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Capítulo 1 Formação do Macrossistema Elétrico Brasileiro

1.3 A construção do Macrossistema Elétrico Nacional

A eletricidade é fruto do desenvolvimento técnico empenhado por cientistas de diversos países. Embora ela seja conhecida pelo homem desde 1800, tecnicamente ainda não era possível utilizá-la em larga escala e transportá-la a grandes distâncias. Entre os anos de 1860 e 1870 as instalações elétricas existentes eram ainda pouco eficientes. Foi, de fato, a ampliação de sua utilização que pressionou os avanços técnicos. Tais avanços culminaram no surgimento das primeiras centrais elétricas nas décadas finais do século XIX.

Entretanto, foi somente após 1880, quando a invenção do dínamo aliada à invenção do alternador e do transformador (que permitiriam a elevação ou a redução de tensão), e à possibilidade de se transportar energia a longas distâncias, que se viabilizou a existência de uma indústria elétrica que se generalizasse pelo mundo (LORENZO, 1993). A energia elétrica não mais precisaria ser consumida no mesmo local de produção ou em suas proximidades e as perdas de energia na transmissão foram reduzidas drasticamente com os sucessivos avanços técnicos (SAES, 2008).

Embora países como Inglaterra e França tenham participado do processo de desenvolvimento e implantação dos sistemas elétricos, foram os Estados Unidos e a Alemanha que lideraram o processo de desenvolvimento dos mais variados equipamentos elétricos. Os inventos mais relevantes foram projetados por representantes destes países, em alguns momentos simultaneamente por ambos.

Curiosamente a eletrificação do território brasileiro teve início no mesmo período em que se iniciou a eletrificação dos Estados Unidos e dos países europeus mais adiantados. Entretanto, o Brasil não faz parte dos países que desenvolveram qualquer das técnicas e equipamentos relacionados à eletricidade. A difusão da eletrificação pelo território brasileiro também se apresentou de forma muito limitada, com manchas e ilhas

de tecnificação. Segundo Antas Jr. (2009) a eletricidade não se implementou no Brasil com a mesma intensidade e capilaridade com que se desenvolveu nos territórios dos países centrais da economia capitalista.

A partir de 1900, a energia elétrica tornou-se suficientemente barata, o que resultou na expansão da rede e no aumento de seu uso no Brasil. Graças à possibilidade de transmissão, à sua flexibilidade, enquanto forma de energia, e a consequente criação de uma indústria consumidora de energia elétrica, que a eletrificação do território pôde ser ampliada (LORENZO, 1993). Nos países centrais esse processo já se desenvolvia fortemente desde a década de 1870.

1.3.1 Microssistemas técnicos independentes

No Brasil o processo de eletrificação do território teve início efetivamente entre 1880 e 1914, com a implantação de serviços de iluminação pública e residencial, em especial, na capital paulista e na capital carioca (LORENZO, 1993).

A primeira cidade do Brasil e da América do Sul a dispor de energia elétrica para iluminação pública foi o município de Campos (RJ). Na sequência vieram o município de Rio Claro (SP) em 1883 e o município de Porto Alegre (RS) em 1887, esta a primeira capital do país a dispor de energia elétrica para iluminação pública. Apenas em 1889 este serviço passou a ser oferecido em São Paulo (SP), Juiz de Fora (MG) e Curitiba (PR) (LIMA, 1984). Antes da implantação da rede pública elétrica as cidades brasileiras eram iluminadas, em sua grande maioria, a gás, e as fábricas eram movidas a vapor.

Enquanto a porção do território que viria a se tronar o que hoje conhecemos como região concentrada (SANTOS e SILVEIRA, 2010)20 e parte do litoral brasileiro, áreas mais dinâmicas do território, ganhavam densidade técnica, a partir da implantação de redes de eletricidade, usinas, indústrias, instalação de portos e ferrovias, nas demais regiões brasileiras a difusão dessas redes não se dava no mesmo ritmo e intensidade.

Durante este primeiro período a eletrificação do território nacional estava diretamente relacionada à cafeicultura, principal atividade econômica brasileira. Por isso o processo de eletrificação do sudeste brasileiro, em especial, do estado de São Paulo

foi mais intenso e teve maior abrangência, que nas demais regiões brasileiras.

