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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO DAIANE SANDRA TRAMONTINI

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA

CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO

DAIANE SANDRA TRAMONTINI

CLÁUSULA DE DESEMPENHO VERSUS PLURALISMO POLÍTICO:

UMA ANÁLISE A PARTIR DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA

FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988 E DA TEORIA DO ESTADO DE

PARTIDOS

Florianópolis

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CLÁUSULA DE DESEMPENHO VERSUS PLURALISMO POLÍTICO:

UMA ANÁLISE A PARTIR DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA

FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988 E DA TEORIA DE ESTADO DE

PARTIDOS

Tese submetida ao Curso de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal de Santa Catarina para a obtenção do Grau de Doutor em Direito.

Orientador: Prof. Dr. Orides Mezzaroba

Florianópolis 2019

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CLÁUSULA DE DESEMPENHO VERSUS PLURALISMO POLÍTICO:

UMA ANÁLISE A PARTIR DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA

FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988 E DA TEORIA DO ESTADO DE

PARTIDOS

O presente trabalho em nível de doutorado foi avaliado e aprovado por banca examinadora composta pelos seguintes membros:

Prof. Antonio Marcos Gavazzoni, Dr.

Universidade do Oeste de Santa Catarina - UNOESC

Prof.(a) Gabriela Natacha Bechara, Dr(a). Universidade Estácio de Sá

Prof. José Sérgio da Silva Cristóvam, Dr. Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC

Prof.(a) Leilane Serratine Brubba, Dr(a). Faculdade Meridional - IMED

Certificamos que esta é a versão original e final do trabalho de conclusão que foi julgado adequado para obtenção do título de doutor em Direito.

____________________________ Prof. Dr. Cláudio Ladeira de Oliveira

Coordenador(a) do Programa

____________________________ Prof. Dr. Orides Mezzaroba

Orientador(a)

Florianópolis, 28 de agosto de 2019. Assinado de forma digital por Orides Mezzaroba:32494971004 Dados: 2019.10.07 08:55:45 -03'00' Claudio Ladeira de

Oliveira:5940666612 0

Assinado de forma digital por Claudio Ladeira de Oliveira:59406666120 Dados: 2019.10.07 11:52:52 -03'00'

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AGRADECIMENTOS

Ao Programa de Pós-Graduação em Direito – PPDG, da Universidade Federal de Santa Catarina, por acreditar e aceitar no projeto hoje transformado em tese.

Ao Prof. Dr. Orides Mezzaroba, pela orientação científica e pelo suporte acadêmico oferecido ao longo do período de estudos do mestrado e doutorado, sem o qual este trabalho não seria possível.

À minha família, meu porto seguro. Ao meu pai, Tadeu, por sempre me ensinar o valor da educação e à minha mãe, Ieda, por me mostrar que os sonhos podem ser alcançados por meio de muito estudo e dedicação. Aos meus irmãos Priscilla, Pepita, Prisciane, Zeca e Lilo, que são um grande um orgulho e um incentivo eterno. Ao meu padrasto João e minha madrasta Mônica pelo apoio de sempre.

As minhas amigas-irmãs baianas Barbara, Juliana, Marina e Paloma, pelo suporte e incentivo de sempre. Geyson, pelo apoio, paciência e parceria.

Às amigas Débora, Renata e Cheila, Leilane, Luciana, Patrícia e Samira, pelo apoio, por entenderem minha ausência e pelas alegrias compartilhadas no decorrer dessa trajetória.

Aos amigos e amigas da Secretaria de Estado da Fazenda, que participaram de grande parte desse processo de estudos, sintam-se homenageados. Aos queridos parceiros do Rico Domingues, pela compreensão.

Aos amigos do PPGD pela parceria nestes anos de doutoramento. Aos professores do Programa de Pós-Graduação em Direito da UFSC pelas valiosas aulas e aos servidores do PPGD pela ajuda constante e atenção do dia a dia acadêmico.

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A democracia, no plano de ideia, é uma forma de Estado e de sociedade em que a vontade geral, ou, sem tantas metáforas, a ordem social, é realizada por quem está submetido a essa ordem, isto é, pelo povo. Democracia significa identidade entre governantes e governados, entre sujeito e objeto do poder, governo do povo sobre o povo. (HANS KELSEN, 2000)

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O trabalho tem como tema o papel do partido político na democracia representativa brasileira, especialmente a partir da configuração estabelecida pela Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Nessa linha buscar-se-á analisar a possibilidade, a partir da teoria da Democracia de Partidos (ou Estado de Partidos), pensada como um sistema que tem o fim de garantir o fortalecimento da atuação dos Partidos no sistema representativo - tidos como corpos intermediários entre o povo e o Estado, catalizadores da vontade popular, de construção democrática pautada no pluralismo político. Modelo esse concebido por Kelsen e Leibholz, quando constataram que o modelo representativo liberal se tornara insustentável e, ainda se mantém nos atuais regimes democráticos. A busca por essa pesquisa tem fundamento na crise de representatividade das instituições partidárias e do modelo adotado no ordenamento pátrio, considerando as alterações inseridas com a Emenda Constitucional n. 97/2017, que modificou profundamente o texto original da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, prevendo de forma taxativa cláusula de desempenho para os Partidos Políticos e que, tangenciando o princípio do pluralismo político, estabeleceu condições alternativas para que os partidos pudessem ter acesso aos recursos do Fundo Partidário e aos meios de comunicação gratuitos. A representatividade e a fragilidade no papel dos partidos políticos é pauta constante nas discussões políticas e a cada alteração na legislação, em busca (ou não) de uma solução, faz com que ressurja de tempos em tempos o debate acerca da crise de representatividade das organizações partidárias. Quando a coexistência de diferentes propostas não é amplamente permitida na seara do debate político-eleitoral, mediante a imposição de barreiras que dificultam ou mesmo excluem a plena consideração das diferenças e particularidades dos diversos segmentos no processo de legitimação política, a concepção do pluralismo político como princípio republicano acaba ficando prejudicada em sua essência. Assim, a problematização do trabalho consiste em analisar se é possível, a partir das alterações promovidas no artigo 17 da CRFB pela Emenda Constitucional n. 97/2017, garantir o fortalecimento dos Partidos Políticos no viés de uma Democracia de Partidos no cenário nacional. O que levará à hipótese principal desse trabalho, de que somente será viável se houver um necessário redimensionamento desta cláusula de desempenho inserida no parágrafo referenciado para, mantendo o primado fundamental do pluralismo político, garantir o fortalecimento das instituições partidárias, frente à crise de representatividade que assolam essas organizações.

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The work has as its theme the role of the political party in Brazilian representative democracy, especially from the configuration established by the Constitution of the Federative Republic of Brazil of 1988. In this line we will seek to analyze the possibility of democratic construction based on the political pluralism from the theory of Party Democracy (or State of Parties), conceived as a system that has the purpose of guaranteeing the strengthening of the Parties‘ performance in the representative system - considered as intermediary bodies between the people and the State, catalysts of the popular will. This model conceived by Kelsen and Leibholz, when they found that the liberal representative model had become unsustainable and still holds in the current democratic regimes. This research is thus based on the crisis of representativeness of party institutions and the adopted model in the homeland order, considering the changes inserted with Constitutional Amendment n. 97/2017, which profoundly modified the original text of the Constitution of the Federative Republic of Brazil of 1988, forcibly providing for a performance clause for political parties and that, in line with the principle of political pluralism, established alternative conditions for parties to have access to Party Fund resources and free media. Representativeness and fragility in the role of political parties is a constant agenda in political discussions and every change in legislation, seeking (or not) a solution, makes the debate about the organizations' representativity crisis resurface from time to time. When the coexistence of different proposals is not widely allowed in the field of political-electoral debate, by imposing barriers that hinder or even exclude full consideration of the differences and particularities of the various segments in the process of political legitimation, the conception of political pluralism as Republican principle ends up being damaged in its essence. Thus, the problematization of the work consists in analyzing if it is possible, from the alterations promoted in article 17 of the CRFB, by Constitutional Amendment n. 97/2017, to ensure the strengthening of political parties through party democracy on the national scene. This will lead to the main hypothesis of this work, which will only be viable if there is a necessary resizing of this performance clause inserted in the referenced paragraph to, while maintaining the fundamental primacy of political pluralism, ensure the strengthening of party institutions, facing the crisis of representativeness that afflicts these organizations.

