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4 A EDUCAÇÃO INFANTIL COMO CAMPO DE CONSTRUÇÃO

4.3 EDUCAÇÃO INFANTIL, CURRÍCULO E PROPOSTA

4.3.2 Sentidos de Currículo nas Vozes de Professoras

4.3.2.1 Sentidos sobre o que constitui Currículo

Na análise das vozes das professoras sobre currículo, identificamos alguns eixos de sentidos: o currículo como ferramenta/instrumento que norteia a prática; o currículo como conjunto de conteúdos/objetos do conhecimento; o currículo como metodologia/estratégia de ensino e aprendizagem; e currículo como conjunto de experiências e práticas que envolvem saberes prévios e ampliação de conhecimentos.

O currículo como ferramenta/instrumento que norteia a prática

As professoras conceituam currículo como instrumento que orienta a prática educativa, fonte de consulta para o planejamento e organização dessa prática. Como nos exemplos seguintes:

É o conjunto de saberes [...] ligados à prática; que é uma ferramenta extremamente importante ‘pra’ o planejamento de nossa atuação, de nossos conteúdos, do nosso planejamento. (Professora Dalila, Primeira Sessão de Entrevista Individual)

É...currículo, a definição pra Educação Infantil que eu penso [...] a organização da prática da escola, organização é... das áreas de conhecimento na educação infantil acho que engloba tudo isso. (Professora Maria, Primeira Sessão de Entrevista Individual)

Eu acho que o currículo ‘tá’ voltado pro estabelecimento de padrão, de funcionamento no geral na Educação Infantil, tanto em relação ao meio, quanto em relação a aprendizagem das crianças. (Professora Ana, Primeira Sessão de Entrevista Individual).

Observamos que os sentidos de currículo como instrumento orientador perpassam a ideia de currículo padrão – um texto normativo que regulamente e institua práticas “iguais”, um currículo definido para ser efetivado – como direção para

o funcionamento da educação infantil. Seria assim, indiscutível, para ser posto em prática. Um currículo prescritivo – que se contrapõe as perspectivas críticas e pós- críticas de pensar e problematizar as práticas curriculares.

O currículo como conjunto de conteúdos/objetos do conhecimento

Considerando também o currículo como instrumentalização para a prática, identificamos sentidos de currículo como programação de conteúdos. O currículo norteia a prática, na medida em que define quais conteúdos são necessários às crianças da educação infantil.

Eu acho que é o que a gente vai trabalhar com a criança, os temas, realmente os conteúdos que vai selecionar ‘pra’ trabalhar com as crianças. (Professora Rute, Primeira Sessão de Entrevista Individual)

Um conjunto de habilidades, de conhecimentos que a criança precisa ter ‘pra’ poder viver assim no mundo, na sociedade de forma coerente. (Professora Ester, Primeira Sessão de Entrevista Individual)

Eu entendo que é um conjunto de objetivos com os conteúdos ‘né’? Por que é aquilo que vai orientar a nossa prática em sala de aula. (Professora Sara, Primeira Sessão de Entrevista Individual)

Nas vozes transcritas, observamos a ideia de um currículo pensado e definido por outros, para os sujeitos da prática efetivarem junto às crianças em seus fazeres pedagógicos. Currículo como conjunto de objetivos/conteúdos predefinidos como necessários/importantes para a formação de sujeitos em uma dada sociedade. Tais saberes e conhecimentos, seriam por sua vez, incontestáveis. Na análise de Silva (2005) as teorias tradicionais do currículo tomam a resposta à questão “o quê?” como dada (predefinida) e se concentram no “como?” – nas questões técnicas de organização do conhecimento (inquestionável?).

O currículo como metodologia/estratégia de ensino e aprendizagem

Nas vozes das professoras Isabel e Eva, por exemplo, identificamos sentidos de currículo como definição de estratégias metodológicas – como ensinar crianças

pequenas. O currículo, desta perspectiva institui o quê ensinar e preocupa-se com as técnicas, a metodologia - aproxima-se, pois de uma tendência tecnicista de currículo.

Eu vejo assim, como o currículo, a maneira, o método, a maneira que você usa pra você colocar é... os seus conhecimentos em prática. Os seus conhecimentos pedagógicos ‘né’? Em prática. (Professora Isabel, Primeira Sessão de Entrevista Individual).

Bem, o currículo como eu estou estudando né, no curso de formação, a gente vê que é uma forma viva, é algo que tem que ser, não é estático. Tem que ser algo maleável, é, que envolva conhecimentos através do lúdico, porque esse eixo que existe na brincadeira ele tem que ser valorizado na educação infantil, criança aprende brincando e não a coisa parada, questão de conteúdos formais, trabalhados de forma tradicionais. (Professora Eva, Primeira Sessão de Entrevista Individual).

Na voz da professora Eva, podemos observar, uma problematização acerca de conteúdos formais trabalhados de forma tradicionais. Há uma preocupação com as especificidades de um currículo para educação infantil, seu caráter lúdico e o papel/lugar da brincadeira que se apoia na “forma” – metodologia de trabalho. Em oposição ao currículo estático e conteúdos formais, a professora fala de uma forma viva, de trabalhar os conteúdos na brincadeira – em movimento, e não de forma parada – tradicional.

O currículo como conjunto de experiências e práticas que envolvem saberes prévios e ampliação de conhecimentos

A ideia de currículo construído a partir das práticas, das experiências das crianças, aparece na voz na professora Marta, que se aproxima das proposições de articulação e ampliação de conhecimentos e experiências propostas nas DCNEI.

Currículo na Educação Infantil ‘pra’ mim inclui a questão das vivências, conhecimento prévio das crianças e aquilo que a gente consegue construir na sala a partir do conhecimento que eles trazem. Sobre a família, sobre o ambiente que eles vivem, sobre a questão da natureza, aí... disso aí que a gente parte ‘pra’ o conhecimento mais teórico que é dar significado aquele conhecimento que eles já trazem de casa e levar novos conhecimentos. (Professora Marta, Primeira Sessão de Entrevista Individual)

De um modo geral, observamos que a ideia de currículo como prescrição, pautada nas teorias tradicionais e tecnicistas de currículo, aparece nas vozes de todas as professoras entrevistadas. A questão central do currículo no âmbito das teorias críticas e pós-críticas, refere-se ao “por quê?” – Por quê esse conhecimento e não outro? Tais teorias “estão preocupadas com as conexões entre saber, identidade e poder”. (SILVA, 2005, p. 17). Nesta perspectiva, as professoras seriam sujeitos/autoras dos processos de construção curricular. No entanto, ainda observamos em suas vozes, um distanciamento dessa autoria, desse entendimento de currículo como práxis, como conjunto de práticas que articula experiências e amplia conhecimentos. O que nos remeteu para buscar entender “com base em que acontece o planejamento – a definição de conhecimentos”.