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Dinâmicas grupais e gestão de orçamentos

Primeira Parte

2. Concepção e organização da comissão portuguesa no IV Centenário 1 O papel de Oliveira Martins

2.2. A organização da comissão representante de Portugal no IV Centenário

2.2.4. Dinâmicas grupais e gestão de orçamentos

O apoio do governo alargou-se para além do reconhecimento da comissão como representante oficial de Portugal nos festejos colombinos, existindo, também, um apoio financeiro por parte do Estado. Segundo as fontes, esse apoio terá sido de dez contos de réis95, mais uma segunda tranche de cinco contos de réis e duzentos96 para se fazer face a derrapagens orçamentais. Sabemos através das fontes que nem todos os elementos envolvidos no destino de Portugal estavam de acordo em relação à verba atribuída à comissão, chegando mesmo a existir algumas vozes a manifestarem-se publicamente perante aquilo que designavam como uma «excessiva» verba para a comemoração do Centenário de Colombo. Na verdade, os problemas financeiros e os debates em torno destes, que são visíveis através da correspondência trocada entre o Ministério do Reino e a comissão portuguesa, foram uma constante durante todo o tempo em que a comissão se manteve no activo.

Infelizmente não possuímos todas as informações relacionadas com os gastos e receitas da comissão97, contudo aquelas que possuímos permitem-nos esboçar alguns

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Cf., B.A.C.L., Cota 59B - Comissão Portuguesa da Exposição Colombina, Actas das sessões da

Comissão Portuguesa da Exposição Colombina, Lisboa, [1891-1893], sessão de 5 de Novembro de 1891.

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Vide Diário da Câmara dos Dignos Pares do Reino, sessão n.º 47, de 18 de Março de 1892, projecto de lei n.º 32, p. 13.

96

Vide Diário da Câmara dos Dignos Pares do Reino, sessão n.º 31, de 27 de Junho 1893, p. 287 [Art. 66 - Autorização de créditos especiais para pagamentos de despesas de exercício de 1892-1893].

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Mesmo contando com um grande número de informações relativas às finanças da comissão portuguesa, seria importante contarmos com os recibos que provassem os gastos elevados, mas muitos deles perderam-se, possivelmente para sempre, existindo apenas alguns exemplares que nos permitem cruzar informações e conferir os valores indicados.

traços gerais das despesas. Ora durante os meses que decorreram entre a criação da comissão e o mês de Outubro gastaram-se cerca de três contos de réis e duzentos e vinte e nove98, este valor já significava uma derrapagem orçamental de duzentos réis, uma vez que no ofício enviado para o Ministério do Reino em 7 de Março de 1892, a comissão portuguesa orçamentara o custo dos trabalhos em apenas três contos de reis99. Entre estas despesas constam os gastos com material e mão-de-obra e ainda as despesas com alguns grupos de trabalho, porém não podemos dar certezas em relação ao carácter absoluto, isto é, poderão ter existido gastos que por alguma razão não se conservaram nos registos. Assim sendo devemos ser cautelosos quando à apresentação deste resultados, salvaguardando sempre a fragilidade das fontes e do nosso conhecimento. Ainda no decorrer deste estudo voltaremos à questão financeira, agora, dedicamos os seguintes parágrafos às questões de ordem de recursos humanos da comissão, no que diz respeito à sua relação interna, tendo como focalização do nosso interesse as relações de poder e às relações interpessoais.

Quando se lê o artigo A commissão Portuguesa da Exposição Colombina, da autoria de Joaquim de Araújo, não se consegue discernir as dinâmicas do grupo, mas através das actas temos uma outra visão - uma visão de um grupo coeso, cioso das suas responsabilidades, aberto a debates e sugestões, contudo pode-se destacar a presença de dois líderes.

