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Violência contra a mulher no município de Panambi/RS e a efetividade da Lei Maria da Penha

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Academic year: 2021

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GRANDE DO SUL

SHEILA LOPES DA SILVA

A VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER NO MUNICÍPIO DE PANAMBI/RS E A EFETIVIDADE DA LEI MARIA DA PENHA

Ijuí (RS) 2015

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SHEILA LOPES DA SILVA

A VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER NO MUNICÍPIO DE PANAMBI/RS E A EFETIVIDADE DA LEI MARIA DA PENHA

Trabalho de Conclusão do Curso de Graduação em Direito objetivando a aprovação no componente curricular Trabalho de Curso - TC.

UNIJUÍ - Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul.

DCJS- Departamento de Estudos Jurídicos e Sociais.

Orientadora: MSc. Ester Eliana Hauser

Ijuí (RS) 2015

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AGRADECIMENTOS

A Deus, por ter permitido que eu chegasse até aqui, me dando força, coragem e perseverança.

A minha família por sempre estar presente, mesmo que não fisicamente, sempre me apoiaram nessa jornada acadêmica, não permitindo que eu desanimasse.

A minha orientadora por me auxiliar, sempre sanando minhas dúvidas e fazendo com que eu acreditasse que era capaz de realizar um trabalho que exigia muita dedicação e esforço como foi meu trabalho de conclusão de curso.

Aos meus colegas da Delegacia de Polícia Civil que sempre me auxiliaram e colaboraram para a concretização desse trabalho, sempre disponibilizando as ferramentas necessárias para que eu tivesse acesso aos dados, mostrando compreensão, generosidade e até mesmo amizade.

Aos meus amigos que sempre estiveram presentes, enfim, a todos que de uma maneira ou outra me auxiliaram durante a trajetória de construção deste trabalho, meu muito obrigado!

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“Vítima de violência doméstica é igual a polícia, vive correndo atrás de vagabundo” Autor Desconhecido

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RESUMO

A pesquisa aborda a violência doméstica e familiar contra a mulher no município de Panambi/RS, avaliando o perfil das vítimas e agressores, bem como as principais formas de violência praticada, destacando aspectos históricos relativos a consolidação da cidadania feminina, bem como a efetividade da Lei 11.340/06, Lei Maria da Penha, como instrumento de proteção à mulher. O trabalho discute o fenômeno da violência doméstica e familiar contra a mulher no município de Panambi/RS, a partir da identificação do perfil de vítimas, de agressores e das principais formas de violência, tendo como referência dados estatísticos relativos aos anos de 2006 e 2014, e busca compreender como está estruturada a rede de atendimento à mulher, avaliando a efetividade da Lei Maria da Penha no município. Também, busca avaliar as principais alterações em relação à violência doméstica no Município, discutindo a efetividade da Lei Maria da Penha enquanto instrumento para sua proteção, bem como demonstrar como está estruturada a rede de atendimento as mulheres no município de Panambi, identificando e classificando os órgãos de atendimento e serviços prestados.

Palavras-Chave: Violência. Perfil. Vítimas. Agressor. Cultura. Maria da Penha. Pesquisa.

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ABSTRACT

The research addresses domestic and family violence against women in the city of Panambi / RS, evaluating the profile of the victims and perpetrators, as well as the main forms of violence, highlighting historical aspects of the consolidation of women's citizenship and the effectiveness of Law 11.340 / 06, Maria da Penha Law, as an instrument of protection to women. The paper discusses the phenomenon of domestic violence against women in the city of Panambi / RS, from the identification of victims profile, offenders and the main forms of violence, with reference to statistical data for the years 2006 and 2014 and seeks to understand how the network is structured care for women, evaluating the effectiveness of the Maria da Penha Law in the municipality. Also seeks to assess the main changes in relation to domestic violence in the city, discussing the effectiveness of the Maria da Penha Law as an instrument for their protection, as well as demonstrate how women are structured service network in the city of Panambi, identifying and classifying organs of care and services provided.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO...8

1 QUESTÕES DE GÊNERO, CIDADANIA FEMININA E VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER...10

1.1 Questões de gênero e a construção histórica da cidadania da mulher...10

1.2 Igualdades de gênero na Constituição Federal de 1988...19

1.3 A violência contra a mulher como manifestação da desigualdade...20

2 LEI MARIA DA PENHA E OS INSTRUMENTOS LEGAIS DE PROTEÇÃO A MULHER...23

2.1 Conceito e formas de violência...24

2.2 A política de enfrentamento da violência contra a mulher na lei...27

2.2.1 Prevenção...27

2.2.2 Atendimento...30

2.2.3 Responsabilização do agressor...33

3 A VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER NO MUNICÍPIO DE PANAMBI/RS E A EFETIVIDADE DA LEI MARIA DA PENHA...37

3.1 A violência contra a mulher, dados estatísticos...38

3.1.1 O perfil das vítimas...40

3.1.2 O perfil dos agressores...45

3.1.3 As formas de violência...47

3.2 A rede de atendimento a mulher no município de Panambi...52

3.3 A efetividade da Lei Maria da Penha no município de Panambi...54

CONCLUSÃO...57

REFERÊNCIAS...59

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INTRODUÇÃO

O presente estudo aborda a violência doméstica e familiar contra a mulher no município de Panambi/RS, avaliando o perfil das vítimas e agressores, bem como as principais formas de violência praticada, destacando aspectos históricos relativos a consolidação da cidadania feminina, bem como a efetividade da Lei 11.340/06, Lei Maria da Penha, como instrumento de proteção à mulher, naquele município.

A justificativa para a escolha do tema proposto é de chegar o mais próximo de descobrir porque a Lei Maria da Penha, apesar de ter uma boa redação não consegue diminuir ou erradicar os casos de violência doméstica, bem como ao analisar a efetividade da referida lei, estabelecer um diagnóstico para as falhas encontradas em sua aplicabilidade no Município de Panambi/RS, contribuindo, assim, para os órgãos públicos complementarem seus campos de atuação, dando maior ênfase em pontos específicos no que diz respeito às políticas públicas para as mulheres, permitindo diminuir os casos de violência doméstica e aumentar a efetividade nos casos abrangidos pelo município de Panambi/RS.

O objetivo deste trabalho é discutir o fenômeno da violência doméstica e familiar contra a mulher no município de Panambi/RS, a partir da identificação do perfil de vítimas, de agressores e das principais formas de violência, tendo como referência dados estatísticos relativos aos anos de 2006 e 2014, e compreender como está estruturada a rede de atendimento à mulher, avaliando a efetividade da Lei Maria da Penha no município. Para realização da pesquisa foram considerados os meses de setembro, outubro, novembro e dezembro de 2006 e de 2014, o que permitiu vislumbrar as principais mudanças ocorridas entre estes dois períodos históricos, no que tange as ocorrências de violência contra a mulher.

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Para realizar a pesquisa foi utilizada a técnica da pesquisa documental, considerando como fontes primárias documentos e registros institucionais constantes do Banco de Dados da Delegacia de Polícia Civil de Panambi/RS, mas especificamente os boletins de ocorrência lavrados, onde constam informações sobre a natureza da infração e sobre as partes envolvidas no conflito. Também foram realizadas entrevistas com representantes de entidades responsáveis pelo acolhimento e atendimento de mulheres vítimas de violência, visando melhor compreender como está estruturada a rede de atendimento, bem como quais são as maiores dificuldades e desafios encontrados no enfrentamento a violência doméstica e familiar.

