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Panorama histórico das Assembléias de Deus no Brasil

1. Origem do pentecostalismo

1.4 A dissidência e o cisma

No Brasil, foram recebido por uma Igreja Batista, cujo pastor era Raimundo Nobre, onde foram acolhidos e passaram a residir nas dependências da igreja (Conde, 2005, p. 26). Como os missionários tinham dificuldades com a língua, primeiro foram aprender o português para posteriormente começarem a “disseminar a doutrina pentecostal, principalmente o batismo no Espírito Santo com o falar em línguas” (Romeiro, 2005, p. 38). Entretanto os jovens missionários tinham uma prática de oração incessante, e esses comportamentos começaram a chamar a atenção de alguns membros da igreja, que passaram a censurá-los, considerando-os fanáticos por dedicarem tanto tempo na oração e pregarem o batismo com o Espírito Santo (Reily, 2003, p.371).

A pregação de Vingren e Berg encontrou receptividade por parte de alguns e resistência por parte de outros, “e como resultado daquelas orações, alguns membros daquela igreja Batista creram nas verdades completas do evangelho que os missionários anunciavam” (Conde, op.cit., p. 30).

Podemos caracterizar a aceitação da nova doutrina por parte de alguns membros através do documento a versão de Vingren que diz:

Mais ou menos seis meses depois da nossa chegada, os diáconos da Igreja Batista me disseram: “Irmão Vingren, na próxima terça feira o irmão dirigirá o culto de aração!”

Eu entendi o seu pedido e li alguns versos no Novo Testamento sobre o Espírito Santo e disse algumas palavras. Isto foi em maio de 1911. Os diáconos tinham as suas Bíblias abertas para conferir se eu estava lendo certo. Parece que ficaram satisfeitos com o que eu disse.

Durante aquela semana tivemos culto de oração cada noite na casa de uma irmã, que tinha uma enfermidade incurável nos lábios e nós sentíamos tristeza, porque ela não podia assistir aos cultos na igreja. O primeiro que fiz foi perguntar se ela cria que Jesus podia curá-la. Ela respondeu que sim. Dissemos então para que ela deixasse, desde aquele instante, todos os remédios que estava tomando. Oramos por ela, e o Senhor Jesus a curou completamente. Nos cultos de oração, que se seguiram, ela começou a pedir e a orar pelo Batismo com o Espírito Santo. Na quinta-feira, depois do culto, ela continuou orando em sua casa. O seu nome era Celina Albuquerque. Ela continuou, pois, orando em sua casa juntamente com outra irmã. E

à uma hora da madrugada esta irmã Celina começou a falar em novas línguas e continuou falando durante duas horas. Foi, portanto, a primeira operação de Batismo com o Espírito Santo feito pelo Senhor Jesus em terra brasileira.

No dia seguinte à outra irmã, que presenciara tudo, foi e contou tudo o que vira aos outros membros da Igreja Batista. O seu nome era Nazareth. Na sexta-feira, depois de terminado o culto na igreja, veio à irmã Nazareth juntamente com outras irmãs para o nosso culto de oração. Aí mesmo Jesus batizou a irmã Nazareth com o Espírito Santo e ela também cantou um hino no Espírito.

Todos os demais que tinham vindo da Igreja Batista creram então que isto era uma obra de Deus, todos menos dois, o evangelista e a mulher de um diácono. O evangelista, que não quis crer, ficou muito orgulhoso e caiu debaixo do juízo do Diabo. Já no domingo seguinte notamos que ele havia sido tomado por um poder estranho e isto se notava mais ainda quando ele falava. Não era de admirar-se, pois ele era tão jovem e tinha tão pouca experiência.

Na terça-feira seguinte, ele convocou os membros da Igreja para um culto extraordinário e não permitiu nem que o pastor falasse. Ele somente disse:

“Todos os que estão de acordo com a nova seita levantem-se”.Dezoito irmãos se levantaram e foram imediatamente cortados da comunhão da igreja. O pastor da igreja, que era um homem verdadeiramente crente e muito sereno, orou então a Deus no seu coração e pediu a palavra. Abriu depois a sua bíblia e encontrou o verso que diz: “Pelo que saí do meio deles, e apartai-vos diz o Senhor, e não toqueis nada imundo, e eu vos receberei; e eu serei para vos Pai e vós sereis para mim filhos e filhas, diz o Senhor Todo-Poderoso”.

Estes dezoito irmãos saíram então da Igreja Batista para nunca mais voltar outra vez. Isto aconteceu no dia 13 de junho de 1911(Reily, 2003, p. 370).

