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2. F UNDAMENTOS TEÓRICOS

2.3. O nível local e suas políticas de desenvolvimento

2.3.2. A dimensão econômica do desenvolvimento local

Não será demais reforçar que dar atenção à dimensão econômica do desenvolvimento local não significa diminuir a importância dada às variáveis sociais, culturais ou políticas desse processo. Coelho, por exemplo, ao identificar as microfinanças e o apoio ao desenvolvimento de pequenos empreendimentos como tendências de destaque entre as experiências de desenvolvimento econômico local, nota que

[...] este é um processo que vem se caracterizando por mudanças nos padrões culturais dos grupos envolvidos, presença de instituições flexíveis de financiamento e capacitação, vontade política de alguns governos, integração entre os agentes públicos e privados, e inovações nas formas de gestão e organização dos empreendimentos (COELHO, 2000, p. 11).

Assim, continua a preocupação com os caminhos e as alternativas pelos quais se implementam as políticas. O que os textos que têm o desenvolvimento econômico local como foco destacam, porém, é o desafio de que as mudanças de ordem quantitativa se dêem com raízes sólidas.

Esta não é uma questão trivial. Inicialmente, há poucos estudos que pretendem medir detalhadamente o impacto dos projetos sobre o crescimento econômico local e a geração de empregos, até pela dificuldade de se criar indicadores adequados que combinem os diversos aspectos do desenvolvimento. Além disso, as poucas pesquisas que avançam nessa direção apontam para impactos quantitativos ainda limitados, aquém dos modelos projetados e das expectativas criadas pelos atores envolvidos (COELHO, 2004; FRANÇA, VAZ e SILVA, 2002).

Não se pretende minimizar as dificuldades que tais políticas necessariamente encontram, como o cenário macroeconômico pouco favorável em anos recentes, ou mesmo a possibilidade de que transformações sólidas e profundas requeiram um tempo de maturação que as atuais pesquisas ainda não conseguiram captar23. Talvez seja o caso de se ter mais clareza nas premissas que sustentam um desenvolvimento econômico de bases endógenas, o que contribuiria para a elaboração de planos e a implementação de projetos mais consistentes.

Assim, uma caracterização desse conceito, com base em estudos da CEPAL, parte da hipótese pela qual as localidades e os territórios têm um conjunto de recursos (econômicos, humanos, institucionais e culturais) e de economias de escala não explorados (COELHO, 2004). Portanto, uma política de desenvolvimento econômico local passa pela valorização e pelo melhor uso desses recursos próprios, buscando complementá-los com inovações de gestão, adaptações institucionais e fomento às micro e pequenas empresas, além da capacitação dos recursos humanos (ALBUQUERQUE, 2004). É interessante notar que o autor reforça a idéia segundo a qual o capital social e a identidade regional não são apenas vistos como dados e imutáveis, mas sim que podem ser o resultado de processos lentos porém abertos à influência positiva da construção de espaços de debates e parcerias (concertación), e da promoção de confiança entre os atores.

Vazquez-Barquero (2000) apresenta quatro fatores que determinam o desenvolvimento endógeno: 1) a difusão de inovações e conhecimento; 2) a organização flexível da produção; 3) o desenvolvimento urbano do território; e 4) a densidade do tecido institucional.

A difusão de inovações e conhecimento impulsiona a transformação e a renovação do sistema produtivo, contribuindo, em última instância, para a acumulação de capital. Espera-se que essas inovações sejam endógenas ao sistema, e que permitam que se obtenha economias internas e externas de escala. Por inovação entende-se a produção de novos bens, a introdução de novos métodos de produção, a criação de novas formas de organização ou mesmo a abertura de novos mercados.

A idéia de uma organização flexível da produção se traduz na existência, no nível local, de uma rede de empresas locais, permitindo a geração de diversos mercados internos e de espaços comuns que facilitam o intercâmbio de produtos, serviços e conhecimento. A essa tendência vem se somar o fato de que grandes empresas também têm-se voltado para esse nível, principalmente pela “proliferação de alianças e acordos estratégicos entre empresas” (VAZQUEZ-BARQUERO, 2000, p. 9, tradução nossa).

O desenvolvimento urbano do território parte de um entendimento da cidade como mais do que um simples ponto no espaço; ela é entendida como um território formado por um espaço construído e um conjunto de atores que tomam decisões de investimento e de localização de atividades produtivas. Também aqui está presente a idéia de que as cidades se modificam continuamente como resultado de processos de aprendizagem, de aquisição de conhecimento por seus atores e do estabelecimento de redes de cooperação entre eles. A cidade é vista por excelência como o espaço do desenvolvimento endógeno.

Por último, quando fala na densidade do tecido institucional, refere-se à constatação de que os processos de desenvolvimento não se dão no vazio, mas que têm profundas raízes institucionais e culturais. Terão mais capacidade de competir os municípios e as regiões cujos sistemas de instituições permitirem a produção de bens públicos e o incentivo às relações de cooperação entre os atores, favorecendo a aprendizagem e a inovação. Nas palavras do autor, “o desenvolvimento econômico, assim, se fortalece naqueles territórios que têm um sistema institucional desenvolvido e complexo” (idem, 2000, p. 11, tradução nossa).

Um processo consistente de desenvolvimento endógeno precisa, em última instância, da combinação desses quatro fatores. Sua articulação gera cada vez mais externalidades positivas, que permitem almejar rendimentos crescentes, “criando sinergias entre si e reforçando seus efeitos sobre a acumulação de capital” (ibidem, 2000, p. 12, tradução nossa).

Seja de caráter mais estrito, econômico, ou de escopo mais amplo, viu-se que o desenvolvimento de bases locais é o resultado de empreendimentos intencionais e, idealmente, coordenados e integrados. Albuquerque (2004) pondera que governos locais nem sempre começam tais esforços, mas que no longo prazo sua presença é fundamental para

garantir a institucionalidade que a iniciativa requer. A partir daí, é possível – e necessário, até – expandir tal pergunta: qual o papel dos governos municipais na promoção de tais processos?