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2 AS VARIÁVEIS DA DEMOCRACIA

2.1. A DEMOCRACIA E SUAS FORMAS

2.1.2. A Democracia Representativa

A democracia representativa tem sua origem no sistema liberal clássico e trabalha com a dualidade representante e representado. Isso porque, foi com o Estado liberal, nascido

17 Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante: I - plebiscito; II - referendo; III - iniciativa popular.

18 Acerca da temática ver: GARCIA, Alexandre Navarro. Democracia semidireta: referendo, plebiscito,

iniciativa popular e legislação participativa. Revista de Informação Legislativa. Brasília, a. 42, n. 166, abr/jun,

2005, p. 9/22. MENDES, Denise Cristina Vitale Ramos. Representação politica e participação: reflexões

sobre o déficit democrático. Revista Katál. Florianópolis, v.10, n.2, p. 143/153. Jun/Dez, 2007. MENDES,

Denise Cristina Vitale Ramos; FARIA, José Eduardo. Democracia semidireta no Brasil pós-1988: a

da luta da burguesia contra as monarquias absolutistas, que os primeiros teóricos viram terreno fértil para questionar o modelo vigente e como harmonizar as liberdades individuais com os interesses públicos. Justamente porque o estado liberal protegia garantias individuais e a relação entre o Estado e a sociedade começa a se modificar, aflora a necessidade da representação política para dar conta de um novo modelo que surgia.

Seria, como destacado por Bobbio (2000, p. 33-34), ―aquela forma de governo em que o povo não toma ele mesmo as decisões que lhe dizem respeito, mas elege seus próprios representantes, que devem por ele decidir‖.

Migrava-se de um sistema em decadência para um novo modelo que retirasse os vícios das monarquias absolutistas. Hobbes, Locke e Montesquieu passaram a tratar do estabelecimento de um Poder Legislativo e da concessão a uma pessoa ou grupo delas, de poder e autoridade para falar em nome da sociedade.

Hobbes (1997, p. 141) via o Estado como uma instituição capaz de dar a proteção e conservação necessária à coletividade, somente assim, seria possível sair da ―mísera condição de guerra‖. Sua ideia central era garantir a lei e a ordem.

Locke (1999, p. 86, 139) pensou em uma organização política, pois via na formação do acordo entre os homens a única maneira através da qual ―alguém se despoja de sua liberdade natural e se coloca dentro das limitações da sociedade civil‖. Seria essa organização, na ordem legal, que se consubstanciaria no elemento integrador da Sociedade e dos indivíduos. Essa sociedade que estabeleceria os limites à ação do governo. Assim, o autor via nesse âmbito o Poder Legislativo como Poder supremo ―sagrado e inalterável nas mãos de quem a sociedade uma vez o colocou‖. Observa-se, pois, a instituição de uma relação entre o Poder Legislativo e a sociedade.

Montesquieu, no seu livro O Espírito das Leis, sistematizou princípio da separação dos poderes com duas características essenciais para tanto: a liberdade política e a ideia de representação política. A separação se daria na Potência Legislativa que retrataria o corpo de representantes do povo, com bases nos interesses gerais deste, no qual cada cidadão teria o direito de escolher seu representante. A Potência Executora era confiada ao monarca, na função de exercer a administração do Estado, executando as leis em geral. E o poder de julgar seria do Judiciário como um poder neutro, a quem caberia punir crimes e julgar demandas particulares (MONTESQUIEU, 2000, p. 168-178).

Para o autor, a essência do regime democrático encontra-se na ideal da soberania popular, pois ―quando, na República, o Povo no seu todo tem o poder soberano, é uma democracia‖, assim, ao eleger os seus representantes, o povo aliena parte da sua soberania, uma vez que ―o Povo é admirável para escolher aqueles a quem deve confiar qualquer parcela da sua autoridade‖ (MONTESQUIEU, 2000, p. 20). Ainda nas palavras de Montesquieu, ―a grande vantagem dos representantes é que eles são capazes de discutir os assuntos. O povo não é nem um pouco capaz disto, o que constitui um dos grandes inconvenientes da democracia‖ (MONTESQUIEU, 2000, p. 171).

