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A efetividade da Lei Maria da Penha no município de Panambi

3 A VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER NO MUNICÍPIO DE PANAMBI/RS E A

3.3 A efetividade da Lei Maria da Penha no município de Panambi

Para melhor compreender como está estruturada e quais os avanços e dificuldades presentes na rede de atendimento à mulher em Panambi foram realizadas entrevistas com agentes públicos responsáveis pelo acolhimento/atendimento/responsabilização, sendo eles a Dra, Katiuscia Kuntz Brust, Juíza de Direito da 2ª Vara Judicial da Comarca de Panambi, Dr. Carlos de Anhaia Beuter, Delegado de Polícia Civil de Panambi, e a Sra. Larissa Beck Gardin, responsável pelo CREAS (Centro de Referência especializado de Assistência Social) de Panambi/RS.

Através de um questionário contendo quinze questões relativas a casos de violência doméstica, política de atendimento às vítimas, o perfil das vítimas e agressores, bem como acerca do tipo de agressão mais praticadas, buscou-se identificar as percepções de agentes responsáveis pelo atendimento de mulheres vítimas de violência doméstica e familiar. Os agentes também foram instigados a responder sobre as causas desse tipo de violência, estratégias para o enfrentamento e dificuldades encontradas, de acordo com a função e setor que cada profissional atua, visando melhor compreender as diferentes visões e percepções sobre a realidade do município.

Nas respostas para os questionamentos feitos aos representantes das instituições, revelaram-se informações interessantes, uma vez que se destacaram dados semelhantes para determinadas indagações e ao mesmo tempo, respostas tão distintas que variam significativamente de acordo com o órgão entrevistado.

Inicialmente, foi dado ênfase para dados acerca do atendimento recebido pelas vítimas de violência nos anos de 2006 e 2014, isto é, no primeiro ano de vigência da Lei Maria da Penha e oito anos após sua entrada em vigor, tendo se verificado, por meio da entrevista, que nos respectivos anos houve 291 registros de ocorrências policial, sendo requeridas 1.596 medidas protetivas e atendidas em média cinco mulheres por mês.

Igualmente, foram feitas questões acerca do atendimento recebido pelas vítimas, tendo as instituições respondido, de maneira unânime, que o referido atendimento é prestado de forma articulada em rede, com serviços junto a Delegacia de Polícia, Poder Judiciário, CREAS, Coordenadoria Municipal de Políticas para as Mulheres e Conselho Municipal de Defesa dos Direitos das Mulheres. Também foi relatado, quanto aos serviços prestados, que inicialmente é efetuado o registro de ocorrência policial, efetuado na Delegacia de Polícia Civil, sendo orientadas as vítimas a procurarem atendimento junto ao CREAS e encaminhadas ao Poder Judiciário, o qual realiza as audiências de violência contra a mulher nas segundas quartas-feiras de cada mês, tendo neste mesmo dia, os técnicos do CREAS realizado palestras às mulheres e da mesma forma ocorre palestra aos agressores, a qual é ministrada pelo Sargento da Brigada Militar, o qual possui capacitação no Programa Estadual Patrulha Maria da Penha.

O perfil de vítimas e agressores traçado pelos responsáveis das instituições delineou as vítimas como mulheres na faixa etária entre os 18 e 60 anos, sendo relatado que em alguns casos excepcionais eram adolescentes e idosas com mais de 80 anos de idade, as quais vivem uma situação de dependência financeira do agressor e que possuem nível fundamental de escolaridade.

Ao mesmo passo, o perfil delineado para os agressores, através das respostas trazidas nos questionários aplicados, foi de indivíduos entre 30 e 50 anos de idade, com condição socioeconômica vulnerável (pobres), sendo que o nível de escolaridade predominante é o ensino fundamental.

Ainda, o tipo de violência mais frequente é o de ameaça e lesões corporais, sendo tais práticas efetuadas pelo marido ou companheiro das ofendidas, bem como o alcoolismo, dependência financeira e emocional foram indicados como fatores que causam as ocorrências das agressões.

Os resultados da pesquisa demonstram que, de forma geral, a percepção dos representantes da rede, quanto ao perfil de vítimas e agressores e formas de violência, corresponde aos dados levantados a partir da análise dos boletins de ocorrência, embora não com tanto detalhamento quanto as informações.

Por fim, os entrevistados apontaram a falta de efetivo de servidores, ausência de local específico e técnicos especializados para o atendimento das vítimas, carência de orçamento para investir em políticas públicas como as principais dificuldades encontradas no cotidiano, o que dificulta ou inviabiliza a realização do trabalho de atendimento e de prevenção da violência contra a mulher.

A partir da análise dos dados e das respostas as entrevistas realizadas percebe-se que, em que pese as dificuldades mencionadas, a rede de atendimento as mulheres está bem estruturada e em pleno funcionamento no município de Panambi, o que pode explicar, de forma geral, a queda nos índices de ocorrências nos últimos anos. Ficou evidente a preocupação com a qualificação do atendimento as vítimas, em especial através da realização de reuniões de esclarecimentos prévios as audiências judiciais.

