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A ELETRIFICAÇÃO RURAL E PRÁTICAS DE GESTÃO

No documento Dissertação Paulo Seifer 2012 (páginas 61-85)

Um projeto de eletrificação dentro de um ambiente comum à empresa concessionária de serviços de energia elétrica tem por padrão levar em consideração apenas aspectos técnicos e econômicos para sua realização. Por exemplo, a extensão da rede para a alimentação de um loteamento dentro de um bairro poderia levar em consideração apenas os custos envolvidos na colocação de equipamentos como postes, cabos, transformadores, e dimensioná-los dentro de uma expectativa de demanda determinada de forma estatística em função da demanda das regiões adjacentes à que será servida. Isto porque espera-se deste novo usuário um comportamento próximo daqueles outros que vivem de maneira similar à este.

Como já explicitado no capítulo 1 desta dissertação esta forma de visão não pode ser adotada de forma direta no caso da eletrificação rural de comunidades isoladas. As dificuldades decorrentes em realizar a extensão de rede, seja por motivos econômicos ou geográficos, a cultura particular da comunidade a ser servida, o acesso a recursos que façam uso da eletricidade, as dificuldades em manter e gerir o sistema, são alguns aspectos que tornam a eletrificação de comunidades isoladas diferente da eletrificação convencional realizada pelas empresas concessionárias. Para tais comunidades a forma de eletrificação que se busca é a descentralizada, que implica no fato de que a eletricidade será gerada de forma específica para este atendimento, tipicamente dentro da comunidade, ou ao menos próximo a esta (espacialmente).

Para compreender melhor a eletrificação rural descentralizada, e as formas como ela ocorre, serão destacados a seguir alguns aspectos relevantes e que em diversos casos podem ser considerados independentes em projetos de eletrificação rural. São eles: (1) a motivação da eletrificação e quem a realiza, (2) a questão da propriedade da infraestrutura de geração, (3) a estrutura de manutenção para a infraestrutura, (4) o uso da estrutura de cooperativas e associações de moradores, (5) estruturas de mercado e por fim (6) a problemática da infraestrutura mantida pela concessionária.

3.2.1 A motivação para a eletrificação rural e quem a realiza

Apesar do recente interesse acadêmico na eletrificação rural, ela ocorre desde os primórdios da eletrificação. Assim, por exemplo, o uso de geradores eólicos para alimentação de baterias é reportado em Re-focus (2002) como ocorrendo a pelo menos 100 anos. Ainda, a prática da eletrificação rural se mostra muito frequente, em especial quando se observa a formação de cooperativas de eletrificação, prática comum nos Estados Unidos (YADOO e CRUICKSHANK, 2010) e no Brasil. Definir uma motivação para esse período histórico talvez não seja o mais apropriado, ou ainda, meramente especulativo, tendo em vista a falta de estudos sobre este tema para este período, por isso esse período não será abordado aqui.

Com relação ao processo de eletrificação a partir da década de 1970, mais documentado, dois elementos podem ser destacados como motivadores para a prática da eletrificação rural descentralizada: a promoção do desenvolvimento e o atendimento a leis nacionais de universalização.

Como já citado, a associação entre a eletrificação e alguma visão de desenvolvimento data desde o período da Doutrina Truman, nos Estados Unidos, e dos movimentos de industrialização das nações socialistas pela antiga URSS (MORANTE, 2004). Com o objetivo declarado de auxiliar nações ditas subdesenvolvidas, gradativamente surgiram instituições de ajuda internacional, como USAID (EUA), Cooperação Espanhola (Espanha); grupos privados, como o GTZ (Alemanha), ou ITDG (Reino Unido – atualmente denominado Practical Action), além de grupos específicos do Banco Mundial, ou organizações religiosas, entre outros que, por meio de alguma forma de intervenção, buscavam promover aquilo que compreendiam como desenvolvimento na região por eles assistidas. A eletrificação rural fazia parte dos instrumentos utilizados com vista ao desenvolvimento, sendo as organizações citadas acima ávidas em seu uso.

Com as reformas nos setores elétricos de diversos países, aqui incluído o Brasil, (HAANYIAKA, 2006), a busca pela universalização ao acesso à eletricidade como forma de desenvolvimento acabou perdendo sua força, pois a figura da empresa pública foi substituída por concessionárias regidas pelas leis de mercado. A motivação para a eletrificação agora passou a ser a abertura de um novo mercado consumidor.