Na área, que viria a se tornar o que hoje conhecemos como região Sudeste, o capital cafeeiro e a dinamização da economia ditaram o ritmo de avanço da eletrificação. O que explica também o fato de a expansão de energia elétrica no Brasil ter se dado, inicialmente, com base no capital nacional. Todas as usinas instaladas até a década de 1890 pertenciam a empresários brasileiros. De forma geral, eram pequenas empresas nacionais, de caráter local, com recursos limitados que lideravam o processo. Elas detinham as concessões públicas municipais para a distribuição e geração de energia, cujo mercado consumidor era ainda bastante reduzido (LORENZO, 1993; SAES, 2008).

No fim do século XIX, grupos estrangeiros passaram a se interessar pelo mercado consumidor de energia que nascia nas ex-colônias, em especial na América Latina. Foi neste período que surgiram as primeiras alianças entre bancos e empresas de energia elétrica, cuja finalidade era a busca por novos mercados. A indústria de energia elétrica já consolidada na Europa e nos Estados Unidos avançava para as ex- colônias.

Grandes grupos como a Light e a Bond & Share (AMFORP)21 passaram a concentrar os serviços de eletricidade nas mais diversas cidades brasileiras, em grande medida através da compra, aquisição e fusão com pequenas empresas nacionais do ramo. Primeiro foram as capitais, entre elas, Rio de Janeiro (RJ), São Paulo (SP) e Salvador (BA), em um segundo momento o processo de busca por novos mercados levou a interiorização da eletrificação em diversas regiões brasileiras (SAES, 2008).

Ainda que as empresas estrangeiras fossem detentoras de grandes parcelas do mercado consumidor de energia elétrica no Brasil, em termos técnicos, não houve a evolução dos microssistemas através da interligação das regiões de concessão. Os sistemas continuavam a ser locais e sem comunicação, inviabilizando a circulação de energia pelo território nacional. Somente em 1947, as estrangeiras Light e AMFORP, promoveram as primeiras interligações da rede, mas que ficavam restritas a manchas do território, cujo objetivo era melhorar o desempenho das próprias empresas, com a

21 A partir de 1927, com a aquisição da Companhia Brasileira de Energia Elétrica, a norte-americana Bond & Share (AMFORP), passa a atuar efetivamente no Brasil.

redução de custos (SAES, 2008).

Diante desta configuração ainda não podemos falar de um macrossistema elétrico nacional. O que havia eram diversas empresas espalhadas pelo território, em geral, com atuação local. Sequer podemos falar de uma integração desses sistemas locais de energia, já que havia pouca ou nenhuma interligação entre os diversos subsistemas de geração e distribuição de energia elétrica. O que existia eram sistemas técnicos menores, isolados e de atuação restrita e bem delimitada, cujo centro de comando era individual e representado pelas próprias empresas detentoras das concessões municipais para produção e distribuição de energia elétrica.

O planejamento desses microssistemas técnicos ficava a cargo da lógica de funcionamento e da busca pelo lucro dessas empresas. Sua expansão seguia a lógica de mercado e a energia elétrica figurava como uma mercadoria e não como um serviço público propriamente dito. Isso quer dizer que a expansão da oferta de energia pelo território dependia da possibilidade de obtenção de lucro, obedecendo à lógica empresarial e não ao princípio de garantia de acesso universal a um serviço essencial.

Os municípios tinham pouca ou nenhuma atuação no planejamento da expansão desses sistemas, embora fossem os responsáveis por regulamentar a atividade e dar a concessão. Os serviços de geração, transmissão e distribuição de energia eram organizados sob a forma de sistemas independentes e isolados e atendiam preferencialmente os grandes centros urbanos (PRAÇA e FURST, 2012).

Outro padrão importante assumido pelo processo de eletrificação brasileiro foi a concentração da fonte de geração elétrica hidráulica na matriz elétrica nacional já no início dos anos de 1900. O crescimento de empreendimentos hidráulicos de geração de energia elétrica coincidiu com a chegada da Light, entre 1900 e 1905, quando o percentual da eletricidade produzida por hidrelétricas, saiu de 51% para 81%, como mostra a Tabela 3 (GONÇALVES, 2007). Esse padrão, com pequenas variações, se manteve ao longo da história de constituição do macrossistema elétrico nacional até os dias atuais.

Tabela 3

Potência elétrica instalada por fonte, no Brasil, 1905-1930

Anos Térmica (MW) Térmica (%) Hidráulica (MW) Hidráulica (%) Total (MW) 1900 5,09 49 5,28 51 10,37 1905 6,67 15 32,28 85 44,93 1910 32,72 18 124,67 82 152,40 1915 51,10 16 258,69 84 309,79 1920 66,07 18 300,94 82 367,01 1925 90,60 18 416,87 82 507,48 1930 148,75 19 630,05 81 778,80

Organizado pela autora. Fonte: Gonçalves (2007).