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RESUMEN

El trabajo tiene como tema el papel del partido político en la democracia representativa brasileña, especialmente a partir de la configuración establecida por la Constitución de la República Federativa del Brasil de 1988. En esta línea buscará analizar la posibilidad, desde la teoría de la Democracia del Partido (o El Estado de Partidos), concebido como un sistema que tiene el propósito de garantizar el fortalecimiento del desempeño de los Partidos en el sistema representativo, considerado como organismos intermediarios entre el pueblo y el Estado, canales de voluntad popular, de construcción democrática basada en el pluralismo político. Este modelo concebido por Kelsen y Leibholz, cuando encontrado que el modelo representativo liberal se había vuelto insostenible y aún se mantiene en los regímenes democráticos actuales. La búsqueda de esta investigación se basa en la crisis de representatividad de las instituciones del partido y el modelo adoptado en el orden de la patria, considerando los cambios insertados con la enmienda constitucional n. 97/2017, que modificó profundamente el texto original de la Constitución de la República Federativa del Brasil de 1988, estableciendo una cláusula de desempeño para los partidos políticos y que, en línea con el principio del pluralismo político, establecía condiciones alternativas para que los partidos tuvieran Acceso a los recursos del Fondo del Partido y medios libres de comunicación. La representatividad y la fragilidad en el papel de los partidos políticos es una agenda constante en las discusiones políticas y cada cambio en la legislación, buscando (o no) una solución, hace que el debate sobre la crisis de representatividad de las organizaciones resurja de vez en cuando. Cuando la coexistencia de diferentes propuestas no está ampliamente permitida en el campo del debate político-electoral, al imponer barreras que dificultan o incluso excluyen la plena consideración de las diferencias y particularidades de los diversos segmentos en el proceso de legitimación política, la concepción del pluralismo político como el principio republicano termina siendo dañado en su esencia. Así, la problematización del trabajo consiste en analizar si es posible, a partir de las alteraciones promovidas en el artículo 17 de la CRFB por la enmienda constitucional n. 97/2017, para garantizar el fortalecimiento de los partidos políticos a través de un Partido Democracia en la escena nacional. Esto conducirá a la hipótesis principal de este trabajo, que solo será viable si hay un cambio de tamaño necesario de esta cláusula de desempeño insertada en el párrafo referenciado para, mientras se mantiene la primacía fundamental del pluralismo político, garantizar el fortalecimiento de las instituciones del partido, frente a la crisis de representatividad que plagar a estas organizaciones.

Palabras-claves: Partidos Politicos. Democracia de los Partidos Políticos. Pluralismo Politico.

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Percentual de destinação de recursos do Fundo...183

Tabela 2 – Valores totais de recursos do Fundo...184

Tabela 3 – Partidos que alcançariam a cláusula da Lei n. 9.096/95...205

Tabela 4 – Partidos que seriam barrados segundo votação nas eleições de 2014...216

Tabela 5 – Partidos excluídos da divisão do Fundo Partidário e acesso aos meios de comunicação a partir de 1º de fev. de 2019...219

Tabela 6 – Valor de distribuição do FEFC em 2018...220

Tabela 7 – Ranking de distribuição entre 2014 e 2018...220

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ADCT – Ato das Disposições Constitucionais Transitórias ADI - Ação Direta de Inconstitucionalidade

ADIs – Ações Diretas de Inconstitucionalidade ANL – Aliança Nacional Libertadora

AIB – Ação Integralista Brasileira

ARENA – Aliança Renovadora Nacional AVANTE - Avante

CE – Código Eleitoral

CRFB – Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 DC - Democracia Cristã

DF – Distrito Federal DJ – Diário da Justiça DEM - Democratas

EUA – Estados Unidos da América EC – Emenda Constitucional LNS – Lei de Segurança Nacional

MDB – Movimento Democrático Brasileiro NOVO – Partido Novo

PATRIOTA - Patriota

PCB – Partido Comunista do Brasil PCdoB – Partido Comunista do Brasil PCO – Partido da Causa Operária PDC – Partido Democrata Cristão PDS – Partido Democrático Social PDT – Partido Democrático Brasileiro PHS – Partido Humanista da Solidariedade PL – Partido Liberal

PMB – Partido da Mulher Brasileira

PMDB – Partido do Movimento Democrático Brasileiro PMN – Partido da Mobilização Nacional

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PPS – Partido Popular Socialista PRP – Partido Republicano Paulista PRM – Partido Republicano Mineiro

PRONA – Partido de Reedificação da Ordem Nacional PRTB – Partido Renovador Trabalhista Brasileiro PRB – Partido Republicano Brasileiro

PROS – Partido Republicano da Ordem Social PSB – Partido Socialista Brasileiro

PSD – Partido Social Democrático

PSDB – Partido da Social Democracia Brasileira PSDC – Partido Social Democrata Cristão PSC – Partido Social Cristão

PSOL – Partido Socialismo e Liberdade PSL – Partido Social Liberal

PSTU – Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado PSP – Partido Social Progressista

PTB – Partido Trabalhista Brasileiro PT – Partido dos Trabalhadores PTC – Partido Trabalhista Cristão PTN – Partido Trabalhista Nacional

PRTB – Partido Renovador Trabalhista Brasileiro PEC – Proposta de Emenda à Constituição

PL – Projeto de Lei PV – Partido Verde

REDE – Rede Sustentabilidade STF – Supremo Tribunal Federal TJ – Tribunal de Justiça

TSE – Tribunal Superior Eleitoral UND – União Democrática Nacional

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1 INTRODUÇÃO ___________________________________________________ 15 2 AS VARIÁVEIS DA DEMOCRACIA _________________________________ 27

2.1 A DEMOCRACIA E SUAS FORMAS __________________________________ 29 2.1.1 A Democracia Direta ________________________________________________ 31 2.1.2 A Democracia Representativa _________________________________________ 35 2.1.2.1 Da Representação Política: aporte teórico ________________________________ 40 2.1.2.2 O diálogo entre representante e representado: Teoria do Mandato _____________ 45 2.1.3 Democracia Representativa Partidária ___________________________________ 52 2.2 DA DEMOCRACIA DE PARTIDOS (TEORIA DO ESTADO DE PARTIDOS) _ 53 2.2.1 Aportes teóricos do Estado de Partidos: de Kelsen à estruturação de Leibholz ____ 55 2.2.2 Pressupostos da democracia de partidos (Estado de Partidos) segundo Leibholz __ 63

3 O PARTIDO POLÍTICO: SEU CONTEXTO, SEU PAPEL NO PLURALISMO, SUA ORIGEM, SUA HISTÓRIA E SUAS ABORDAGENS _______ 69

3.1 CONTEXTUALIZANDO O ESTADO DE DIREITO: ANTECEDENTES

TEÓRICOS _______________________________________________________________ 69 3.1.1 Do Estado de direito ao Estado Constitucional Democrático de Direito _________ 75 3.2 PARTIDO POLÍTICO: ATOR PRINCIPAL DO PLURALISMO POLÍTICO – PRINCÍPIO ESTRUTURANTE FUNDAMENTAL DA ORGANIZAÇÃO POLÍTICA __ 85 3.3 ORIGEM, ABORDAGENS E DEFINIÇÃO DOS PARTIDOS POLÍTICOS ____ 92 3.4 TRAJETÓRIA HISTÓRICA DO PARTIDO POLÍTICO NO BRASIL ________ 104 3.4.1 Brasil Colônia (a ausência do Partido Político) ao Império (o início dos debates e o surgimento controlado dos ―Partidos Políticos‖) _________________________________ 105 3.4.2 Primeira República e Segunda República (Governo Provisório de Vargas) _____ 106 3.4.3 O Estado Novo (Terceira República): o retrocesso da representatividade _______ 109 3.4.4 Quarta República: ―reincorporação‖ dos Partidos Políticos__________________ 110 3.4.5 Regime Militar: desmantelamento do sonho democrático ___________________ 111