Ainda assim, a ideia de que a eletricidade pode ser um vetor para o desenvolvimento não perdeu sua força19. No entanto, surge a necessidade de um mecanismo que trouxesse para a

empresa concessionária a responsabilidade que antes foi pública. No caso brasileiro esse mecanismo foi a criação da Lei 10.438, de 26 de abril de 2.002, a Lei de Universalização de Acesso à Eletricidade, que define que todos têm direito ao acesso à eletricidade, cabendo ao Estado a concretização deste direito. Como forma de estímulo ao cumprimento da lei, foi criado o programa “Luz para Todos”, em novembro de 2003, com o objetivo de diminuir o ônus financeiro das concessionárias na eletrificação de locais poucos atrativos financeiramente e de fomentar o uso de tecnologias alternativas para geração. Este programa sucedeu outros de mesmo fim, como o PRODEEM e o programa “Luz no Campo”, desenvolvidos em um governo anterior com o mesmo objetivo, mas por meios diferentes para a obtenção da universalização.

Esse movimento de transferência de responsabilidade, ainda que estimulada por incentivos financeiros, acabou resultando também em uma mudança de motivação por parte do interventor. Este, que antes era a instituição que tinha como motivação a busca pelo desenvolvimento do local em que a intervenção ocorre, agora passa a ser a concessionária, cujo objetivo direto é o cumprimento de metas estabelecidas pela agência reguladora (no Brasil, a ANEEL).

Um exemplo de como a mudança de visão ocorre é o caso ECOWATT (ver Box 3.1). Nele, a empresa CESP deixa claro que compreende sua colaboração ao desenvolvimento socioeconômico da região como sendo a taxa de retorno de 10% sobre o valor investido. Neste caso, a questão do desenvolvimento é abordada não sob a ótica do usuário, mas sim do interventor, assumindo-se que o “sacrifício” do lucro do interventor é suficiente para que os usuários atendidos tenham condições de buscar o desenvolvimento.

Box 3.1 O programa Ecowatt

19 Houveram mudanças em termos de conceitos. A visão de desenvolvimento se diversificou, deixando de ser

apenas desenvolvimento econômico, passando a socioeconômico e finalmente, deixando-se de compreender a eletricidade como elemento suficiente para tal, somando-se a esse a providência de elementos relacionados ao acesso (como construção de estradas), saúde, produtividade etc.

O programa ECOWATT foi desenvolvido nos municípios de Iguape, Iporanga e Cananéia, na região do Vale do Ribeira, tendo como objetivo atender consumidores de baixa renda, baixa demanda e que ocupavam área de proteção ambiental (ZILLES et al.1997 apud SERPA 2001).

Desenvolvido no ano de 1997, o programa realizou a instalação de 120 sistemas fotovoltaicos domiciliares. A escolha do sistema fotovoltaico veio em função de poucos estudos sobre as possibilidades de sistemas eólicos e híbridos (SERPA 2001), e teve como base para dimensionamento o uso de duas lâmpadas 9 W (4h/dia), 1 TV branco e preto (3h/dia) e um rádio (3h/dia). A CESP optou pelo processo de licitação pública para a compra dos equipamentos, que foi vencida pela empresa SIEMENS SA (SANTOS 2002).

A CESP optou pelo planejamento com base em um retorno de 10% do valor investido, utilizando a forma de

leasing para o estabelecimento de uma relação comercial com as famílias selecionadas para o atendimento. O

valor de 10% como taxa de retorno, ao invés de uma taxa maior, foi entendido como contribuição social da concessionária para o desenvolvimento sócio-econômico da região (CESP 1997 apud SANTOS 2002). Para o processo de instalação a SIEMENS SA optou pela terceirização do serviço, com o objetivo de diminuir seus custos (SANTOS 2002).

Serpa observa que o treinamento foi feito de forma rápida. Foi oferecido um manual de instruções ao usuário atendido, e o suporte foi oferecido por meio de linha telefônica 0800 (SERPA 1998 apud SANTOS 2002).

Santos (2002) observa que o sistema de geração oferecido pela empresa SIEMENS SA foi sobredimensionado, e o de armazenamento subdimensionado, implicando na sua subutilização (em função do equipamento elétrico escolhido para uso) e, consequentemente, na impossibilidade de uso de toda energia elétrica disponível, além do custo passado ao usuário não ser compatível com seu real uso. Também observa problemas relacionados à qualidade dos equipamentos, que apresentaram problemas sistemáticos durante a duração do projeto.

