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Capítulo I. Apresentação Geral do Trabalho

1.1 A Escolha da Área Temática da Investigação

Neste trabalho procura-se relatar, de forma sistematizada, todo o percurso de investigação e as questões inerentes a um tema que se apresenta como problemático há longos anos e que tem gerado alguma discussão. Usar instrumentos de medida com as características das escalas de avaliação, compostas por itens com formato de medida ordinal não é uma tarefa fácil, devido ao caráter qualitativo e subjetivo dos itens que as compõem e, também, devido à forma como os dados que emergem destes instrumentos são analisados estatisticamente.

Nas áreas de Ciências Sociais e Ciências da Saúde confrontamo-nos, demasiadas vezes, com problemas desta natureza, não só ao medir, mas também ao analisar os

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dados que emergem das variáveis ordinais. O tipo de medida destas variáveis pode perpetrar alguns erros estatísticos pela dificuldade na validação dos pressupostos metodológicos e, pelo facto de apenas os seus efeitos ou manifestações poderem ser observáveis.

A motivação pessoal para desenvolver este trabalho está relacionada com os contextos em que tenho trabalhado, na formação de enfermeiros, como professora da disciplina de investigação e na intervenção como profissional de enfermagem e, como investigadora inserida em alguns grupos de pesquisa na área da saúde.

A importância atribuída à área da criança e do jovem teve na sua base, por um lado, o facto de trabalhar com crianças e por outro lado, ser uma área onde se aplicam muitas das escalas desenvolvidas com variáveis com formato de medida ordinal. A utilização destes instrumentos é feita, muitas vezes, sem recorrer à evidência científica e sem tomar as decisões baseadas nessa mesma evidência e nos estudos de simulação já desenvolvidos. É também problemática a escolha de soluções estatísticas para o tratamento de dados, sobretudo quando se consideram as variações possíveis associadas à dimensão da amostra, ao tipo de escala e outros fatores. Assim, surgiu o interesse por estudar as variáveis ordinais e os instrumentos desenvolvidos com estas variáveis para dar algum contributo na tomada de decisão aquando do desenvolvimento e da tradução e adaptação de escalas para uma determinada situação e para um cliente específico.

Na literatura científica está disponibilizado um grande número de instrumentos que apresentam muitas vezes os mesmos objetivos de avaliação, pelo que, a seleção dos instrumentos que melhor servem as decisões a serem tomadas, quer na avaliação específica do desenvolvimento, quer da saúde individual, nem sempre são fáceis por parte de quem os procura, quer seja por serem de diferentes tipologias, quer por falta de uma fundamentação adequada.

Enquanto docente e investigadora fui questionada sobre a problemática da medida, técnicas estatísticas, e validade e fiabilidade dos instrumentos utilizados na avaliação e observação da criança e jovem e nem sempre as justificações teóricas ou metodológicas permitiram uma melhor adequação da decisão.

O recurso à estatística como ferramenta facilitadora da tomada de decisão faz com que o investigador se depare com a problemática do erro mesmo antes de iniciar a

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realização dos testes estatísticos (Loureiro & Gameiro, 2011). O estudo da potência dos testes estatísticos está associado a dois erros que podem ser cometidos quando se tomam decisões incorretas. Se o investigador rejeita a hipótese nula sendo ela verdadeira, estamos perante um erro de tipo I

 

 ou se não rejeita a hipótese nula sendo ela falsa, estamos perante o erro de tipo II

 

 , sendo a potência de um teste o seu complemento

1

. A investigação de Pearson (1930, 1931) sobre a potência dos testes paramétricos perante a violação dos seus pressupostos é um exemplo da importância atribuída à potência estatística desde os anos trinta do século passado. Estes estudos começaram por analisar a probabilidade de erro de tipo I e só depois a probabilidade do erro de tipo II e a potência de teste.

A simulação estatística tem sido uma mais-valia na comparação da performance dos testes paramétricos e não paramétricos (Blair & Higgins, 1985; Lehman, 1975), mas os estudos com variáveis ordinais são em menor quantidade (Nath & Pavur, 1985; Katz & MacSweeney, 1980). Os estudos de simulação, sob o ponto de vista científico e metodológico, apresentam especificidades muito próprias e usam-se pela impossibilidade de se obterem analiticamente resultados. Assim, podemos dizer que uma das âncoras deste trabalho é o estudo de simulação pelo método de Monte Carlo, no qual foram utilizadas duas metodologias de geração aleatória de dados ordinais. No delineamento do estudo de simulação, houve a necessidade de criar vários cenários nos quais pudessem ser enquadradas diferentes situações reais. Assim, foram utilizadas várias dimensões amostrais, 3 tipos de intensidade de correlação entre os itens, escalas de medida com números de pontos diferentes, e também distintas distribuições de frequência.

Em teoria, com variáveis com formato de medida ordinal não deviam ser utilizadas estatísticas paramétricas e, a serem usadas deviam ter pelo menos 5 pontos (Lozano, García-Cueto, & Muñiz, 2008, Temme, 2006). Em situações específicas em que as escalas têm menos de três pontos, nem as estatísticas não paramétricas deviam ser aplicadas (Katz & MacSweeney, 1980). Na prática, tanto se usam testes paramétricos como não paramétricos com este tipo de variáveis, havendo situações em que a justificação está enquadrada em alguns estudos de simulação e outras em que tal

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não acontece, não sendo, em muitos casos, valorizada a dimensão da amostra, a correlação entre os itens, nem a distribuição de frequência.

No estudo de simulação desenvolvido no âmbito deste trabalho, a seleção dos 4 formatos de medida com 3, 4, 5, 7 pontos, justifica-se por estes serem o número de pontos mais utilizados nas escalas de avaliação em saúde infantil e pediatria.

A exclusão de escalas com um formato de medida com 2 pontos prende-se com o facto de estarmos a usar variáveis ordinais. Esta decisão exclui globalmente as escalas de avaliação de desenvolvimento da criança cuja finalidade é verificar a ausência ou presença de um atributo na criança, e como tal apresentam-se de forma dicotómica. A opção por escalas com um formato de medida igual ou superior a 3 pontos fez com que o foco fosse em instrumentos que avaliam a saúde da criança (avaliação de desenvolvimento oro-motor, de risco de lesão da pele, da independência nas atividades de vida diária).

O percurso de trabalho para a investigação que agora se apresenta foi bastante sinuoso, não só pelas mudanças e obstáculos que tiveram que ser ultrapassados, mas também pelo próprio estudo de simulação realizado. Numa primeira fase deparámo-nos com as normais dificuldades da elaboração do programa de simulação que apresentava especificidades muito próprias por necessitar de um algoritmo para gerar dados ordinais; numa segunda fase, surge o problema relacionado com o tempo de execução das simulações, pelo facto de um dos dois métodos de geração de dados utilizado ser muito lento, o que exigiu um longo período de simulação (17 meses) com recurso contínuo a 7 computadores virtuais e periodicamente (9 meses) a mais 23 computadores fixos de forma a simular todos os cenários previstos.

No ponto seguinte faremos a contextualização teórica da temática sob estudo.