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1.3 RELAÇÕES INTERNACIONAIS: COOPERAÇÃO E

1.3.1 A cooperação nas relações internacionais

Grotius em seus Prolegômenos ao Direito da Guerra e da Paz dava sinais de que acreditava na nobreza do homem, de que o homem, por ser um animal de natureza superior tem toda condição de diferenciar aquilo que é iníquo do que é justo. Discordava do entendimento de que o homem é um ser egoísta, disposto somente para suas próprias utilidades.63

Grotius não concordava com o alegado justo temor, para justificar os conflitos. Em sua opinião, dentro dos limites da inteligência humana, com a capacidade de apreciação das coisas que o homem tem, ele pode conformar um juízo sadio, que não o permita se deixar vencer pelo temor nem pelas seduções dos prazeres presentes ou ainda por um

61 Como ocorreu na guerra que envolveu os Estados Unidos e o Vietnã com os grupos

contrários à guerra. ENTELMAN, 2005, p. 80.

62 ENTELMAN, 2005, p. 81.

63 Prolegômenos de GROTIUS, Hugo. O direito da guerra e da paz. v. 1. Ijuí: Unijuí, 2004.

ímpeto temerário. Pois o que está contra referido juízo, é contrário à natureza humana.64

Locke, que além de identificar o estado de natureza como um estado de igualdade e liberdade, como já dito, o diferencia do estado de guerra, afirmando que um está tão distante do outro “como um estado de paz, boa vontade, assistência mútua e preservação está de um estado de inimizade, malícia, violência e destruição mútua”65.

Angell, no início do século XX, também vai expor suas ideias a favor do homem. Angell opôs-se ferrenhamente às ideias realistas de que à guerra, traria inúmeros benefícios, como geração de riquezas, possibilidade de confisco ou de ganhar indenizações, crescimento da força militar, etc.

Rebatendo um a um os argumentos realistas, o autor chega à conclusão de que os alegados benefícios acarretados pela guerra não passam de uma grande ilusão.66 Angell admite que o homem possa, em tempos mais primitivos, ter sido detentor de uma natureza mais belicosa, porém, assevera que não há que se falar em imutabilidade da natureza humana, muito pelo contrário, crê que o homem pode transformar-se, especialmente, quando envolvido pelos efeitos de um desenvolvimento de cunho mecânico e social, convertendo-se, desse modo, “em um conjunto de objetivos cada vez menos destrutivos e antieconômicos, facilitando a cooperação dos homens na luta contra o ambiente, condição da sua sobrevivência e do seu progresso”67.

Angell eleva seu entendimento de que o indivíduo não é imutável, para o âmbito dos Estados. Conclui que eles também podem evoluir a ponto de prescindirem das formas violentas de resolver conflitos, sobretudo a guerra, especialmente se conscientizarem-se das desvantagens da mesma.68

O paradigma realista que firma suas bases nas afirmativas que as Relações Internacionais são por natureza conflitivas, traduzindo-se em atos de conflito e poder, foi desacreditado pelo interdependentismo que demonstrou que essas relações poderiam ser de caráter predominantemente cooperativo.69

64 Prolegômenos de GROTIUS, 2004, p. 40. 65 LOCKE, 1978, p. 41.

66 ANGELL, Norman. A grande ilusão. Brasília: Universidade de Brasília, Instituto de

Pesquisa de Relações Internacionais, 2002.

67 ANGELL, 2002, p. 167. 68 ANGELL, 2002, p. 167-183. 69

Nye esclarece seu entendimento sobre política internacional, afirmando que atualmente, trata-se de um sistema anárquico composto por Estados relativamente coesos, porém sem poder superior.70 Na concepção do autor, há duas tradições teóricas acerca do tema: o realismo e o liberalismo, apontando como seus respectivos expoentes Thomas Hobbes e John Locke.

Nye analisou três grandes conflitos internacionais: a Guerra do Peloponeso e as duas Grandes Guerras Mundiais. A análise desses conflitos foi realizada com uma espécie de paralelismo entre as correntes realista e liberal, sendo que o ponto destacado nesse paralelismo foi a visão que cada uma dessas correntes detinha sobre o grau de inevitabilidade dos referidos conflitos. Em todos os eventos, ao contrário das análises dos realistas, Nye chega à conclusão que poderiam ter sido evitadas.71 Em sua opinião, nas situações em que pareça que a guerra é inevitável, há que se perceber que “existem margens de liberdade e as decisões humanas podem, por vezes, evitar os piores acontecimentos”72.

A inclinação interdependentista do autor o leva a crer que não obstante haver uma estrutura geral de anarquia nos assuntos internacionais, que pode até mesmo por vezes encorajar a guerra, a cooperação é sempre uma possibilidade.73

Para Entelman, após a Segunda Guerra Mundial começaram a intensificar-se as análises teóricas sobre os conflitos internacionais, e neste viés, iniciou-se uma diferenciação entre conflitos, de forma que a alguns se atribuiu caráter de objetivo único e, aos demais, caráter de objetivos múltiplos. Esta distinção entre os conflitos internacionais levou a pensar que os primeiros, conflitos de objetivo único, resultariam invariavelmente numa situação de ganhador-perdedor, ou seja, uma parte ganharia, e necessariamente, a outra perderia, enquanto que na presença de conflitos com objetivos múltiplos, ambas as partes poderiam obter ganhos.

70 O autor informa que ao longo dos séculos houve três formas básicas de política mundial

(somente se pode falar em política internacional a partir da formação do Estado Moderno): um sistema de império mundial (um governo dominante sobre a maior parte do mundo); um sistema feudal (as obrigações políticas eram, em grande parte, determinadas pelo o que acontecia aos hierarquicamente superiores); e por fim o sistema anárquico de estados.

71 NYE, Joseph. Compreender os conflitos internacionais: uma introdução à Teoria e à

História. Tradução de Tiago Araújo. Lisboa: Gradiva. 2002.

72 NYE, 2002, p. 23. 73

A contribuição de Entelman, foi no sentido de expressar duas de suas convicções: a de que era possível tratar a todos os conflitos com a mesma atitude, com a busca de soluções satisfatórias para todos; e que não era inevitável produzir um ganhador e um perdedor apenas pelo fato de tratar-se de uma situação de objetivo único. Na verdade, imaginar que ambas as partes esperam desse objetivo a satisfação de valores absolutamente idênticos, ocorre somente quando não se investiga com profundidade três elementos que fazem parte dessa relação de conflito: valores, interesses e objetivos. Entelman conclui então que, buscar uma solução de forma criativa e cooperativa, supõe uma atitude, um estado de ânimo, ou melhor, uma mentalidade.74