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CAPÍTULO 3 – ESCOLHAS METODOLÓGICAS

3.6 Descrição do contexto de realização da pesquisa

3.6.1 A escola

A pesquisa foi realizada em uma escola privada, conveniada com o sistema público de ensino do Distrito Federal (DF), localizada em Brasília – DF. Segundo, Geovana, funcionária da Secretaria Escolar, e Elisabete, Coordenadora Pedagógica da escola em 2008, a Escola Educar funcionou em diferentes locais e com diversas formas de organização, embora sempre tenha ofertado escolarização para jovens e adultos. No início de seu funcionamento, em 1977, a escola não tinha convênio com a SEE-DF e apenas oferecia um curso preparatório para as provas realizadas por essa Secretaria, que fornecia a certificação de conclusão do nível de escolarização correspondente à prova realizada pelo aluno. A partir do segundo semestre de 2001, foi estabelecido o convênio com a SEE-DF e, no final de 2003, foi celebrado um acordo para que a avaliação pudesse ser realizada pela própria escola, embora a expedição dos certificados tenha continuado a cargo da SEE-DF. Desde então, os cursos oferecidos pela escola são presenciais, com avaliação no

processo, nos quais cada semestre equivale a um ano do ER, contemplando os AFEF e o EM completo. No segundo semestre de 2008, a escola funcionava em quatro turnos - manhã, tarde I, tarde II e noite. Mas a partir do primeiro semestre de 2009, cumprindo uma exigência legal, a escola passou a ofertar apenas três turnos - matutino, vespertino e noturno - com cinco aulas por dia em cada turno. Todos os turnos possuem apenas turmas de EJA.

Documentos fornecidos pela Secretaria Escolar mostram que o curso dos AFEF, ofertado pela escola, tem duração de 1600 horas-relógio, com as seguintes disciplinas: Língua Portuguesa, Matemática, Ciências, História, Geografia, Artes Plásticas, Educação Física, Língua estrangeira (Inglês) e Expressão Oral e Escrita. A grade curricular mostra que a distribuição de carga horária é diferente entre as diversas disciplinas. A disciplina com maior carga horária é Matemática (5 módulos semanais); seguida por Língua Portuguesa e Ciências (4 módulos semanais cada); História e Geografia (3 módulos semanais cada); Artes Plásticas e Inglês (2 módulos semanais cada); Educação Física e Expressão Oral e Escrita (1 módulo semanal cada).

O curso de EM oferecido na escola possui 1200 horas-relógio, com as seguintes disciplinas: Português, Artes Plásticas, Educação Física, Física, Química, Biologia, Matemática, História, Geografia, Língua Estrangeira (Inglês), Sociologia e Filosofia. A distribuição de carga horária entre as disciplinas também é diferente: Matemática e Português - 4 módulos semanais, cada; Física - 3 módulos semanais; Química, Biologia, Inglês, História e Geografia - 2 módulos semanais, cada; Artes Plásticas, Filosofia, Sociologia e Educação Física – 1 módulo semanal, cada.

Durante o período de realização da pesquisa - segundo semestre de 2008 e primeiro de 2009 - a escola manteve atendimento a cerca de 520 alunos. A distribuição de alunos matriculados nesses semestres, por turno, encontra-se na TABELA 1.

TABELA 1 - Distribuição de alunos por turno/semestre

Segundo semestre de 2008 Primeiro semestre de 2009

Matutino 227 207

Vespertino 142 164

Noturno 153 149

O número de turmas de cada etapa de escolarização varia de um semestre letivo para outro, e entre os turnos, em função da demanda de alunos. A demanda de vagas é maior nos dois últimos anos do EF e no EM, segundo Elisabete e Geovana. Elas explicaram esse fato por considerarem que os alunos que deixaram a escola nas antigas quinta e sexta séries são menos motivados para voltar a estudar porque avaliam que levarão muito tempo para concluir os estudos.

Outro aspecto informado por Elisabete, e também observado pela pesquisadora, é a predominância de alunos mais jovens nos turnos da manhã e tarde e de mais alunos adultos no período noturno.

