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2. ROMANTISMO: UM PERÍODO NOTÁVEL NA LITERATURA BRASILEIRA

3.3 Rubí: uma narrativa em três suportes

3.3.1 A construção de Rubí

Rubí é originada em uma história em quadrinhos dos anos 1960, criada por Yolanda

Vargas Dulché, autora mexicana considerada “la reina de las historietas”. Dulché nasceu na Cidade do México, em 1926, e trabalhou inicialmente como cantora de rádio, para ajudar financeiramente sua família, de classe média baixa. Aos 16 anos começou a publicar contos no jornal El Universal e reportagens no jornal Esto, antes de trabalhar na editora Cadena García Velasca. Ela e seu marido Guillermo de la Parra fundaram em 1957 a Editorial

Argumentos, depois denominada Grupo Editorial Vid. O casal também foi dono de um hotel e de oficinas tipográficas.

Além de histórias em quadrinhos, a autora escreveu peças de teatro e ganhou diversos prêmios em seu país, como o de melhor conto em um concurso organizado pela Universidad Nacional Autónoma de México, em 1939; o Prêmio Ariel pelo melhor argumento original (Cinco rostros de mujer), outorgado pela Academia Mexicana de Ciencias y Artes Cinematográficas, em 1948; a medalha Presidente Miguel Alemán, por seu trabalho como escritora, em 1990; e um reconhecimento ao seu impulso à história em quadrinhos mexicana, na Primera Convención Nacional de Cómics y Ciencia Ficción del Distrito Federal, em 1997. Em sua homenagem, a Editorial Vid criou em 2001 o Premio de Novela Yolanda Vargas Dulché.

Vargas Dulché morreu em 1999, na Cidade do México. Em 2006, o historiador do cinema mexicano David Ramón publicou um livro sobre ela chamado La reina de las

historietas de México.5 Em 2012 a autora foi homenageada no Museo de Arte Popular da

Cidade do México, com uma exposição sobre sua vida e suas obras, chamada “Yolanda Vargas Dulché: Contadora de historias”, que mostrava alguns números de suas revistas em quadrinhos, materiais de seu acervo pessoal, fotos e figurinos usados nas adaptações de suas histórias. A exposição visava ressaltar sua importância para a cultura e a arte popular mexicana, reafirmando seu título de “Reina da las historietas”.

As revistas publicadas por Vargas Dulché eram bastante acessíveis financeiramente e o interesse das classes populares nelas era tão grande que chegaram a ser consideradas relevantes para a diminuição do analfabetismo no México. Em 1995 elas deixaram de ser publicadas, mas entre 2002 e 2008, após a morte de Vargas Dulché, algumas voltaram a circular em novas edições, inclusive Rubí.

Rubí foi publicada em dezoito números semanais, com trinta e duas páginas cada um.

Sua estrutura era semelhante à de um folhetim, com narrativa evoluindo quadro a quadro e com o necessário suspense ao final de cada fragmento, para manter o interesse do público e as vendas. No entanto, na história em quadrinhos, como é sabido, contamos com a linguagem não-verbal para auxiliar a narração.

As ilustrações, em preto e branco, foram feitas por Antonio Gutiérrez, que trabalhou em diversas outras revistas da Editorial Argumentos. Ele nasceu em 1920, em San Luis Potosí e iniciou sua carreira muito jovem desenhando quadrinhos. Começou a estudar para se

5 RAMÓN, David. La reina de las historietas de México. México: Sociedad General de Escritores de México

desenvolver na profissão quando se mudou para a Cidade do México, onde teve aulas ao lado de consagrados artistas das histórias em quadrinhos mexicanas. A marca de seus desenhos era o realismo, como podemos observar em Rubí, quando ele criou a imagem de uma personagem admirada pela beleza. Depois de anos trabalhando com quadrinhos, foi pioneiro da animação no país. Morreu em 2006 na Cidade do México.

Já as capas das revistas Rubí eram coloridas e desenhadas por Luis Rey, considerado uma lenda das histórias em quadrinhos mexicanas. Ele era espanhol e viveu em Cuba antes de chegar à Cidade do México em 1961, quando começou a trabalhar fazendo as capas de diversas revistas de Lágrimas, risas y amor e de outras da mesma editora. Morreu em 2000.6

Figura 1: Imagem e ficha técnica da telenovela Rubí, de 1968

Após o grande sucesso da história em quadrinhos, a emissora de televisão Televisa fez a primeira versão de Rubí em formato de telenovela, em 1968. Foi exportada para diversos países, sob o acompanhamento atento da autora Vargas Dulché, que inclusive opinou sobre a escolha do elenco, especialmente da atriz que interpretaria Rubí, que nessa primeira versão foi Fanny Cano.

6 Fonte: http://www.cineyalgomas.com.mx/noticias/187-

DOMINGO+13+DE+DICIEMBRE+EN+EL+MUSEO+DE+LA+CARICATURA+E+HISTORIETA.html Acesso em 06 de fevereiro de 2015.

O filme Rubí estreou em 1971, colhendo os frutos do êxito da telenovela. Foi dirigido por Carlos Enrique Taboada e protagonizado por Iran Eory, atriz iraniana que havia trabalhado no Marrocos e na Espanha e estava fazendo seu primeiro trabalho no México. Ela foi convidada para o papel pela própria Vargas Dulché, já que se destacava por sua beleza diferente.

Figura 2: Cartaz do filme Rubí (1971)

Em relação ao contexto social mexicano da época, as décadas de 1960 e 1970 não foram tranquilas. Em 1968, justamente o ano da exibição da primeira versão da telenovela

Rubí, ocorreram os Jogos Olímpicos na Cidade do México, o que provocou diversos

protestos, especialmente promovidos por estudantes universitários, considerando que o país vivia extremas desigualdades sociais.

Apenas dez dias antes da abertura das Olimpíadas, em 2 de outubro de 1968, aconteceu o Massacre de Tlatelolco, no qual centenas de estudantes foram mortos pelas forças armadas mexicanas e mais de mil foram presos. Outros protestos também ocorriam no mesmo momento histórico em diversos lugares do mundo, como Paris e Praga, assim como nos Estados Unidos e em outros países latino-americanos. É importante lembrar que durante esses anos o Brasil vivia uma ditadura militar.

Nessa época surgiram guerrilhas urbanas em diversas cidades do México. Em 1971, ano do lançamento do filme Rubí, aconteceu El Halconazo, a violenta repressão a uma manifestação estudantil por um grupo paramilitar (Los Halcones) a mando do Estado, que resultou na morte de aproximadamente 120 pessoas, entre elas um adolescente de 14 anos.

No entanto, as temáticas políticas e sociais não aparecem em nenhum momento em

Rubí, mostrando que as telenovelas e filmes melodramáticos talvez não fossem os suportes

convenientes para esse tipo de reflexão e que provavelmente não era de interesse dos meios de comunicação despertar a consciência crítica da população em relação a esses fatos.