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A Educação Infantil e a Formação dos Profissionais –

Conforme situamos, as preocupações relativas à qualidade do atendimento às crianças em instituições de educação infantil, se acentuam nas políticas nacionais

a partir do início da década de 1990. Naquele contexto, já se diagnosticava a desvalorização e a falta de formação dos profissionais que atuam na educação infantil, especialmente na creche, muitos sem a escolaridade fundamental. As diretrizes da Política Nacional de Educação Infantil (BRASIL, 1994a) já apontavam para a necessidade de reconhecimento profissional dos adultos que atuam na área, assegurando condições de trabalho, plano de carreira, salário e formação continuada:

 O profissional de educação infantil tem a função de educar e cuidar, de forma integrada, da criança na faixa de zero a seis anos de idade;

 A valorização do profissional de educação infantil, no que diz respeito às condições de trabalho, plano de carreira, remuneração e formação, deve ser garantida tanto aos que atuam nas creches quanto na pré-escola;

 Formas regulares de formação e especialização, bem como mecanismos de atualização dos profissionais de educação infantil deverão ser assegurados;

 A formação inicial, em nível médio e superior, dos profissionais de educação infantil deverá contemplar em seu currículo conteúdos específicos relativos a esta etapa educacional. (BRASIL, 1994a, p. 19).

Tais diretrizes são retomadas e ampliadas na atual política nacional de educação infantil (BRASIL, 2005). Ações e programas de formação inicial e continuada vêm sendo disseminados pelo Ministério da Educação – MEC em parceria com Municípios e Universidades Federais.

Após a publicação dos Referenciais Curriculares Nacionais para Educação Infantil – RCNEI (BRASIL, 1998) foi desenvolvido como formação continuada o curso de 180h – PCN’s em ação, o programa formava multiplicadores em cada município e estes realizavam encontros de formação com os professores da rede com o objetivo de estudar e colocar em prática as orientações do documento de referência.

Mais recentemente, como ação da política nacional de educação infantil em vigor, para garantir a formação inicial, foi desenvolvido, o Programa de Formação Inicial de Professores em Exercício na Educação Infantil – PROINFANTIL/MEC – curso de nível médio na modalidade Normal, realizado pelo MEC em parceria com estados, municípios e instituições formadoras, desde o ano 2005, por meio de atividades presenciais e vivenciais.

O material do PROINFANTIL (BRASIL, 2005a) envolve dois grandes volumes que tratam das áreas temáticas da Base Nacional do Ensino Médio (Linguagens e

códigos; Identidade, sociedade e cultura; Matemática e lógica; Vida e natureza) e da formação pedagógica, organizado em quatro módulos com áreas temáticas relativas aos fundamentos da educação e à organização do trabalho pedagógico (história, legislação e política educacional; a criança e suas interações; proposta pedagógica: conceitos, elementos constitutivos e mediadores; pressupostos teórico-metodológicos do trabalho docente).

Também no âmbito das políticas de formação, o Ministério da Educação, em parceria com Universidades Federais vem desenvolvendo cursos de especialização e de aperfeiçoamento na área de Educação Infantil, desde 2010, formando professores especialistas em diferentes estados.

Além destas iniciativas de formação continuada, também estão sendo incluídas, mediante reestruturações curriculares, nos cursos de pedagogia, disciplinas mais especificas na área de educação infantil, com caráter obrigatório. O currículo do curso de Pedagogia da UFRN, por exemplo, em 2009 passou a incluir dois componentes obrigatórios que tematizam a educação infantil.

As Diretrizes Curriculares Nacionais dos Cursos de Formação de Professores, recentemente atualizadas na Resolução nº 2, de 1 de julho de 2015, reforçam a necessária formação básica para atuar na educação infantil com a inclusão de disciplinas com temáticas específicas dessa etapa.

No entanto, em movimento contrário, observamos que a Lei nº 12.796 de 04 de abril de 2013, que altera a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, continua assegurando, de forma contraditória às últimas políticas educacionais, a formação em nível médio na modalidade normal para atuação na educação infantil e anos iniciais do ensino fundamental, apesar de definir políticas de formação em serviço e incentivo para a formação inicial em curso superior.

Consideramos importante ampliar a discussão acerca dos processos e contextos formativos de professores da educação infantil, considerando, como propõe Oliveira-Formosinho (2005) que são necessários saberes diferenciados para garantir a profissionalidade da docência nessa etapa, respeitando-se as especificidades das crianças e do trabalho pedagógico por elas requerido.