Elisabete: Mas de manhã, de manhã é a faixa de (+) 15 pra 18. Então é isso que domina. À tarde é mais 14 a a 17 e a à noite o pessoal assim mais maduro, mas TAMBÉM ta tendo um número grande de adolescentes. (Eccordsec225-228*)

A identificação dessa característica corrobora as pontuações sobre a mudança de perfil dos alunos atendidos na EJA, feitas por Haddad e Pierro (2000) e comentadas no referencial teórico deste trabalho21.

O número de alunos por turma varia de acordo com a demanda, mas é limitado a 30 alunos no EF e 35 no EM. No entanto, o número de alunos matriculados no início do semestre acaba diminuindo. Geovana e Elisabete reconhecem a existência de evasão na escola e, além de a atribuírem a motivações intrínsecas dos alunos, a justificam também pela concorrência com outras escolas e pela existência de certificação mais rápida oferecida através do Exame Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos (ENCCEJA) realizado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP).

Pesquisadora: Tem muita evasão?

Geovana: Sempre, sempre tem, educação sempre tem muita evasão. Pesquisadora: Começa cheio, né e depois (+) eles [vão saindo...]

Elisabete: [Vem] (+) vem diminuindo muito. Cerca de (+) vamos supor (+) cinco anos para cá, tá/

Geovana: Tem caindo bastante, né Elisabete?

Elisabete: Mas eu acho assim, ta [tendo menos evasão.]

Geovana: [É, mas assim, eu vou falar assim, né, (incompreensível) (ta caindo um pouquinho), mas eu acho que em função desse supletivo da/ Elisabete: [a concorrência também].

Geovana: concorrê::ncia, é, esse ENCCEJA que veio agora (+) as provas são facílimas assim, quem/ não faz quem não tem conhecimento realmente, quem não (+) porque cê vai lá, faz a inscrição, daqui a dois meses cê faz as provas, cê sendo aprovado, cê tem a certificação. (Ecoordsec157-169)

21

Entretanto, as duas destacaram casos de alunos que solicitaram transferência para outras escolas para obter o certificado de forma mais rápida, ou mais fácil, e depois retornaram à escola porque perceberam que não tinham aprendido o suficiente e realmente desejavam aprender. Essas ocorrências indicam que embora os alunos almejem a certificação rápida, existe o reconhecimento por parte de alguns de que só o certificado não satisfaz suas necessidades. Outro indicativo de que há alunos nesta escola em busca de conhecimento, e não apenas da certificação, é que duas alunas, dentre os cinco alunos entrevistados para este trabalho, afirmaram estar repetindo níveis de escolarização, cursados quando adolescentes, porque não tinham aprendido o suficiente. Cabe mencionar que a escola exige, para que os alunos concluam os estudos, o domínio de conhecimentos básicos, sendo essa exigência considerada um diferencial da escola por Elisabete. Ela inclusive afirmou que seu lema era: “Não é pagar e passar” (Ecoordsec292).

O sistema de avaliação da escola é bimestral, havendo dois bimestres por semestre letivo. Em cada bimestre, o aluno deve realizar uma prova e dois trabalhos, em média, por disciplina. Há recuperação no final do semestre letivo, além de “aulas de reforço” oferecidas ao longo de cada semestre. Não há sistema de dependência por disciplinas e, caso o aluno seja reprovado em alguma disciplina, ele deverá cursá-la isoladamente no semestre seguinte, ou seja, ele terá que ir à escola apenas para assistir as aulas desta disciplina. Durante o trabalho de campo, diversos alunos foram encontrados nessa situação, assistindo aulas apenas das disciplinas em que tinham sido reprovados no semestre anterior. O aluno só teria que repetir todas as disciplinas se tivesse superado 25% de faltas no semestre letivo.

Outro diferencial da escola, segundo Elisabete, é a atenção que a equipe pedagógica dispensa aos alunos, considerados por ela em situação especial:

Elisabete: E todos alunos que vêm pra E- EJA (+) são alunos especiais: ou ele parou de estudar há muito tempo, ele ta querendo retornar (+) ou ele reprovou (+) ou ele foi expulso (+) ou ALGO ele tem. (Ecoorsec584-586).