Das mudanças sociais ocorridas a partir do século XIX começam a surgir modelos democráticos para uma sociedade divida em classes. Macpherson (1991, p. 20) destaca que a partir de Bentham e Mill surgem teorias democráticas que inserem uma sociedade com diferenças quanto à propriedade e ao capital e que, para estes – que tinham como base a doutrina utilitarista19 – a justificação para adoção de um sistema democrático de governo girava em torno de uma proteção (à propriedade e ao capital) que somente esse regime propiciaria contra a opressão estatal.

Para essa corrente, o sistema político deveria proteger a economia de mercado, deixando-o livre e proteger o cidadão contra a ganância dos governos, assim os governados poderiam revogar os mandatos dos governantes que tentassem satisfazer os seus interesses particulares (RUSSEL, 1969, p. 336).

Todavia, como afirma Schumpeter (1979, p. 315), os pais utilitaristas da doutrina democrática deixaram de considerar ―com seriedade qualquer mudança substancial na estrutura econômica e nos hábitos da sociedade burguesa. Enxergavam pouca coisa além do mundo do comerciante de ferro do século XVII‖. De sorte que como destacado por Macpherson (1991, p. 58/59), com a intensificação da militância de classe trabalhadora e as condições de trabalho, um novo paradigma se fez necessário.

Stuart Mill foi o primeiro a perceber tais mudanças, pregando que é na democracia representativa que é garantida a participação ativa do povo no governo (MILL, 2018, p. 200). Em Considerações sobre o Governo Representativo, Mill propõe ideias elementares para o

19 A doutrina utilitarista defende que o único critério racional para determinar o bem social é a maior felicidade do maior número de membros da sociedade, ―Bentham afirmava que o que é bom é o prazer ou a felicidade (empregava estas palavras como sinônimos) e o que é mau é a dor. Por conseguinte, um estado de coisas é melhor que outro se implicar uma maior quantidade de prazer que de dor‖ (RUSSEL, 1969, p. 23).

processo democrático que transcende até mesmo o interesse partidário e pessoal, pois todos encontrariam expressão e não apenas aqueles que detêm o comando do poder.

Para o autor inglês é base essencial na democracia os conflitos políticos para que diferentes grupos que compõem a sociedade participem do processo democrático. ―[...] comunidades só progridem enquanto existe um conflito entre o poder mais forte e algum outro poder rival‖ (MILL, 2018, p. 79). Trata-se da dialética de verdades parciais.

Consoante Mill (2018, p. 132-134), um dos maiores riscos para a democracia são os interesses escusos presentes nos detentores do poder, ou seja, ―é o risco da legislação de classe, dos governos voltados [...] para o benefício imediato da classe dominante, em detrimento duradouro do todo‖. Como garantir medidas contra esse mal? Em um sistema representativo ideal, segundo o autor, as classes divergentes deveriam ficar igualmente equilibradas:

[...] cada qual influenciando igual número de votos no Parlamento: pois, supondo que a maioria de cada classe, qualquer que fosse a diferença entre elas, seria basicamente governada por seus interesses de classe, haveria uma minoria em cada uma delas cujas considerações estariam subordinadas à razão, à justiça e ao bem de todo (MILL, 2018, p.81).

A representação adequada de uma minoria é parte elementar de uma democracia, e como visto anteriormente, ―sem isto, não será possível uma verdadeira democracia – haverá apenas uma falsa aparência de democracia‖ (MILL, 1018, p. 74).

Schumpeter sistematizou um paradigma democrático que buscava reelaborar a ideia protetora de Mill, tentando adaptar o regime democrático a uma sociedade plural e atribuindo a grupos dirigentes o papel fundamental no processo político. Nesse modelo é privilegiada a definição processual da democracia como um mecanismo de escolha de governo, por meio de grupos auto escolhidos; o autor afirma que ―o método democrático é aquele acordo institucional para se chegar a decisões em que os indivíduos adquirem o poder de decisão através de uma luta competitiva pelos votos da população‖ (SCHUMPETER, 1979, p. 336).

Segundo o autor, ―democracia significa que o povo tem a oportunidade de aceitar ou recusar as pessoas designadas para governá-lo‖ e mais, acrescenta um critério para definir seu método democrático: ―a livre competição entre líderes potenciais pelo voto do eleitorado‖ (SCHUMPETER, 1979, p. 355).

Para Macpherson (1991, p. 100), a teoria schumpeteriana, faz da democracia ―um mecanismo de mercado: os votantes são os consumidores; os políticos são os empresários‖, traz como base de justificação um paradigma econômico que iguala o homem político ao homem econômico. Nada obstante, os argumentos da referenciada teoria tem como base a ―hipótese indemonstrável de que a capacidade política da pessoa média numa sociedade moderna de mercado é um dado fixo‖ e imutável. No entanto, a concepção de homem está vinculada a uma época e cultura determinadas, não são imutáveis (MACPHERSON, 1991, p. 104).