1.3.2 O Estado brasileiro passa a promover a expansão do setor elétrico: bases para a emergência de um macrossistema

Em 1934, foi promulgado o Código de Águas22, principal marco na regulamentação do setor de energia elétrica no Brasil. Até então a atividade era regulamentada apenas pelos municípios e em alguns casos pelos estados. Com o advento do Código de Águas, a União passou a ser a proprietária das águas, além de ser a responsável pela regulamentação da atividade, ficando sob sua responsabilidade as autorizações, outorgas e concessões ou não de aproveitamentos das quedas d’água. As autorizações e concessões novas dos serviços de eletricidade ficavam restritas às empresas nacionais, sendo que às estrangeiras ficava resguardado o direito adquirido.

O Estado brasileiro passou a mostrar sua intenção de planejar, regulamentar e atuar diretamente no setor elétrico, estabelecendo assim uma nova lógica de funcionamento. Um novo projeto político, o do capital nacional, passou a pautar e a determinar a ação política e econômica do Estado brasileiro (GONÇALVES, 2007).

A nova legislação que reorganizava o setor elétrico nacional não era capaz de criar um macrossistema técnico, que integrasse todo o território nacional, mas centralizava as decisões políticas e uniformizava a regulamentação preparando o sistema para sua unificação física futura. O centro de comando político da atividade havia sido transferido da escala local para a nacional, já indicando uma tendência à centralização do poder.

22 Disponível em: http://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1930-1939/decreto-24643-10-julho-1934- 498122-publicacaooriginal-1-pe.html. Aceso em: 02 de fev. de 2014.

O Estado brasileiro, através da centralização do planejamento e da regulamentação do setor elétrico, buscava planejar outro setor, o industrial. Para tanto era necessário garantir o suprimento de energia segundo a lógica de expansão da indústria no Brasil e não segundo a lógica do lucro das empresas privadas de energia elétrica.

As empresas estrangeiras de eletricidade já nesta época faziam apenas investimentos cujo horizonte de retorno fosse imediato, isto é, as instalações só eram ampliadas se houvesse uma expansão da demanda que pudesse combinar o aumento da oferta, com a finalidade de garantir maior lucratividade (GONÇALVES, 2007).

Para garantir a expansão do fornecimento de energia e melhorar o desempenho dos subsistemas era necessário: investir na otimização da utilização da energia produzida, em especial através da promoção da interligação dos sistemas existentes; promover o aumento da capacidade instalada; uniformizar a organização da atividade; e centralizar o comando da produção, da transmissão e da distribuição de energia, racionalizando assim o uso dos recursos (LIMA, 1984; LORENZO, 1993).

As grandes empresas estrangeiras do ramo, embora acumulassem lucros vultosos, não investiam na proporção em que lucravam e as pequenas empresas do setor não tinham capital suficiente para fazer tais investimentos, além de serem incapazes de alavancar investimentos nas proporções necessárias. A expansão do setor elétrico brasileiro estava comprometida.

Ao Estado brasileiro restava a intervenção, através da criação de empresas públicas estaduais e federais capazes de sanar as deficiências do setor. E foi pensando em um planejamento no longo prazo que foi criado em 1952 o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE), que funcionou como uma agência estatal de financiamento e execução do Programa de Reaparelhamento Econômico Brasileiro.

A área de geração era a área que apresentava a maior demanda por investimentos de longo prazo e que demandava longos períodos de maturação, sendo o retorno do capital investido também de longo prazo. Os serviços de distribuição, que por sua vez, eram de maturação rápida e também demandavam investimentos menores, eram mais adequados para permanecer com a iniciativa privada.

O governo federal esperava a criação da Eletrobrás, empresa pública federal, que deveria ficar responsável pela gestão dos recursos e pela organização do sistema. Todavia, o projeto de lei de sua criação tramitou no Congresso Nacional por sete anos, de 1954 a 1961, quando a criação da estatal foi finalmente aprovada (ELETROBRAS, 1977; SILVA, 2011).

Durante toda a década de 1950 e 1960 houve uma inversão progressiva na participação do setor privado e do setor público nas atividades de geração de eletricidade. Em 1952 a participação de empresas privadas, no total de geração de energia elétrica, era de 6,8% do potencial total instalado, em 1962 passou a 31,3% e em 1965 chegou a 54,6% (SILVA, 2011).