O presidente oficial da comissão era o Conde Ficalho. Contudo, a conduta de Ramalho Ortigão durante as várias secções preparatórias da presença portuguesa em Madrid, revelou um espírito de liderança, através da sua postura entusiasta, irrequieta, sempre disposto a avançar com novas ideias e sendo capaz de reunir o apoio de todos em torno delas. Sabe-se, através das actas, que Ramalho Ortigão foi agregado à comissão através de uma proposta apresentada logo na primeira sessão, ficando responsável pela recolha de artefactos relativos à história marítima100.

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Vide, B.A.C.L., Cota 60B - Comissão Portuguesa da Exposição Colombina, Livro de Despesas e

Receitas, Lisboa, [1891-1893].

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Do documento enviado ao Ministério do Reino constam os seguintes valores: Secção Marítima 500,00; Secção Etnográfica 600,00; Secção Artística 400,00; Secção Bibliográfica 1,000,00; Expediente 500,00; apresentando-se um montante total de 3,000,00. Ainda neste documento a comissão salientou que estes valores eram apenas referente aos trabalhos realizados em Lisboa e que não poderia ainda apontar um orçamento para os trabalhos a serem realizados em Madrid, assina este documento Manuel Pinheiro Chagas. Vide, B.A.C.L., Cota 129B - Comissão Portuguesa da Exposição Colombina, Livro de Ofícios, Lisboa, [1891-1893], oficio n.º 12, 7 de Março de 1892.

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Cf., B.A.C.L., Cota 59B - Comissão Portuguesa da Exposição Colombina, Actas das sessões da

Graças às actas foi ainda possível obter outras informações pertinentes que não se conservaram noutros documentos, como o estreito contacto entre a comissão espanhola e a comissão portuguesa. Infelizmente o material disponível nas actas, embora bastante relevante, não nos permite ir além de uma análise descritiva e coloca- nos mais interrogações do que respostas.

No dia 31 de Março de 1892, alguns elementos da comissão espanhola visitaram a comissão portuguesa com o objectivo de verificar como estavam a correr os preparativos para o Centenário101. Os elementos da comissão portuguesa aproveitaram esta ocasião para colocar algumas questões relacionadas com o espaço físico que iria receber a exposição dos objectos enviados por Portugal. As actas revelam ainda um desejo por parte da comissão espanhola para ser parceira da portuguesa. E, segundo as informações disponíveis, terá mesmo existido a agregação de espanhóis nos grupos de trabalho da comissão portuguesa102. Contudo, não possuímos os seus nomes destes elementos, nem encontramos nas actas menções aos mesmos.

Este acontecimento leva-nos a questionar o real impacto desta medida nos trabalhos da comissão portuguesa. Não nos parece que estes novos elementos adicionados aos grupos de trabalho possuíssem um resultado efectivo. Pelo contrário, parece-nos mais uma medida de cariz cordial, reflexo do bom entendimento entre as duas nações ibéricas. Porém, devemos colocar outras questões. Haveria um sigilo em relação ao discurso português? Terá a comissão portuguesa mantido os novos elementos à parte por razões de espionagem? Não acreditamos que estas tenham sido as razões para a inexistência de mais informações relativamente aos espanhóis agregados aos grupos de trabalho da comissão portuguesa. Assim, reiteramos a ideia anteriormente exposta de que constitui um gesto meramente de ordem diplomática e sem qualquer repercussão a nível dos trabalhos da comissão portuguesa.

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Mendez Vigo (Embaixador de Espanha), Diego de la Cruz Quesada, Nicolau de Goyri, J. Castro, são alguns dos nomes dos espanhóis que marcaram presença na sessão de 31 de Março de 1892. B.A.C.L., Cota 59B - Comissão Portuguesa da Exposição Colombina, Actas das sessões da Comissão

Portuguesa da Exposição Colombina, Lisboa, [1891-1893], sessão de 31 de Março de 1892.

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Relembramos que este carácter de proximidade entre Portugal e Espanha relativamente ao IV Centenário foi uma constante desde 1888. Com efeito, podemos considerar que a presença de um contacto entre membros das duas comissões, embora de uma forma quase protocolar, é um sinónimo da grande cumplicidade que se verificou ao longo dos festejos.