4 A CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988 E O PARTIDO POLÍTICO __________________________________________________ 115

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4.1.1 O Sistema eleitoral: majoritário e proporcional ___________________________ 119 4.1.2 O Sistema Partidário ________________________________________________ 136 4.1.3 ―Presidencialismo de coalizão‖ e sua relação com os partidos políticos ________ 143 4.2 LIBERDADE PARTIDÁRIA CONSTITUCIONAL E OS SEUS PRINCÍPIOS BALIZADORES _________________________________________________________ 147 4.3 CONTROLE FORMAL CONSTITUCIONAL PARA CRIAÇÃO DOS PARTIDOS POLÍTICOS _____________________________________________________________ 151 4.4 NATUREZA JURÍDICA DOS PARTIDOS POLÍTICOS __________________ 156 4.5 AUTONOMIA PARTIDÁRIA COMO GARANTIA CONSTITUCIONAL E CONSEQUENTE ORGANIZAÇÃO INTERNA DOS PARTIDOS POLÍTICOS _______ 159

4.6 DISCIPLINA E FIDELIDADE PARTIDÁRIAS COMO GARANTIA

CONSTITUCIONAL ______________________________________________________ 173 4.7 DIREITO AO FUNDO PARTIDÁRIO E ACESSO GRATUITO AOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO COMO GARANTIA CONSTITUCIONAL _____________________ 185

5 A CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988 E O CONTROLE QUANTITATIVO DOS PARTIDOS POLÍTICOS ______________ 194

5.1 CLÁSULAS DE DESEMPENHO _____________________________________ 195 5.1.1 Cláusula de desempenho no direito comparado: breve relato ________________ 197 5.1.2 Cláusula de desempenho no Brasil _____________________________________ 201 5.2 O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL E O JULGAMENTO DAS ADIS N.1351-3/DF e N.1354-8/DF: PROTEÇÃO ÀS MINORIAS E PLURALISMO POLÍTICO COMO ÂNGULOS CENTRAIS ANTE AS BARREIRAS IMPOSTAS PELA LEI DOS PARTIDOS POLÍTICOS _____________________________________________________________ 206 5.3 CLÁUSULA DE DESEMPENHO DO ARTIGO 17 E A (IN)COMPATIBILIDADE DAS NOVAS REGRAS COM O PLURALISMO POLÍTICO ______________________ 215 5.4 VERIFICAÇÃO DOS REQUISITOS PARA A VIABILIZAÇÃO DE UMA DEMOCRACIA DE PARTIDOS (ESTADO DE PARTIDOS) _____________________ 233

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QUANTITATIVO PREVISTO NO ARTIGO 17 DA CRFB PARA O FORTALECIMENTO PARTIDÁRIO A PARTIR DA TEORIA DO ESTADO DE PARTIDOS _____________ 251

6 CONCLUSÃO ___________________________________________________ 260 REFERÊNCIAS _________________________________________________________ 274

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1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem como tema o papel do partido político na democracia representativa brasileira, especialmente a partir da configuração estabelecida pela Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Nessa linha buscar-se-á analisar a possibilidade, a partir do viés da teoria da Democracia de Partidos (ou Estado de Partidos), pensada como um sistema que tem o fim de garantir o fortalecimento da atuação dos Partidos no sistema representativo - tidos como corpos intermediários entre o povo e o Estado, canalizadores da vontade popular, de construção democrática pautada no pluralismo político.

A necessidade da pesquisa tem fundamento na crise de representatividade das instituições partidárias e do modelo adotado no ordenamento pátrio, considerando as alterações inseridas com a Emenda Constitucional n. 97/2017, que modificou profundamente o texto original da Constituição de 1988, prevendo de forma taxativa cláusula de desempenho para os Partidos Políticos e que, tangenciando o princípio do pluralismo político, estabeleceu condições alternativas para que os partidos pudessem ter acesso aos recursos do Fundo Partidário e aos meios de comunicação gratuitos. Salienta-se, desde já, que essa alteração se deu após julgamento realizado pelo Supremo das ADIs 1351-3/DF e 1354-8/DF, que analisou a temática à época prevista na Lei n. 9.099/95.

Assim, a problematização do trabalho consiste em analisar justamente se é possível, a partir dessas alterações promovidas no artigo 17 da CRFB pela Emenda Constitucional n. 97/2017, garantir o fortalecimento dos Partidos Políticos no viés da Teoria de Estado de Partidos (Democracia de Partidos) no cenário nacional. O que levará à hipótese principal desse trabalho, de que somente será viável tal salvaguarda com um necessário redimensionamento da cláusula de desempenho inserida no parágrafo referenciado para, mantendo o primado fundamental do pluralismo político, garantir o fortalecimento das instituições partidárias, frente à crise de representatividade que assola essas organizações.

O referencial teórico deste trabalho é o modelo de Estado de Partidos, que tem como precursor Kelsen e teve na pessoa de Leibholz, seu estruturador. Os Autores revisitaram o conceito de democracia liberal clássico, vigente à época, e moldaram um formato democrático pautado na igualdade e liberdade, cujo sujeito de poder (o povo), somente consegue de fato exercer a vontade geral por meio dos direitos políticos, pelos partidos. Além disso, o trabalho

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usa como referência a obra de Mezzaroba, especialmente na relação entre o atual papel dos Partidos Políticos e o esgotamento do modelo de representação na política brasileira.

A justificativa para a utilização desse marco reside justamente na constatação realizada pelos Autores de que o modelo representativo liberal se tornou insustentável há tempos e se mantém nos atuais regimes democráticos. A representatividade e a fragilidade no papel dos partidos políticos é pauta constante nas discussões políticas e a cada alteração na legislação, em busca (ou não) de uma solução, faz com que ressurja de tempos em tempos o debate acerca da crise de representatividade das organizações partidárias.

Importa salientar que este trabalho concentra-se na análise dos institutos e teorias pertinentes à conclusão de seu objeto. Não houve, portanto, a pretensão de esgotar o tema ora investigado, já que é por demais amplo, complexo e divergente para que pudesse ser pesquisado mesmo que no âmbito de uma tese, por isso algumas questões foram tratadas apenas de forma periférica.

Para desenvolver o tema foi necessário entender a Democracia no Brasil e, para tanto, perpassar pelas formas democráticas direta, representativa, representativa partidária e, assim, analisar o sistema representativo. Só então é possível verificar no que consiste a Democracia de Partidos. Ademais, essencial aferir onde se insere o partido político no contexto no Estado Democrático de Direito, sua origem, abordagens, trajetória histórica, a sua base fundamental e estruturante pluralista. Da mesma forma, entender como a Constituição e o direito constitucional lidam com as organizações partidárias.

A crise de representatividade decorrente do descrédito do poder político perante a sociedade, com suas diversas facetas, não permite o reconhecimento de que o Estado cumpre satisfatoriamente o seu papel social e finalístico de garantia do interesse coletivo. O modelo político contribui para a percepção de insatisfação cada vez mais acentuada, pois apresenta evidentes falhas de estruturação que afastam do processo de legitimação decisória o caráter pluralístico do ideal republicano, circunstancialmente ocorrendo apenas uma legitimidade formal do poder constituído.

