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A escola e o trabalho com os conteúdos escolares

CAPÍTULO 1 – A ABORDAGEM DO CICLO DE POLÍTICAS, DIREITO À

1.4 A escola e o trabalho com os conteúdos escolares

A gestão escolar além de gerir as condições existentes no seu âmbito, com relação aos recursos, tem como atribuição, a organização do trabalho com os conteúdos escolares, encaminhar o processo de ensino e aprendizagem, que é a maior de suas responsabilidades. Vieira (2007) afirma que uma gestão escolar só se concretiza com o sucesso dos alunos e, isso implica num constante zelo sobre o processo de difusão e produção do saber na escola.

Equivocadamente, por vezes se considera que as políticas públicas são feitas somente nas esferas do governo federal, estadual ou municipal. Há de se concordar com Vieira (2007) que nenhuma gestão será bem sucedida se estiver distanciada das condições que lhe são possíveis. Reforça-se aqui, a importância das propostas políticas precisam ser viáveis, isto é, apresentar condições de implementação. Também devem levar em consideração que nem tudo é consenso, ao passo que no campo da prática, onde as coisas são feitas, a efetivação de uma política depende da aceitação de suas propostas por parte de quem irá executá-las ou não.

Diante dessa visão da prática, há necessidade de se voltar às reflexões para as condições de implementação (infraestrutura, financiamento, condições materiais, recursos humanos) e condições políticas (resistência, interesses contraditórios ou conflituosos) com vistas a explorar de modo mais qualificado o âmbito da gestão educacional, que afeta diretamente a organização da gestão escolar.

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Sobre o trabalho com os conteúdos escolares, Young (2007) levanta a necessidade de um olhar sob as implicações que se podem ter quando colocado para a escola um único papel, o de aquisição dos conhecimentos. Há críticas de que a escola, ao trabalhar com a ênfase nos conteúdos, mascara a forma em que se estabelece a sua seleção, pois se percebe que esta seleção é feita conforme conceitos importantes para quem detém o poder.

Ao mesmo tempo em que as idéias pós-estruturalistas emergiam, outro conjunto de idéias, as neoliberais, vieram a dominar a economia, o governo e, indiretamente, a educação. Os neoliberais argumentavam que a economia deveria ser deixada para o mercado e que os governos deveriam desistir de tentar ter políticas econômicas ou industriais. A lógica dessa posição foi seguida com entusiasmo por governos de ambos os partidos neste país, com profundas implicações para as escolas. Enquanto delegavam ao mercado livre qualquer papel na economia (com exceção do controle das taxas de juros), os governos dedicavam seus esforços a reformar o sistema escolar ou aprimorar o “capital humano”. (YOUNG, 2007, p. 1290).

Não se pode deixar de evidenciar que existem contradições por parte de quem formula as políticas para o campo educacional, ao estabelecer uma universalidade de condições mediante as desigualdades. Para Young (2007), há uma contradição entre as ideias de justiça social e democracia e a ideia de que as escolas devem trabalhar o conhecimento.

Uma observação importante levantada pelo autor, e que há que se considerar, é que ao fazer a seleção de conteúdos pensando nos conteúdos importantes para quem detém o poder, a escola está de certa forma, acentuando a desigualdade presente na sociedade, tornando mais fracos aqueles que já estão enfraquecidos. Fortalecendo essa análise, Vieira (2007, p. 67) destaca a política educacional como um plano teórico e discute a necessidade de considerar a prática, ir desta para a teoria, tendo sempre “como norte a função social da escola e da educação.”

