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2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA E TENDÊNCIAS DA BIBLIOTECA PÚBLICA NA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO

2.1 A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA BIBLIOTECA PÚBLICA

Para Araújo (2002) as bibliotecas públicas nasceram da necessidade de organização e disseminação dos registros gráficos, visuais e sonoros, oriundos do aumento acelerado da produção cultural e intelectual. A história registra que seu surgimento se deu na “Inglaterra fabril do século XIX, em decorrência das transformações provocadas pela revolução industrial, as quais exigiram força de trabalho qualificado” (ARAÚJO, 2002, p. 11). Além de Araújo (2002), autores como Mueller (1984) e Nogueira (1986) defendem o seu surgimento a partir da segunda metade do século XIX concomitantemente nos Estados Unidos e Inglaterra. Sobre isto Bezerra (2011, p. 22) completa que o “conceito de biblioteca pública como serviço do Estado está sedimentado nos princípios de liberdade e igualdade fundamentados pelas ideias revolucionárias” da França no século XVIII. Entretanto, as razões do seu surgimento não tem uma precisão histórica, pois alguns afirmam ter nascido em virtude das necessidades e exigências da revolução industrial (ARAÚJO, 2002; ALMEIDA JÚNIOR, 2003), outros, como Wada (1985), afirmam que a biblioteca surgiu a partir de uma atitude filantrópica para minimizar os problemas sociais da época.

Com o surgimento do papel e também da imprensa, a produção em massa de livros se expandia e consequentemente as bibliotecas cresciam. Conforme Battles (2003), a Biblioteca do Museu Britânico é um exemplo desse fenômeno, pois, juntamente com outras Bibliotecas Nacionais na Europa e na América, viu-se subitamente com um acervo de centenas de milhares de livros. A biblioteca do Museu Britânico tinha como responsável o advogado Anthony Pannizzi9, que começou sua carreira como revolucionário italiano no exílio. Ainda de acordo com Battles (2003, p. 133), com o seu trabalho de organização dos livros, catálogos e marcação das estantes, Pannizzi “pretendia fazer com que a biblioteca ficasse mais

transparente para seus leitores, substituindo os mistérios de seu funcionamento por uma sofisticação que contribuiria para a independência do leitor”.

A biblioteca pública até então tinha um perfil elitista e, por conseguinte, excludente enquanto que a sociedade inglesa encontrava-se em sério declínio econômico em virtude do período napoleônico. Sobre isto Battles (2003, p. 137) afirma que:

Foi nesses anos de conflito de classes e de terror econômico que o movimento pela biblioteca pública tomou conta da Inglaterra, com a elite progressista da nação reconhecendo que as luzes da energia intelectual e cultural faziam falta na vida do homem do povo.

Nesse período, Pannizi dedicava-se a criação de uma biblioteca para a nação e essa luta pela biblioteca pública se espalhava para toda a população. Neste momento se tem a criação do primeiro projeto de uma biblioteca pública, entretanto, este enfrentou dificuldades de aceitação pelas autoridades britânicas. Em 1838, liderado por William Lovett10, teve início o movimento cartista e por toda a Inglaterra no final do século XIX disseminavam-se os salões de leitura cartista, baseados na “Carta do Povo” de Lovett. Tratavam-se na realidade de bibliotecas cooperativas que emprestavam livros aos membros de organizações políticas radicais (BATLLES, 2003).

Difundiu-se então essa ideia para a população e, enquanto não surgia de fato uma biblioteca pública, iniciativas de socialização da informação se espalharam por toda a Inglaterra. Como ressalta Battles (2003, p.138), esses salões se “tornaram extremamente populares, e logo estavam competindo com as bibliotecas comerciais, que funcionavam por subscrições e ofereciam a seus membros um cardápio sempre renovado de livros” por uma pequena taxa.

Apesar da iniciativa popular para a criação da biblioteca pública, alguns filósofos eram contrários à ideia pautados pelo pensamento de que, quando as camadas mais pobres adquirissem conhecimento, este seria utilizá-lo para a ruína da nação. Entretanto, outros pensadores acreditavam que a democratização do acesso à informação seria benéfica para todos. Em 1850 é aprovada a Lei de Bibliotecas Públicas da Inglaterra com 118 votos a favor e 101 contra; em 1919 a lei finalmente é aprovada por unanimidade (SANTOS, 2012). Assim, os salões cartistas de leitura foram imediatamente suplantados pelas bibliotecas públicas, um

10 William Lovett (1800-1897), ativista britânico, líder do movimento político radical cartista. Escreveu o

documento: Cartismo, uma nova organização do povo, que deu origem ao Projeto: Carta do Povo, que reivindicava a melhoria política e social do povo através da educação e da cultura.

exemplo disso, é a Biblioteca Pública de Manchester, inaugurada em 1852, no local onde antes era ocupado por um salão de leitura (BATTLES, 2003).

