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A educação nacional

No documento ANÍSIO TEIXEIRA E A EDUCAÇÃO BRASILEIRA: (páginas 180-200)

O retorno de Anísio Teixeira ao cenário educacional, 1946–

3.3 A educação nacional

Com efeito, os anos sucessivos ao período do Estado Novo — de redemocratização — foram de mais liberdade, o que possibilitou avanços importantes na educação. Além de campanhas pró-escola pública, foram criados a CAPES, em 1951, e o Conselho Nacional de Pesquisa (CNPq), 1951. Também foi aprovada a primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, em 1961, após muita polêmica, discussões e embates.

Com efeito, a reestruturação da legislação estava prescrita na Constituição de 1946, e as discussões que se estenderam de 1946 a 1961 foram acaloradas em torno do embate do público versus o privado. Segundo Xavier, “Nesse processo, voltaram ao centro do debate, as questões relativas ao embate público-privado, ainda associado à relação Estado–Igreja e seus desdobramentos na esfera educacional”. Além disso, segundo essa autora, “[...] a defesa da escola pública, universal e gratuita foi retomada por muitos dos remanescentes do escolanovismo [...]” com o protagonismo de Anísio nos decênios de 50 e 60. Ele seria um dos líderes mais atuantes.478 Tal qual a Escola Parque, a CAPES e o INEP são projetos de Anísio,

mesmo que não tenham sido instituições criadas por ele. Mas sua direção foi influente por mais de uma década. Provam isso numerosas iniciativas pioneiras na educação brasileira. Convêm aqui considerações breves sobre tais projetos (uma compreensão mais detalhada se desdobra no capítulo a seguir).

Em 1951, a convite do ministro da Educação e Saúde, Ernesto Simões Filho,479 Anísio deixou a Secretaria de Educação da Bahia para se tornar secretário-geral480 da então

478 XAVIER, 1999, p. 59.

479 O advogado, jornalista, empresário e político baiano Ernesto Simões da Silva Freitas Filho, mais conhecido

como Simões Filho (1886–1957), exerceu dois mandatos de deputado federal (1924–6; 1927–30) e foi ministro da Educação e Saúde (1951–3). Em janeiro de 1951, como resultado das articulações políticas que contribuíram

Campanha de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior,481 fundada via decreto 29.741,

de 11 de julho daquele ano.482 Conforme Ferreira e Moreira, o momento de criação da CAPES

merece ser avaliado em perspectiva histórica porque

Era o início do segundo governo Vargas, com a retomada do projeto de construção de uma nação desenvolvida e independente. A ênfase à industrialização pesada e a complexidade da administração pública trouxeram à tona a necessidade urgente de formação de especialistas e pesquisadores nos mais diversos ramos de atividade: de cientistas qualificados em física, matemática, química e biologia, economistas, técnicos em finanças e pesquisadores sociais, entre outros.483

Segundo essas autoras, a criação da CAPES não constituiu fato isolado. Nos primeiros meses de 1951, foram criadas, também, outras instituições e agências públicas, tais como “[...] Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (atual BNDES) e o Conselho Nacional de Pesquisa (CNPq) com os quais a Capes interagiu na formulação e implementação de uma nova política de desenvolvimento científico e tecnológico”.484 Isso significa que a CAPES foi

criada em um contexto político e econômico propício ao incentivo à formação de pessoal de nível superior, mesmo sendo exigência do projeto de desenvolvimento nacional e da necessidade de fortalecer a presença do país no cenário internacional.

Ao ingressar na CAPES, Anísio transitava em várias esferas do poder, em especial na área educacional. As relações com o conterrâneo Ernesto Simões Filho – então ministro da Educação e Saúde485 proporcionavam a Anísio autonomia de ação, enquanto as articulações

políticas lhe davam autoridade no cargo. Dessa forma, foi marcante sua presença na fase inicial da CAPES, não somente no plano de estruturação de sua política institucional, mas também na definição de suas diretrizes intelectuais. Nos primeiros anos, ele se dedicou à formação da equipe, aos trabalhos de estruturação e planejamento de ações, aos contatos e aos

para a volta de Getúlio Vargas à presidência, no pleito de outubro de 1950, ele foi nomeado para o ministério. Sua atuação foi condicionada à tramitação, no Congresso, do projeto de lei sobre diretrizes e bases da educação nacional, que desde 1946 ocupava espaço nas discussões sobre o assunto no país. Ainda em 1951, foi criada, no âmbito do ministério, a CAPES. FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS/FGV. Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil. Ernesto Simões Filho. Verbete biográfico.