Dessa forma, no primeiro capítulo são apresentados e discutidos aspectos históricos relativos a violência contra a mulher, com especial ênfase as questões de gênero e ao princípio da igualdade consagrado no texto da Constituição Brasileira de 1988. Neste momento é evidenciado o todo o processo cultural, que baseado em uma lógica patriarcal e machista, encontra-se na base da violência contra a mulher, o que justificou a promulgação da Lei 11.340/06, também conhecida como Lei Maria da Penha. Referida lei, que adveio de um processo de lutas, do qual participaram as mulheres, visando prevenir e coibir atos de violência e abusos praticados contra seu gênero, foi reflexo da luta por respeito, igualdade e dignidade humana.

Já no segundo capítulo foram apresentados e discutidos os principais institutos presentes no texto da Lei Maria da Penha e os instrumentos legais de proteção a mulher, sendo exibido o funcionamento da rede de atendimento às vítimas de violência doméstica no município de Panambi/RS.

Ao final, no terceiro e último capítulo, são apresentados e discutidos os dados da pesquisa de campo realizada no Município de Panambi/RS, demonstrando-se, a partir de dados relativos aos anos de 2006 e 2014, qual o perfil de vítimas e agressores, quais as formas de violência predominantes e o contexto em que esta se dá. Referidos dados são apresentados por meio de gráficos e, a partir de sua análise, apresentam-se os resultados da pesquisa.

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1 QUESTÕES DE GÊNERO, CIDADANIA FEMININA E VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER

A violência doméstica é um problema antigo e também muito atual, especialmente no Brasil, o qual traz em sua história inúmeros exemplos de degradação feminina, na qual a mulher é vista, por muitos, como um objeto/propriedade dos homens. Esta forma de violência se constituiu a partir de uma cultura patriarcal que tem sido reproduzida durante séculos e está na base da desigualdade entre gêneros ainda muito presente na sociedade brasileira.

Apesar da evolução da sociedade brasileira e das recentes alterações normativas, que consagraram a igualdade de gênero, em especial no texto da Constituição de 1988, e que foram incorporados ao cotidiano, a mulher continua sendo considerada inferior e ainda é submetida a várias formas de violência, não só física, mas também psicológica. Em que pese a maior repercussão dos casos de violência, em razão do aumento do número de denúncias, percebe-se que ainda há um longo caminho a ser percorrido no enfrentamento a esta questão.

Da mesma forma, apesar da mulher brasileira ter conquistado maior espaço e participação na sociedade, percebe-se que a violência contra ela persiste sendo que, na maioria dos casos, a violência ocorre no interior de suas residências e os agressores são pessoas próximas, que se profundamente marcadas pela cultura patriarcal, o que faz com que se tornem intolerantes e não aceitem a igualdade entre homens e mulheres.

1.1 Questões de gênero e a construção histórica da cidadania da mulher

Sabe-se que historicamente a mulher ocupou um lugar de subordinação na sociedade sendo relegada a um segundo plano pela cultura patriarcal e machista. No período antigo e medieval a mulher era considerada inferior ao homem, sendo que a mesma não era considerada cidadã.

No período medieval a sociedade foi marcada pela hegemonia masculina e a mulher continuava numa posição de absoluta dependência do pai e do marido sendo que naquele contexto os valores da família e da virgindade feminina foram ressaltadas pelos normas religiosas e jurídicas, o que contribuiu para a repressão do universo feminino e para a

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consolidação da imagem da mulher como “propriedade/objeto” do homem, seja pai ou marido.

Com a modernidade esta realidade não foi alterada. Segundo Machado, o renascimento trouxe novas regras para as mulheres, mas estas não as retiraram do lugar de subserviência e dominação, pois estas permaneceram situadas no âmbito da vida doméstica tendo sido então criado o culto “à domesticidade, a criação do amor materno e do amor romântico.” (MACHADO, 2003, p. 94)

Mesmo durante o séculos posteriores marcados pelas grandes revoluções e pelo reconhecimento dos valores igualdade, liberdade e fraternidade, a realidade das mulheres não se alterou. Os discursos produzidos naquele período ressaltam a ideia de uma mulher ideal, dotada de feminilidade e preparada apenas para a vida doméstica. A mulher virtuosa é, naquele contexto, “a rainha do lar”, sendo frágil e despreparada para a vida pública. Rousseau (apud MACHADO, 2003, p.95) salientava a posição de suposta inferioridade feminina afirmando que

A mulher mantém-se perpetuamente na infância; ela é incapaz de ver tudo o que é exterior ao mundo fechado da domesticidade, que a natureza lhe legou e daí resulta que ela não pode praticar ciências exatas. A única ciência (....) que ela deve conhecer é a dos homens que a rodeiam e, essencialmente, a do seu marido, e que é baseado no sentimento.

Segundo Machado (2003, p. 97) a Revolução Francesa poderia ter transformado o destino das mulheres, mas não o fez, pois

(....) ela mostrou-se respeitosa as instituições e as valores burgueses. Assim as mulheres que lutaram ao lado dos homens, na tomada da Bastilha, reivindicaram os seus direitos de vencedoras que também o foram, mas tiveram os mesmos negados com a resposta: “A revolução Francesa é uma revolução dos homens. Não podemos conceder o Direito da Mulher porque hoje foi o dia que nasceram os direitos do homem”.

Durante os séculos seguintes (XIX e início do século XX) as leis produzidas fortaleceram a desigualdade transformando-a em desigualdade jurídica. Os Códigos Civis reproduziam a ideia da mulher como um ser relativamente capaz, que existia apenas como “filha, esposa e mãe, enquanto o homem era o único sujeito de direitos” (MACHADO, 2003, P. 100)

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No Brasil a realidade não foi diferente e somente a partir da década de 60 do século XX, a partir de muitas lutas a mulher consegue, lentamente, libertar-se da condição de inferioridade que a sociedade lhe atribui. Neste processo o movimento feminista teve papel fundamental, inspirando-se nos grandes movimentos de contestação ao poder instituído em nível mundial nas décadas de 60 e 70.

O movimento feminista se impôs, negando a ordem patriarcal que atribuía à mulher uma função secundária em relação ao homem. Esses movimentos frutificaram, pois abriram espaço para que hoje as mulheres ocupem posições de destaque no mercado de trabalho e na sociedade como um todo. (MACHADO, 2003, p. 119)

Este movimento contribuiu, no Brasil, para o reconhecimento da igualdade de gênero na constituição de 1988, o que representou uma conquista histórica significativa para as mulheres. Mas a igualdade consagrada no texto constitucional brasileiro ainda não é plenamente efetiva e a violência contra a mulher representa um dos principais entraves a sua consolidação prática. Infelizmente, muitos homens ainda se utilizam de variadas formas de agressão contra as mulheres para assegurar uma suposta “superioridade” e até mesmo para impedir seu protagonismo e emancipação, sendo que muitas vezes os objetivos dos agressores são consumados com o silêncio das mulheres que se submetem a tais agressões sem denunciar.

Apesar dos avanços visíveis na sociedade, principalmente no que tange a mulher brasileira, a qual conquistou um lugar na construção da sociedade, e também assegurou direitos anteriormente inexistentes, adquirindo seu papel de cidadãs, percebe-se que estas não sabem a força que tem e muitas vezes não exercem plenamente sua cidadania, permitindo abusos e agressões. “Com a evolução da sociedade e depois de muitos esforços empreendidos aos poucos as mulheres foram conquistando espaços, conseguindo alterar as leis para garantia de seus direitos”. (GROSSMANN; CARDOSO, 2013, p. 67).

Como mencionado, ao longo da história são facilmente perceptíveis as dificuldades que a mulher teve para receber um tratamento igualitário ao dos homens, uma vez que a cultura patriarcal criou a imagem de uma mulher pura e que nasceu com o único objetivo de ser dona de casa, procriar, tendo sempre um comportamento submisso perante aos homens, os quais detinham todo o poder e controle familiar, podendo inclusive castigar o sexo oposto se

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este não agisse de acordo com as normas impostas pela sociedade. Nesse sentido, a sociedade atual que traz conceitos de igualdade, sem distinções de nenhuma natureza ainda apresenta respingos de uma cultura patriarcal, que atribui a mulher, a partir da construção de papeis de gênero, um lugar de subordinação, o qual é responsável por sustentar comportamentos de violência contra a mulher, seja fisicamente ou psicologicamente.