Importa salientar que a característica essencial em uma democracia representativa está na concepção de um processo formal de escolha de representantes que ―pressupõe um conjunto de instituições que disciplinam a participação popular no processo político, que vem a formar os direitos políticos que qualificam a cidadania [...]‖ (SILVA, 2009, p.137).

Conforme define Silva (2009, p. 137-138), ―na democracia representativa a participação popular é indireta, periódica e formal, por via das instituições eleitorais que visam a disciplinar as técnicas de escolha dos representantes do povo”. Essas técnicas, que adotam o voto para a escolha dos agentes governamentais, irão dar à ordem democrática a característica de procedimento.

Em Bobbio (2000, p. 458), temos que a democracia pode possuir um órgão em que as decisões coletivas são tomadas por representantes e pode espelhar através desses representantes os diferentes grupos de opinião ou de interesses que compõe essa sociedade. Os dois significados são claros quando se contrapõe a democracia representativa à direta. Ou seja, a democracia direta é aquela na qual as decisões coletivas são tomadas diretamente pelos cidadãos; e a indireta, os cidadãos possuem formas alternativas de participarem das decisões.

Mas que representação é essa? Para visualizar de forma correta a democracia representativa e posteriormente a sua evolução para a democracia representativa partidária, importante entender o conceito da representação.

2.1.2.1. Da Representação Política: aporte teórico

É por meio da representação política que fundamentos como a cidadania, a soberania popular e o pluralismo político se formam e se concretizam. E ela vai proporcionar a efetivação da soberania popular, que se dará, nos termos do parágrafo único do artigo primeiro da Constituição Federal, através de representantes eleitos ou diretamente. É a teoria da soberania nacional que dará o ponto de partida da representação política e através dela a condução a um governo representativo (CANOTILHO, 2008, p. 113).

A palavra representação vem do substantivo latim repraesentatio e do verbo repraesentare, que significam tornar presente algo, ou reapresentar novamente. Mezzaroba (2004, p. 10-16) ao tratar do termo representação, relata que existem inúmeras significações em cada meio que é utilizado, a exemplo da representação artística que reproduz a subjetividade do autor, a representação em Filosofia, que vai desde o sentido aristotélico – intelectual ou sensível, ao cartesiano como imaginação, ao kantiano como apreensão intuitiva. Cita ainda o autor, a representação sucessória da herança, a representação penal do ofendido em crimes de ação privada ou pública condicional, a representação administrativa por meio do direito de petição, a representação comercial, contratual, processual, a representação postulatória por advogado, a representação proporcional, que no Direito Público, garante que grandes e pequenos Partidos tenham espaço e sejam juridicamente protegidos.

Pitkin (1985, p. 270-271) destaca que a representação no Direito surge ainda no século XIII, quando se inicia a ideia de um direito poder ser pleiteado através da sociedade, como na aquisição de personalidade, e quando a sociedade passa a estar em juízo por meio de um procurador ―representante‖. Salienta a autora que o termo específico ―representação‖, à época, ainda não era utilizado. Contudo, o sentido era de atuação dos procuradores e magistrados, em nome da Sociedade.

Relata Pitkin (1985, p.269-270; 2006, p.17-18) que na Antiguidade, os gregos possuíam diversas instituições nas quais se poderia aplicar o termo ―representação‖, todavia, não era utilizada a palavra como um conceito próprio. Na Idade Média o termo passa a ser utilizado pela Igreja Católica para significar a encarnação de Cristo na figura do Papa; é também, segundo a autora, que no século XIII, os canonistas adotam a ideia, derivada do

direito romano, de que ―o príncipe ou o imperador atua pelo povo romano, ocupa seu lugar, cuida do seu bem-estar‖.

A representação, segundo Pitkin (2006, p.16) é em larga monta, ―um fenômeno cultural e político, um fenômeno humano‖. Para essa autora ―a representação política se tornou um direito sagrado na experiência política inglesa e a partir da Revolução americana e francesa, foi guindada ao rol dos Direitos Humanos, quando passou a ser concebida sob o sentido de representação popular” (PITKIN,1985, p. 276).