O nível de conhecimento dos usuários do sistema, segundo Serpa (2001) estava entre médio e baixo, sendo alto apenas o do usuário que hospedou o técnico contratado para instalação pela empresa SIEMENS SA, que teve a oportunidade de absorver mais conhecimento em função do seu contato.

As consequências da forma de desenvolvimento da CESP no projeto ECOWATT foram que em novembro de 1998 o nível de inadimplência chegava a 70% (SANTOS 2002) e Serpa (2001) registrou a falência total do projeto no ano de 2001. Vale observar que durante o projeto a CESP foi privatizada, passando a ser ELEKTRO, que pouco interesse demonstrou em reverter o quadro apresentado.

Barnes (2007), em seu estudo sobre os desafios da eletrificação rural, aponta que uma das premissas para que o projeto de eletrificação rural tenha sucesso é justamente a motivação do interventor. Para que o projeto possa ser efetivo, a busca pelo desenvolvimento deve ser esse motivador. De fato, o comprometimento do interventor com a infraestrutura e o objetivo desta

pode significar um incentivo para que os custos de transação relacionados ao processo de eletrificação sejam superados.

Evidentemente, o fato de o interventor ter o compromisso com o desenvolvimento não implica, necessariamente, no sucesso da empreitada. As variáveis que são consideradas neste, a forma como é conduzido, e as próprias características do interventor são elementos que contribuem para o sucesso ou fracasso da eletrificação rural descentralizada.

Um problema recorrente nos projetos de eletrificação rural descentralizada é o fato de este ser guiado apenas por aspectos técnicos relacionados à forma de geração e distribuição da energia, ignorando as particularidades da comunidade atendida.

Nesse sentido, Serpa (2001) e Goméz e Montero (2010) argumentam que a presença do cientista social é um elemento fundamental para que o processo de eletrificação tenha maior chance de êxito. Isso ocorre porque o cientista social pode auxiliar a compreender os valores da comunidade, sua relação com o território, suas reais necessidades e de que forma a nova forma de energia pode ser melhor apropriada pela comunidade. Nesse sentido, o cientista social tem o conhecimento necessário para tal, diminuindo assim os custos para a obtenção de informação e, ainda, diminuindo a assimetria entre a qualidade da informação do interventor e da comunidade. Além disso, as informações obtidas e a diminuição da assimetria de informação diminuem os custos de transação associados ao projeto, aumentando suas chances de êxito. Van Els (2008) argumenta que este pode ter sido um dos elementos que motivou o sucesso para recentes projetos de eletrificação descentralizada na região amazônica, e este pode ser observado também em outros processos de transição energética, como observa Murphy (2001), quando apresenta casos de sucesso relacionados à participação do cientista social.

Por fim, as próprias características do interventor, enquanto organização, podem influir nos resultados do processo de eletrificação. Segundo Moraes et al. (2012), a probabilidade de um projeto de eletrificação rural atingir a sustentabilidade varia em função da instituição que o mantém após o início de suas operações. Sua análise tem como base as instalações realizadas com painéis fotovoltaicos e é aplicada também para sistemas fotovoltaicos de bombeamento de água (objeto de análise do artigo citado). Os autores desenvolveram a seguinte tabela para análise:

Tabela 3.1 – Instituições e a possibilidade de sucesso de seus projetos de eletrficação

Tipo de instituições

Características Possibilidade do

projeto ter sucesso a longo prazo

Especializadas - Atuam na região de maneira assídua e constante.

- Sua especialização permite que contem com pessoas e logística necessária para trabalhos focados no uso da tecnologia fotovoltaica. - Como exemplo pode-se mencionar empresas especializadas, concessionárias de energia elétrica com área para o uso da tecnologia fotovoltaica, instituições governamentais com área especializada.

Muito grande

Consolidadas - Atuam na região durante muito tempo.

- Contam com pessoas e logística necessária para trabalhos em campo.

- Como exemplo pode-se mencionar fundações, instituições de grande vínculo com a região, concessionárias de energia elétrica, instituições

consolidadas municipais, estaduais ou federais.

Grande

Temporais - Atuam na região de forma esporádica.

- Embora participem pessoas especializadas não contam com a logística necessária para trabalhos em campo durante vários anos. - Como exemplo pode-se mencionar ONG´s, laboratórios ou centros de pesquisa de Universidades ou instituições científicas, instituições governamentais com expectativa de curta duração.

Pouca

Ocasionais - Atuam na região ocasionalmente.