Segundo Lurdes Aparecida Grosmann e Ângela Teresinha Rambo Cardoso (2013, p. 67):

Desde os tempos mais remotos o tratamento dispensado às mulheres era diferenciado, considerado-as (sic) em princípio propriedades de seus pais e depois de seus maridos, que sobre elas detinham poder de vida e de morte. Eram tratadas como objeto e seu principal papel na sociedade era o de procriar e dedicar-se aos afazeres domésticos, não lhes era dado direito algum, estando relegadas à submissão e inferioridade.

Nesse mesmo sentido é o que dispõe Maria Berenice Dias (2011, p. 97):

A presença da mulher é a história de uma ausência. Era subordina a ao marido, a quem devia obediência. Sempre esteve excluída do poder dos negócios jurídicos, econômicos e científicos. O lugar dado à mulher sempre foi um não lugar. Relegada da cena pública e política, sua força política sempre foi desconsiderada, não sendo reconhecido o valor econômico dos afazeres domésticos.

Odila de Mélo Machado (apud HESKETH, 2003, p. 85) narra que:

Com o advento do Cristianismo os padres da Igreja eram homens que, tendo prestado voto de castidade, rejeitavam, em seus sermões, tudo aquilo que se relacionasse com o corpo e os desejos sexuais. A Virgem Maria tornou-se o modelo apregoado a todas as mulheres que deveriam, a seu exemplo, manter-se castas.

Em contraposição a essa imagem do sexo feminino como uma figura angelical, a mulher protagonizou vários marcos na história em busca de maior isonomia com o sexo oposto podendo ser mencionado dentre elas, a conquista do direito estudar, de trabalhar, de votar, ou seja, lutaram por sua cidadania.

Segundo Carla Bassanezi Pinsky e Joana Maria Pedro (apud PINSKY, J; PINSKY, C, 2003, p. 505):

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Foi em teorias iluministas do final do século XVIII que muitas mulheres se basearam para reivindicar direitos para si e demandar a emancipação feminina. O iluminismo abria perspectivas, possibilitando uma nova abordagem da arena pública (e, consequentemente, da questão da cidadania, ao afirmar ser cada indivíduo possuidor de direitos inalienáveis. [...]A percepção do crescimento da influência feminina nas Cortes (exercida por rainhas, cortesãs e amantes de reis e nobres) e fora delas, nos salões, fez crescer o coro de vozes que temiam a intromissão de mulheres na política, na cultura e na vida social, considerando-a perniciosa. [...] A mulher que atua nos territórios “masculinos” da cultura e da política foi repudiada em favor da mulher doméstica, que elege a família como centro de sua vida.

O século XIX foi marcado por mais uma conquista em relação à cidadania das mulheres, uma vez que estas dispuseram do direito de estudar, direito este que antes era lhes negado e permitido somente aos homens, porém a educação fornecida às moças era diferenciada dos rapazes, pois não era considerado necessário fornecer instrução às mulheres, as quais deveriam se preocupar em constituir família e após cuidar desta, ao invés de adquirir conhecimento.

A educação formal para as mulheres não era muito valorizada no século XIX. A formação adequada- que para muitos se distinguia da instrução- serviria, conforme a ideologia dominante, apenas para torná-las boas cumpridoras de seus papéis femininos. Assim, as disparidades entre os sexos era também diferenciada para rapazes e moças. [...] Apesar dos obstáculos, a alfabetização para as mulheres progrediu nas cidades do século XIX. Por volta de 1880, os principais países da Europa haviam implantado, ou estavam em vias de implantar, um ensino primário(em escolas gratuitas) e secundário acessíveis a elas.[...] O ensino superior norte-americano abriu, antes da Europa, desde a metade do século XIX, suas portas às mulheres nas universidades estatais, sobretudo no Oeste. Pinsky e Pedro (apud PINSKY, J; PINSKY, C, 2003, p. 275-276)

Com relação ao direito de votar na escolha de seus representantes, às mulheres só tiveram esse direito conquistado, no Brasil, há 82 anos, sendo esse um marco referencial na história das conquistas femininas. O direito ao voto era negado as mulheres com o argumento da incapacidade feminina para a escolha dos governantes, pois estas seriam mais aptas as tarefas da vida privada/domestica e não para as atividades da vida pública. Já o homem, como provedor da casa, seria o único dotado de sabedoria para fazer todas as escolhas em seu nome e de sua família, sendo considerado inquestionavelmente certo suas decisões.

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O direito de votar e de ser eleita tem sido conquistado a duras penas.[...] Os argumentos de que exercício do direito de voto por parte das mulheres traria conflitos para os lares, desviando-as de suas funções “naturais”, ou de que a natureza feminina as torna incapazes de escolher racionalmente, por exemplo, foram constantemente utilizados e, hoje, muitas vezes, são retomados com outras roupagens, com o intuito de afastá-las do mundo da política.

[...]O direito das mulheres em escolher seus representantes foi garantido em 1932, através do decreto 21.076 do Código Eleitoral Provisório, após intensa campanha nacional. Com a consolidação da participação feminina nas eleições, a mulher passou a conquistar cada vez mais o seu espaço no cenário político brasileiro. Hoje, há mulheres em todos os cargos eletivos. Além da Presidência da República, exercem mandato duas governadoras, 11 senadoras, 45 deputadas federais e 134 deputadas estaduais.(82..., 2014, p. [?]).

A década de 1960 do século XX foi de suma importância para as mulheres em sua busca por um lugar de destaque na sociedade. Não somente pela formatação dos movimentos feministas, como já mencionado, mas também pela criação das pílulas contraceptivas, o que permitiu as mulheres a possibilidade de optar por gerar filhos ou não, o que gerou polêmica, pois foi em desencontro com as normas aceitas na sociedade.

Nesse diapasão é o que narra Judith Hartl (s.d, p [?]):

O sexo, na época, ainda era tratado apenas como meio de reprodução. Por isso, a pílula significou uma reviravolta no conceito de sexualidade, pois o casal podia passar a manter relações sexuais apenas por prazer. A demanda aumentou muito a partir de 1965 na Alemanha. Ao mesmo tempo em que a indústria farmacêutica enriquecia, o sexo masculino começou a preocupar-se com a fidelidade de esposas e namoradas.

O maior avanço operou-se, contudo, com a promulgação da Constituição Brasileira de 1988 que reconheceu plenamente a igualdade de gênero proibindo qualquer espécie de discriminação.

A igualdade de gênero consagrada no texto constitucional brasileiro ainda não é plenamente efetiva e a violência contra a mulher representa um dos principais entraves a sua consolidação prática. Infelizmente, muitos homens ainda se utilizam de variadas formas de agressão contra as mulheres para mostrar sua superioridade e até mesmo para impedir seu protagonismo e emancipação, sendo que muitas vezes os objetivos dos agressores são consumados com o silêncio das mulheres que se submetem a tais agressões sem denunciar.

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Com o crescimento dos casos de violência doméstica, os quais na maioria das vezes não eram denunciados pelas mulheres, seja por vergonha de se expor ou até mesmo porque para os casos denunciados a penalidade era insignificante, abrindo as portas para a impunidade e somente disseminando a ira dos agressores que continuavam a praticar o ciclo de agressões contra as mulheres, foi necessário ser criada uma lei para proteção dessas mulheres vítimas de violência, sendo denominada Lei 11.340/06, também conhecida com Lei Maria da Penha.