Os interesses de grupos ou de indivíduos melhor aparelhados parecem possuir representatividade mais significativa, independentemente do impacto ou da qualificação social do próprio pleito. Desconsideram, contudo, que as organizações partidárias são centrais

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na distribuição do poder no Legislativo, e que irão lidar com embates e normas de âmbito nacional.

Aliado a isso, a complexidade das relações sociais e as dificuldades do Estado, como ente político em uma democracia representativa em dimensionar a relevância das demandas públicas fazem com que sejam priorizados os interesses de categorias sociais cuja preponderância se reconheça de plano, segundo critérios positivados juridicamente, pelos quais se atribui a cada grupamento um determinado grau de representatividade. Como é impraticável o atendimento personalizado de situações individuais ou que atinjam minorias, reivindicações de segmentos pouco organizados acabam praticamente desconsideradas.

O Estado Democrático de Direito, assentado nos fundamentos republicanos, é caracterizado em essência pelo pluralismo, tendo por princípio estruturante a garantia da participação efetiva de indivíduos e grupos sociais multifacetados no processo de constituição e legitimação do poder estatal, institucionalizado nos Partidos Políticos.

Nesse contexto, as democracias contemporâneas estabelecem a igualdade, a soberania popular, o pluralismo político e o pluripartidarismo como alicerces dos regimes democráticos, pressupondo que a coexistência de interesses divergentes e conflitantes faz parte do meio social e conferindo a cada segmento uma valorização correspondente à sua representatividade social. Não é a quantidade de partidos que irá designar uma democracia forte e sim a qualidade destes.

Foi com o Estado liberal, nascido da luta da burguesia contra as monarquias absolutistas, que os primeiros teóricos viram terreno fértil para questionar o modelo vigente e como harmonizar as liberdades individuais com os interesses públicos, é onde nasce o próprio Estado Democrático. Procurava-se nesse período, sair de um sistema decrépito para um novo modelo que retirasse os velhos vícios do sistema regido por monarquias absolutistas.

Clássicos como Hobbes, Locke, Rousseau e Montesquieu influenciaram o pensamento desse período, e passaram a tratar do estabelecimento de um ―Poder Legislativo‖ e da concessão a uma pessoa ou grupo delas, de poder e autoridade para falar em nome da sociedade.

Buscando justamente a proteção de garantias individuais, o Estado Liberal vai se formar para modificar a relação entre o Estado e a sociedade. Aflora então a necessidade da representação política para dar conta de um novo modelo que surgia.

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Nesse viés a representação política aparece como ponto elementar na participação popular, na formação da vontade. E é possível verificar como as mudanças de pensamento, na forma de ver o próprio governo e seus governados, caracterizaram uma oportunidade de melhora, diante de governos falidos e regimes ora totalitários ora ineficazes para lidar com a insatisfação humana, a exemplo do que se forjou com a Democracia de Partidos.

Nesse modelo, buscou-se uma organização capaz de mediar à relação Estado-sociedade, de forma a construir uma vontade geral articulada à vontade popular, que seria feita pelo Partido Político. São protagonistas, pois, da mecânica representativa, responsáveis por formar vontade estatal a partir da vontade popular e, para tanto, devem deter a prerrogativa da atuação dos mandatários, seja por meio dos cargos do sistema proporcional seja nos majoritários, uma vez que a finalidade das agremiações é de articular os seus interesses.

Assim, quando a coexistência de diferentes propostas não é amplamente permitida na seara do debate político-eleitoral, mediante a imposição de barreiras que dificultam ou mesmo excluem a plena consideração das diferenças e particularidades dos diversos segmentos no processo de legitimação política, a concepção do pluralismo político como princípio republicano fica prejudicada em sua essência, enfraquecendo as instituições partidárias tidas como elementares nesse processo.

Os limites para a interferência Legislativa, Executiva ou Judicial na autonomia conferida aos Partidos Políticos pela Carta Magna estão postos no próprio texto constitucional, devendo o controle pautar-se na garantia do pluralismo político e não na sua violação.

Os Partidos Políticos necessitam, é fato, de recursos financeiros, não apenas para as campanhas, mas para sua organização e estruturação que são concedidos em grande parte, pelo Fundo Partidário, devendo estar atrelado ao mínimo de equilíbrio e proporcionalidade, de forma a permitir que cumpram seu papel como instrumentais democráticos, sob pena de privilegiar sempre as grandes legendas que possuem acesso a maior parte do fundo público. O cerceamento do acesso dos partidos aos meios gratuitos de comunicação (rádio e televisão) acaba vilipendiando o que seria um dos grandes fins da própria existência da organização, ou seja, difundir seus preceitos, princípios, programas, para que possam participar do embate político.

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Hodiernamente as normas constantes do artigo 17, §3º são realizadas segundo regras de transição; a sua plena eficácia em 2030 poderá significar a inviabilidade material de todos aqueles Partidos que não alcançarem êxito nesse período de transição. Novos partidos, por exemplo, que forem criados após 2030, pouco provavelmente terão oportunidade de expor para a sociedade em geral seus ideais.

O método de procedimento manejado foi o monográfico, e o de abordagem foi o dedutivo e em decorrência da temática apresentada, utilizou-se de conteúdo interdisciplinar, em especial da ciência política, do direito constitucional, do direito eleitoral e partidário. No que diz respeito à técnica de pesquisa, foram utilizadas as modalidades bibliográfica e documental.

Para a concretização deste trabalho, o estudo foi organizado em quatro capítulos, fundamentais para oferecer sustentação teórica e argumentativa à tese.

No primeiro capítulo, far-se-á uma abordagem teórica atinente ao conhecimento das variáveis da democracia. A ideia de democracia emerge justamente da necessidade de garantias e de quem detém o poder soberano, retirando o poder autocrático e transferido ao povo. Hodiernamente, é sabido, o povo manifesta-se por intermediários (seus representantes), uma vez que, em regra, as sociedades são demasiadamente numerosas, não sendo possível esse povo soberano manifestar-se de forma direta. Contudo, é preciso entender como essa forma de participação democrática foi construída, para inserir a Democracia de Partidos no contexto atual.

Para tanto, o capítulo inicia com a formação do processo de democratização, que buscou afastar os subjetivismos próprios da Idade Média, como a tradição ou religião. A influência dos contratualistas como Locke e Rousseau no processo de formação de afirmação de direitos - em que pese esse último ser descrente quanto a governos democráticos, que influenciaram diretamente a formação de uma vontade geral, por meio de contrato social, através de um poder constituído.

Assim, como se verá, com o advento da Idade Moderna e o início do pensamento iluminista e liberal, os valores do humanismo medieval e renascentista passaram a se concretizar enquanto valores políticos e emergir a democracia, sendo largamente desenvolvida e influenciada a ideia de liberdades individuais, que desaguaram em formas de participação do povo.

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Aborda-se ainda neste capítulo, como se dá a participação na criação da ordem democrática, que caracterizará as formas de democracia. Assim, será perpassada a formação democrática clássica – a democracia direta, como o mais antigo regime democrático. Desenvolvida pelos gregos em suas cidades-estados, formou um governo da maioria e como tal pautado na igualdade, cujo modelo, todavia, esgotou-se com o aumento populacional, o que tornou cada vez mais impossível a participação direta do povo nas decisões do Estado.

Assim, tratar-se-á da democracia representativa, que tem sua origem no sistema liberal clássico e trabalha com a dualidade representante e representado. Será apresentada a evolução desse modelo, desde a sua fase embrionária do estabelecimento de um poder Legislativo com os contratualistas, por exemplo, até o surgimento de teorias democrática dos utilitaristas como Bentham e Mill, a evolução do pensamento de Stuart Mill.