480 Fávero considera que esse é o terceiro (e último) momento importante de Anísio como gestor educacional,

que se inicia em 1951, com o cargo de secretário-geral da CAPES, passando pela diretoria do INEP e se estende até 1968, como membro do Conselho Federal de Educação — cf. FÁVERO, 1999.

481 A locução “campanha nacional” do nome inicial da CAPES foi mudada para “coordenação” em 1964, por

meio do decreto 53.932, de 26 de maio, assinado pelo primeiro presidente do período de governo militar.

482 Em 1961, a CAPES passou a ser subordinada diretamente à presidência da República. Com a ascensão militar

em 1964 e a saída de Anísio, o órgão voltou a se subordinar ao Ministério da Educação e Cultura.

483 FERREIRA, M. M.; MOREIRA, R. L. Capes, 50 anos: depoimentos ao CPDOC/FGV. Brasília: CAPES, 2002. 484 FERREIRA; MOREIRA, 2002, p. 17

485 Criado em 1930, após a vitória da Revolução, o Ministério da Educação e Saúde foi desmembrado em 1953,

convênios com instituições daqui e de fora para formar pessoal especializado de nível superior. A estratégia básica incluiu articulação e parceria institucional com o setor econômico, sobretudo o industrial, que necessitava de especialistas, e com a administração pública, para suprir a necessidade de servidores especializados. Tal foi o trabalho de Anísio na CAPES, que seus projetos o posicionaram, também, no INEP,486 dada a proximidade de

intenções. Também pesou o prestígio político de Simões Filho. Pinho se refere à escolha de Anísio para a direção do INEP:

Em abril de 1952, desapareceu bruscamente, numa catástrofe aérea, Murilo Braga, 487 jovem diretor do Inep. O golpe foi muito violento para todos da equipe do ministério, mas não havia como demorar a escolha de substituto. Simões não teve um minuto de dúvida e fixou-se logo em Anísio, para levá- lo ao próximo despacho com o Presidente. Getúlio Vargas, nessas oportunidades, era assediado pelos mais íntimos e lhe foram então apresentados nomes de muito valor para a direção do Inep. A um dos postulantes foi muito franco o Presidente: — “Para cargos dêsse porte o Ministro da Educação tem sempre um baiano de indiscutível merecimento”. E foi assim narrando o episódio que êle deu inteiro apoio à nomeação de Anísio Teixeira.488

Nomeado diretor do INEP em abril de 1952, Anísio permaneceu no cargo por doze anos. Tal permanência no cargo — diz Rothen — justifica-se, dentre outras razões, porque o INEP tinha certa autonomia em relação ao Ministério da Educação. Exemplo disso é que “[...] Murilo Braga assumiu a direção do Inep em 1946 e ficou no cargo até a sua morte, em 1952, passando por cinco ministros e dois presidentes”. Seu sucessor “[...] passou por dezoito ministros e cinco presidentes”. 489

486 Fundado em 1937, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP) foi

criado originalmente com a denominação de Instituto Nacional de Pedagogia, concebido em plena efervescência do Movimento de renovação educacional, levado a cabo pelos integrantes da Associação Brasileira de Educação (ABE). Teria as atribuições de promover inquéritos, cursos de aperfeiçoamento do magistério, demonstrações, assistência técnico-pedagógica, levantamento de bibliografia educacional brasileira e de intercâmbios internacionais, além de fazer publicar conhecimentos relativos à ciência pedagógica na Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos. Cf. BRZEZINSKI, I.; ARAUJO, Marta Maria de (Org.). Anísio Teixeira na direção do INEP: programa para reconstrução da nação brasileira (1952–1964). Brasília: Instituto Nacional de Estudos e

Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, 2006.

487 Murilo Braga de Carvalho nasceu em Luzilândia, PI, em 1912. Faleceu em 1952, em um desastre aéreo, quando se

dirigia para os Estados Unidos, a fim de representar o Brasil em num congresso de educação. Foi diretor do Instituto de Educação (1934–8); diretor do Departamento Administrativo do Serviço Público (1939–45); diretor-geral do Serviço Social do Comércio (1948–52) e diretor do INEP (1946–52). Cf. FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS/FGV. Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil. Murilo Braga.