A Lei 11.340, de 07 de agosto de 2006,

Cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8o do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres e da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; altera o Código de Processo Penal, o Código Penal e a Lei de Execução Penal; e dá outras providências. (BRASIL, 2014)

A violência doméstica contra a mulher é um assunto inesgotável, uma vez que a cada dia os casos desse tipo de violência tem um aumento alarmante, mesmo com a vigência da Lei 11.340/06, também conhecida como Lei Maria da Penha, é perceptível o aumento de denúncias de mulheres contra seus agressores.

Segundo Alice Bianchini, (2013, p. 29, grifo do autor):

A Lei Maria da Penha não trata de toda a violência contra a mulher, mas somente daquela baseada no gênero (art. 5º, caput). Tal delimitação decorre da relação contida no dispositivo antes mencionado, o qual estabelece que, “para efeitos desta Lei [Lei Maria da Penha], configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero.”

Nesse sentido é o que dispõe Waiselfisz no Mapa da Violência (2012, p. 16), que apresenta dados sobre homicídios de mulheres no Brasil entre os anos de 1980 e 2012, ao trazer informações no sentido que o Brasil está no 7º lugar no ranking das taxas de homicídios femininos (100 mil mulheres), entre 84 países, apresentando a taxa de 4,4% feminicídios por 100.000 habitantes.

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Do mesmo modo, o estado do Rio Grande do Sul, ocupa a posição 19ª no ranking das taxas de homicídio feminino (em 100 mil mulheres) por UF. Brasil. 2010, sendo que o município gaúcho de Taquara é o que apresenta maiores níveis de homicídios femininos em Municípios com mais de 26 mil mulheres, no período compreendido entre 2008 e 2010, ocupando a 19ª posição, entre os 100 Municípios do Brasil. (MAPA DA VIOLÊNCIA, 2012)

Também, com a criação da Lei 11.340/06 ocorreram mutações significativas visando coibir a violência de gênero, porém a referida lei deixa em seu texto algumas falhas, as quais podem ser a responsáveis pela não diminuição e uma futura erradicação desses atos de violência, podendo ser citado o tratamento da lei que deixa as práticas de violência, com exceção da lesão corporal (art.129, § 9, do CP) e em alguns casos as vias de fato (art. 21, do LCP), condicionados a representação da mulher vítima de violência doméstica para ter prosseguimento, sendo que as referidas vítimas na maioria dos casos imbuídas por medo, dependência financeira ou outros motivos alheios a sua vontade, acabam por desistir/renunciar da ação, gerando reincidência nos casos de violência posteriormente.

Não obstante isso, a Lei representou um significativo avanço pois retirou os casos de violência doméstica do âmbito dos Juizados Especiais Criminais, o que permitia fossem tratados como infrações de menor potencial ofensivo, com aplicação de penas irrisórias, sendo tratadas como uma simples briga entre vizinhos. Para Dias, (2012, p. 27):

Quando a mulher é a vítima de violência doméstica, a aplicação da Lei dos Juizados Especiais é desastrosa. [...] Ou seja, crimes contra a integridade física e psicológica, bem como contra a dignidade feminina, eram apreciados na mesma forma que os crimes de trânsito ou brigas de vizinhos.

Em que pese os avanços trazidos pela lei Maria da Penha, observa-se que os casos de violência contra a mulher ainda persistem. Isso deve-se a cultura patriarcal e machista que coloca a mulher como objeto/propriedade dos homens e que ainda precisa ser superada.

Tal cultura foi construída ao longo dos tempos e está na base da violência contra a mulher que continua presente nos dias de hoje. A história nos traz a figura da mulher como vítima de uma cultura patriarcal, na qual era considerada como um objeto de propriedade dos homens, primeiro de seu pai e depois de seu marido.

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Procuraremos percorrer toda uma situação de inferioridade da mulher que vem desde o direito romano onde ela sequer tinha capacidade jurídica. A mulher era vista como um mero objeto. Era posse do pai enquanto menina, posse do marido enquanto jovem e se por ventura ficasse viúva passava a ser posse da família do pai do marido morto (EVOLUÇÃO..., 2008, p. [?]).

Da mesma forma, por muitos anos a mulher viveu sem ter direitos, a sombra dos homens, acreditando que os direitos que estes detinham sobre elas era natural, o que reproduzia uma postura conformista que se estendeu durante anos.

No Brasil o estereótipo da mulher desenvolvido pela sociedade patriarcal trazia o gênero feminino como aquele que tem sua existência com o único objetivo de aprender a executar as tarefas domésticas para ser uma boa esposa e consequentemente uma boa mãe, sem ter oportunidade de estudar ou ter um destino diverso, pois se “desafiassem” as leis da natureza de mulher, era considerada uma anomalia, a qual poderia ser castigada por seu pai e posteriormente por seu marido se não desempenhasse seu papel conforme o esperado.

A violência doméstica não pode ser considerada somente violência contra a mulher, mas violência de gênero, uma vez que nem toda violência contra a mulher pode ser aplicada como violência doméstica, uma vez que pode ser citado como exemplo o marido que assassina sua esposa para que ela não delate um crime por ele cometido.

A violência de gênero nada mais é do que uma maneira de tentar impor as mulheres uma superioridade masculina, na tentativa de coibir sua inserção na sociedade como uma cidadã detentora de direitos.

Segundo Moraes (apud PINSKY, J; PINSKY, C, 2003, p. 505) “A violência de gênero é a manifestação das relações históricas de poder entre masculino e feminino que se reproduzem na prática cotidiana.”

Posteriormente as mulheres conquistaram o direito de trabalhar, porém a carga horária a elas impostas era desumana e seus salários extremamente baixos em comparação ao dos homens, além de terem vagas de trabalho apenas em cargos não tão prestigiados pela sociedade, tendo sido enxergadas como uma mão de obra barata, sendo que inicialmente não eram permitidas as mulheres casadas trabalharam e as que casassem quase sempre eram demitidas. Naquela época os salários dos homens não eram muito altos e como eram

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responsáveis pelo sustento de sua família, algumas mulheres conciliavam sua vida de trabalho doméstico com um emprego a fim de complementar a renda de seu marido no sustento da casa.

1.2 Igualdades de gênero na Constituição Federal de 1988

Historicamente, as mulheres foram vistas como frágeis e sem direitos, sendo relegadas a um lugar de subordinação na sociedade. No Brasil, o Código Civil de 1916 não considerava as mulheres detentoras de direitos, mas sim subordinadas ao homem no grupo familiar, sendo consideradas incapazes de praticar os atos da vida civil sem o consentimento do marido. “Com o casamento a mulher perdia sua capacidade civil plena. Cabia ao marido a autorização para que ela pudesse trabalhar, realizar transações financeiras, fixar residência”(MORAES, apud PINSKY, J; PINSKY, C, 2003, p. 505).

O Código de 1916 era uma codificação do séc. XIX, pois Clóvis Beviláqua foi encarregado de elaborá-lo no ano de 1899. Retratava a sociedade da época, marcadamente conservadora e patriarcal. Assim, só podia se consagrar a superioridade do homem. Sua força física foi transformada em poder pessoal, em autoridade, outorgando-lhe o comando exclusivo da família.(DIAS, 2011, p. 99, grifo do autor).

Em 1962, com a criação do Estatuto da Mulher Casada é que a mulher casada passa a ser detentora de alguns direitos, diminuindo um pouco o abismo da desigualdade que há entre o gênero feminino e os homens, uma vez que o marido passa a ter os mesmos impedimentos que sua esposa, sendo necessária autorização desta para praticar alguns atos da vida civil.

