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BOBBIO, 1997 30 SIRINELLI, 2003.

No documento ANÍSIO TEIXEIRA E A EDUCAÇÃO BRASILEIRA: (páginas 32-48)

31 Cf. HOUAISS, Antônio. Anísio Teixeira. Antônio Houaiss (1915–99), intelectual brasileiro formado pela

Faculdade Nacional de Filosofia da Universidade do Brasil (hoje Universidade Federal do Rio de Janeiro), em 1942, foi escritor, filólogo, lexicógrafo, crítico literário, professor, tradutor, diplomata e enciclopedista. Ministro da Cultura no governo de Itamar Franco (1992–4), foi membro da Academia Brasileira de Letras e amigo de Anísio.

suas universidades”.32 Todos os construtos da humanidade utilizavam a experiência do

passado, “[...] mas essa experiência atingiu, nos tempos modernos, tamanha complexidade intelectual, que sem a existência das universidades grande parte dela se teria perdido e a outra parte nem chegaria a ser formulada”.33 Como se infere, o intelectual baiano reforçava,

peremptoriamente, a importância da universidade na formação da intelectualidade e no desenvolvimento da sociedade brasileira.

O período de quase meio século de atividade intelectual e administrativa no ambiente da educação se tornou, então, o recorte temporal para situar a pesquisa histórica descrita nesta tese. Vai de 1924 — quando começou a carreira pública de Anísio, na secretaria de Instrução Pública da Bahia — a 1964 — quando Anísio foi exonerado dos cargos que ocupava na CAPES e no INEP, o que o tira do campo da ação institucional. É claro, o texto cruza esses limites cronológicos porque toca na gênese das mudanças educacionais e dos intelectuais da educação, a exemplo de Rui Barbosa, assim como considera a atuação a distância de Anísio no CFE até 1968. Esse recorte temporal é complexo, porque abriga mudanças importantes na sociedade. Mudanças que puseram em xeque a atuação profissional de Anísio, incluindo a iminência de vir a ser preso político. Os contextos políticos formados em tal recorte de tempo obrigaram a uma leitura atenta das fontes que apontam as circunstâncias, os meios e os recursos de que ele se valeu para se manter longevo e com autonomia no trabalho.

Recompor tal período numa lógica histórico-sociopolítica, ou seja, alinhavar dados difusos e fragmentários, não pressupôs recompô-lo no todo. Mas pressupôs buscar marcos que sustentassem com solidez pontos e referências de análise em nome da construção de um “sentido do passado” para a sociedade do presente, como postula Hobsbawm. O passado, como reflete esse autor, é uma dimensão permanente da sociedade humana, e aos historiadores cabe a tarefa de atribuir sentidos que assumiu em cada período histórico.

Todo ser humano tem consciência do passado (definido como o período imediatamente anterior aos eventos registrados na memória de um indivíduo) em virtude de viver com pessoas mais velhas. Provavelmente todas as sociedades que interessam ao historiador tenham um passado, pois mesmo as colônias mais inovadoras são povoadas por pessoas oriundas de alguma sociedade que já conta com uma longa história. Ser membro de uma comunidade humana é situar-se em relação ao seu passado (ou da comunidade), ainda que para rejeitá-lo. O passado é, portanto, uma dimensão

32 TEIXEIRA, Anísio. Notas para a história da educação. Discurso proferido na inauguração dos cursos da

Universidade do Distrito Federal, Rio de Janeiro, 1935. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, v. 37, n. 85, jan./mar. 1962, p. 181–8.

33 TEIXEIRA, Anísio S. [Fragmentos do discurso de Anísio Teixeira na inauguração da Universidade do Distrito

permanente da consciência humana, um componente inevitável das instituições, valores e outros padrões da sociedade humana. O problema para os historiadores é analisar a natureza desse “sentido do passado” na sociedade e localizar suas mudanças e transformações.34