488 PINHO, 1960, p. 167–90. 489 ROTHEN, 2008, p. 219.

Sob a direção de Anísio, o INEP se tornou um órgão prestigioso de planejamento e execução de levantamentos e campanhas educacionais. No discurso de posse, ele

Avalia a evolução da educação brasileira, concentrando-se no período de reação tradicionalista ao programa de reconstrução escolar adotado nas reformas da década de 1930. Conclui que, desde então, o País teria entrado em uma fase de hostilidade a tudo quanto fosse ou parecesse novo e de condescendência indiscriminada para com os persistentes defeitos nacionais, tais como o caráter ornamental e livresco do ensino, a resistência aos métodos ativos do ensino e o espírito da educação para o exame. Compromete-se a colaborar para que o Inep torne-se o principal instrumento de coordenação e controle da educação nacional, de modo a que o Governo possa exercer uma liderança estimuladora e criadora no quadro de descentralização administrativa da educação, a ser regulamentado pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação, então em votação no Congresso.490

Segundo Xavier, “[...] ao assumir a direção do Inep, em 1952, Anísio procurou revigorar a função específica de desenvolver os estudos sobre os problemas brasileiros de educação”. Para efetivar essa proposta, “ele apresentou um amplo projeto que incluía uma fase de levantamentos de dados relativos à situação do ensino em todo o território nacional”. Xavier comentou tal projeto nestes termos:

É provável que as dificuldades de operacionalização de tal projeto, tanto pela carência de pessoal competente quanto pela insuficiência de recursos orçamentários por parte do Inep tenham levado Anísio Teixeira a estabelecer como estratégia o lançamento de uma campanha extraordinária de educação que, abarcando diferentes modalidades e níveis de ensino no país, pudesse fazer acordos, contratos e convênios com organizações técnicas e de ensino e com especialistas externos aos quadros da burocracia do MEC.491

Na prática, o projeto de levantamento de dados educacionais se desdobrou, em 1953, em duas campanhas pioneiras de Anísio: a “Campanha de inquéritos e levantamentos do ensino médio e elementar” (CILEME) e “Campanha do livro didático e material de ensino” (CALDEME).

À frente do INEP, Anísio conheceu o antropólogo e cientista social Darcy Ribeiro, que se tornou um companheiro importante no movimento de luta pela escola pública e nos embates em torno da aprovação da LDBEN. Eis as impressões de Ribeiro sobre Anísio:

490 TEIXEIRA, Anísio. Discurso de posse do Professor Anísio Teixeira no Instituto Nacional de Estudos

Pedagógicos. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, v. 17, n. 46, p. 69–79, 1952.

No Rio de Janeiro, Anísio volta a ser nosso principal líder intelectual. Foi, então, que me aproximei dele, no movimento de luta em defesa da escola pública, nos debates da Lei de Diretrizes e Bases, em que Dom Helder e Lacerda queriam entregar recursos públicos às escolas privadas. Passei a colaborar diretamente com Anísio, ajudando no projeto e na criação do Centro Nacional e da rede de Centros Regionais de Pesquisas Educacionais, implantados no Rio, São Paulo, Minas, Pernambuco, Bahia, Paraná e Rio Grande. O projeto ambicioso de Anísio era, com esses Centros, prover recursos para forçar as universidades brasileiras a assumir responsabilidades no campo educacional, na mesma proporção em que o faziam com respeito a medicina e a engenharia.492

No ano de 1955, em entrevista ao Correio do Povo,493 Anísio relatou realizações do

INEP, destacando a construção de sete mil unidades escolares. Mesmo entusiasmado com as realizações, ele continuava a preocupar com a formação docente; afinal, havia conhecido de perto o problema na Bahia, em 1924 e 1947; e no Distrito Federal, em 1932. Para minimizar tal problema — ou seja, sua preocupação —, Anísio desenvolveu cursos para treinamento e capacitação de professores primários e criou escolas de demonstração escolar de experimentação pedagógica, cujo objetivo era aproximar futuros professores da prática de sala de aula.

