as relações sociais, Lefort fala na ideologia con- temporânea como a ideologia invisível. Ou seja, enquanto na ideologia burguesa tradici- onal as ideias eram produzidas e emitidas por determinados agentes sociais – o pai, o patrão, o padre ou pastor, o professor, o sábio –, agora parece não haver agentes pro- duzindo as ideias, porque elas parecem emanar diretamente do funcionamento da Or- ganização e das chamadas “leis do mercado”.

Sobre o funcionamento da linguagem em sociedade: opção ontológica e aproximações interdisciplinares

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Ao mesmo tempo em que há a necessidade de esconder sua origem, o poder desdobra-se como forças invisíveis espraiadas em diferentes práticas sociais e mobilizadas por grupos específi- cos de ideólogos/as fomentados pelo poderio econômico e cujas ideias podem (tragicamente) ser dispersadas ao vento que sopra o barco hegemônico, por meio dos espaços sociais, centralmente discursivos, legitimados pelo poderio político (que se origina desse poder econômico).

A maneira como esses espaços são construídos e como essa autolegitimação é processada também é um foco de investigação pertinente para a ADC, tendo em vista que para sua realiza- ção são elaboradas tecnologias específicas. Essas tecnologias são o fulcro de “instrumentos de precisão que interferem no próprio conteúdo da ciência” (CHAUÍ, 2008 [1980], p. 105), enten- dendo-se ciência (de modo limitado e limitador) como um saber útil a determinados propósitos.

Assim, observando-se o desenvolvimento dessas tecnologias e sua penetração na vida so- cial, é possível falar em uma tecnologia discursiva, que vem sendo amplamente desenvolvida e explorada pelas mais diversas redes de práticas sociais. Desse modo, é emergente o interesse no conhecimento sobre os usos da linguagem, sendo cada vez mais sofisticadas as tecnologias apli- cadas à produção de textos, com objetivos dos mais diversos.

No entanto, deve-se ponderar que aqueles/as que detêm os meios e os recursos para aces- sar o conhecimento especializado de construção textual ganham status (ou o mantêm) ao serem capazes de ‘distribuir’ sua forma de ver o mundo ao mundo. E, assim, sobrepõem-se às/aos que são desprovidas/os em alguma medida desses meios e recursos, o que corrobora para perpetuar, pelo uso da linguagem, assimetrias sociais existentes, em favor de interesses particulares.

Santos (2011, p. 38) observa que o atual sistema ideológico assenta-se no binômio poder econômico e informação. Em suas palavras:

Entre os fatores constitutivos da globalização, em seu caráter perverso atual encon- tram-se a forma como a informação é oferecida à humanidade e a emergência do di- nheiro em estado puro como motor da vida econômica e social. São duas violências centrais, alicerces do sistema ideológico que justifica as ações hegemônicas e leva ao império das fabulações, a percepções fragmentadas e ao discurso único do mundo, ba- se dos novos totalitarismos – isto é, dos globaritarismo a que estamos assistindo.

O autor discute assim o caráter despótico da informação a serviço de interesses econômi- cos. Nesse sentido, as tecnologias de texto (FAIRCLOUGH, 2007) são engendradas sob o jugo da hegemonia e são empregadas para construir, no campo simbólico da comunidade, a opressão do individualismo como norma. Os grupos que detêm o poder hegemônico, no campo da eco- nomia, transferem, sem muitas “perdas energéticas” (SANTOS, 2011, p. 52), o potencial do po- derio econômico para o campo simbólico, por meio do discurso, pela manutenção de veículos mediáticos. A importância central da influência sobre a mídia é construída pelos meios e pelos fins, é dizer, os meios que permitem a existência de empresas mediáticas que outorgam a si mes- mas como detentoras de uma verdade reiterada pela audiência. Isso leva ao incremento de inves-

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75 tidores/as ávidos por mais consumidores/as, o que novamente assegura a hegemonia da mídia como mediadora das realidades no universo social hipersemiotizado, legitimando o poder que produziu essa mídia.

A mídia, na materialização promovida por seus diversos produtos, constrói e divulga sig- nificados sobre os mais diversos temas. No que concerne à realidade da situação de rua e da po- breza extrema, é mister observar que a construção de significados por atores sociais opera na construção social da realidade (FOUCAULT, 2011), e que, associado a isso, o caráter ampliado que esses significados assumem ao serem veiculados por instrumentos midiáticos de grande visi- bilidade contribui na perpetuação de determinadas estruturas sociais, pela reprodução de signifi- cados (CHAMPAGNE, 2011).