O marco inicial do recorte da pesquisa — a entrada de Anísio na administração da Instrução Pública da Bahia, gestão do governador Góes Calmon, em 1924 — coincide com o acirramento do debate educacional e com um movimento sociopolítico que resultou em uma produção intelectual densa sobre a educação do país. Bomeny afirma, metaforicamente, que aquela década pode ser conhecida como “dos viajantes”, tal era movimento de intelectuais, ideias e projetos país afora. Não só dos “[...] modernistas à busca da autêntica nacionalidade e da cultura original brasileiras” — vide Mário de Andrade e a caravana modernista; mas também dos “[...] profissionais da ciência, em verdadeira caravana pela saúde, confrontavam- se com a doença do ‘imenso hospital’ em que se transformara o Brasil, expressão do escritor Monteiro Lobato [...]” — vide os “cientistas da saúde” Oswaldo Cruz, Belisário Pena, Arthur Neiva, Carlos Chagas, Clementino Fraga, Ezequiel Dias; enfim, mas não menos importante, o movimento dos “[...] educadores espalhados pelos estados com seus experimentos empíricos, um verdadeiro laboratório de reformas, idéias e projetos, inspirados, em sua grande maioria, em modelos estrangeiros [...]” — vide os “cientistas da pedagogia” como Anísio, Lourenço Filho, Fernando Azevedo, Francisco Campos e outros.35 Ainda na década de 20, impuseram- se dois desafios nacionais: curar a saúde física — carente de padrões mínimos de saúde, daí a metáfora de Lobato — e curar a saúde social: a “chaga” do analfabetismo, que impedia o país de ingressar no mundo moderno. Neste último, impuseram-se a obra, o pensamento e a atuação de Anísio como favoráveis à criação de um sistema nacional de ensino na cruzada contra o analfabetismo.

O marco final da pesquisa — a saída de Anísio das instâncias de gestão educacional do governo federal — coincide com o golpe civil-militar de 1964, que levou à deposição do presidente João Goulart e fez se instalar um regime de ditadura que durou mais de duas décadas e interferiu diretamente na atuação de Anísio no INEP, na CAPES e na Universidade de Brasília (UnB), além de interromper muitos projetos em curso nesses órgãos. Segundo Ianni, “[...] o período que vai da Primeira Guerra Mundial a 1º de abril e 1964 está repleto de

34 HOBSBAWM, Eric. Sobre história. São Paulo: Companhia das Letras, 1998, p. 22.

35 BOMENY, Helena M. B. Novos talentos, vícios antigos: os renovadores e a política educacional. Estudos

movimentos armados, atos isolados de violência, greves, revoltas, golpes e revoluções”.36

Como se infere, os anos 60 foram de desestabilidade política, inflação, movimentação em torno da questão agrária etc. O anúncio de uma educação nacional fundada em lei própria — a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1961 — soou como prenúncio de tempos de mudanças favoráveis à educação, ou seja, mudanças na ordem política e social. Mas o golpe e seus desdobramentos como o ato institucional n. 5 em 1968 derrubaram as expectativas elevadas.

Conforme Ianni, grosso modo, da década de 20 à de 60, numerosos acontecimentos assinalaram etapas e desdobramentos da ruptura das estruturas político-econômicas: crise da cafeicultura, agravamento dos antagonismos nas camadas dominantes, Primeira Guerra Mundial (1914–8), crise do capitalismo iniciada com o crack de 1929, Segunda Guerra Mundial (1939–45) etc. Houve ruptura parcial e relativamente lenta das estruturas políticas e econômicas internas e externas.

Os desdobramentos e as tendências do desenvolvimento econômico, político e social brasileiro, bem como das crises que o acompanham somente se explicam pelo caráter e pelas condições de ruptura verificadas no período que medeia a Primeira Guerra Mundial e o Golpe de Estado de 1964.37

A obra de Anísio é um marco do pensamento educacional no Brasil. Expressa a defesa dos princípios democráticos de educação para todos, sobretudo ao defender o ensino público de qualidade, obrigatório e gratuito. Ancorado nesses princípios, ele analisou e discutiu a educação dos anos 20 à década de 60, além de propor, com efetiva participação do Estado, a criação de um sistema educacional nacional capaz de minorar desigualdades sociais no acesso e na permanência na escola.