Geovana destacou que muitos jovens excluídos do ER, ingressam na Escola Educar e gostam de freqüentá-la. Ela citou casos de alunos que concluem o EF e ficam sem estudar até ter idade para ingressar no EM lá oferecido e concluir os estudos. Tanto a fala de Elisabete quanto a de Geovana mostram que elas

reconhecem que os alunos da EJA possuem especificidades e que acreditam que a escola atenda essas especificidades, acolhendo esses alunos.

A escola também busca utilizar materiais didáticos específicos para EJA. No entanto, Elisabete e Geovana mencionaram tentativas que não tiveram o êxito esperado, como foi o caso do uso de apostilas cujo conteúdo acabou não atendendo às necessidades dos alunos. No segundo semestre de 2008, quando iniciei o trabalho de campo em sala de aula, os alunos utilizavam essas apostilas, mas os professores reclamavam que elas eram incompletas e os presenciei complementando tanto o conteúdo teórico quanto os exercícios das apostilas. No primeiro semestre de 2009, as apostilas foram descartadas e a escola adotou livros específicos para EJA no EF e livros de volume único, não específicos para EJA, no EM. Elisabete destacou dois motivos para o uso de livros didáticos na escola: oferecer um suporte para o aluno que se ausentou de algumas aulas poder recuperar o conteúdo perdido e facilitar o controle do cumprimento do programa por parte da coordenação.

Em abril de 2009, durante a segunda fase deste estudo, a escola mudou de endereço, passando a se localizar em um prédio próximo ao que funcionava em 2008, mas, agora, com mais espaço e mobiliário novo. No prédio em que esta pesquisa foi iniciada, para ministrar aulas diferenciadas, os professores utilizavam as seguintes salas temáticas: “Sala Mundo” (utilizada para aulas das disciplinas Filosofia, Sociologia Geografia e História); “Sala de Artes” (utilizada para aulas de Artes Plásticas); “Sala de Conhecimento Virtual (utilizada para aulas de Matemática); “Sala de Linguagem e Leitura” (utilizada para aulas de Português e Inglês) e “Laboratório de Ciências” (utilizado para aulas de Ciências Naturais, Biologia, Física e Química). Havia ainda o “Cantinho da Leitura”, localizado no hall de entrada da escola, que contava com uma mesa e cadeiras para que os alunos pudessem ler ou realizar suas tarefas. Além disso, a escola reservava uma sala para atendimento dos alunos por estagiários das áreas de Português, Inglês, Matemática, Física e Química, em horário extra-escolar. Esse atendimento, oficialmente denominado “Projeto de Acompanhamento Pedagógico”, era chamado de “aulas de reforço” pelos alunos e visava o esclarecimento de suas dúvidas. Na entrada da escola, havia um mural temático, organizado em um sistema de rodízio pelas diversas turmas da escola. Cada turma recebia o auxílio de determinado professor para organizar o

mural. Além desse, havia o mural de “Curiosidades Científicas”, mantido pela professora Marília, com materiais de divulgação científica.

No novo prédio, os laboratórios de Biologia, Física e Química são separados. As salas Mundo, de Artes, de Conhecimento Virtual; de Linguagem e Leitura e de reforço escolar continuam existindo, mas o “Cantinho da Leitura” foi abolido. Em compensação, reservou-se um espaço para a instalação de uma biblioteca. Manteve-se também o mural temático, agora localizado no hall de entrada da escola. A escola costuma realizar diversos eventos, como a Feira de Ciências, a Semana da Consciência Negra e a Feira de Talentos. Também promove saídas de campo, como idas ao teatro. No entanto, estas não são acontecimentos regulares, uma vez que dependem da iniciativa individual dos professores de escreverem projetos para as saídas de campo.

A descrição contextual acima mostra o esforço empreendido pela escola para oferecer educação de qualidade aos jovens e adultos. Em entrevista, alguns dos alunos justificaram a escolha dessa instituição justamente em virtude de sua organização e nível de exigência.