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A criação de grupos de trabalho e o planeamento da exposição

Primeira Parte

2. Concepção e organização da comissão portuguesa no IV Centenário 1 O papel de Oliveira Martins

2.2. A organização da comissão representante de Portugal no IV Centenário

2.2.2. A criação de grupos de trabalho e o planeamento da exposição

Desde o início que o rigor metódico reinou no seio da comissão. Uma das medidas iniciais foi a criação de grupos de trabalho, a saber, Ramalho Ortigão e Artur Baldaque da Silva ficaram responsáveis por reunir «objectos cerâmicos e ilustrativos da história marítima»80; Lino da Assunção e Rafael Bastos ficaram encarregues da parte que dizia respeito à «monumenta bibliográfica»81; a Teixeira de Aragão e Teófilo Braga competia a parte etnográfica. Mais tarde estes grupos seriam remodelados, dando lugar a novas nomenclaturas, e tendo como membros outros nomes. É importante ainda salientar que os grupos de trabalho trocavam impressões entre si e era prática comum a discussão das escolhas de cada grupo e muitas vezes existia espaço para o aconselhamento. Na sua fórmula final apresentaram-se as secções de trabalho com a seguinte configuração: Marítima; Documentária e Bibliográfica; Etnografia Americana; e Arte ornamental82. Nos próximos parágrafos iremos descrever as secções e os trabalhos que competiam a cada uma destas, assim como os membros integrados nas mesmas.

Secção marítima

A memória histórica não conservou muitas das informações relativas a este grupo de trabalho. Do número total de possíveis participantes nestes trabalhos podemos apenas resgatar os nomes de Ramalho Ortigão e Baldaque da Silva. No entanto,

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B.A.C.L., Cota 59B - Comissão Portuguesa da Exposição Colombina, Actas das sessões da

Comissão Portuguesa da Exposição Colombina, Lisboa, [1891-1893], sessão de 19 de Fevereiro de 1892.

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B.A.C.L., Cota 59B - Comissão Portuguesa da Exposição Colombina, Actas das sessões da

Comissão Portuguesa da Exposição Colombina, Lisboa, [1891-1893], sessão de 19 de Fevereiro de 1892.

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B.A.C.L., Cota 59B - Comissão Portuguesa da Exposição Colombina, Actas das sessões da

Comissão Portuguesa da Exposição Colombina, Lisboa, [1891-1893], sessão de 19 de Fevereiro de 1892.

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suspeitamos que mais nomes terão colaborado, nomeadamente alguns marinheiros83, mas não foi possível encontrar registo de tais participações. Sabemos que resultou dos trabalhos deste grupo um catálogo onde podemos observar uma breve descrição de quinhentos e dois objectos e documentos, divididos em várias áreas que passamos em seguida a enumerar: navegações, descobrimentos, conquista de portugueses, quadros, cromo-litografias, gravuras, modelos de barcos de pesca e jangadas, armações e outros aparelhos de pesca, e trabalhos de marinha. Todo este material foi exposto em Madrid. Secção documentária e bibliográfica

José Ramos Coelho, Xavier da Cunha e Rafael Eduardo de Azevedo Basto compunham a equipa de trabalho que tinha como missão a investigação de documentação relativa à época dos descobrimentos. Para esse efeito deveriam procurar em arquivos e bibliotecas, fossem elas públicas ou privadas, dando, contudo, um maior destaque à Torre do Tombo face aos restantes centros de documentação. A publicação

Alguns Documentos do Archivo Nacional da Torre do Tombo acerca das Navegações e Conquistas Portuguesas Publicados por Ordem do Governo de Sua Majestade Fidelíssima ao Celebrar-se a Commemoração Quadricentenaria do Descobrimento da América, que abordaremos na terceira parte deste estudo contém apenas uma parte dos

documentos analisados por este grupo de trabalho. Os documentos que ficaram de fora do corpus escolhido para figurar nesta obra tinham de ser justificados. Contudo, não nos foi possível encontrar essas explicações84, nem a lista dos mesmos documentos colocados de parte.

Secção de etnografia americana

Este grupo de trabalho foi o único que manteve a sua estrutura inicial. Tendo como principal cérebro Teixeira de Aragão que, durante a execução de trabalhos, procurou entre as colecções públicas e privadas os materiais etnográficos a serem expostos no certame de Madrid. Nas actas são raras as menções ao decurso destas actividades, algo que levanta algumas dúvidas em relação à escolha de determinados artefactos. Segundo as informações oficiais, foram levados para Madrid quatrocentos e

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A participação de alguns marinheiros está documentada na obra de Rafael Bordalo Pinheiro, embora seja a única indicação que podemos resgatar. Vide O António Maria, Ano VIII, N.º 366, Lisboa, 22 de Dezembro de 1892, pp. 4-6.