Ainda, nesse ponto, considerando a dualidade representante e representado é importante entender que representação é essa. Motivo pelo qual, será aberto subtópico próprio para expor o aporte teórico da representação política. Discorrer-se-á portanto, acerca da origem do termo representação política, a sua formação, que tem na teoria hobbesiana essencialmente seu nascedouro político como um modelo de delegação, vinculada à ideia de autoridade. Verificar-se-á também a representação como um modelo relação de confiança, que tem em Burke seu expoente, no qual o eleitor já sabe que está transferindo o poder a outrem, que se traduz da representação de interesses gerais, e a representação vista como um espelho, como um reflexo, que leva em consideração as características e semelhanças existentes entre os representantes e os representados.

Outro elemento a ser abordado será a forma como se dá o diálogo entre representante e representado: o mandato, pois é nele que se consubstanciarão a própria representação e a legitimidade da autoridade. Assim a clássica discussão acerca do mandato divide-os em três modelos: i) mandato imperativo; ii) mandato representativo e iii) mandato partidário. A compreensão de cada um deles é especialmente relevante para que se possa compreender como se dá a relação entre representante e representado, bem com a quem pertence o mandato.

Importa dizer, desde já, que o mandato partidário é o modelo, ainda que implicitamente, adotado pela Carta 1988, quando no artigo 14, determina que a ―soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para

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todos‖, e condiciona a elegibilidade à filiação partidária (art. 14, §3º, V, CRFB), esse inclusive é entendimento adotado pelos Tribunais pátrios, em geral, ao tratarem da temática da fidelidade partidária.

Ponto ainda trabalhado no primeiro capítulo, refere-se à democracia representativa partidária, que seria uma evolução lógica do modelo liberal clássico, em decorrência da necessária intermediação partidária. Mas não se está aqui tratando, ainda, de uma Democracia de Partidos ou Estado de Partidos, que pressupõe outros requisitos que vão além dessa intermediação, mas partem da evolução lógica desse modelo. E é nesse ponto, que será explicada a teoria da Democracia de Partidos, com o aporte teórico desde sua origem em Kelsen à estruturação por Leibholz.

Kelsen foi o grande precursor dessa teoria, que viu a necessidade de revisão da democracia clássica liberal ante o aparecimento, em regimes democráticos, dos totalitarismos. Para o autor, a democracia implica a identidade entre o objeto e o sujeito do poder. Esse poder, exercido pelo povo que efetiva a vontade geral, por meio dos direitos políticos, somente poderá se dar, por meio de uma organização em partidos.

A partir da leitura de Kelsen será possível ver essa nova realidade democrática fundada nos partidos políticos como peças imprescindíveis para realização do próprio princípio democrático. Com Leibholz a visão do Estado de Partidos ganhou uma versão mais elaborada, vinculando, a partir da representação proporcional, a liberdade dos deputados aos interesses partidários. Elenca dois critérios básicos que devem anteceder a esse modelo: a prévia constitucionalização dos partidos e o reconhecimento destes com relevância fundamental ao sistema político democrático.

Além disso, como se verá, Leibholz concebeu um ideal necessário para verificação acerca da possibilidade da existência de um Estado de Partidos em determinado sistema político, seriam: a formação política da vontade; o financiamento público; o mandato comissionado/partidário; a fidelidade e disciplina partidárias; e as eleições plebiscitárias e a democracia interna partidária.

A natureza do mandato sofre diversas críticas, como será tratado no decorrer deste trabalho, contudo, é visível nos julgados dos nossos Tribunais a tendência de fortalecimento do mandato partidário e consequentemente dos partidos políticos.

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Dadas as bases teóricas fundantes deste trabalho, o segundo capítulo trabalhará com o Partido Político no sistema constitucional pátrio. Para tanto, será inicialmente contextualizado o regime constitucional democrático de direito e como o Partido Político se insere, sendo realizado um aporte do próprio Estado de Direito e a evolução deste para o Estado Constitucional de Direito.

Ato contínuo, ainda neste segundo capítulo, será o Partido Político identificado como ator principal do pluralismo político, uma vez que o Estado Democrático de Direito assentado nos fundamentos republicanos é caracterizado em essência pelo pluralismo. Nesse ponto, dar-se-á especial atenção ao princípio do pluralismo político, uma vez que foi alçado à condição de princípio estruturante da organização política.

Na sequência, serão abordadas a origem do Partido Político em si, suas diversas abordagens e conceituação, por diversos doutrinadores. Trabalhar-se-á acerca da trajetória histórica dos partidos, e aqui tomando como base a análise realizada por Mezzoraba, desde o Brasil Colônia, perpassando pelo Império, Primeira e Segunda Repúblicas, o Estado Novo, a chegada na Quarta República, os partidos no Regime Militar.

A partir do terceiro capítulo, o Partido Político será inserido na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, momento em que se explanará acerca da constitucionalização dos Partidos Políticos – antecedente necessário a uma Democracia de Partidos.

Assim, serão abordados nesse ponto, ainda que de forma breve, os sistemas eleitoral (majoritário e proporcional) e partidário, visando à compreensão dos reflexos ocorridos com a alteração sensível inserida pela Emenda Constitucional n. 97, de 2017, que constitucionalizou o controle quantitativo dos partidos, uma vez que o enfoque dessa análise quantitativa dá-se no sistema proporcional. Assim como a relação do presidencialismo de coalização com os partidos políticos nessa seara.

Destarte, contextualizados os sistemas eleitoral e partidário, ainda no terceiro capítulo será analisada a liberdade partidária constitucional a partir de seus princípios balizadores elencados na Carta Magna, uma vez que, ―é livre a criação, fusão, incorporação e extinção de partidos políticos, resguardados à soberania nacional, o regime democrático, o pluripartidarismo, os direitos fundamentais da pessoa humana‖. E em seguida, far-se-á uma

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exposição acerca dos controles formais impostos pela Carta Magna, como detalhado no parágrafo anterior.

Seguindo a análise, será apresentada a natureza jurídica dessas organizações, conforme preceitua o parágrafo segundo do artigo 17 da CRFB, uma vez que foi com a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 que o partido político ganhou o status de associação de caráter privado e não um organismo vinculado ao poder público. A sua criação é de interesse da sociedade civil e da sua vontade na participação da vida pública e política, seu estatuto e sua organização interna são de responsabilidade e de decisão dos seus membros.

Especial atenção será dada, ainda, à autonomia partidária como garantia constitucional e consequente organização interna (democracia interna) dos partidos. Adiante, será analisado mais uma garantia constitucional dos Partidos Políticos que decorre da própria autonomia: a disciplina e fidelidade partidárias, também presentes nas disposições atinentes aos Partidos Políticos da CFRB e requisito, para a Democracia de Partidos.

A perda do mandato por infidelidade também será pauta aqui, cujo entendimento consolidado pela doutrina era de que se daria apenas nas hipóteses previstas no texto constitucional que estão descritos de forma taxativa, os quais não tratariam da infidelidade. Contudo, como se verá, a discussão acerca da perda do mandato e consequentemente da fidelidade partidária voltou ao centro das discussões jurisprudências e teve uma reviravolta, por meio de Consultas realizadas ao Tribunal Superior Eleitoral (Consulta n. 1398/DF - Resolução n. 22.526/20071, Consulta n. 1.423/DF - Resolução n. 22.5632, Consulta n. 1.426/DF - Resolução n. 22.6083, e Consulta n. 1407 – Resolução n. 22.6004), que versavam de uma forma geral acerca da fidelidade partidária e do detentor do mandato – partido ou eleito, no sistema proporcional, nas quais mantinham com o partido o mandato.

1 Inteiro teor em file:///C:/Users/Administrator/Downloads/Resolu%C3%A7%C3%A3o.pdf. Acesso em 3 de

jun. 2019.

2 Inteiro teor em file:///C:/Users/Administrator/Downloads/CTA%201423%2001.pdf. Acesso em 3 de jun. de

2019.

3 Inteiro teor em: file:///C:/Users/Administrator/Downloads/CTA%201426%2023.pdf. Acesso em 3 de jun. de

2019.