A biblioteca pública surge, portanto, na Inglaterra como uma oportunidade de democratização da educação e da cultura para as classes que até então não tinham acesso à informação por meio da biblioteca, visto que a mesma não era disponível a todos (ARAÚJO, 2002). Além disso, embora alguns não concordassem com esse plano, ela surge num contexto de dificuldades econômicas, como uma ferramenta de inclusão social, confirmando o que diz Battles (2003, p. 137) acerca de Anthony Panizzi, que “honrou o bom senso do povo que o adotou – criando não apenas para os ricos intelectuais, mas para os estudantes pobres, para o povo – uma das maiores bibliotecas do mundo”.

Sobre isto, Almeida Júnior (1997 apud ALMEIDA JÚNIOR, 2003, p. 67) afirma que,

A biblioteca pública surge, não isoladamente, deslocada dos acontecimentos e da situação da sociedade daquela época. Ao contrário, ela está imersa nas transformações, nas mudanças e alterações daquela época e, assim, deveria continuar participando de cada cenário histórico, cenários não estanques, mas dinâmicos e em constante mutação.

Nos Estados Unidos foram os filantropos capitalistas que fundaram bibliotecas públicas por volta dos séculos XIX e XX (LEMOS, 2008). Moraes (2006, p. 97) destaca a relevância da contribuição das bibliotecas públicas norte-americanas ao afirmar que: a “biblioteca pública aberta, no sentido que hoje se tem, desenvolveu-se com as ideias democráticas norte-americanas. É das contribuições mais relevantes dos Estados Unidos à cultura universal”.

2.1.1 A Biblioteca Pública na América Latina

As bibliotecas públicas assumem na era da informação uma gama de desafios que, conforme Betancur Betancur (2007), não era uma realidade em outras épocas e as razões são as mais variadas possíveis. Pode ser pelo desenvolvimento dos sistemas de informação, pelas demandas da sociedade da informação ou pela própria evolução do conceito de biblioteca pública.

Na América Latina as bibliotecas públicas tem sido alvo de reflexões nos últimos anos tanto no que diz respeito a sua atuação na sociedade da informação, como sobre a sua missão e conceito, que reforça imagens de uma instituição viva e dinâmica, marcadamente social. Refletindo sobre as bibliotecas públicas da América Latina, Suaiden (1993) afirma que a

maioria dessas bibliotecas são consideradas como bibliotecas escolares, sendo poucas as que podem realmente ser consideradas como referência para a comunidade. O autor afirma ainda que o desenvolvimento dessas bibliotecas só foi possível devido à dedicação e criatividade dos bibliotecários “que acreditam em sua instituição como agente de transformação social” (SUIDEN, 1993, p. 20).

O pesquisador venezuelano Iraser Páez Urdaneta (1952-1994) trouxe uma interessante reflexão sobre a missão da biblioteca pública como uma definição da estratégia de capitalização, de inteligência e de cidadania. A capitalização é o investimento para o melhoramento dos recursos humanos, financeiros, tecnológicos e de infraestrutura para a biblioteca pública. A estratégia de inteligência se constitui em um investimento em ações culturais de desenvolvimento do conhecimento no ambiente social da biblioteca em sua comunidade e seu entorno. Para a estratégia de cidadania, o foco é a formação do cidadão, incentivando a aquisição e consumo de cultura em ambiente socializador da biblioteca (YEPES OSÓRIO, 2007). Entender a biblioteca pública como um sistema tríplice de capitalização, de inteligência e de cidadania requer sensibilidade e, sobretudo, vontade política.

O surgimento e o desenvolvimento da biblioteca pública na América Latina para Jaramillo, Montoya Ríos e Uribe-Tirado (2008, p. 40) se devem “[...] fundamentalmente, a fenômenos urbanos que correspondem aos processos de imigração e de industrialização e que, de alguma maneira, correspondem às condições sociais, econômicas e políticas de cada país”. Dentre os aspectos históricos que marcaram a biblioteca pública na América Latina, destaca- se a criação da Biblioteca Nacional da Colômbia, em 1777, que foi a primeira BN na região e que mais tarde impulsionaria os serviços bibliotecários e criaria a Rede Nacional de Bibliotecas Públicas em 1972.