- Embora envolvam pessoas especializadas não contam com a logística necessária para trabalhos em campo durante vários anos. - Como exemplo pode-se mencionar ONG´s não consolidadas, empresas motivadas por marketing, iniciativas particulares, partidos políticos.

Pouquíssima

Fonte: Adaptado de Moraes et al. (2012)

Assim, instituições de atuação constante em uma determinada região e com a especialização necessária para o trabalho com a tecnologia empregada (Especializadas e Consolidadas) apresentam uma maior probabilidade de garantir a sustentabilidade do projeto, enquanto organizações Temporais e Ocasionais apresentam baixa probabilidade de conseguir essa meta. Para os autores é imperativo que instituições do tipo Temporais e Ocasionais transfiram a responsabilidade pelo sistema implementado para instituições Consolidadas ou Especializadas. Também é altamente recomendável que organizações Consolidadas criem uma área especializada dentro de sua estrutura para que possam manter tais sistemas.

Um exemplo que já se tornou clássico em termos de projetos de eletrificação rural descentralizada é o que é conduzido por laboratórios de instituições de Ensino, normalmente no modelo de projeto piloto. Tais projetos muitas vezes têm como foco apenas a tecnologia que será empregada, ignorando outros aspectos como a própria gestão do sistema e sua manutenção. É comum o interventor manter consigo a responsabilidade sobre estes. Fato é que estes se tornam onerosos para a instituição de ensino, que por não possuir uma estrutura específica para tal, e com presença constante no local de instalação da infraestrutura, acaba muitas vezes no abandono do sistema.

Tratando especificamente de sistemas híbridos, o Grupo de Estudos e Desenvolvimento de Alternativas Energéticas (GEDAE), da Universidade Federal do Pará, é pioneiro no Brasil. O grupo instalou, até o ano 2004, seis sistemas: um no Estado do Amazonas, na vila de Campinas, município de Manacapuru, em 1996, um no Estado de Rondônia, na vila de Araras, município de Mamoré, em 2001, e quatro no Estado do Pará, na vila de Praia Grande, município de Ponta de Pedras, em 1998, na vila de Joanes, município de Salvaterra, em 1997, na vila de Tamaruteua, em 1999 e na vila de São Tomé, município de Maracanã (BARBOSA

et al, 2005).

Os sistemas desenvolvidos pelo GEDAE têm o formato de minigrid para geração e transmissão. A forma de gestão dos sistemas é variada. Os sistemas das vilas de Joanes e Campinas são gerenciados pelas concessionárias locais (CELPA e CEAM, respectivamente), os das vilas de Praia Grande, Tamaruteua e São Tomé, gerenciados em conjunto pela comunidade e pela prefeitura local, enquanto que o da vila de Araras é gerenciado por um Produtor Independente de Energia (PIE – Guascor), sendo que nesse modelo, a energia gerada é fornecida de forma direta à rede (BARBOSA et al., 2005).

Os resultados, até 2004, eram de apenas três infraestruturas funcionando, as de São Tomé, Campinas e de Araras, enquanto as de Praia Grande e Tamaruteua vinham operando apenas com o sistema de backup diesel, e Joanes não funcionava. As causa apontadas para os problemas das infraestruturas são essencialmente a falta de manutenção, consequência de escassez financeira, falta de manutenção preventiva, falta de especialização para os técnicos e pouca participação das prefeituras locais (BARBOSA et al. 2005, BARBOSA et al. 2004).

3.2.2 A questão da propriedade da infraestrutura de geração

A posição de proprietário da infraestrutura é independente que qualquer outra. A propriedade do sistema de geração não necessariamente é do interventor, e o proprietário também não é, necessariamente, o responsável pela estrutura de manutenção. Isso tanto para o formato de minigrid, ou centro de carga de baterias ou mesmo domiciliar.

A forma mais trivial de propriedade é aquela em que o próprio interventor se mantém como proprietário, como no caso em que as concessionárias realizam a intervenção.

Outra forma é aquela em que o usuário é o proprietário, que é a mais usual em intervenções que utilizam sistemas domiciliares. Há ainda a forma em que é constituída uma microempresa que se torna proprietária e mantém o sistema. Menos usual é o caso em que a propriedade da infraestrutura é transferida a alguma organização, que apenas mantém sua posse (recebendo pela locação do sistema).

A questão da propriedade influencia, diretamente, os custos que serão passados ao usuário. O maior impacto para o usuário é observado onde este assume a propriedade do sistema. Neste caso, o usual é que este assuma, também, os custos de aquisição do sistema.