Hamilton, Madison e Jay (2003, p. 64) na obra O Federalista, ressaltam que a representação vai depurar as perspectivas públicas, pois será por meio de um corpo escolhido de cidadãos, o qual deverá ter sabedoria e prudência para escolher o real interesse do país, e que, ―pelo seu patriotismo e amor da justiça, estarão mais longe de sacrificar a considerações momentâneas e parciais‖. Para os autores, somente em um governo assim, no qual a vontade pública é expressa pelos representantes, haverá condições de ter harmonia com os interesses públicos.

O abade Sieyés, quando trata de Nação, entende ser formada pela vontade dos indivíduos que unidos passam a constituir um Poder maior, qual seja, a Soberania nacional, - essa caracterizaria a própria nação: soberana, una e indivisível. O exercício dessa soberania nacional se daria através de uma Constituição e o Poder Constituinte e para ser eficaz deveria estar assentado sobre o princípio da representação (SIEYÉS, 1986, p. 65-69).

Mezzaroba (2004, p. 39) esclarece que ―enquanto Sieyés estava preocupado em determinar os pressupostos para uma doutrina da Soberania nacional, Rousseau buscava estabelecer os princípios para uma Soberania popular‖. Assim, ―para Rousseau toda e qualquer ordem política para ser legítima deveria, no processo legislativo, sustentar-se pela participação livre de cada indivíduo‖.

Jellinek (1981, p. 429) vê a representação como ―fundamentalmente jurídica‖, onde a vontade de um (ou muitos) sobrepõe-se sobre a de outros. A representação no viés técnico/jurídico e no senso comum é explicada por Bobbio (2000, p. 457-458), que relata ser na linguagem técnico/jurídica que a representação vai significar o ―agir em nome e por conta de um outro‖, na linguagem comum ―reproduzir‖, ―espelhar‖ ou ―refletir‖, simbolicamente uma realidade objetiva.

O conceito de representação passou a ser utilizado no sentido de atividade política, quando na Inglaterra a convocação de burgueses e cavaleiros para reunirem-se no Parlamento, passou a ser vista como uma política do Rei. No século XVII inicia-se a ideia acerca de mudanças na função dos membros do Parlamento baseadas em duas linhas, uma, segundo a qual todos os homens estariam presentes no Parlamento, visão essa tida como uma ficção legal de origem medieval, e outra, segundo a qual a nação estaria encarnada no governante, da mesma forma que a Igreja estava no Papa (PITKIN, 2006, p. 21-25).

Segundo Pitkin (2006, p. 27-28), a primeira notícia de aplicação do termo representação conhecidas ao Parlamento foi a utilizada por Sir Thomas Smith, em 1583, no livro De republica Anglorum. Em 1651 foi com Hobbes que o termo e a ideia de representação apareceram na teoria política, com a publicação do Leviatã.

Hobbes (1997, p. 61-62; 96) afirma que o representante é aquele que recebe autoridade para agir por outro. Pautou a ideia de representação ao poder de agir no lugar de outrem. Autoridade, para o autor, ―se entende sempre o direito de praticar qualquer ação, e feito por autoridade, significa sempre por comissão ou licença daquele a quem pertença o direito‖. Declara que o Estado se forma quando há a formação de um pacto, mediante a concordância e autorização dos homens, para que ―qualquer homem ou assembléia de homens a quem seja atribuído pela maioria o direito de representar a pessoa de todos eles (ou seja, de ser seu representante)‖, e como representantes possam decidir.

Para o citado autor, ―personificar é representar, seja a si mesmo ou a outro; e daquele que representa outro diz-se portador de sua pessoa, ou que age em seu nome‖, e podem ter designações diversas conforme a ocasião: ―representante, mandatário, lugar-tenente, vigário, advogado, deputado, procurador, ator, e outras semelhantes‖ (HOBBES, 1997, p. 110).

O contratualista destaca que é preciso criar algo além do pacto social para que o acordo seja constante e duradouro: ―um poder comum que os mantenha em respeito, e que dirija suas ações no sentido do benefício comum‖. Para isso é preciso conceder tal ―poder‖ a um homem ou assembleia de homens como representantes: ―considerando-se e reconhecendo-se cada um como autor de todos os atos que aquele que reprereconhecendo-senta sua pessoa praticar ou levar a praticar [...]; todos submetendo assim suas vontades à vontade do representante, e suas decisões a sua decisão‖ (HOBBES, 1997, p.116-117).