Nesse sentido, ao pensar o papel da escola, como instituição social, Young (2007) afirma ser primordial que se garanta nesse espaço o trabalho com o conhecimento que não é possível que o sujeito aprenda em casa, na comunidade, ou em outros espaços não escolares. Destaca o conceito distinto entre “conhecimento poderoso” e “conhecimento dos poderosos”. O conhecimento poderoso é aquele que possibilitará a quem o apreender, novas formas de ver e compreender o mundo. Trabalhar esse conhecimento não quer dizer, desconsiderar o que os alunos sabem, mas articular esse saber ao currículo, viabilizando o trabalho com eles, para que se alcance a possibilidade de uma amplitude de conceitos. O “conhecimento dos poderosos” não nos diz nada em si, pois é mais articulado com os limites do cotidiano, da análise restrita conforme a realidade vivida, o cotidiano, de situações locais.

Por trás dessas diferenças há uma mais básica entre dois tipos de conhecimento. Um é o conhecimento dependente do contexto, que se desenvolvem ao se resolver problemas específicos no cotidiano. Ele pode ser prático, como saber reparar um defeito mecânico ou elétrico, ou encontrar um caminho num mapa. Pode ser também

procedimental, como um manual ou conjunto de regras de saúde e segurança. O

conhecimento dependente de contexto diz a um indivíduo como fazer coisas específicas. Ele não explica ou generaliza; ele lida com detalhes. O segundo tipo de conhecimento é o conhecimento independente de contexto ou conhecimento teórico. É desenvolvido para fornecer generalizações e busca a universalidade. Ele fornece uma base para se fazer julgamentos e é geralmente, mas não unicamente, relacionado às ciências. (YOUNG, 2007, p. 1296, grifos do autor).

A escola precisa considerar o conhecimento local e cotidiano, mas este nunca deve ser a base para o currículo. Os princípios generalizáveis é que possibilitarão o conhecimento para além do particular, e dessa forma, viabilizar meios de articular os conceitos de sociedade local com os conceitos de sociedade mais ampla. Ressalta-se como de igual importância a análise sobre a gestão educacional e a gestão escolar.

Para o trabalho com o conhecimento “poderoso”, o conhecimento adquirido na escola, a instituição precisa considerar seriamente, por meio de seus educadores, a base de seu currículo, mesmo quando isso parece longe das demandas dos seus alunos. Assim se a escola quer assumir um papel importante, com vistas a promover a igualdade social, deve trabalhar o “conhecimento” considerando o currículo escolar, atendendo a categorias mais abrangentes que o contexto, para além das demandas das circunstâncias locais e particularidades.

A importância do trabalho com os conteúdos escolares articulados com a realidade dos alunos contribui na pesquisa sobre o programa PDE Escola, no sentido de poder analisar em que medida as ações propostas nos Planos de Ação, elaborados pelas escolas, estão voltados para o trabalho com as reais necessidades levantadas no diagnóstico escolar, e dessa forma, poderão contribuir para melhorar o desempenho dos alunos diante das dificuldades diagnosticadas.

Ressalta-se, no entanto, que as questões levantadas na situação escolar, proposto na primeira parte do manual PDE Escola como diagnóstico, são tratadas como dificuldades para avanço no desempenho educacional. No entanto não se pode deixar de considerar os vários aspectos sociais que envolvem a escola, e que podem ser complementados com ações de outros setores dos poder públicos, além do setor educacional.

Em síntese, as questões conceituais abordadas nesse capítulo permitem analisar o programa PDE Escola como uma política definida pelo Estado, que visa atender princípios do direito à educação e, de igual forma, propiciar uma educação de qualidade social. Entretanto, como se percebe no decorrer desse estudo, as concepções presentes nos documentos que fundamentam o programa, pouco explicitam os meios para construção de um projeto

educacional realmente democrático, ou que o currículo escolar possa ser fortalecido de tal maneira que, a formação para que a igualdade somente na perspectiva jurídico-política seja superada e se possa caminhar para a efetiva liberdade humana, possível somente com a transformação dessa organização social.

O capítulo seguinte abordará os procedimentos metodológicos da pesquisa, visando explicitar como os dados foram analisados, na busca da articulação necessária entre o contexto que influenciou as políticas educacionais e a forma como foram materializadas no contexto da prática escolar.