4 Interior teor em file:///C:/Users/Administrator/Downloads/CTA%201407%2016.pdf. Acesso em 3 de jun. de

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A partir desses precedentes coube ao TSE, por determinação do Supremo Tribunal Federal5, regulamentar a perda de mandato por desfiliação partidária, o que ocorreu por meio da Resolução n. 22.610/2007, de 25 de outubro de 20076. É claramente perceptível que a infidelidade, após a resolução, ficou vinculada à ideia de mudança de partido quando não caracterizada as hipóteses de justa causa. Quando, por meio das alterações inseridas pela Lei n. 13.165/2015, foi acrescido o artigo 22-A da Lei dos Partidos Políticos, mantendo a ideia de justa causa, nas seguintes hipóteses: ―I - mudança substancial ou desvio reiterado do programa partidário‖, ainda ―II - grave discriminação política pessoal‖ e por fim, ―III - mudança de partido efetuada durante o período de trinta dias que antecede o prazo de filiação exigido em lei para concorrer à eleição, majoritária ou proporcional, ao término do mandato vigente.‖ 7.

Aqui far-se-á uma crítica especial às ―janelas partidárias‖, criadas pelo legislador, consubstanciada na troca de partido pelo representante eleito, o que, invariavelmente, acaba por fragilizar a ideia da fidelidade e da própria qualidade do partido.

Ainda tratando das garantidas constitucionais dos Partidos Políticos, será analisado nesse terceiro capítulo o direito ao Fundo Partidário e o acesso gratuito aos meios de comunicação, ressaltando desde já, que as peculiaridades inseridas pela EC n. 97/2017, serão analisadas em detalhes no capítulo final do trabalho. A Carta de 1988 constitucionalizou o acesso ao fundo e aos meios de comunicação pelos partidos para que, em tese, possam usufruir de recursos para a divulgação de seus programas e financiamento das suas atividades, sendo a forma de acesso a esses recursos essenciais as atividades de fortalecimento das organizações partidárias. De sorte que, neste ponto, tratar-se-á do modo como o ordenamento pátrio organiza o financiamento partidário, que hoje é eminentemente público.

Dessa forma, no quarto e último capítulo analisar-se-á a hipótese desse trabalho, cuja problematização consistiu em verificar justamente se é possível a partir dessas alterações promovidas no artigo 17 da CRFB pela Emenda Constitucional n. 97/2017 garantir o

5 O Julgamento dos Mandados de Segurança n. 26.602, n. 26.603 e n. 26.604 pelo Supremo Tribunal Federal,

por maioria reconheceu a existência do dever constitucional de observância do princípio da fidelidade partidária, confirmando a orientação jurisprudencial ensaiada pelo TSE.

6 Inteiro teor em

http://www.tse.jus.br/legislacao/codigo-eleitoral/normas-editadas-pelo-tse/resolucao-nb0-22.610-de-25-de-outubro-de-2007-brasilia-2013-df Acesso em 3 de jun. de 2019

7 A referenciada lei alterou Leis n.9.504, de 30 de setembro de 1997, 9.096, de 19 de setembro de 1995, e

4.737, de 15 de julho de 1965 - Código Eleitoral. Inteiro teor em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13165.htm Acesso em 4 de jun. de 2019

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fortalecimento dos Partidos Políticos a partir de uma Democracia de Partidos no cenário nacional.

Para tanto, é preciso entender quais foram as mudanças promovidas pela EC n. 97/2017 no seio das instituições partidárias. Assim, a partir da compreensão do Partido Político e das garantias que a Constituição lhe atribuiu, bem como a forma de escolha dos candidatos no sistema proporcional, será analisada a cláusula de desempenho que é inserida no ordenamento constitucional e infraconstitucional para regular a participação dos partidos.

Tratadas dessas premissas, e considerado aqui ponto elementar, será exposto como o Supremo Tribunal Federal julgou as Ações Diretas de Inconstitucionalidade n. 1.351-3/ DF e 1.354-8/DF, que tinham por objeto a harmonia ou não do artigo 13 da Lei dos Partidos políticos e correlatos com a Constituição Federal. Inseriu-se ali uma cláusula de desempenho aos partidos, que versava sobre o funcionamento parlamentar e repercutia diretamente no Fundo Partidário e no acesso gratuito aos meios de comunicação.

Como se verá, no referido julgamento, vários foram os fundamentos utilizados pelos Ministros em seus votos para declarar a inconstitucionalidade da cláusula de barreira da Lei dos Partidos Políticos, tendo como essenciais às violações ao pluralismo político e proteção às minorias. Nesse viés, após a declaração de inconstitucionalidade dos artigos previstos na Lei n. 9.096/95 que usurpavam direitos dos partidos à participação no parlamento, o Congresso Nacional aprovou em setembro de 2017 a Emenda Constitucional n. 97, que instituiu uma nova Cláusula de Barreira nacional no ordenamento eleitoral brasileiro, especificamente no parágrafo terceiro do artigo 17 da CRFB.

Assim, será realizada uma análise, pautada nos pressupostos do Supremo, se o atual modelo previsto no artigo 17 permite (ou não) garantir o pluralismo político como forma de fortalecimento das próprias instituições partidárias.

A grande pauta do Supremo ao analisar a constitucionalidade do artigo 13 da Lei dos Partidos Político, foi justamente a preservação do direito das minorias, sob pena de mitigação do princípio republicano do pluralismo político e do pluripartidarismo. Assim, a partir desse ponto o trabalho se voltará à tentativa de encontrar uma maneira de harmonizar o princípio republicano do pluralismo político, como garantia de igualdade de chances, de direitos das minorias.

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Para tanto, e considerando a Democracia de Partidos, pensada como um sistema que tem o fim de garantir o fortalecimento da atuação dos Partidos no sistema representativo, tidos como corpos intermediários entre o povo e o Estado, canalizadores da vontade popular, como fundamentais para a construção democrática pautada no pluralismo político, serão recuperados os requisitos elencados, associado as garantias constitucionais dedicas a Partidos Políticos, com enfoque na referência teórica de Kelsen-Leibohlz, como forma de fortalecer os elementos essências à compreensão de uma alternativa à crise de representatividade que assola os partidos políticos. A partir do exposto, propomos um redimensionamento do disposto no artigo 17 para o fortalecimento partidário, pensado no viés da Teoria do Estado de Partidos.

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2 AS VARIÁVEIS DA DEMOCRACIA

Foi com os Estados Modernos que houve o afloramento de movimentos essenciais para o processo de democratização. Isso porque desencadeou-se a dualidade entre Estado e sociedade e inaugurou-se um processo propriamente dito de representação. Os juspositivistas do século XVIII viam no Direito uma justificação do poder do Estado e do governante, afastando-se de subjetivismos como tradição ou religião, concepções comuns ao Estado Medieval. A partir dos contratualistas modernos como Locke e Rousseau, que se pensou na coercibilidade como parte do Direito, vinculando-se o poder político e, consequentemente, ao Estado.

Tal compulsoriedade decorre do ―pacto social‖ pregado, dentro das devidas diferenças pelos contratualistas, que explica a passagem do estado de natureza para o estado de sociedade civil, ou seja: aqueles que possuem certos direitos naturais não o fazem valer senão por meio da instituição de poder político capaz de lhes assegurar esses direitos. Assim, ―um poder capaz de impor-se a cada um dos indivíduos: esse poder soberano, que surge e se fundamenta com o pacto social, é o que faz com que os direitos naturais passem a ser direitos civis‖8 (ATIENZA, 2004, p. 117 – tradução nossa).

Rousseau (1996, p. 36) via no contrato social uma forma de resgatar a liberdade natural e consequentemente garantir a liberdade civil, já que segundo ele, somente por meio desse pacto as pessoas teriam suas vidas e bens protegidos, pois se uniriam todos e somente obedeceriam a si próprios. Seu pensamento segue para a formação de um contrato social, em que somente através de um poder constituído por uma decisão soberana da população que são estabelecidas regras, poder-se-ia pensar em centros de poder e convivência.