A teoria hobbesiana exerceu importante influência no liberalismo e na concepção da própria democracia contemporânea, isso porque é a partir dele que se desenvolve a noção de soberania baseada no consentimento individual e a noção de lei como produto externo aos indivíduos.

Cotta (1998, p. 1102) lembra que a representação política como um modelo de delegação é tipicamente medieval, sendo rejeitada nas atuais constituições em decorrência da proibição de mandatos imperativos. Isso porque nesse modelo ―o representante é concebido como um executor privado com iniciativa e autonomia, das instituições que os que os mandatários lhe distribuem, tal como um embaixador‖. A representação política vinculada à ideia de autoridade deriva de Hobbes (1997, p. 96) que ―compreende por ―autoridade o direito de praticar qualquer ação, e, feito por autoridade, significa comissão ou licença daquele a quem pertence o direito‖ Rousseau (1996, p.26), segue a linha vinculada à autoridade, pois a vontade geral, segundo o autor, não se representa, ―a vontade ou é geral (necessário que todos os votos sejam considerados, sem embargo precise ser unânime), ou não é vontade‖.

Burke trabalhou com a representação como um modelo relação de confiança, nesse modelo, como relata Mezzaroba (2018a, p. 71), ―no momento da escolha, o representado deposita toda sua confiança no representante escolhido. Isto equivale dizer que, na hora de votar, o eleitor já sabe que está transferindo ao seu representante o Poder para que ele possa decidir e legislar sobre condutas gerais‖. Em Burke (s/d, p. 20), a representação de interesses se traduz na representação de interesses gerais.

A representação é vista, ainda, como um espelho, um reflexo social, a partir do momento em que leva em consideração as características e semelhanças existentes entre os representantes e os representados. Segundo Cotta (1986, p.1102), ―é centrado mais sobre o efeito de conjunto do que o papel de cada representante. Ele concebe o organismo representativo como um microcosmos que fielmente reproduz as características do corpo político‖. Nessa linha, Barreto (1984, p. 26/27) afirma que esse modelo tem ―precisamente a função do representante, em uma Sociedade em que a representação de interesses sociais e econômicos são essenciais para o seu funcionamento‖. Kinzo (1998, p. 65) conceitua este modelo como ―tendo partido do princípio de que se representar é tornar presente alguma coisa que de fato não está presente, representar significa espelhar de algum modo o ausente‖.

Duverger (1985, p. 63-64) destaca que ―os eleitos representam os seus eleitores, não como um mandatário representa os seus mandantes, mas como uma fotografia representa o objeto fotografado‖, ou ainda, como ―um quadro, em que o pintor interpreta a realidade.‖.

Piktin (2006, p. 30) leciona que a construção da representação continuou e mostrou-se como pano de fundo de grandes revoluções no final do século XVII e nas lutas políticas e institucionais do século XIX, como as que visavam ―o sufrágio, a divisão em distritos e a proporcionalidade, os partidos políticos e os interesses e políticas, a relação entre as funções legislativas e executivas‖.

Mill (1964, p. 87-89) foi um dos precursores do modelo descritivo de representação. Para o autor, ―a ameaça da liberdade não residia no governo, mas na maioria intolerante que via com desconfiança as minorias divergentes, e estaria disposta a usar de sua condição de maioria para reprimi-las e regulá-las‖. Dessa forma ―a significação de um governo representativo consiste em que o povo inteiro, ou certa parcela muito numerosa dele, exerce, por meio de deputados periodicamente eleitos por ele, o poder controlador extremo‖ (MILL, 1964, p. 60).

A representação política, especificamente, ―provoca a disseminação da presença do soberano e sua transformação em uma tarefa contínua e regulada de contestação e reconstrução da legitimidade‖ (URBINATI, 2006, p. 193).

Conforme anuncia Cotta (1998, p. 1106), a ―representação é um fenômeno complexo em cujo núcleo se mantém um processo de escolha dos governantes e de controle sobre a sua ação‖. Bobbio (1997, p. 1105) salienta que a representação política pode ser definida como ―um sistema institucionalizado de responsabilidade política, realizada através da designação eleitoral livre de certos organismos políticos fundamentais: o mais das vezes os parlamentos‖. Importante ainda estabelecer até onde vai a relação entre representantes e representados. Para tanto, será a seguir apresentado, sob o viés da teoria do mandato, alguns pontos desse diálogo.