FIGURA 7. Circunstância de encontro pedagógico no INEP

Professoras reunidas com Anísio Teixeira em um dos muitos encontros pedagógicos que o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira realizou entre agosto de 1951 a 1964 visando à qualificação e ao aperfeiçoamento docente

FONTE: dados da pesquisa494

492 RIBEIRO, 1995, p. 33–6.

493 TEIXEIRA, Anísio. Sete mil unidades escolares construídas pelo INEP. Entrevista. Correio do Povo, Porto

Alegre, RS, 3 de março de 1955.

Anísio defendia a necessidade de uma política educacional que fosse integradora, capaz de promover a educação comum destinada à formação do cidadão e da democracia. Dadas a sua posição e atuação na CAPES e no INEP, em especial no processo de tramitação do projeto da LDBEN, ele assumiu a liderança na defesa da escola pública. Segundo Fávero, esse período marca “o ápice da atuação” como diretor do INEP e educador; ele participa “[...] novamente das articulações para que esse projeto privilegiasse o sistema público de ensino, ao invés do privado”.495

Com efeito, as discussões referentes à LDBEN se estenderam de 1947 a 1961. Foram debates políticos e ideológicos intensos, polarizados em duas propostas de lei que representaram uma relação contraditória no âmbito econômico e político: vários grupos buscavam a hegemonia na decisão sobre os rumos da educação. Era o embate ideológico e político entre escola pública e escola privada.

De um lado, estavam defensores do nacionalismo desenvolvimentista: o Estado deteria o planejamento estratégico para o desenvolvimento da nação. Representavam-no educadores, intelectuais, sindicalistas. Eram os chamados “reformadores”, favoráveis ao investimento de recursos públicos na educação pública. Embora compusesse o grupo dos “reformadores”, ao lado de Fernando de Azevedo, Lourenço Filho, Carneiro Leão, Francisco Campos, em vários pronunciamentos ele afirmava não ser contrário ao ensino privado; o que defendia era o direcionamento de recursos públicos a instituições escolares públicas; afinal, as instituições privadas possuíam outras formas de obter financiamentos em instituições bancárias e financeiras ou outras fontes de renda, como a própria escola. Esse discurso de Anísio era compartilhado pelos demais intelectuais que se juntaram ao movimento pró-aprovação da LDBEN, conforme sugerem as palavras de Ribeiro:

Não nos opusemos jamais à liberdade de ensino no sentido do direito, de quem quer que seja, a criar qualquer tipo de escolas às suas expensas, para dar educação do colorido ideológico que deseja. Nos opúnhamos, isto sim, é que em nome dessa liberdade, o privatismo se apropriasse como se apropriou dos recursos públicos para subsidiar escolas confessionais.496

495 FÁVERO, 1999.

Do outro lado, estavam a Igreja e os “privatistas”, ou seja, empresários e proprietários de instituições de ensino particulares que defendiam a iniciativa privada leiga como promotora de educação, que se opunham à intervenção normativa e fiscalizadora do Estado nas questões econômicas e educacionais. Defendiam o subsídio estatal para instituições privadas — entendiam que o Estado tinha obrigação de subsidiar, também, o ensino particular; porém não aceitariam a intervenção do estado nas questões educacionais para não ferir princípios da fé católica, nem a liberdade de ensino, nem o direito das famílias de escolher qual educação daria à prole. Pode-se afirmar que instituições privadas de ensino, em particular aquelas ligadas à Igreja Católica, objetivavam, com a aprovação da LDBEN, a possibilidade de obter financiamento público para se sustentarem.

Os debates não ficaram na esfera filosófica ou ideológica. Chegavam à esfera política com vigor. A bancada católica na Câmara dos Deputados pressionava o ministro da Educação; em carta endereçada a Simões Filho datada de 5 de novembro de 1956, o deputado federal Fonseca e Silva fez críticas a Anísio e o acusou nestes termos:

[...] repetidas restrições assacadas contra o patrimônio moral e espiritual da igreja católica no setor do ensino, através de atitudes veladas, sutis, escondidas no valor dos postos que “esses pioneiros” ocupam. De um lado é o filosofismo pragmatista de John Dewey, que desde 1932 vem sendo a retaguarda contra o apostolado da Igreja Católica, no campo do ensino, prerrogativa que sempre identificou os fundamentos divinos da própria Barca de Pedro com os fundamentos que definem e remarcam a nossa unidade nacional. Lamentavelmente é o Diretor do Inep o revolucionário dessa velada campanha.497