Contudo, cabe ressaltar que existia descompasso entre a proposta de Anísio e as condições estruturais no período pesquisado (1924–64) em virtude da pouca efetividade das políticas públicas. Havia assimetrias. Os níveis primário e secundário eram reformados em alguns estados; mas pelo prisma de cada ente federado, ou seja, de acordo com o prestígio político de seus governantes no governo federal. Dessa forma, fala-se em “moderna tradição”, ou seja, na persistência do modelo social vigente à época. Nessa lógica enfocamos Anísio imerso nessa “moderna tradição” como intelectual renovador do ensino — apesar de numerosas assimetrias sociais, econômicas e educacionais — e cujo pensamento inovador se

36 IANNI, Octávio. O colapso do populismo no Brasil. 2. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978, p. 14. 37 IANNI, 1978, p. 8; 9.

desdobrou numa tradição que se consubstanciava em meio a relações políticas clientelistas, à urbanização descontrolada (fins da década de 50), ao desenvolvimentismo e a conflitos ideológicos, sobretudo em torno da discussão do projeto da LDBEN. Anísio expressou um pensamento progressista numa proposta “além de seu tempo”; mas num tempo e numa cultura de tradição e conservadorismo. Suas proposições chocaram com um país, embora em processo de modernização, ainda ossificado pela tradição política herdada do período imperial. Seu pensamento foi inovador, porém se circunscreveu à estrutura da sociedade em que se desdobrou a “moderna tradição” brasileira.

O interesse em analisar o contexto socio-histórico que circundou a existência desse intelectual devotado à causa do ensino público partiu desta hipótese: há certa contradição no pensamento de Anísio Teixeira, a qual nominamos de “moderna tradição”38 e que se traduz, sobretudo, na proposição de um ensino escolar inovador e antitradição por um intelectual cuja personalidade e visão de mundo começou a se formar em ambientes conservadores e tradicionalistas: em parte, o meio familiar, de extração aristocrática, de vínculos e amizades políticas com famílias dos escalões mais altos do governo e de tradição política; em parte, o meio educacional, de orientação católico-jesuíta rumo a uma carreira no sacerdócio.

Trabalhar com tal hipótese exigiu estudar os contextos histórico-sociais por que transitou Anísio no processo de formação de seu pensamento a fim de compreender como se tornou intelectual da educação, entender o processo de formação intelectual tendo em vista forças de apoio e de colisão. Durante quase quatro décadas, ele participou da vida educacional do Brasil, e sua atuação se caracterizou em um movimento pendular entre o conservadorismo e a inovação. Além disso, averiguar tal hipótese demandou compreender dimensões inovadoras das propostas e como impactaram na “moderna tradição”, ou seja, em que medida a sociedade assimilou ideais inovadores para a educação e os valores de democracia e liberdade.

Com efeito, Anísio afirmou que a “Democracia sem educação e educação sem liberdade são antinomias, em teorias, que desfecham, na prática, em fracassos inevitáveis”.39

Mais: as “[...] aspirações humanas podem ser comuns a um e outro povo, mas o genius loci40

38 A expressão “moderna tradição” compõe o título de um livro de Renato de Ortiz — cf. ORTIZ, Renato. A

moderna tradição brasileira: cultura brasileira e indústria cultural. São Paulo: Brasiliense, 1988. Tomamos a

expressão de empréstimo porque nos pareceu traduzir com precisão e concisão uma compreensão que se delineou aos poucos na pesquisa e revelou ser seu mote.

39 TEIXEIRA, 2007a, p. 59.

40 Entendemos que a expressão latina genius loci foi utilizada por Anísio com o sentido de espírito do lugar,

dará a cada uma delas matiz e característica especial”.41 Em Educação e o mundo moderno,

ele afirma que o postulado da democracia “[...] liga o programa de vida que representa a um programa de educação, sem o qual, uma organização democrática não poderia sequer ser sonhada”. Para Anísio, aliada ao pensamento democrático, a educação visa a uma luta constante contra a marginalização de uma maioria em oposição à concessão de privilégio a poucos.