A evolução da condição jurídica da mulher foi bastante lenta e no Brasil teve marcos básicos, dentre os quais podemos citar o Estatuto da Mulher Casada, que alterou o Código Civil; a Consolidação das Leis do Trabalho; a Consolidação das Leis da Previdência Social e as anteriores Cartas Magnas culminando com a atual Constituição Federal. (EVOLUÇÃO..., 2008, p. [?]). O ano de 1977 foi marcado com a entrada em vigor da Lei 6.515/77, também conhecida como Lei do Divórcio, momento em que houve necessidade de mudanças Constituição Federal, sendo que essa lei trouxe mudanças significativas para as mulheres, as quais puderam passara escolher quanto a adoção do nome do cônjuge, bem como o regime de bens padrão dos casamentos quando não era optado pelo pacto antinupcial, passou do regime universal, para o parcial. “A Lei do Divórcio (L 6.515/77), em vez de regular o divórcio,

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limitou-se a substituir a palavra desquite pela expressão separação judicial, mantendo as mesmas exigências para sua concessão. Mas trouxe grandes avanços em relação à mulher.” (DIAS, 2011, p. 98, grifo do autor).

Os mais significativos avanços das mulheres na conquista por direitos e na afirmação da igualdade entre os gêneros se deram com a entrada em vigor da Constituição Federal de 1988, a qual colocou homens e mulheres como sujeitos de direitos e afirmou a igualdade de gênero.

Para Calvi Tait (2008, p. [?]):

Em outubro de 1988 foi promulgada a nova Constituição da República Federativa do Brasil. Resultado de discussões relevantes para um período marcado pelo retorno à democracia, a nova constituição trouxe consigo também as lutas dos movimentos de mulheres e suas reivindicações. Dessa forma, conceitos como "sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação" foram incorporados ao texto da nova Constituição. As mulheres, também, passaram a ter visibilidade na lei, como sujeitos, ao serem igualadas aos homens, em direitos e obrigações.

Outrossim, em que pese a Constituição Federal de 1988 afirme a igualdade sem distinção de qualquer natureza, observa-se que a realidade é totalmente diferente, uma vez que não vai ser uma Lei que irá desfazer o que anos de cultura patriarcal criou, mas sim a educação das novas gerações empregando conceitos de igualdade e respeito as diferenças.

1.3 A violência contra a mulher como manifestação da desigualdade

Apesar dos avanços legais e das transformações culturais que já se operaram no país no que tange ao reconhecimento da igualdade de gênero, a violência doméstica continua presente na sociedade brasileira e, apesar desta ser considerada tolerante com as diferenças, continua presenciando atos tão primitivos como a violência contra a mulher. Esta se manifesta como forma de autoafirmação masculina e demonstração de superioridades sobre gênero feminino que ganha cada dia mais espaço na sociedade.

Para Ester Eliana Hauser et al (2013, p. 242):

Mesmo em sociedades democráticas, baseadas no princípio da dignidade humana, a violência física, sexual, moral e psicológica contra a mulher ainda é utilizada por

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muitos homens como instrumento de afirmação de uma suposta “supremacia” e representa a forma mais radical de negação concreta do direito à igualdade.

O reconhecimento do direito a igualdade não significa a negação das diferenças. Trata-se não de uma igualdade meramente formal, mas da afirmação da igualdade substancial, em que se reconheçam as diferenças. Em situações específicas, considerando as diferenças naturais, inerentes ao sexo, e considerando a condição histórica de desigualdade, a afirmação da equidade exige tratamento diferenciado, de modo a se respeitar as diferenças (naturais ou reais) existentes. Neste âmbito as ações afirmativas, que visam igualar no acesso a direitos e na afirmação da dignidade, aqueles que se encontram em situação de desigualdade natural ou fática, são absolutamente necessárias. A disparidade histórica e a violência contra a mulher, como forma mais radical de manifestação concreta da desigualdade, só pode ser efetivamente reduzida com a consolidação de políticas públicas que as enfrentem. Neste aspecto a criação da Lei Maria da Penha, assim como a lei que determina cotas para mulheres em partidos políticos mostram-se necessárias, pois são leis que buscam assegurar a igualdade substancial entre homens e mulheres.

Outra questão que merece ser destacada diz respeito a inserção da mulher no mercado de trabalho, pois neste campo ainda se está muito distante do ideal de igualdade, uma vez que estas não são contratas em todas as áreas por haver preconceitos, seus salários são inferiores ao dos homens, mesmo desempenhando a mesma função, além de sofrerem assédio moral em seu local de trabalho em razão de pertencerem ao sexo feminino.

Segundo Marcus Vinicius Pinto (2014, p. [?]):

Apesar de a formalização ter beneficiado as mulheres no que se refere à carteira de trabalho assinada, ainda não foi possível reduzir a diferença em relação aos homens. Houve queda de 3% no número de trabalhadores domésticas sem carteira assinada (quase sempre pretas e pardas), e também no número de trabalhadores (sic) domésticas com carteira de trabalho. Esse número no futuro deve sofrer variação, já que agora a lei iguala o direito das domésticas com outras trabalhadoras. Quando o estudo foi feito, em 2010, essa lei ainda não estava em vigor.

Ainda, Hauser (2013, p. 244) nos coloca que:

Neste sentido, vale lembrar que não é somente no ambiente doméstico que a violência contra a mulher se manifesta. Ela pode estar presente em diversos espaços sociais, notadamente nos espaços de trabalho, e assumir formas,

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muitas vezes, imperceptíveis. Neste aspecto, cabe ressaltar que incumbe a cada um e a todos a responsabilidade pelo enfrentamento desta e de outras formas de violência.

Portanto, no decorrer da história fica evidente que ocorreram grandes avanços em relação à conquista da cidadania pelas mulheres e um resultado satisfatório em sua busca por uma participação ativa na sociedade, tendo direitos e deveres, assim como os homens, ao invés de ter uma vida a sombra do sexo masculino, baseada na submissão. Porém também é evidente o aumento na incidência de casos de violência doméstica contra a mulher, sendo essa a mais pura manifestação dos homens, os quais geralmente figuram como agressores, de repressão à equidade entre os gêneros.

Para tanto faz-se necessário, em primeiro lugar, a sensibilidade para percebermos as inúmeras formas de manifestação da violência na sociedade contemporânea e, em segundo lugar para disseminarmos uma ideologia baseado no respeito incondicional à pessoa humana, independente de sua condição de sexo, religião, etnia, origem, idade, convicções. Este é o pressuposto para a afirmação concreta da dignidade humana e da democracia, consagrados como valores fundamentais do Estado brasileiro. (HAUSER, 2013, p. 244).

Por fim, nota-se que o sexo feminino, taxado pela sociedade como o sexo frágil se mostra a cada dia mais forte e guerreiro, tendo que lutar cotidianamente desde início de sua existência para dirimir as desigualdades entre os sexos e com seus esforços mostrar que são capazes de fazer tudo o que desejam tão bem quanto os homens, os quais são criados com uma ideia de superioridade natural.

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2 LEI MARIA DA PENHA E OS INSTRUMENTOS LEGAIS DE PROTEÇÃO A MULHER

Como se viu no primeiro capítulo a violência doméstica é um problema social complexo, o qual sempre foi tratado com certa naturalidade, uma vez que os agressores, pessoas com as quais as vítimas possuem, em regra, uma relação de afeto, aproveitando-se da proximidade usam da vulnerabilidade destas para agredi-las de variadas formas, colocando-se na posição de dominadores (agressor) e relegando a vítima a uma condição de total submissão.

Segundo Maria Amélia de Almeida Teles (2010, p. 382):

Quando empregamos o termo violência, referimo-nos a práticas de determinados grupos ou segmentos que forçam outros à submissão como fim de explorar, oprimir, dominar e controlar a ponto de impedir o exercício da manifestação da vontade e da autonomia por parte dos que estão sendo dominados.