Ainda, salienta o contratualista, que a força pública precisa para sua efetivação de um agente que possa se portar de acordo com as direções da vontade geral, por isso, ressalva, é preciso que um Estado tenha um governo que é ―um corpo intermediário estabelecido entre os súditos e o soberano para sua mútua correspondência, encarregado da execução das leis e da manutenção da liberdade, tanto civil quando política‖ (ROUSSEAU, 2011, p. 112).

8 ―un poder capaz de imponerse a cada uno de los individuos: ese poder soberano, que surge y se fundamenta

con el pacto social, es lo que hace que los derechos naturales pasen a ser derechos civiles‖ (ATIENZA, 2004, p. 117).

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O Autor pautou seu modelo na ideia de autoridade. Para o contratualista uma verdadeira democracia nunca existiu, pois, segundo ele é naturalmente contraditório um grande número governar. Isso porque ―a soberania não pode ser representada pela mesma razão pela qual não pode ser alienada; consiste ela essencialmente na vontade geral, e a vontade geral não se representa‖ (ROUSSEAU, 1996, p.107-108).

Locke (1999, p. 139) tinha na formação do acordo entre os homens a única maneira através da qual ―alguém se despoja de sua liberdade natural e se coloca dentro das limitações da sociedade civil‖. Enquanto Hobbes (1997, p. 141) via o Estado, por ele denominado de Leviatã, incorporado na instituição capaz de dar a proteção e conservação necessária à coletividade, somente assim, com a formação e cumprimento de pactos e respeito às leis de natureza, com a justiça, equidade, modéstia, piedade, seria possível sair da ―mísera condição de guerra‖.

Com o advento da Idade Moderna e o início do pensamento iluminista e liberal, os valores do humanismo medieval e renascentista passaram a se concretizar enquanto valores políticos e emergir a democracia, sendo largamente desenvolvida e influenciada a ideia de liberdades individuais. Em que pese o movimento contratualista ter exercido forte influência na formação do Estado de Direito, na medida e diferença de cada teoria, foi a partir da década de 1920 e 1930 que surgiram teorias que iriam concretizar constitucionalmente o sentido de uma ―teoria normativa política‖.

Kelsen (2000, p. 28-29 e 35) foi um dos expoentes que viu a democracia, a partir da transformação das ideias de liberdade e igualdade, em princípios da organização social e estatal, tendo o conceito de liberdade sofrido uma alteração semântica dentro da lógica democrática, sendo entendido como ―autodeterminação política do cidadão, como participação do próprio cidadão na formação da vontade diretiva do Estado‖. O autor, como é sabido, trabalhou um conceito procedimental de democracia:

A democracia, no plano de ideia, é uma forma de Estado e de sociedade em que a vontade geral, ou, sem tantas metáforas, a ordem social, é realizada por quem está submetido a essa ordem, isto é, pelo povo. Democracia significa identidade entre governantes e governados, entre sujeito e objeto do poder, governo do povo sobre o povo (KELSEN, 2000, p. 35).

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Essa unidade do povo aparece do ponto de vista estritamente jurídico, e a participação da vontade geral se verifica, segundo Kelsen, por meio dos direitos políticos. Porém, destaca o autor:

Se quisermos passar da noção ideal para noção real de povo, não poderemos limitar-nos a substituir o conjunto de todos os indivíduos submetidos ao poder pelo círculo bem mais estreito dos titulares dos direitos políticos; é preciso dar outro passo e levar em consideração a diferença existente entre o número desses titulares dos direitos políticos e o número dos que efetivamente exercem esses direitos (KELSEN, 2010 p. 37-38).

Isso, conforme salienta Kelsen (2000, p. 39), nos coloca diante do que ele chama de ―um dos elementos mais importantes da democracia real: os partidos políticos, que agrupam os homens de mesma opinião, para lhes garantir influência efetiva sobre a gestão dos negócios públicos‖.

A ideia de democracia emerge justamente da necessidade de garantias e de quem detém o poder, retirando do soberano e transferido ao povo. Hodiernamente, é sabido, o povo manifesta-se por intermediários (seus representantes), uma vez que em regra as sociedades são demasiadamente numerosas para que haja o exercício direto.

Nada obstante, é preciso entender como essa forma de participação democrática foi construída para inserir a Democracia de Partidos no contexto atual. Assim, importante perpassar a formação democrática clássica (democracia direta), até a democracia representativa e sua possível evolução a uma democracia partidária.

2.1. A DEMOCRACIA E SUAS FORMAS

Do vocábulo grego demos (povo) e cracia (governo), a democracia, desde sua origem passa a ideia de governo do povo. A participação popular é intrínseca à democracia. Bonavides (1997, p. 51) salienta que sem participação não há democracia, ela que dará força, eficácia, e legitimidade às relações de poder e ao fenômeno político.

A fórmula democrática tem sua origem nos destinatários do poder: o povo, e na definição básica de Abraham Lincon, ―o governo do povo, pelo povo e para o povo‖. Assim tal sistemática vai consagrar contornos indisponíveis do pluralismo político, da liberdade (livre manifestação) para a busca da garantia que as escolhas espelhem as perspectivas sociais (HOFSTADTER, 1958, p.414).

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Ao se definir a democracia como um governo do povo, define-se quem governa. Mas o conceito de povo não é um conceito fechado. O povo, essa pluralidade de indivíduos, para Kelsen (2000, p. 36-37) é uma unidade vista como sujeito de poder do ponto de vista jurídico, pois é uma realidade resultante de um dado jurídico: ―a submissão de todos os seus membros à mesma ordem jurídica estatal constituída‖ e, salienta, ―a participação na vontade geral se dará por meio dos direitos políticos, por meio daqueles que exercem efetivamente esses direitos‖. Povo, para Negri (2008, p. 57), é um ―sujeito constitucional‖, na medida em que deve ser assegurado a ele ―a condição de protagonista das decisões mediante compartilhamento decisório (discurso que vincula todos os seres humanos que estão reunidos pelo mesmo conjunto de normas constitucionais)‖.

Uma noção muito usada na Europa, resultado de decisão proferida pelo Tribunal Constitucional Alemão, de 23 de outubro de 1952, define a ordem democrática como ―aquela pertinente ao poder no âmbito de um Estado de Direito, exercido com fundamento na autodeterminação do povo, de acordo com a vontade da maioria, com observância da liberdade e da igualdade, excluído todo o poder violento e arbitrário‖ (GICQUEL, 2002, p. 186). Emergem, de forma geral, os conceitos de liberdade e igualdade, como dito por Kelsen (2000, p. 32), no ideal democrático, que se considera satisfeito ―na medida em que os indivíduos submetidos a ordem o Estado participam da criação desta mesma ordem‖.

A forma como se dá a participação na criação da ordem caracterizará as formas de democracia. Conhecer a formação e a evolução do pensamento democrático é essencial para a compreensão da teoria do Estado de Partidos. Diga-se, por relevante, que seja na democracia direta ou representativa, há em comum a passagem de governos autocráticos para democráticos. Destarte, será tratado a seguir do registro histórico acerca da democracia direita e a representativa, para fornecer uma visão panorâmica acerca do fenômeno democrático, e posteriormente, demonstrar, como citado por Garcia-Pelayo (1986), a sua evolução à democracia representativa partidária e à democracia de partidos.

Importante lembrar que tal abordagem não tem a pretensão de abarcar por completo todas as elaborações teóricas acerca da temática e sim valorizar alguns traços essenciais para a compreensão da visão do Estado de Partidos teorizado, em especial, por Kelsen e Leibholz.

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2.1.1. A Democracia Direta

O mais antigo regime democrático é o da democracia direta, modelo desenvolvido pelos gregos em suas cidades-estados9. Na democracia direta, a soberania popular é exercida sem intermediários ou representantes, onde os cidadãos10, titulares do poder político, participam das decisões, discutindo-as e votando-as em assembleias. Nessa forma de regime os representantes são dispensáveis, pois quem decide de forma direta é o povo.