Que igreja protestante não nasceu cismática? Divisionismo, aliás, reside no cerne do protestantismo (Niebuhr, 1992). O movimento pentecostal brasileiro se inicia a partir de dissidências. Mesmo que nenhum dos imigrantes pentecostais tenha vindo para fundar igrejas, Luigi Francescon chega ao Brasil como membro da Igreja Presbiteriana em Chicago e Daniel Berg e Gunnar Vingren da Batista. No Brasil, em ambas as igrejas, a novidade da mensagem pentecostal foi rejeitada, e, os missionários, “convidados” a sair, resultando assim, no surgimento de novas igrejas. “Neste caso o pentecostalismo repete, como em outros países, o caráter cismático do protestantismo. Afinal que Igreja Protestante não tem um cisma em sua origem19?” (Alencar, 2000, p. 55).

É interessante como as versões dos historiadores20 das duas denominações – Assembléia de Deus e Batista - coincidem no fundamental, mesmo que as visões sejam distintas: os missionários suecos chegam ao Brasil, e não tendo onde morar são acolhidos no

19 Sem muito esforço é fácil identificar isto em todas as igrejas protestantes no Brasil. Ex: Igreja Presbiteriana do

Brasil, Independente, Unida.

porão da Igreja, o pastor batista viaja e deixa sua igreja na confiança dos dois. Eles começam a realizar reuniões de oração pentecostal e, confrontados pelo evangelista que está substituindo o pastor, são excluídos (Alencar, 2000, p. 55).

Tabela 1: Versão assembleiana e batista da divisão.

VERSÃO ASSEMBLEIANA VERSÃO BATISTA

“Daniel Berg e Gunnar Vingren até aquele momento estavam ligados à igreja batista na América (as igrejas que aceitavam o Avivamento permaneciam com o mesmo nome”) (Conde, 1960, p. 19).

“Em abril de 1911 desembarcaram em Belém dois missionários suecos (...) que se intitularam batistas... Dirigiram-se imediatamente a Nelson, seu conterrâneo, sendo acolhidos por ele” (Mesquita, 1940, p. 136).

“Raimundo Nobre (evangelista), apoderou- se do púlpito e atacou os partidários do Movimento Pentecostal. O grupo atacado começou a murmurar (...). Nesse momento o dirigente ilegal, dessa sessão ilegal, propôs que ficassem de pé todos aqueles que aceitavam a doutrina do Espírito Santo. A maioria ficou de pé. Imediatamente Raimundo Nobre propôs à minoria que excluísse a maioria, o que era ilegal também” (Conde, 1960, p. 25).

“O evangelista (...) convocou uma reunião da congregação, declarou que os pentecostais, que já eram maioria, estavam fora da ordem e, apoiado pele minoria21 que permanecera

batista, excomungou os que tinham falseado a sã doutrina. (...) Desta forma a comunidade foi dizimada... Tal foi o começo do movimento pentecostal no Brasil” (Mesquita, 1940, p. 137).

A mensagem pentecostal verdadeiramente foi o estopim para o cisma, obrigando os novos ideólogos dessa doutrina a se retirarem da Igreja e formarem outra segundo os novos pressupostos aprendidos. Podemos encontrar o registro dos nomes das pessoas que foram excluídas daquela Igreja Batista por haverem recebido a fé apostólica do batismo com o Espírito Santo. São eles:

21 Conde reclama disto em que a “minoria exclui a maioria” como se este princípio de democracia

Celina e seu marido Henrique de Albuquerque; Maria Nazaré; José Plácido; Piedade e Prazeres da Costa, estas, respectivamente esposa e filha daquele; Manoel Maria Rodrigues e esposa, Jerusa Rodrigues; Emília Dias Rodrigues; Manoel Dias Rodrigues; João Domingues; Joaquim Silva; Benvindo Silva, Teresa Silva de Jesus e Isabel Silva, respectivamente esposa e filhos; José Batista de Carvalho e esposa, Maria José de Carvalho; Antônio Mendes Garcia. Dessa lista, 17 eram membros, e outros, menores de idade (Conde, 2005, p.32).

As biografias dos suecos também confirmam estes fatos, só há um dado conflituoso em todos os relatos: o número de excluídos. A 1ª história (Conde, 1960, p. 26) registra 17; Berg, 18 (1995, p. 97); Vingren 18(1973, p. 33); 2ª história (Almeida,1982, p. 27) 19; 3ª história (Oliveira, 1998, p.51), 19. Em todos os livros (à exceção de Mesquita), há listas dos nomes, as quais não combinam com o número informado. Conde registra 17 excluídos, mas relaciona 20 nomes. A explicação provável está no próprio Conde quando diz que “dessa lista, 17 eram membros e outros menores” (Conde, 2005, p. 32).