Também, Maria Berenice Dias (2007, p. 6):

A banalização da violência doméstica levou a invisibilidade do crime de maior incidência no país e o único que tem perverso efeito multiplicador. Suas sequelas não se restringem a pessoa da ofendida. Comprometem todos os membros da entidade familiar, principalmente crianças, que terão a tendência de se transformar em agentes multiplicadores do comportamento que vivenciam dentro de casa.

Com alarmantes índices de violências contra mulher, o Brasil foi responsabilizado no ano de 2001 pela CIDH/OEA (Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos) por omissão, negligência e tolerância aos casos de violência doméstica, uma vez que em 1998 recebeu denúncia relativa ao caso de Maria da Penha Maia Fernandes, por intermédio do CEJIL-Brasil (Centro para a Justiça e o Direito Internacional) e do CLADEM-Brasil (Comitê Latino-Americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher), um caso de impunidade que estava ocorrendo em Fortaleza/CE, no qual Marco Antonio Heredia Viveiros, após ter sido condenado duas vezes pelo Tribunal do Júri do Ceará por tentar, em duas oportunidades, assassinar Maria da Penha Maia Fernandes,

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sua esposa, permanecia em liberdade. Posteriormente a essa condenação pela OEA, foi criada a Lei 11.340/2006, também chamada de Lei Maria da Penha, em “homenagem” a vítima de violência doméstica, a qual ficou paraplégica em razão de uma das agressões a que foi submetida.

Denunciou-se a violação dos artigos 1(1) (Obrigação de respeitar os direitos); 8 (Garantias judiciais); 24 (Igualdade perante a lei) e 25 (Proteção judicial) da Convenção Americana, dos artigos II e XVIII da Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem (doravante denominada “a Declaração”), bem como dos artigos 3, 4,a,b,c,d,e,f,g, 5 e 7 da Convenção de Belém do Pará. (O CASO..., d [?], p. [?]).

A Lei 11.340/2006 objetiva a criação de mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar, sendo que é considerada pelo Fundo de Desenvolvimento das Nações Unidas uma das três mais avançadas no mundo. “[...] o próprio Fundo de Desenvolvimento das Nações Unidas para a mulher reconheceu como uma das três mais avançadas do mundo (ao lado da lei que vige na Espanha e da que vige na Mongólia), dentre 90 legislações sobre o tema.” (BIANCHINI, 2013, p. 22).

Utilizando-se como estratégias de combate a violência doméstica o tripé prevenção, atendimento e responsabilização, a Lei Maria da Penha traz em seu texto, formas de aplicação de políticas públicas visando a prevenir a ocorrência de casos de violência de gênero, devendo ser ressaltado o conceito de gênero no presente caso, o qual não se aplica somente às mulheres, mas também a todos os que ocupam, na relação afetiva o papel feminino, sendo em razão disso, discriminados e vitimados.

2.2 Conceito e formas de violência

A expressão violência doméstica pode induzir ao erro, levando muitos a acreditar que tais práticas delituosas somente ocorrem na residência das vítimas. Porém caracterizam-se como violência domésticas as agressões praticadas pelo agente no local onde residem as partes, na via pública, na escola, no local de trabalho, bastando somente que agressor e vítima mantenham ou já mantiveram alguma relação de afeto e que a violência esteja baseada em questões de discriminação de gênero.

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Outrossim, se faz necessário ressaltar que figuram como vítimas de violência doméstica mulheres e meninas que estão inseridas nas relações familiares como ex-esposa, esposas, filhas, enteadas, irmãs, netas, noras, ex-companheiras, companheiras, ex-namoradas, namoradas, independente de opção sexual, ou seja, também podem figurar como ofendidas as lésbicas, transgêneros, travestis, transexuais, demonstrando uma clara preocupação da Lei Maria da Penha em proteger o gênero de acordo com a realidade atual na formação da família. Fica perceptível que além de tentar alertar para os casos de violência doméstica, retirando-os da banalidade, o sistema judiciário também “tirou a venda dos olhos” e adotou uma postura visando atender a todos os cidadãos e sua opção sexual e não somente a um modelo conservador de constituição de família.

Nesse sentido, é o que dispõe a Lei 11.340, de 07 de agosto de 2006, em seu art. 5º (BRASIL, 2015):

Art. 5o Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial:

I - no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas;

II - no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa;

III - em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação.

Parágrafo único. As relações pessoais enunciadas neste artigo independem de orientação sexual.

Cabe ressaltar que se entende por âmbito da unidade doméstica o espaço familiar de convívio permanente de pessoas com ou sem vínculo sanguíneo, inclusive as esporadicamente agregadas, como, por exemplo, a tia, a prima, enteadas, sobrinhas e irmãs unilaterais que embora não coabitem a residência a essa unidade doméstica se agregam em razão de algum vínculo afetivo. Excluem-se, entretanto, as temporariamente agregadas, isto é, a amiga que foi fazer uma visita ou a entrega domiciliar de algum produto (BIANCHINI, 2013).

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Por âmbito familiar se entende a comunidade formada por indivíduos que se unem em razão de laços familiares, por afinidade ou vontade expressa, incluindo-se nesse grupo os parentes consanguíneos e os que se uniram não por imposição da lei e sim por sua vontade declarada, como, por exemplo, pelo casamento ou união estável.

A Lei ainda menciona a expressão relação íntima de afeto e assim o fez para justificar que a proteção estabelecida se estende às relações independentes de coabitação, ou seja, estão amparadas pela Lei Maria da Penha não somente as mulheres casadas ou em união estável e sim também aquelas que mantenham relacionamentos afetivos do tipo namoro ou, ainda, que já tenham rompido o relacionamento, mas que ainda possuam algum vínculo.

As práticas reconhecidas como violência de gênero estão elencadas na Lei Maria da Penha como sendo violência física, psicológica, sexual, moral, patrimonial. Segundo Maria Berenice Dias (2012, p. 59) “A violência para ser considerada doméstica, não exige a diferença de sexo entre os envolvidos. O sujeito ativo- ou seja, o agressor-tanto pode ser um homem como uma mulher”.

É imprescindível mencionar que a Lei Maria da Penha classifica os delitos em Violência Física, a qual compreende as práticas delituosas de lesão corporal, vias de fato, homicídio consumado e na sua forma tentada e aborto; Violência Psicológica, incorporando crimes de ameaça, injúria, calúnia, difamação e perturbação da tranquilidade; Violência Sexual, a qual abrange o estupro consumado e na forma tentada e por última Violência Patrimonial, agregando as práticas de dano, violação de domicílio, incêndio.

No que tange a Violência Física, especificamente o crime de homicídio praticado na forma de violência doméstica, o Brasil teve um grande avanço no dia 09/03/2015 ao promulgar, através de sua Presidenta da República, Dilma Rousseff, a Lei do Feminicídio, palavra utilizada para se referir ao assassinato de mulheres no âmbito da violência doméstica ou discriminação em razão do gênero, classificando esse tipo de crime como hediondo e o colocando no rol taxativo das qualificações no artigo 121 do nosso Código Penal Brasileiro.

O feminicídio é a instância última de controle da mulher pelo homem: o controle da vida e da morte. Ele se expressa como afirmação irrestrita de posse, igualando a mulher a um objeto, quando cometido por parceiro ou ex-parceiro; como subjugação da intimidade e da sexualidade da mulher, por meio da violência sexual associada ao assassinato; como destruição da

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identidade da mulher, pela mutilação ou desfiguração de seu corpo; como aviltamento da dignidade da mulher, submetendo-a a tortura ou a tratamento cruel ou degradante. (BANDEIRA, 2015).