Nessa mesma perspectiva, Bourdieu (1998, pp. 34-35), ao discutir a construção mediática da xenofobia que alveja imigrantes e descendentes de imigrantes na Europa, aponta alguns recur- sos de que dispõem as empresas mediáticas para promover o espraiamento dos conteúdos simbó- licos que forja, pelo/para o cadinho econômico:

Através dos automatismo verbais, das imagens banalizadas, das falas batidas, e à in- sensibilização que a violência produz, elevando pouco a pouco, em toda a população o limiar de tolerância ao insulto e ao desprezo racistas, minando as defesas críticas con- tra o pensamento pré-lógico e a confusão verbal (…) reforçando subrepticiamente to- dos os hábitos de pensamento e de comportamento herdados de mais de um século de colonização e de lutas coloniais. (…) mutilam uma realidade histórica ambígua para reduzi-la às dicotomias tranquilizadoras do pensamento maniqueísta que a televisão, inclinada a confundir um diálogo racional com uma luta livre, instituiu como modelo.

O realizado é atravessado pela ação discursiva hegemônica, que estabelece uma realidade simbolicamente distribuída. Devo salientar que poderia ter empregado o termo no plural, no en- tanto, pela incrível coerência e coesão das hegemonias, em seus propósitos, que resultam ser uní- vocos, o resultado é o apagamento da alteridade. O destaque a essa ação robusta e espraiada é necessário para evidenciar como suas ferramentas visam, grosso modo, a um fim unívoco que é a manutenção dos arranjos de poder por meio do silenciamento do/a outro/a. A sofisticação das técnicas assim aplicadas leva ao estarrecedor consenso que impossibilita a reação, por agir pre- ventivamente na docilização/apassivação dos corpos (FOUCAULT, 2011). Essas técnicas, no entanto, necessitam da repetição para construir a concordância com a exploração. Essa repetição novamente necessita do apoio de veículos mediáticos que repetem, nos diários, semanários, seus regimes de verdade, periodicamente repisando construtos simbólicos e apagando sua construção, naturalizando-os. Nessa perspectiva, Bourdieu (1998, p. 56) aponta para o caráter repetitivo das técnicas para viabilizarem seus efeitos sociais. Ele observa que:

Esse trabalho de imposição, começado há muito tempo, continua hoje. (…) essa espé- cie de gota-a-gota simbólico para o qual os jornais escritos e televisados contribuem muito fortemente – em grande parte inconscientemente, porque a maioria das pessoas que repetem essas declarações o fazem de boa fé –, produz efeitos muito profundos. É

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assim que no fim das contas, o neoliberalismo se apresenta sob as aparências da inevi- tabilidade.

O conceito de inevitabilidade é, como o faz ver o título desta dissertação, central para meu estudo. Nesse sentido, a violência sistêmica e sistematizada, imanente ao capitalismo, é re- crudescida, no novo capitalismo, pelo seu potencial colonizador. Há uma crença, fundada sobre a repetição discursiva, de que as práticas sociais só podem ter uma determinada forma, que é a própria violência. As agressões e abusos são mitigados pela ação discursiva, e seu efeito se torna acentuadamente perverso, pois ao mesmo tempo em que aumentam a potência de violação, si- lenciam seus efeitos, e emudecem a resistência. Essas ações discursivas são centralmente promo- vidas pela grande mídia, que sustentada pelo poder econômico, age servilmente aos interesses particulares, conferindo-lhe a força da legitimação, pela naturalização dos arranjos de poder.

Bourdieu (2011, p.122) ainda observa que “É a estrutura do campo mundial que exerce uma coação estrutural, o que confere aos mecanismos uma aparência de fatalidade”, assim a rede globalitária cria uma teia que apreende a todas/os no campo do negativo: da impossibilidade de resistir e da inevitabilidade da exploração e da dominação. Deve-se pontuar que estamos tratan- do de uma aparência construída e repetida sistematicamente, de maneira a projetar-se como um simulacro. Nesse sentido, a exemplo da fábula, emprestada de Borges, com que Baudrillard (1991 [1981]) introduz seu Simulacres et Simulation,11 a tarefa dos “cartógrafos do Império” se assemelha em muito ao ofício desses/as ideólogos/as contemporâneos/as, que constroem um emaranhado de representações ficcionais que descolam a prática das ideias. Há, no entanto, que se marcar uma diferença crucial para a manutenção dos “mapas” discursivos contemporâneos: essa cons- trução é feita à miúde e é repercutida sistematicamente, instanciando inúmeros mapas que se so- brepõem e dão a aparência do inevitável às práticas sociais.

Mesmo em face desse quadro desolador, em que a resistência encontra limites ao esbarrar em todas essas pressões (centralmente) discursivas, a possibilidade pode ser construída por meio do contraditório formulado em ações contra-hegemônicas; sendo necessário, para tanto, o desen- volvimento de tecnologias formuladas em matrizes epistemológicas contra-hegemônicas, bem como de espaços subversivos (tais como a mídia alternativa sói ser) que possam ser apropriadas por atores sociais para combater no campo simbólico a opressão da verdade única tautológica e inevitável. A inevitabilidade, desse modo, tem de ser contrariada construção da noção de ‘evita- bilidade’, por meio do preenchimento das lacunas e dos silêncios, o que só pode ser construído com base em outras matrizes de conhecimento, que não as legitimadas pela e legitimadoras da hegemonia.