Nesse contexto político, Anísio publicou, em junho de 1957, o livro Educação não é privilégio,498 onde faz um balanço de sua vida como educador e reafirma sua opção e luta pela

escola pública, comum, gratuita, oficial. Considerado por educadores e intelectuais um clássico dentre as obras sobre a educação nacional, o livro foi divulgado em jornais de projeção, como o Correio da Manhã. Dentre outras edições, destacamos a de 7 de junho de 1957, onde se lê:

497 Documentos acerca da acusação feita pelo Deputado Fonseca e Silva a Anísio Teixeira, de promover

campanha anti-católica na educação. Rio de Janeiro. São Paulo. Localização dos documentos: AT t 1956.09.28, referentes ao período de 28/09/1956 a 23/06/1958. São 10 documentos que totalizam 153 folhas e a carta citada encontra-se às folhas 4 a 21.

498 TEIXEIRA, Anísio S. Educação não é privilégio. Rio de Janeiro: José Olympio, 1957. Republicado pela

Lançando o livro de Anísio Teixeira “Educação não é privilégio” (cento e quarenta e seis páginas, nas quais o grande educador brasileiro aborda com a cultura e seriedade que lhe são características alguns dos mais importantes problemas do ensino em nosso país), diz o editor José Olympio em nota de apresentação: “Na qualidade de um dos nossos líderes mais competentes, mais lúcidos e experimentados em matéria educacional, o professor Anísio Teixeira reexamina em “Educação não é privilégio” as reformas e planos com que vem procurando abrir caminhos e perspectivas capazes de ajustar a instrução no Brasil às exigências nacionais e humanas, de modo a que possa ser oferecido a todo o nosso povo um ponto comum de partida nas lutas pela existência.499

As ideias presentes na obra tiveram repercussão nos ambientes acadêmicos e políticos. Registre-se, em particular, o incômodo da Igreja Católica ao perceber ameaças à sua força e aos privilégios políticos em seus espaços de atuação. Afinal, durante décadas da história brasileira ela foi detentora de poder e influência, nas decisões do governo e na obtenção de subsídios e financiamentos para a educação. Como Anísio participou das discussões em torno da aprovação da LDBEN, não demorou a surgir o posicionamento público dos católicos: partir para a disputa política aberta contra os rumos da política e da educação, em especial contra o intelectual baiano. A revista Vozes, de Petrópolis (RJ) de propriedade da Igreja, reuniu muitos textos e sermões que defendiam a posição católica e o atacavam diretamente. Por ironia, Anísio tinha admiradores na Igreja que o criticava. Não por acaso, em 23 de julho de 1957, após divulgação de outros textos de ataque, ele recebeu uma carta de apoio e solidariedade do amigo cardeal primaz da Bahia dom Augusto Álvaro da Silva.500 Mas não

sem ter de ler críticas do cardeal ao seu afastamento do catolicismo, à idolatria dele pela ciência e ao seu culto a Lobato. Eis o tom da carta:

Foi dolorosa surpresa a leitura do artigo “A bolchevisação do ensino”, principalmente por vê-la sob o título de “Vida Católica”. A mágoa que, de justiça lhe causou aquela publicação, feriu-me, ao mesmo tempo, profundamente; conheço bem seu coração e suas ideias. Se ao menos se

499 CORREIO DA MANHÃ. “Educação não é privilégio”. Rio de Janeiro, RJ, 7 de junho de 1957, ed. 19.692,

“1º caderno” [coluna “Escritores e livros”], p. 14. Várias edições desse jornal destacaram o assunto. Convém destacar aqui o que se disse na edição de 8 de junho: “[...] entre as pessoas que até hoje examinaram com maior lucidez o problema [da educação] figura o professor Anísio Teixeira, autor de vários livros sobre o assunto. [...] A esses livros acrescenta ele mais um agora, de particular importância: “Educação não é privilégio” — cf. CORREIO DA MANHÃ. “Educação não é privilégio”. Rio de Janeiro, RJ, 8 de junho de 1957, ed. 19.693, “1º caderno” [coluna “Letras estrangeiras”], p. 11. Igualmente, cabe citar o dito na edição seguinte: “A responsabilidade da educação está em razão lógica e direta com o preparo não de uma elite, mas de um povo, sem caráter supérfluo e discriminatório. [...] Bate-se o autor por um sistema de educação pública, destinado à

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