Do ponto de vista físico, até o fim dos anos de 1950 e o início dos anos de 1960 os sistemas elétricos brasileiros eram, em sua maioria, de pequeno porte e isolados. Eles formavam um arquipélago de ilhas elétricas, com padrões técnicos bastante desiguais. A duplicidade de frequências utilizadas no país impedia que a integração regional dos serviços de eletricidade fosse realizada. Ainda que na região Nordeste, as áreas de distribuição tenham sido convertidas de 50 Hz para 60 Hz, em decorrência da interligação com a Usina de Paulo Afonso, sistemas elétricos importantes, como o da Light no Rio de Janeiro e o da Companhia Estadual de Energia Elétrica (CEEE) no Rio Grande do Sul, ainda operavam em 50 Hz (ONS, 2003).

Os governos estaduais, a partir da década de 1950, preocupados também com a crise de suprimento de energia, resultante da falta de investimentos da iniciativa privada, que foi agravada por condições hidrológicas negativas entre 1951 e 1956, decidiram criar empresas estaduais de energia elétrica, com o apoio do governo federal (RAMALHO, 2006). Os governos estaduais passaram também a planejar o setor de energia elétrica através da criação de planos estaduais de eletrificação que tinham como objetivos: a organização do setor a nível estadual, evitar racionamentos de energia e ampliar o fornecimento de energia. Uma das formas de se obter tais resultados foi promover a interligação dos sistemas elétricos isolados locais e regionais dentro dos estados através da ampliação da malha de transmissão de energia.

A Tabela 4 mostra o crescimento do número de empresas estaduais a partir da década de 1950 até o fim da década de 1960.

Tabela 4

As principais concessionárias públicas estaduais de energia elétrica no Brasil, criadas nas décadas de 1950 e 1960

Empresa Estadual Estado de Atuação Ano de Criação

CEMIG Minas Gerais 1953

COPEL Paraná 1953

ECELSA Espirito Santo 1953

CELG Goiás 1955

CEMAT Mato Grosso 1956

CEA Amapá 1956

CEMAR Maranhão 1959

COELBA Bahia 1960

CEAL Alagoas 1960

ENERGIPE Sergipe 1960

COSERN Rio Grande do Norte 1960

COELCE Ceará 1961

CEM Amazonas 1962

CEPISA Piauí 1962

CELPA Pará 1962

CELF Rio de Janeiro 1963 CELESC Santa Catarina 1963 CEEE Rio Grande do Sul 1963

SAELPA Paraíba 1964

CELPE Pernambuco 1965

ELETROACRE Acre 1965

CESP São Paulo 1966

CEB Brasília/ DF 1968

CERON Rondônia 1968

Organizado pela Autora. Fonte: Eletrobrás (1977), Lima (1984), Silva (2011).

A CEMIG (Companhia Energética de Minas Gerais), criada em 1953, foi uma dessas empresas estaduais criadas com o objetivo de executar o plano de eletrificação estadual. Inicialmente ela ficou responsável pela construção de novas usinas e de seus respectivos sistemas de transmissão, mas por fim acabou por ser essencial na promoção da interligação dos sistemas elétricos isolados do estado de Minas Gerais. Quando a CEMIG foi criada o predomínio da operação isolada era quase absoluto e as interconexões existentes funcionavam em caráter precário. O processo de construção e interligação de usinas empreendido pela CEMIG resultou na melhoria considerável dos serviços de energia elétrica em diversas áreas do estado (ONS, 2003).

Seguiram a iniciativa mineira, primeiro os estados de São Paulo, Rio de Janeiro, e Rio Grande do Sul, e até o fim da década de 1960, praticamente todos os estados brasileiros já haviam criado uma ou mais empresas estaduais que ampliavam a oferta

de energia com investimentos na geração e promoviam a interligação interna e a expansão da malha de transmissão estadual.

Em 1957 foi criada, sob iniciativa do governo federal, FURNAS. Empresa pública federal que tinha como acionistas o próprio governo federal, os estados de São Paulo e Minas Gerais, além da Light, da CPFL e da AMFORP. Inicialmente, seu objetivo era a construção de uma usina hidrelétrica no rio Grande, entre São Paulo e Minas Gerais, com o objetivo de ampliar a oferta de energia na principal região industrial do país, o Sudeste. No entanto, Furnas acabou por liderar todo o processo de organização dos sistemas de engenharia elétricos na região concentrada (SANTOS e SILVEIRA, 2010), promovendo assim sua interligação (RAMALHO, 2006).