Há na educação de infância uma interligação profunda entre educação e “cuidados”, o que contribui igualmente para a abrangência do papel da educadora em relação aos professores de outros níveis educativos. [...] O educador da criança pequena necessita de um saber fazer que

incorpore ao mesmo tempo a globalidade e vulnerabilidade social das crianças e a sua competência. (Ibid, p. 139)

A autora propõe que a profissionalidade das educadoras deve ser baseada em redes de interações alargadas com profissionais internos e externos à instituição, famílias, órgãos auxiliares e comunidade escolar, bem como, requer a integração de práticas, serviços e saberes:

 A centração na criança e na globalidade da sua educação requer integração de saberes;

 A centração na educação e nos cuidados requer integração de funções;

 A relação com os pais, com outros profissionais, com agentes voluntários requer interações e interfaces;

 A relação com a comunidade requer interações e interfaces. (OLIVEIRA-FORMOSINHO, 2005, p. 139).

Em nossos estudos referentes a currículo na/para educação infantil (SOBRAL, 2008), temos defendido que são necessários saberes específicos para que os professores sejam construtores ativos de propostas curriculares que se materializem como documento de intenções e práticas efetivas.

Essa compreensão articula-se com a proposição de Moreira (1999, p. 30) que o processo de elaboração/efetivação/avaliação do currículo precisa ser pensado, discutido a partir de investigações sobre a prática curricular com os que nela atuam. Por conseguinte, concordamos com Sacristán (1999, p. 72) quando se preocupa com a caracterização técnica dos currículos e a sua elaboração prévia por especialistas como “fatores de desprofissionalização do professorado”.

Nessa perspectiva, a participação ativa nos processos de elaboração e desenvolvimento de um currículo para educação infantil pode converter-se em fator de profissionalização docente, o que envolve, entre outros determinantes, a elaboração de saberes específicos para que os professores atuem como partícipes efetivos dos debates legal, teórico e prático que sustentam a implementação e atualização de propostas pedagógicas. Segundo Tardif (2002) esses saberes são provenientes da prática docente e de suas relações com os saberes da formação profissional (das ciências da educação e da ideologia pedagógica), das disciplinas e dos currículos. Ou seja, em diferentes contextos de experiência escolar (quando

estudantes), profissional e formativa – processos formais e não formais de constituição de saberes, como

conjunto de relações – objetivas e intersubjetivas, incluindo os condicionantes, igualmente condicionados, que enredam, nas interações, o sujeito e o meio social – que constituem os processos formais e não formais (história de vida) que ‘compuseram’ (compõem) o corpus de saberes [...] contextos como interações, relações essencialmente dialógicas, partilhadas com e entre os outros com quem as professoras interagiram durante seus percursos de formação – contextualizados em seus percursos de vida [...] (UBARANA, 2011)

A elaboração de saberes é sempre resultante de processos mediados em interações sociais e como significações (VIGOTSKI, 2007). Assim, o saber é uma relação, não há sujeito de saber e não há saber senão em uma certa relação com o mundo - relação com o saber, consigo mesmo, com a linguagem e com os outros (CHARLOT, 2000). Nessa perspectiva, podemos complementar afirmando, segundo Tardif (2002, p. 11) que

o saber não é uma coisa que flutua no espaço: o saber dos professores é o saber deles e está relacionado com a pessoa e a identidade deles, com a sua experiência de vida e com a sua história profissional, com as suas relações com os alunos em sala de aula e com os outros atores escolares na escola, etc”. (Grifo do autor).

Desta forma, entendemos que para elaborar – e, sobretudo, vivenciar – uma proposta curricular em que atuem como sujeitos e não apenas como meros observadores e/ou executores passivos, aos professores são requeridos saberes próprios sem os quais eles não têm condições de, verdadeiramente, participar ativamente da construção e materialização de uma proposta.

Entre estes saberes, consideramos importante que os professores conheçam os processos de aprendizagem e desenvolvimento das crianças, as possibilidades de intervenções e práticas de ensino, bem como os objetos de aprendizagem – os conhecimentos a serem ensinados e aprendidos na educação infantil.

Entendemos que aos professores cabe ensinar – apontar signos – às crianças, possibilitando que elas aprendam e se desenvolvam e, quem ensina, ensina alguma coisa – objetos do conhecimento, e precisa tomar decisões sobre o que, quando e como ensinar. No caso da educação infantil, as ações de ensinar e aprender acontecem, ou precisam acontecer, considerando as especificidades e necessidades

do sujeito que aprende – a criança – sujeito do conhecimento. Sendo prática educativa, precisa ser pensada por professores.

Desse modo, compreendemos que as crianças enquanto sujeitos do conhecimento, ou seja, sujeitos que conhecem, que aprendem a conhecer e intervir no mundo em que vivem, podem e precisam se apropriar de objetos do conhecimento construídos e acumulados historicamente nas instituições educativas. Mas, que conhecimentos são esses? Como são definidos? O que constitui conhecimento? São as questões que permeiam este trabalho. Apresentamos a seguir uma breve exposição teórica acerca do conhecimento.

3.5 EDUCAÇÃO INFANTIL COMO TEMPO-ESPAÇO DE CONHECIMENTO – DE