Ainda, de acordo com Waiselfisz, no Mapa da Violência (2012, p. 21), de todas formas de violência de gênero descritas na letra da Lei 11.340/06, a violência física foi a mais preponderante no ano de 2011, sofrida pelas vítimas atendidas pelo SUS, englobando 44,2% dos casos. A violência psicológica ou moral representa mais de 20%. Já a violência sexual é responsável por 12,2% dos atendimentos. A violência física adquire destaque a partir dos 15 anos de idade da mulher. Já a violência sexual é a mais significativa na faixa de 1 aos 14 anos, período que apresenta significativa concentração.

2.3 A política de enfrentamento da violência contra a mulher na lei

O Estado conta com as políticas de enfrentamento à violência contra a mulher como grande aliado na caminhada para atingir o objetivo de auxiliar as vítimas de violência, oferecendo estrutura, através de um conjunto de atendimento psicológico, Polícia Civil, Ministério Público e Poder Judiciário, os quais solicitam/deferem as medidas protetivas de urgência para que estas possam vencer as barreiras do ciclo de violência que por muito tempo viveram e terem condições de seguir suas vidas normalmente, sem que seu passado as impeçam de viver um futuro sem respingos de violência e dor, causados por quem elas mais amam.

2.3.1 Políticas de Prevenção

Tendo em vista a cultura patriarcal, em que a mulher é considerada objeto e não um indivíduo que exprime suas vontades e desejos, é que Lei Maria da Penha traz em seus dispositivos a necessidade de implementação de políticas preventivas, objetivando romper com a cultura que lhe dá sustentação. Ao lado das políticas públicas de atendimento de vítimas e de responsabilização de agressores, a política preventiva visa instaurar uma nova linha de pensamento na qual a mulher está em grau de igualdade e disseminar essa ideia através das novas gerações, para somente assim ser possível coibir e quem sabe erradicar tais práticas violentas tão repudiáveis.

(28)

Desde a entrada em vigor da Lei Maria da Penha os órgãos estatais (União, Estado e Munícipios) tem autonomia para atuar visando a prevenção e atendimento das partes através de políticas públicas, a partir das quais deve ser trabalhado com os agressores para mudar suas ações e às vítimas para denunciarem seus agressores ou mesmo para receberam atendimento psicológico após a ocorrência, cessando o ciclo de violência que perdura por muitos anos em situação de silencio e sofrimento, por vergonha e medo de represálias da sociedade.

Acerca das políticas públicas e assistenciais, Alice Bianchini (2013, p.79) narra que:

Além do (a) sistema de prevenção, a Lei Maria da Penha também conta como (b) sistema jurídico de repressão à violência e (c) sistema jurídico de repressão a violência doméstica e familiar. O primeiro insere-se na nas estratégias extrapenais, enquanto os outros dois, nas estratégias criminais[...].

No Brasil já foram estruturadas várias estratégias de políticas públicas para combater a violência de gênero, sendo que no Rio Grande do Sul existe a Rede Lilás, a qual funciona utilizando-se de recursos do governo estadual e através de ações como atendimento psicológicos, consultoria jurídica, centros de referência e abrigos a fim de empoderar as vítimas de violência doméstica, transmitindo assim segurança para prosseguir com a denúncia e cessar com o ciclo de violência que sofrem. “Trabalhando em Rede, a SPM Gaúcha está fortalecendo os espaços municipais específicos de aplicação de políticas públicas para as mulheres (Coordenadorias, Centros de Referência, Casas-abrigo etc.). (SECRETARIA..., s.d., p. [?]).

O município de Panambi/RS, cidade com 38058 habitantes (censo de 2010) conta com o CREAS (Centro de Referência especializado de Assistência Social), o qual é o responsável pelo combate contra a violência doméstica, prestando atendimento necessário as vítimas, tais como atendimento psicológico, que poderá ser individual ou em grupos.

Além do mais, a Rede Lilás para auxiliar na prevenção e atendimento as mulheres vítimas de violência doméstica disponibilizou um veículo para que o CREAS (Centro de Referência Especializado de Assistência Social)pudesse utilizar para atender situações de violência, bem como também através de convênio firmado no ano de 2012 entre a Secretaria

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de Políticas para as Mulheres do RS (SPM/RS) e o município de Panambi/RS, foi disponibilizado verba no valor de mais de 146 mil reais para a criação do Centro de Referência da Mulher, o qual atenderá as vítimas de violência doméstica do município e região (SECRETARIA, 2012).

Ademais, o município de Panambi/RS, através do CREAS em uma parceria com o sistema Judiciário da Comarca de Panambi/RS realiza palestras às mulheres como forma de conscientização das mesmas antes de cada audiência, sendo que a Brigada Militar pressentindo que os efeitos da palestra seriam mais positivos se buscassem sensibilizar os agressores quanto aos seus atos e que estes são repudiáveis também iniciou um ciclo de palestras que ocorrem no mesmo instante que a das vítimas, ministrada por um policial militar devidamente treinado, tendo como público alvo os agressores com o intuito de faze-los compreender que a sociedade atual não cultiva atos violentos contra as mulheres, bem como estas não são propriedade destes.

Igualmente, sobre políticas públicas é importante mencionar o artigo 8º da Lei Maria da Penha e seus incisos V e IX, os quais confirmam a importância da educação, da inserção do tema direitos humanos, compreendendo também a violência doméstica para serem tratado nos currículos escolares e campanhas que deverão ser realizadas nesses locais, com intuito de promover a mudança cultural nas novas gerações e consequentemente ao implantar novos conceitos acerca da igualdade de gêneros. Tais políticas são essenciais para a redução das estatísticas de violência e discriminação em todas as formas, afastando a cultura patriarcal que sustenta esta forma de violência.

Para Dias (2012, p. 41):

Entre as diretrizes das políticas públicas a serem adotadas no âmbito federal, estadual e municipal e nas ações não-governamentais destaque especial e dado aos direitos humanos femininos na esfera educacional E determinada (art., 8 °, V): a promoção e a realização de campanhas educativas de

prevenção da violência doméstica e familiar contra a mulher, voltadas ao público escolar e a sociedade em geral, e a difusão desta Lei e dos instrumentos de proteção aos direitos humanos das mulheres. A

preocupação e de tal ordem que e obrigatória a inclusão do tema nos currículos escolares (art 8 °, IX): destaque, nos currículos escolares de todos

os níveis de ensino, para os conteúdos relativos aos direitos humanos, a equidade de gênero e de raça ou etnia e ao problema da violência doméstica e familiar contra a mulher.

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Quando das práticas de violência doméstica fica evidenciado um indivíduo querendo sobrepor suas vontades sobre a do outro indivíduo, geralmente as mulheres e para isto explora das fraquezas e temores que sabe que a vítima tem e que descobriu através do convívio. Imersos na cultura patriarcal, agressores e agredidas, muitas vezes naturalizam as ações violentas, o que produz um ciclo vicioso, fazendo com que a violência se perpetue como estratégia de resolução dos conflitos familiares.

2.3.2 Políticas de Atendimento

A Lei Maria da Penha é composta por 46 artigos, sendo que são poucos que possuem caráter criminal. A maioria dos dispositivos referem-se as políticas de prevenção e ao atendimento que deve ser prestado as vítimas, estabelecendo regras relativas a ocorrência policial, as medidas protetivas à vítima e as medidas que obrigam o agressor.

A ocorrência deve ser feita em Delegacias Especializadas da Mulher, as quais devem ter em seu quadro de funcionários, preferencialmente policiais do sexo feminino. Esta exigência, nem sempre cumprida, serve para assegurar um atendimento mais humanizado às vítimas que estão sempre muito fragilizadas ao denunciar. Referindo-se a esta questão Bianchini (2013, p. 84) observa que

As Delegacias Especializadas compõem a estrutura da Polícia Civil. A seleção e a capacitação periódica de seus operadores representam diretrizes que muito podem contribuir para que não seja vivenciada pela mulher uma segunda vitimização, agora, pelos aparelhos do Estado.

