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2. JAPÃO: ASPECTOS HISTÓRICOS E CULTURAIS

2.2 A Era Meiji

O novo governo estabelecido no país é formado pela união anteriormente descrita entre os samurais inferiores e os comerciantes, na qual aliou-se o conhecimento político da administração obtido pelos samurais que ocupavam cargos administrativos no shogunato e o conhecimento de técnicas produtivas e riqueza obtida pelos comerciantes. Os novos detentores do poder no Japão, traçaram a política revolucionária e executaram-na num

esforço para que o país pudesse ocupar um lugar no circuito econômico e geopolítico mundial.

Apesar de todas as transformações no cenário econômico, político e social empreendidos pelo novo governo, os novos estadistas não derrubaram a ordem hierárquica que prevalecia no feudalismo, ao contrário, simplificaram-na, passando a ser exercida apenas pelo Imperador com a abolição do shogunato.

A obrigação tradicional para com os superiores que compunha o código de conduta e honra dos japoneses13 foi mantida com relação ao Imperador que tornou-se a maior força de convergência do Estado em relação à população. Segundo Benedict (1972), para o povo japonês, o Estado representa o bem supremo do país, e desde que cumpra o seu papel, todas as suas prerrogativas são respeitadas, pois as regras éticas e de deferência proíbem que a população despreze sua autoridade.

As mudanças propostas pelo novo governo ocorreram principalmente nos campos econômico e social, que descreveremos suscintamente a seguir.

Dentre as medidas econômicas, o governo operou uma centralização da economia através da construção, financiamento e administração de indústrias (principalmente as indústrias pesadas) que, após atingirem um período de prosperidade foram vendidas para

13 As regras de respeito, de conduta e a confiança na hierarquia compõem a visão de homem e de mundo do

povo japonês, pois as obrigações tradicionais com os superiores precedem as exigências individuais.A hierarquia social é definida segundo a geração, sexo e idade ocupada, sendo que a aprendizagem e observação das regras de respeito e de hierarquia ocorrem na família. O devotamento filial constitui-se na mais elevada lei ética que conduz a posição e as atitudes assumidas por cada um na família. O chefe da família (pai) ou o irmão mais velho (primogênito) atuam como o mandatário de uma propriedade material e espiritual – legado familiar – e é necessário que todos os membros da família subordinem suas vontades para que se façam merecedores da honradez da casa, portanto, do seu legado.

“Os japoneses não aprendem em seus lares a dar valor à autoridade arbitrária, como também não é cultivado o hábito de submeter-se facilmente a ela. A submissão à vontade da família efetua-se em nome de um valor supremo para o qual todos se voltam, conquanto opressivas suas exigências. Ela se processa em nome de uma lealdade geral.” (BENEDICT, 1972, p. 53).

Portanto, o hábito de respeito à hierarquia é adquirido inicialmente na família, sendo posteriormente aplicado nos mais vastos campos da vida social, como nas relações com a vida econômica e produtiva e nas relações com o Estado.

grandes oligarquias financeiras, entre as quais destacam-se os conglomerados Mitsui e

Mitsubishi. Essas indústrias contaram com o benefício da tecnologia ocidental, através da

importação de técnicos estrangeiros e envio dos japoneses ao exterior para a importação tecnológica. Houve também investimentos na infra-estrutura de transportes e das comunicações.

No setor fundiário, os feudos foram abolidos e criaram-se as prefeituras, unindo e centralizando as decisões governamentais, seguidos da

revogação à proibição da venda de terras, seguido pela Regulamentação para a Reforma dos Impostos Territoriais (1873) que regulamenta a homogeneização dos impostos, agora em forma monetária. São esses impostos do setor agrário que vão alimentar os subsídios estatais à indústria que emerge. O que ocorre no campo, é uma tendência ã concentração de terras em função da alta taxa de impostos sobre a propriedade fundiária. O número de arrendatários e de trabalhadores assalariados cresce significativamente nos anos finais do século XIX. (SAKURAI, 2000, p. 38)

O governo organizou e criou também alguns ministérios, como o Ministério do Trabalho, do Interior e da Agricultura e do Comércio, com a preocupação de estabelecer regras nítidas de funcionamento interno do país.