Até 1960, todo o planejamento e a organização do setor de energia elétrica no Brasil havia ficado sob responsabilidade do Ministério da Agricultura. Em 1960, foi criado o Ministério de Minas e Energia (MME)23, que começou a funcionar em 1961. A concessão e fiscalização dos serviços concedidos de energia elétrica, bem como, o planejamento, a coordenação e execução dos estudos hidrológicos em todo o território nacional passaram a ser de inteira responsabilidade do MME (ELETROBRAS, 1977).

A Eletrobrás, finalmente criada em 1961, se constituiu enquanto uma holding, um núcleo de um conjunto de concessionários que contavam com certo grau de autonomia administrativa. Ela ficou responsável por gerir enormes recursos, tornando-se a principal agência financiadora do setor de energia elétrica, tanto para suas empresas controladas e associadas, como para outras empresas do setor. O Sistema Eletrobrás crescia e o controle estatal do setor também.

O que se percebe a partir da década de 1960 é que o sistema foi se tornando mais integrado e ganhando característica de um sistema técnico maior. Os sistemas antes isolados passaram a ser interligados a nível estadual e regional. O Estado brasileiro, através da Eletrobrás e das empresas públicas federais e também das estaduais passou a ser o grande construtor desse sistema.

Durante toda a década de 1960 o governo federal empreendeu diversos esforços para a expansão e o aprimoramento do Sistema Elétrico Brasileiro (SEB), entre eles, a implantação de usinas de grande porte localizadas distante dos centros de carga e a

construção de extensas linhas de transmissão em alta e extra-alta tensão (PRAÇA e FURST, 2012). Entretanto, era necessário interligar os diversos sistemas isolados, para garantir um melhor aproveitamento da energia produzida e evitar crises de abastecimento.

Para tanto, a unificação da frequência era essencial e ela foi feita pela Eletrobrás, a partir da década de 1960. A frequência foi fixada em 60 Hz para todo o território nacional, vencendo os fornecedores de equipamentos norte-americanos que produziam com base na frequência de 60 Hz (ELETROBRAS, 1977). O processo de unificação da frequência durou 15 anos. De acordo com Praça e Furst (2012) este processo foi de fundamental importância, pois viabilizou as futuras interligações dos sistemas de transmissão, que até aquele momento haviam sido expandidas apenas em caráter local ou no caso do Sudeste em caráter regional.

Em 1967 através de um decreto federal24 foi criado o Sistema Nacional de Eletrificação. O Decreto recomendava também que os governos estaduais passassem a promover seus serviços de eletricidade através de uma única empresa de economia mista. Essa normativa levou os estados a fundirem suas diversas empresas de economia mista e a oferecer um serviço público de energia elétrica em todo o território estadual, esse foi um passo importante para a formação dos sistemas regionais posteriormente (ELETROBRAS, 1977).

Foram criadas também ao final da década de 1960 e início da década de 1970 diversas empresas subsidiárias da Eletrobrás, elas tinham jurisdição regional e eram controladas pela Eletrobrás. O território brasileiro foi dividido em quatro regiões geoelétricas, cada uma delas correspondia à área de atuação de cada uma das subsidiárias da Eletrobrás.

As empresas subsidiárias criadas foram: a Chesf, que ficou responsável pela região Nordeste; Furnas, que ficou responsável pela região Sudeste, pelo Distrito Federal e parte dos estados de Goiás e do Mato Grosso; a Eletrosul, que ficou responsável pela região Sul e a Eletronorte, que ficou responsável pela região Norte e parte dos estados de Goiás e Mato Grosso (PRAÇA e FURST, 2012). Essas empresas tinham como objetivo planejar, construir e operar sistemas elétricos de grande porte,

superiores às dimensões de um só estado (ELETROBRAS, 1977). Nesse momento podemos falar de sistemas elétricos cuja operação tinha alcance ainda muito limitado, mas que já alcançava a escala regional em alguns casos, como no Sudeste.

Figura 4

Esquema da estrutura política do Sistema Elétrico Brasileiro

Organizado pela autora. Fonte: Eletrobrás (1977), Lima (1984), Silva (2011).

O crescimento do sistema se deu ao longo dos anos 1960 e 1970 de forma gradual. A ampliação da oferta de energia era feita através da construção de grandes obras de infraestrutura que contavam com financiamento proveniente de empréstimos no exterior. No entanto, a expansão da rede elétrica ainda se dava de forma regional sem uma visão sistêmica em âmbito nacional (PRAÇA e FURST, 2012). As linhas de transmissão de caráter regional continuaram sendo construídas em níveis de tensão muito próximos e sem uma padronização, variando de 230KV a 500KV, o que dificultou a viabilização de soluções menos custosas para a expansão das interligações regionais