A educação nas democracias, a educação intencional e organizada, não é apenas uma das necessidades desse tipo de vida social, mas a condição mesma de sua realização. Ou a educação se faz o processo das modificações necessárias na formação do homem para que se opere a democracia, ou o modo democrático de viver não se poderá efetivar.42

O desdobramento da investigação para averiguar a hipótese de pesquisa seguiu certos objetivos. Num plano geral, seguiu o objetivo de compreender as concepções de Anísio

Teixeira como intelectual da educação para o ensino público no Brasil e seu legado, assim como sua tradução em propostas educacionais, seus significados e seus impactos na sociedade. Cumprir esse objetivo exigiu considerar o percurso traçado por Anísio em suas propostas educacionais e a dinâmica dos contextos sociopolítico e econômico das primeiras décadas do século XX. À época, um debate intenso sobre questões educacionais se estabeleceu, com uma produção intelectual sólida em nome de um projeto de educação nacional. Nesse horizonte, Anísio procurou criticar o “imobilismo” e ousou criar, em 1935, a Universidade do Distrito Federal (UDF), que propôs a pesquisa, o ensino e a extensão universitária interligados nos currículos dos cursos.

Num plano específico, a pesquisa seguiu objetivos para compor uma análise do quadro teórico-conceitual da educação brasileira e seus contextos:

 identificar analiticamente propostas de Anísio para a educação tendo em vista o cenário político e social e os impactos de suas concepções no ensino público;  delinear as redes de sociabilidade (intelectuais e políticas) que ajudaram a validar e

sustentar os projetos e as relações entre Anísio, governos e intelectuais liberais e conservadores;

 caracterizar a participação de Anísio nos movimentos educacionais dos anos 20 em diante com base no quadro teórico-conceitual sobre a educação brasileira e os contextos sociopolítico e econômico das primeiras décadas do século XX.

41 TEIXEIRA, 2007a, p. 245.

Esses objetivos sintetizam o pressuposto básico de que Anísio, ao longo do período aqui investigado, teve uma participação relevante no processo de “construção” de um modelo educacional nacional e em uma nova concepção de ensino público. Nesse sentido, a pesquisa priorizou a análise dos projetos educacionais propostos por ele na perspectiva de um sistema educacional com fins de reconstrução nacional.

Com efeito, a historiografia que trata da educação na Primeira República (1889–1930) demonstra que os espaços geográficos estaduais foram privilegiados, dado o afastamento do governo federal das questões educacionais daí emanadas. Perdurou a descentralização, de origem imperial. Também dos tempos do império permaneceu o coronelismo — e seu prestígio — como sustentação da estrutura do poder. Para Nagle, a implantação da República não estancou o poder e prestígio do sistema coronelista; ao contrário, este foi continuamente alimentado pelo desenvolvimento das formações oligárquicas e atingiu um ponto alto com a chamada “política dos governadores”.43 Com esse pensamento, governadores elegiam presidentes por meio de convenções com a quase totalidade dos votos dos que compareciam.44 Originou-se um sistema de representação coletiva singular com o poder nas mãos de um grupo restrito.45 Não seria equivocado afirmar, portanto, que as oligarquias estaduais

dominantes legislavam em causa própria, para usufruírem os benefícios que criavam. É esse o fenômeno político mais importante da história do regime republicano até o final da primeira República e que influenciou diretamente na gestão das questões educacionais, inclusive em tempos de regime ditador como o primeiro governo Vargas (1937–45).

Conhecido como Estado Novo, o regime de governo de Getúlio Vargas foi uma das maiores expressões do populismo, cujos vetores incluem a ideia da transferir prestígio ao líder. O populismo, segundo Francisco Weffort, é a política de incorporação das massas populares realizada pelo Estado a fim de legitimar seu poder, pois este necessita de base de sustentação.

43 Nagle diz que a “[...] implantação do regime republicano não provocou a destruição dos clãs rurais e o

desaparecimento dos grandes latifúndios, bases materiais do sistema político coronelista. Ainda mais, instituindo a Federação, o novo regime viu-se obrigado a recorrer às forças representadas pelos coronéis, provocando o desenvolvimento das oligarquias regionais que, ampliando-se, se encaminharam para a “política dos governadores”. Assim, os “homens mais importantes do lugar”, por seu poderio econômico, político e social, mantiveram-se mais fortemente ainda como chefes das oligarquias regionais e, dessa forma, atuaram como as forças sociais no âmbito dos governos estaduais e federal — cf. NAGLE, 2009, p. 12.