Deve-se destacar, entretanto, que as políticas preventivas ainda são frágeis, em especial aquelas destinadas a enfrentar a cultura patriarcal e machista, que coloca a mulher como objeto e não como sujeito de direitos. Neste aspecto seria fundamental a realização de um trabalho voltado para a população jovem, visto que esta tem sido a faixa de indivíduos responsável por protagonizar o maior número de casos de violência doméstica e familiar identificados no município.

CONCLUSÃO

A história das mulheres na sociedade sempre foi marcada por diversas formas de violência. Estas, como regra, foram colocadas em posição de desprestígio e subordinação, tendo ficado restritas ao campo doméstico e a função materna. A violência contra a mulher foi sustentada pelo modelo patriarcal de sociedade, que foi reproduzido, inclusive, nas principais leis brasileiras durante a história.

Somente com a Constituição Federal de 1988 é que a igualdade entre homens e mulheres foi definitivamente reconhecida. A partir dela foram criadas leis e políticas públicas para dirimir essas desigualdades com equidade, ou seja, tratando os indivíduos igualmente na medida de suas desigualdades. Apesar disso a violência contra a mulher ainda persiste, sendo que mesmo com a criação da Lei Maria da Penha e sua entrada em vigor no ano de 2006, não houve significativas mudanças, uma vez que nos primeiros anos houve declínio nos casos violência e em seguida um aumento gradativo, chegando até mesmo a ultrapassar os números registrados antes da Lei 11.340/06. Igualmente, analisando dados constantes no Mapa da violência se nota que a violência contra a mulher ainda é muito presente em muitos lares brasileiros. Além das ameaças, lesões corporais, crimes sexuais e da violência psicológica, chama atenção o número significativo de feminicídios praticados no país todos os anos e que representa a forma mais radical de violência contra a mulher. Ademais, a violência de gênero é também chamada de violência doméstica, em razão de que a maior parte dos casos de violência são praticados na residência onde convivem as partes (vítima e agressor).

Para enfrentar a questão da violência contra a mulher no Brasil foi promulgada em 2006 a Lei 11.340, Lei Maria da Penha, com a finalidade de criar mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, tendo sido criada após uma condenação do Brasil pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos, por omissão, negligência e tolerância aos casos de violência doméstica. A lei baseia-se no tripé prevenção, atendimento a vítima e responsabilização do agressor e trouxe importantes inovações, especialmente no que tange a proteção à vítima, vez que passou a

prever atendimento mais qualificado aos casos de violência contra a mulher, com especial ênfase as medidas protetivas, que até então eram inexistentes.

A pesquisa de campo realizada no município de Panambi/RS, evidenciou que as mulheres vítimas são, preferencialmente jovens entre 18 e 29 anos, vivendo em união estável, comerciárias e moradoras dos bairros Arco-Íris, Pavão, Piratini, Zona Norte e Alves Klasener I. Por outro lado os agressores são indivíduos entre 30 e 40 anos, sendo que quanto ao grau de escolaridade predominou o ensino fundamental, porém no ano de 2014, houve um aumento significativo dos indivíduos com escolaridade de nível médio. As principais formas de violência praticadas são os delitos de violência física e psicológica, tendo a lesão corporal leve e as ameaças maiores casos de incidência.

Também ficou demonstrado que a rede de atendimento está estruturada e em pleno funcionamento no município, mas ainda existem falhas, devendo estas ser sanadas. Destaca-se a necessidade de implementação de políticas de prevenção à violência, especialmente entre os jovens, que são o grupo em que a violência tem se mostrado mais frequente, mediante a promoção da educação para a cidadania e para a igualdade de gênero, capaz de enfrentar a cultura machista e patriarcal que está na base da violência contra a mulher. Ao mesmo passo, restou destacado através de entrevistas aplicadas junto as instituições Delegacia de Polícia Civil, CREAS e Poder Judiciário, que uma das barreiras encontradas para uma melhora nos serviços prestados e consequentemente uma resposta nas tentativas de coibir com a violência doméstica, é a falta de efetivo e de investimento junto as instituições que compõem a rede, bem como a ausência de qualificação desses servidores que atendem às vítimas, sendo a referida qualificação é responsável muitas vezes pela decisão das ofendidas quanto ao prosseguimento ou não das ações para responsabilizar os agressores e cessar com a violência sofrida.

Por fim, cabe destacar, que a dignidade humana, enquanto fundamento do Estado Brasileiro só se fará efetiva quando os índices de violência contra a mulher forem significativamente reduzidos no Brasil. Neste processo, a afirmação da igualdade e o enfrentamento das questões culturais que estão na raiz da violência doméstica, são os principais desafios a serem enfrentados e requerem comprometimento dos poderes públicos e também de toda a sociedade.

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