No caso da constituição de microempresas, é usual que estas aluguem os sistemas, diminuindo assim os custos para o usuário. Ainda assim, os custos de aquisição do sistema ficam com a microempresa. Este é o caso do Projeto Luz do Sol (ver Box 3.2). Nele o financiamento oferecido pelo Banco do Nordeste tornava acessível a aquisição dos sistemas por parte das microempresas, que por sua vez, tinham sua receita pelo uso do sistema pelos usuários.

Box 3.2 Projeto “Luz do Sol”

As informações a seguir foram extraídas de Santos (2002), trabalho que buscou avaliar modelos de gestão para sistemas fotovoltaicos para a eletrificação rural.

O “Projeto Luz” do Sol foi desenvolvido no Estado de Alagoas pela Fundação Teotônio Vilela, atual Instituto Eco-Engenho, em parceria com o Banco do Nordeste e, no início, com a empresa americana Golden Photon a partir do ano de 1996.

A infraestrutura original era a de Centro Fotovoltaico de Carga de Baterias (CFCB), e foi administrada por microempresas constituídas por pessoas da própria comunidade. Os sistemas foram adquiridos via financiamento com o Banco do Nordeste (responsável pelo financiamento de componentes brasileiros do sistema). Toda a tecnologia era da Golden Photon (também responsável pelo financiamento destes). A manutenção preventiva ficaria a cargo dos microempresários, enquanto a manutenção especializada ficaria por conta de técnicos de campo funcionários do interventor (sem ônus para as microempresas).

Esse formato original apresentou problemas, em especial relacionados à participação da empresa Golden Photon. O primeiro problema destacado diz respeito à qualidade do equipamento empregado, e do seu dimensionamento. A empresa tratou de todos os assuntos relacionados ao projeto nos Estados Unidos, o que dificultou o contato com a Fundação e comprometeu a adequação do sistema ao campo em que seria aplicado. Isso implicou em diversos problemas de ordem técnica, provocando a descrença no sistema por parte de muitos usuários. Além disso, houve a expectativa na empresa de retorno financeiro pela venda dos sistemas, o que de fato não ocorreu, em especial porque o número de sistemas vendidos não atingiu a meta necessária para que houvesse lucro.

Esses fatores levaram a Golden Photon a abandonar o projeto, que acabou tendo todos os aspectos financeiros assumidos pelo Banco do Nordeste, mediante o compromisso com a Fundação Teotônio Vilela de que os sistemas deixariam de ser CFCBs para ser SFDs. A estrutura de microempresariado foi mantida, mas agora este alugava os equipamentos domiciliares.

Os microempresários eram treinados pela Fundação Teotônio Vilela, que também era responsável por providenciar a documentação destes (como RG e CPF), quando estes não tinham, e responsável também pela abertura e legalização das microempresas. O Banco do Nordeste, por sua vez, oferecia linhas de financiamento para o pagamento dos sistemas em 12 anos. Originalmente essas linhas eram dedicadas para a compra de 30 sistemas (29 para aluguel e 1 para o microempresário). Ainda, o banco era responsável pela contratação de um contador para verificar a contabilidade das microempresas.

A estrutura de manutenção foi mantida. No entanto, a capacitação do microempresário e seu treinamento para a manutenção preventiva ficaria a cargo do técnico de campo. Santos observa que dada a quantidade de manutenção requerida, está já não se caracterizava mais como preventiva, mas sim como corretiva.

Um dos problemas observados por Santos diz respeito à capacidade dos microempresários de honrar a dívida assumida com o Banco do Nordeste. O problema residia na alta inadimplência dos usuários, justamente com o microempresário, que acarretava no baixo retorno para este e, consequentemente, na dificuldade em pagar o valor do financiamento.

Parte desse problema vinha das relações próximas entre os usuários e o microempresário, que não procuravam cobrar os usuários inadimplentes. De fato, o contato direto com estes usuários era, tipicamente, feito pelo técnico de campo, que buscava conscientizá-los da necessidade do pagamento em dia.

Durante a pesquisa de Santos, os sistemas ainda operavam. Entretanto é pouca a documentação a respeito deles após esse período, mas uma consulta ao site do Instituto Eco-Engenho mostra que este projeto vem sendo revitalizado, e que conta com 90 microempresários instituídos, com 2.700 sistema fotovoltaicos instalados,

No documento Dissertação Paulo Seifer 2012 (páginas 61-85)

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