44 Não surpreende o fato revelado pelas onze eleições presidenciais realizadas no período de 1894 a 1930: o

candidato vencedor, com a constante ajuda do governo federal, elegia-se com a quase totalidade dos votos dos que compareciam. Por exemplo, a votação obtida por Campos Sales representava 90,93% do comparecimento do eleitorado; em sua primeira presidência, Rodrigues Alves obteve 91,59%; Washington Luís 97,99%. Cf. NAGLE, 2009, p. 17.

45 Cf. FAUSTO, Boris. História do Brasil. 14. ed. São Paulo: ed. USP, 2012; FAUSTO, Boris. A Revolução de

1930: historiografia e história. 12. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1994; LAPA, José Roberto do Amaral

“Esse estilo de governo e de comportamento político é essencialmente ambíguo e, por certo, deve muito à ambigüidade pessoal desses políticos divididos entre o amor ao povo e o amor ao poder”.46 Entendemos que, na realidade, foi um modo de manipulação das classes populares.

No contexto revolucionário de 30 — com destaque para a emergente classe média e a burguesia industrial —, o Estado efetivou um “compromisso” com as massas populares urbanas para se legitimar e se assegurar no poder (vide as políticas de conteúdo social como a legislação trabalhista, de 1943). Weffort afirma que “[...] uma das raízes da capacidade de manipulação dos grupos dominantes sobre as massas está na sua própria debilidade como classe, na sua divisão interna e na sua incapacidade de assumir, em seu próprio nome, as responsabilidades do Estado”.47 São esclarecedoras as palavras desse autor ao analisar que

Essa transferência de prestígio contém um dos elementos importantes da relação populista em geral, tanto no período ditatorial quanto na etapa democrática: o líder será sempre alguém que já se encontra no controle de alguma função pública — um presidente, um governador, um deputado, etc. isto é, alguém que por sua posição no sistema institucional de poder, tem a possibilidade de “doar”, seja uma lei favorável às massas, seja um aumento de salário, ou, mesmo uma “esperança de dias melhores”.48

A pesquisa seguiu uma abordagem qualitativa na coleta de documentos dos eventos passados considerados no recorte da pesquisa e na leitura histórica crítico-analítica das fontes eleitas.49 Tal leitura buscou apreender particularidades do objeto estudado nas fontes, e não

46 WEFFORT, Francisco. O populismo na política brasileira. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1978, p. 63. 47 WEFFORT, 1978, p. 71.

48 WEFFORT, 1978, p. 73.

49 A escrita da história é uma prática social — do historiador — cujo produto — o fato histórico — é criação

sempre sujeita a revisões dos valores que a história constrói e legítima. Tal sujeição se justifica pela natureza da matéria com o que o historiador lida: o documento do passado, o registro material do pretérito, os vestígios de como era a vida social, por exemplo, segundo dado enfoque. Novos documentos podem levar a novas histórias. Essa primazia da fonte histórica — o registro do passado que o historiador transforma em medida para conhecer a vida pretérita — ganhou relevo no século XX. O documento se afirmou como elemento essencial para produzir a história. Um dos que teorizaram sobre essa questão é Jacques Le Goff, historiador francês associado com a corrente historiográfica chamada escola dos Annales. De acordo com ele, o documento triunfa com a escola

positivista e “[...] todo historiador que trate de historiografia ou do mister de historiador recordará que é indispensável o recurso ao documento”. Para Le Goff, o documento é algo que permanece, não é neutro nem inócuo, pois é fruto da intervenção do historiador. Ele faz escolhas: seleciona alguns registros, descarta outros; atribui valores de testemunho que, pelo menos em parte, dependem da posição social na sociedade da sua época e de sua organização mental e que podem não ter o mesmo valor para outro historiador. “[...] não é qualquer coisa que fica por conta do passado, é um produto da sociedade que o fabricou segundo as relações de forças que aí detinham o poder”. Daí a “[...] análise do documento enquanto monumento, que permite à memória coletiva recuperá-lo e ao historiador usá-lo cientificamente, isto é, com pleno conhecimento de causa” (p. 459). Com efeito, no terceiro capítulo da quarta parte de História e memória (p. 485–92), Le Goff usou o vocábulo

No documento ANÍSIO TEIXEIRA E A EDUCAÇÃO BRASILEIRA: (páginas 32-48)