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“Se outrora pudemos tomar pela mais bela alegoria da simulação a fábula de Borges em que os cartógrafos do Império de- senham um mapa tão detalhado que acaba por cobrir exactamente o território (mas o declínio do Império assiste ao lento esfarrapar deste mapa e à sua ruína, podendo ainda localizar-se alguns fragmentos nos desertos – beleza metafísica desta abs- tração arruinada, testemunha de um orgulho à medida do Império e apodrecendo como uma carcaça, regressando à substân- cia do solo, de certo modo como o duplo acaba por confundir-se com o real ao envelhecer) – esta fábula está terminada para nós e tem apenas o discreto encanto dos simulacros de segunda categoria.” (BAUDRILLARD, 2001 [1981], p. 7)

Entre teoria e prática: o estudo sistemático de textos por meio de categorias analíticas

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A produção desse contraditório assenta, assim, na evidência da incoerência dessa “coe- rência ideológica”, mas, para tanto, é necessário também a repetição. Essa repetição só é viável se houver espaços de construção/veiculação simbólica contra-hegemônicas, que constituem (en- tre outros) espaços discursivos. É nessa perspectiva, que os objetos que focalizo nessa investiga- ção – a revista Ocas” e o jornal O Trecheiro – distanciam-se de objetos tradicionais da ADC, pois, tratam-se de periódicos, cuja participação na vida social se dá contextualizada em práticas de mobilização social contra a disparidade sócio-político-econômica. E que, por essa razão, têm o potencial de construir esse contraditório, por meio da produção e da veiculação de textos - repre- sentações, ações e identificações – alternativos.

Nesse sentido também, esses espaços discursivos formulados e encerrados pela ação des- sas publicações, oferecem a possibilidade de se investigar as situações de rua a partir da visão par- ticular de quem está engajado/a na sua superação das práticas de exploração, tendo em vista que são produto da ação de atores sociais articulados e engajados pela superação das radicais assime- trias sociais que foram construídas diacronicamente e que são reiteradas sincronicamente pelos poderes hegemônicos. Em consequência disso, as estratégias textuais de que lançam mão os/as editores/as e colaboradores/as dos periódicos supracitados tendem a ser diferentemente constru- ídas, e a aplicação das ferramentas metodológicas constituídas pela ADC, a priori, para o mape- amento de discursos hegemônicos, tem de ser repensada, a exemplo do que foi sinalizado quando tratei dos modus operandi tradicionais da ideologia. Desse modo, a aplicação dessas ferramentas aos textos que compõem os corpora desta investigação exigiram, como veremos, um refinamento teórico-metodológico, o que pode constituir-se como um retorno para o arcabouço da ADC, e, desse modo, contribuir para o incremento das investigações discursiva, sendo que meu foco recai sobre o potencial discursivo para a promoção de mudanças, sob uma perspectiva crítica positiva.

Na subseção que segue, focalizarei as ferramentas metodológicas fundamentais para a produção de análise de discurso textualmente orientadas: as categorias analíticas discursivas.

2.3 Entre teoria e prática: o estudo sistemático de textos

por meio de categorias analíticas

A ADC estabelece uma interface com a LSF de Halliday (2004 [1991]), sendo central o conceito de que a linguagem humana constrói e é construída pela realidade social, havendo “uma relação entre as funções sociais da linguagem e a organização do sistema linguístico”. A orientação das investigações em ADC se dá, desse modo, na direção do entendimento funcional da linguagem, que como “sistema aberto” para os “estímulos de seu meio social” (RESENDE; RAMALHO, 2006, pp. 56-57) possibilita acessar os conteúdos simbólicos construídos e veiculados por meio de seu uso. Tendo como parâmetro o fato de que determinados traços linguísticos interiorizam sis-

Análise de discurso crítica

tematicamente alguns significados sociais, os fatores do sistema linguístico que definem as esco- lhas das quais se constituem os textos são analisados.

Isso não quer dizer que a relação entre significação e estruturas linguísticas seja fixa, pelo contrário, há uma imensa gama de variabilidade em como os significados sociais são texturiza- dos, mas, ainda assim, é possível observar as regularidades de realização dos significados sociais nos recursos semióticos. E é, justamente, por meio do mapeamento dessas regularidades que é viável proceder a análises textualmente orientadas. Nossas análises não podem definir quais fo- ram os objetivos de produtores/as textuais, nem qual os efeitos do texto no âmbito de sua recep- ção12, o que podemos analisar são efeitos potenciais de significação social.

Para poder realizar tal tipo de estudo, que focaliza os textos, para acessar a instância discursiva e, posteriormente, fazer o salto para a explanação social crítica, é imprescindível a elaboração de ferramentas metodológicas que liguem o denso construto teórico e o trabalho investigativo empí- rico, assim, as categorias analíticas emergem como ferramentas essenciais para a investigação dis- cursiva. Segundo Resende e Ramalho (2006), em ADC, é imperioso ao/à pesquisador/a ter vas- to domínio das categorias analíticas discursivas para proceder a uma investigação textualmente ori- entada.

Nessa perspectiva, com o mesmo peso do arcabouço teórico transdisciplinar, há os pro-