As Forças Armadas foram organizadas de uma forma independente do governo civil de maneira que não interferisse nos assuntos militares, pois o comandante supremo das Forças Armadas era o imperador, de modo que os chefes militares tinham acesso direto a ele, com orçamento também independente.

Na área social, ocorreu a quebra do antigo sistema de castas e todos passaram a constituir-se em cidadão com os mesmos direitos e deveres, inclusive com o direito de usar sobrenomes, pois até então, era o nome do senhor de terras que identificava as pessoas. Os

samurais deixaram de constituir uma classe diferenciada, ao mesmo tempo em que foram

Em 1889 foi promulgada a Constituição do Império do Grande Japão, e no ano seguinte, o Edito da Educação. O conteúdo processado nesses documentos foi responsável pela normatização do papel desempenhado pelo imperador enquanto o centro do poder e pelos novos contornos sociais que se delinearam no país.

O imperador foi considerado uma divindade, um deus vivo ao qual todos deviam lealdade. Tornou-se o símbolo do povo japonês: o imperador e o povo japonês são inseparáveis. Isso explica o devotamento e a obediência do povo japonês às decisões imperiais.

A educação, por sua vez, passou a ser compulsória desde 1872 e o Edito sofreu influências do confucionismo14 e pregava a manutenção e a reprodução do “Nosso Império”. Afirmava a origem ancestral do povo japonês e ao lado da importância da educação revelava o poder moral como forças inseparáveis para a construção, a prosperidade e a manutenção do Império japonês. O Estado regulamentou a Educação por todo o país, por isso, as escolas tornaram-se homogêneas e independentes da autoridade local.

A organização estrutural da família também sofreu alterações, conforme será descrito posteriormente, com a promulgação de um novo Código Civil em 1896.

Porém, apesar de todo o avanço da indústria que ocorreu nesse período, o setor agrícola não acompanhou esse mesmo movimento de modernização, permanecendo com relações de produção semi-feudais.

14 O confucionismo foi introduzido no Japão através da Coréia em 404 d.C. Constitui-se numa doutrina de

princípios éticos e políticos que busca regular as relações entre os homens, baseada na crença da relação entre as forças da natureza e a sociedade. Apesar de ter sido alvo de diversas interpretações e modificações, seus primeiros compiladores o definem como um sistema de pensamento no qual “a terra e tudo nela são concebidos como parte das leis dos Céus. A conduta de harmonia com as leis dos Céus asseguram a justiça, a bondade, a felicidade, e o governo benevolente.” (SAKURAI, 2000, p. 40). Afirma o compromisso aos deveres como obrigação universal na relação entre homens e a sociedade.

Durante os anos de 1868 e 1940, o desenvolvimento econômico no Japão durante o novo regime passou por oscilações responsáveis por alguns desequilíbrios financeiros. (Hashimoto, 1995). A primeira oscilação pôde ser percebida do início da era Meiji até 1882, fase na qual o governo investiu maciçamente na infra-estrutura, na instalação de novas indústrias e na introdução de novas tecnologias.

Um novo período de oscilação ocorreu até 1902, no qual foram realizados investimentos em sistemas de transportes, geração de eletricidade e em indústrias siderúrgicas, de construção naval, de armamentos e de fiação de algodão. Nesse período ocorreram revoltas no campo resultantes da Reforma que não proporcionou grandes benefícios nessa área. Ao contrário, os excedentes da agricultura foram utilizados em outros setores de produção, gerando fome e miséria no setor rural.

Entre 1902 e 1920, ocorreu um momento de crise no comércio da seda devido à Primeira Guerra Mundial. Essa situação é agravada pela crise mundial em 1929, e o país passou por um período de muitas dificuldades, até 1932, quando a crise mundial começou a emergir.

Diante dessas situações de crises econômicas, o governo nipônico recorreu à emigração, afinal, nem mesmo as migrações internas puderam conter o empobrecimento da população. É nesse contexto que a emigração passou a ser autorizada pelo governo e os japoneses se vêem obrigados a sair temporariamente do país em busca de melhores condições econômicas e materiais, mas com o objetivo de retorno à sua pátria.

2.3 O On: obrigações e devoção nas relações interpessoais da cultura