Contudo, a realidade é bem diferente da que está estabelecida em Lei, uma vez que as adequações exigem investimento por parte do Estado e principalmente fiscalização. Neste aspecto vale mencionar que as Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher não existem em todos os Municípios ou Comarcas, sendo que Panambi/RS, contando com a população de 38058 habitantes (censo de 2010) também não conta com os serviços de uma Delegacia Especializada. “Não obstante o serviço DEAMs, dados do IBGE (2009), revelam que, das 5.565 cidades brasileiras, apenas 395 têm delegacias especializadas para o atendimento eventualmente buscado (pelas mulheres)”. (BIANCHINI, 2013, p. 84).

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No caso da cidade de Panambi/RS, as vítimas têm seu primeiro atendimento no Plantão da Delegacia de Polícia, não sendo o policial em regra do gênero feminino. Contudo, as vítimas são tratadas com o máximo de discrição, pois são levadas para sala do Plantão para efetuar a denúncia com tranquilidade, porém ao contrário do que refere o artigo 28 da Lei 11.340/2006, em relação ao acompanhamento de advogado ou Defensor Público, a fim de que seja prestado atendimento específico e humanizado as ofendidas. Da mesma maneira, não há o referido acompanhamento até o DML (Departamento Médico Legal), localizado na cidade de Ijuí/RS, local onde a vítima procederá o exame de corpo de delito em alguns casos, uma vez que o efetivo da Delegacia está defasado, o que ocasiona que a maioria das vítimas não realize os exames, perdendo o interesse pelo prosseguimento da ação penal. Entretanto há um grande avanço o fato de haver na Delegacia de Panambi um cartório dedicado aos casos de violência doméstica, no qual uma policial civil do gênero feminino é responsável e faz toda a instrução do Inquérito Policial.

Destaca Bianchini (2013, p.191) com relação à fase inquisitorial pela autoridade policial em casos de violência de gênero:

O art. 10, da Lei Maria da Penha, determina que diante da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher ou na iminência da ocorrência deve a autoridade policial, imediatamente, adotar as providências cabíveis previstas na Lei. Elas encontram-se elencadas nos arts. 11 (medidas protetivas e assistenciais) e 12 (procedimentos a serem adotados após o registro de ocorrência). Todas as ações a serem realizadas pela autoridade policial estendem-se para as hipóteses de descumprimento de medida protetiva de urgência deferida (art. 10, parágrafo único).

As vítimas chegam até a Delegacia de Polícia trazidas pelos policiais militares, os quais as acompanham durante o registro, sendo que em algumas oportunidades as conduzem de volta para suas residências.

Além do atendimento especializado, a Lei 11.340/2006 traz em seus artigos as chamadas Medidas Protetivas de Urgência, que se classificam em Medidas que Protegem a Vítima e Medidas que obrigam o Agressor e têm o objetivo de assegurar a integridade das vítimas. Geralmente são solicitadas pelas vítimas durante o registro de ocorrência policial e dirigidas à Autoridade Judiciária, que terá o prazo de 48h para decidir ou não pelo deferimento.

(32)

As Medidas que protegem a vítima estão previstas no art. 23 da Lei Maria da Penha e englobam ações que visam preservar sua integridade física e psicológica, incluindo-a, juntamente com seus dependentes quando existirem, em programas de proteção ou de atendimento, garantindo-lhe ainda a separação de corpos e a recondução a seu domicílio após o afastamento do agressor, sem prejuízo dos bens, guarda dos filhos e alimentos.

As Medidas que obrigam o agressor estão previstas no art. 22 da referida Lei e dizem respeito a ações determinadas pela Autoridade Judiciária e que devem ser cumpridas pelo mesmo. Essas medidas incluem: suspensão da posse ou restrição do porte de armas; afastamento do lar ou domicílio ou local de convivência com a ofendida; proibição de determinadas condutas, dentre elas aproximar-se da ofendidas, familiares e testemunhas mediante fixação de limite mínimo de distância; contato com a ofendida, familiares ou testemunhas por qualquer meio de comunicação; proibição de frequentar determinados locais; suspensão ou restrição de visitas aos dependentes menores; prestação de alimentos provisionais ou provisórios.

Tais medidas podem ser aplicadas de forma isolada ou cumulativamente e são as medidas protetivas de urgência mais utilizadas na prática, solicitadas pela vítima no momento do registro do boletim de ocorrência policial.

Após relatar os fatos ao policial a vítima é cientificada dos direitos que lhe confere a lei, bem como da possibilidade de requerer as medidas protetivas de urgência. O pedido então é formalizado e após encaminhado pelo policial civil responsável ao Plantão do Fórum, que encaminhará o pedido ao juiz responsável pela vara da Violência Doméstica, sendo que no caso do município de Panambi/RS esta Vara não atende exclusivamente a esses casos de violência doméstica, funcionando cumulativamente com a 2ª Vara Judicial. O Magistrado possui o prazo de até 48h para analisar o pedido e deferir ou não. Neste diapasão, afirma Dias (2012, p. 145), sobre Medidas Protetivas de Urgência (MPU):

Para agir o juiz necessita ser provocado. A adoção de providências está condicionada à vontade da vítima. Ainda que a mulher proceda no registro da ocorrência, é dela a iniciativa de pedir proteção por meio de medidas protetivas.

(33)

Do mesmo modo, ressalva Bianchini (2013, p. 165) ao enumerar as características das MPUs:

[...]

caráter primordial de urgência, sendo que o juiz deverá decidir sobre o pedido de medidas protetivas no prazo de 48horas- art. 18;

podem ser requeridas pela ofendida, pelo delegado ou pelo Ministério Público- art. 19;

podem ser decretadas de ofício pelo juiz (art. 20);

não há necessidade de audiência das partes, nem de manifestação prévia do Ministério Público, para a concessão da medida – art. 19, § 1º;

podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente- art. 19, § 2º; a substituição de uma medida protetiva por outra (mais ou menos drástica) pode se dar a qualquer tempo, desde que garantida a sua eficácia-

art. 19, § 2º;

dividem-se em duas espécies: (a) as que obrigas o agressor- art. 22 e (b) aquelas dirigidas à proteção da vítima e seus dependentes- arts. 23 e 24.

Dessa maneira, fica manifesto não só a importância, mas também os benefícios e formas de proteção trazidos pela Lei Maria da Penha às vítimas de violência de gênero, devendo ser destacado que a referida base legal, coloca a figura da ofendida em um lugar de destaque, cuidando para que tudo ocorra de modo de que não a fragilize ainda mais, mas que proporcione condições para que essa se fortaleça, através de medidas proporcionadas pelo Estado e após cessar a violência sofrida, possa seguir em frente, cortando o vínculo antes existente com seu agressor, resultando efeitos positivos para si e para as pessoas que presenciaram as práticas delituosas, tendo de alguma forma sofrido e sido afetado junto com a vítima.

2.3.3 Responsabilização do agressor

Com uma forte influência do patriarcalismo que assombra a cultura de nossa sociedade até os dias atuais, a violência de gênero se tornou algo cotidiano, banal e espantosamente até a condenação do Brasil pela Corte Interamericana de Direitos Internacionais estava sendo tratado com desdém pela Justiça, uma vez que tais casos eram, como regra, considerados infrações de menor potencial ofensivo, ou seja, de competência do Juizado Especial Criminal. Aos Juizados Criminais compete o julgamento de infrações de menor potencial ofensivo sendo que neles, como regra, são impostas penas irrisórias de prestação pecuniária ou como se diz popularmente, “ao pagamento de cestas básicas”. Com a entrada da Lei Maria da Penha em vigor, foram vedados aos casos de violência doméstica a aplicação dos institutos previstos

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