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cinquenta e sete artefactos85 relativos ao tema etnográfico, divididos nas categorias de armas e instrumentos, tecidos, ornatos de gentios, máscaras, cerâmica, e vários outros artefactos. Estes eram oriundos de várias partes do continente americano e a sua trajectória até Portugal varia em muitos dos casos.

O papel de Teófilo Braga neste grupo de trabalho é omisso, não existindo, para além da menção nas actas, qualquer tipo de associação deste académico a esta secção. Secção de arte ornamental

Este grupo de trabalho foi formado por Ramalho Ortigão, Conde de Ficalho, Teixeira de Aragão. Durante meses foram responsáveis pela recolha de distintos objectos, desde jóias a loiças, passando por fotografias e mobiliário86. O objectivo era recolher o maior número de objectos que permitissem ilustrar o passado artístico de Portugal, com especial atenção à época dos descobrimentos. No período em que durou esta recolha de objectos foram várias as propostas, pois a oferta era vasta. Relembramos que a comissão tinha permissão de escolher de todos os museus pertencentes ao reino87 peças que julgassem relevantes para levar para a exposição. De todos os objectos observados existiram alguns que se destacaram dos demais, devido à sua excentricidade ou ao intenso debate que suscitaram entre a comissão88. Todo o material recolhido para ser exposto em Madrid ficou guardado no edifício da Academia das Ciências.

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Este é o número de objectos que figuram no catálogo. Por falta da existência de guias de transporte, ou outro documento que enumere um a um todos os artefactos expostos na parte etnográfica, assumimos como uma preciosa informação a enumeração que existe no catálogo. Veja-se A. C. Teixeira de Aragão,

Catalogo dos objectos de arte e industria dos indígenas da América que pelas festas comemorativas do 4.º Centenario da sua descoberta a Academia Real das Sciencias de Lisboa envia à exposição de Madrid,

separata de Centenário da Descoberta da América. Memorias da Comissão Portugueza, [Lisboa, Na Typographia da Academia Real das Sciencias de Lisboa, 1892].

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O mobiliário exposto possuía uma dupla finalidade, ao mesmo tempo que constituía um objecto decorativo, servia, também, como plataforma expositiva dos objectos artísticos, produzindo-se, desta forma, aos olhos dos visitantes, um maior impacto visual da exposição. No entanto, nem todo o mobiliário exposto serviria como suporte, ficaria isento desta dupla funcionalidade o mobiliário do reinado de D. Manuel I. A maioria do mobiliário exposto era oriunda do Museu Nacional de Arte Antiga. Cf. B.A.C.L., Cota 59B - Comissão Portuguesa da Exposição Colombina, Actas das sessões da Comissão

Portuguesa da Exposição Colombina, Lisboa, [1891-1893], sessão de 22 de Fevereiro de 1892.

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Vide Joaquim de Araújo, op. cit., pp. 4-5.

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No decorrer das sessões preparatórias da representação portuguesa para Madrid, surgiu por parte de Agostinho de Ornelas a menção de uma janela da casa onde supostamente Cristóvão Colombo teria habitado; tal indicação despertou em Ramalho Ortigão a ideia de a expor no espaço reservado a Portugal na exposição Histórico-Americana. Depois de intensas conversas, onde se discutiu a autenticidade ou não da casa enquanto habitação de Colombo, foi incumbida a Agostinho de Ornelas a missão de trazer para o continente a janela, mas rapidamente se desistiu dessa ideia, passando-se a propor a salvaguarda daquele património. Assim, a solução seria fazer-se um molde da mesma para ser exposto em Madrid. Porém, tal não aconteceu. Na origem de todo o empenho em relação à janela estiveram as dúvidas de Harrisse em

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Uma das principais preocupações da comissão desde o início foi a questão do espaço disponível para a apresentação dos artefactos e documentos que compunham o acervo da exposição portuguesa. Ramalho Ortigão liderou essas questões desde o primeiro momento, insistindo várias vezes na necessidade de se saberem as medidas exactas do espaço cedido a Portugal. Estas preocupações parecem indicar uma certa pré- concepção da exposição portuguesa na sua mente, isto porque são visíveis as indicações dadas relativas a apontamentos decorativos a serem montados em Madrid. Aliás é o próprio que sugere a agregação de Rafael Bordalo Pinheiro à comissão tendo já em mente o seu nome para a decoração das salas portuguesas. Devemos ainda salientar que quando surgiu a oportunidade de um membro da comissão portuguesa ir escolher as salas, o nome apontado de imediato foi o de Ramalho Ortigão. Na segunda parte deste estudo iremos retomar a questão do espaço português no IV Centenário, expondo de uma forma aprofundada a complexidade e a importância deste para o discurso português.