Velloso e Agra (2014, p. 19-21) ao tratarem da origem da democracia registram Atenas como sua precursora, em que pese apenas uma minoria ter participado dessa formação. Chevallier (1983, p.31) ressalva que os cidadãos de Atenas11 passaram a decidir diretamente em assembleia geral sobre os assuntos concernentes à cidade, quando Clístenes instaurou as primeiras instituições democráticas atenienses em 508 a.C. Assim, todos aqueles que integravam um demo12, dirigido por um demarca, participavam das assembleias, surgindo daí a expressão democracia, ou seja, governo do demos, pela junção do governo (kratia) do povo (demos).

Foi através da democracia ateniense que nasceu a ideia fundamental do pensamento democrático, que posteriormente iria constituir para autores como Rousseau e Kelsen, o princípio fundamental do regime: a liberdade. Todavia, importante esclarecer que tal liberdade deve ser vista com os olhos daquele tempo, isso porque não havia liberdade do

9 Definição de Cidades-estados ou pólis: ―Por Pólis se entende uma cidade autônoma e soberana, cujo quadro institucional é caracterizado por uma ou várias magistraturas, por um conselho e por uma Assembleia de cidadãos (politai).‖ (BOBBIO, 1995, p. 949).

10 Vale lembrar que a democracia direta grega reconhecia como cidadãos apenas algumas pessoas: para ser considerado cidadão aqueles do sexo masculino nascidos de pais atenienses. Era uma sociedade patriarcal, de sorte que as mulheres não possuíam o direito à cidadania. Estavam excluídos desse rol os metecos (estrangeiros) e os escravos. Nesse sentido ver: ROSSET, Luciano. A democracia ateniense: filha de sua

história, filha de sua época. Revista de Cultura Teológica. V. 16, n. 64, Jul/Set. 2008, p. 183-207.

11 A democracia ateniense foi o modelo, que por suas dimensões culturais e econômicas, mais se expandiu pelo

mundo, chegando aos nossos dias por meio dos seus historiadores e filósofos, todavia, como ressalva Bonnard (1984, p. 102), não foi ela – a democracia ateniense – a primeira cidade-estado governada democraticamente: antes havia as cidades na Jônia.

12 O termo demo, significa um subdivisão da Ática, região da Grécia ao redor de Atenas, eram subdivisões de

terra que existiam mesmo antes das reformas operadas por Clístenes em 508 a.C.. Nesse sentido ver: VAYENÁS, Alexander. Democracia: das origens à modernidade. In: ZANERRI, Hermes (org). Democracia:

a grande revolução. Brasília: UnB, 1996, p. 31/33; LEISTER, Margareth. A polis ateniense. Revista Mestrado

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homem antigo com relação às leis da cidade, ele estava à disposição da pólis e somente os cidadãos as alcançavam13.

Segundo Bobbio (1992, p. 58-59), a ideia do homem livre que poderia se opor contra o Estado, que teria direitos individuais, pertence ao jusnaturalismo e só veio a ser inserido com John Locke. Antes disso, ressalva Bobbio, os direitos que os homens possuíam estavam restritos à oikia, ou seja, a casa, à esfera econômica do seu próprio domínio.

Conforme destaca Jaguaribe (1985, p. 48), o povo que se constituía no poder de exercer a democracia era um conjunto reduzido dos possuidores de bens, excluídos, portanto, grande contingente de produtores, escravos, mulheres e estrangeiros, pois, para isso, o cidadão deveria provar, por exemplo, ―o pleno gozo dos seus direitos políticos, que não devia ao Estado, que era de costumes puros, que estava legitimamente casado, que possuía bens de raiz na Ática [...]‖. Ressalva o autor que a exclusão populacional realizada na democracia ateniense deve ser relativizada, pois devem levar em conta ―o fato de que nenhum sistema político pode superar os parâmetros da própria cultura‖.

Chaui explica que a democracia grega era direta ou participativa e não como as modernas representativas salienta a autora que nesse sistema:

Dois princípios fundamentais definem a cidadania: a isonomia, isto é, a igualdade de todos os cidadãos perante a lei, e a isegoría, isto é, o direito de todo cidadão de exprimir em público (na Boulé ou na Ekkléria) sua opinião, vê-la discutida e considerada no momento da decisão coletiva. Assim, a democracia ateniense não aceita que, na política, alguns possam mais que outros [...] (CHAUI, 1997, p. 111).

Urbinati (2010, p.214) lembra que ―escritos clássicos que descreviam a democracia ateniense realçaram que todos os cidadãos possuíam uma chance igual não apenas de competir pelo poder, mas também de propor leis e conquistar a maioria na ekklesia‖.

Aristóteles (2010) via na democracia um governo da maioria, no qual tinha como essência a igualdade. Para o filósofo a igualdade e liberdade eram valores a ela. De se destacar que essa maioria na Antiguidade era a minoria, ou seja, uma minoria de homens livres cuja liberdade só a eles era conferida. Para o autor, a pluralidade da cidade seria indispensável para a diversidade de fins próprios da comunidade política. Segundo Bobbio

13 Característica própria da antiguidade era a distinção entre pólis e oikia: segundo FERRAZ JR (1993, p. 27),

a oika ou casa, era o governo de um só, ―a sede da família e e as relações familiares eram baseadas na diferença: relação de comando e de obediência, donde a ideia do paterfamílias, do pai, senhor de sua mulher, seus filhos e seus escravos‖ e a pólis era por muitos governada.

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(1995, p. 321), essa tipologia clássica aristotélica, chega até a era moderna em autores como Locke e Rousseau.

Esse modelo logo se esgotou com o fim das cidades-estados e pelo aumento populacional, cada vez mais se tornava impossível a participação direta. Atualmente é quase impossível, considerando que não há forma de catalisar toda a vontade da população. Borja (1991, p. 126), ao tratar do assunto ressalta que esse governo direto, pensado como governo do povo pelo povo, ―é definitivamente uma ficção, carente de conteúdo real e de possibilidade prática, haja vista que é impossível que a multidão exerça por si mesma as funções diretivas do Estado‖.

A democracia em Atenas revelou, à sua época, de forma original dois princípios democráticos: a liberdade e a igualdade. Isso porque garantia, segundo Chevallier (1983, p.31-34), a igualdade de justiça para todos (isonomia), abolia títulos ou funções hereditárias (isotimia) e garantia o direito do uso da palavra em assembleias (isagoria).

Não obstante, Bobbio (1997, p.53-54) destaca a insuficiência da democracia direta quando analisados dois dos seus institutos clássicos, hoje encontrados nas democracias modernas (representativas): i) assembleia dos cidadãos deliberantes sem intermediários; e ii) referendum. Quanto à assembleia dos cidadãos, o autor afirma que tal órgão deliberativo estaria restrito as pequenas comunidades, como a Atenas dos séculos IV e V, ―quando os cidadãos não passavam de poucos milhares‖ e ainda era possível reuni-los em um mesmo lugar estabelecido.

No que tange ao referendum, o autor aduz que de fato é o único instrumento de que se utiliza a democracia direta, dotado de ―concreta aplicabilidade e de efetiva aplicação na maior parte dos estados de democracia avançada‖, porém, adverte ser um instrumento que cabe apenas em ―circunstâncias extraordinárias‖ (BOBBIO, 1997, p. 54-54). Tal advertência se deve ao fato da inviabilidade de consulta à população em razão do volume da demanda legislativa.

Imaginar a aplicação do referendum como uma regra no sistema nacional brasileiro, seria algo complexo. Vejamos, por exemplo, os dados coletados pelo Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação – IBPT (AMARAL, 2017), no qual realizou-se uma pesquisa acerca da produção normativa no país desde a promulgação da Constituição Federal de 1988. Segundo esse estudo:

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