Notadamente, a Colômbia é o país que mais investiu e desenvolveu suas bibliotecas públicas. O destaque é – em um esforço conjunto com a UNESCO – a criação da Biblioteca Piloto de Medellín em 195211, que se deu a partir da necessidade de uma biblioteca pública que contribuísse para o desenvolvimento cultural da sociedade. A Biblioteca Piloto de Medellín foi planejada e executada com o intuito de ser a maior e mais completa biblioteca pública da América Latina. A biblioteca piloto de Medellín é a segunda no mundo, a primeira encontra-se em Nova Delhi, na Índia.

A Escola de Biblioteconomia da Universidade de Antioquia, criada em 1956, é uma importante instituição para o desenvolvimento da biblioteca pública na Colômbia. Além de formar profissionais para as bibliotecas, também mantém o “Grupo de Investigação em Biblioteca Pública”, do Centro de Investigações em Ciência da Informação da Escola Interamericana de Biblioteconomia. A Rede Colombiana de Bibliotecas Públicas foi criada a partir de 1972 como uma estratégia para a “proteção, recuperação, registro e difusão do patrimônio cultural” (JARAMILLO; MONTOYA RÍOS; URIBE-TIRADO). A Rede Colombiana de Bibliotecas Públicas é coordenada pelo Ministério da Cultura através da Biblioteca Nacional, especificamente pelo Grupo de Bibliotecas Públicas. É responsável por várias ações, dentre elas a realização de eventos como o Seminário Nacional de Bibliotecas Públicas em 1985. Em função do Seminário surgiu o Comité Nacional de Bibliotecas Públicas, que realizou diagnóstico das bibliotecas públicas colombianas e o encaminhamento de propostas para o desenvolvimento do Sistema Nacional de Bibliotecas Públicas.

A partir do Plano de Fortalecimento das Bibliotecas Públicas em 2002, as instituições convocadas entregam um Plano Mestre para os serviços de bibliotecas na Colômbia e criam em 2004 os Parques Bibliotecas. Os Parques Bibliotecas são complexos formados por prédio de arquitetura moderna, com amplos espaços de uso público, e no eixo central encontra-se uma biblioteca com equipamentos de alta tecnologia, internet, acervo e pessoal qualificado. Os Parques Bibliotecas foram construídos nos locais de menor índice de desenvolvimento humano e contribuíram para a diminuição dos índices de violência. Os objetivos da criação dos Parques bibliotecas foram contribuir para a melhoria da qualidade de vida e da cidadania, criar condições para o desenvolvimento urbano em Medellín, melhorar o acesso à informação e educação e contribuir para uma convivência pacífica entre os cidadãos (DOMINGUÉZ, 2009).

Na Argentina as primeiras bibliotecas públicas surgiram a partir de 1794 com a socialização das livrarias para o público local. O pioneiro foi Facundo de Prieto y Pulido que doou sua biblioteca particular ao “Convento de la Merced” para consulta pública, que foi transformada em biblioteca pública pela Junta de Mayo12 em 1810 e que passou a funcionar apenas em 1812 (PARADA, 2002). A Lei nº 419 de 1870, Lei de Proteção às Bibliotecas Populares, deu origem a Comissão Nacional Protetora das Bibliotecas Populares (CONABIP) na Argentina.

12“Junta Provisional Gubernativa de las Provincias del Río de la Plata”, conhecida como a Junta de Mayo,

surgida em Buenos Aires em 25 de maio 1810 e que deu impulso a destituição de Baltasar Hidalgo de Cisneros em consequência à Revolução de Maio.

Em 1813, o Chile cria a sua Biblioteca Nacional e em 1873 é criada a primeira biblioteca pública no país, a Biblioteca Santiago Severín, em Valparaíso. No período de 1978 a 1993 as bibliotecas públicas chilenas ficaram subordinadas à Direção de Bibliotecas, Arquivos e Museus (DIBAM) e a partir de 1993 à Coordenação Nacional de Bibliotecas Públicas, que passou a chamar-se no mesmo ano de Subdireção de Bibliotecas Públicas13.

A Biblioteca Nacional do Perú (BNP) foi criada por decreto em 28 de agosto de 1821 pelo General Dom José de San Martín, entretanto, só foi inaugurada mais de um ano depois, em 17 de setembro de 1822. É apenas em 1962 que a Biblioteca Nacional assume a função de promover o desenvolvimento das bibliotecas públicas do país. Em 1922 é criada a Lei nº 4506 que dispõe sobe a obrigatoriedade dos municípios provinciais a criar e prover bibliotecas públicas e em 1983 cria-se, a partir de Lei Orgânica, a mesma obrigatoriedade para os Distritos. O Sistema Nacional de Bibliotecas do Perú firmou convênios com as bibliotecas públicas e a Biblioteca Nacional para o desenvolvimento das bibliotecas públicas do país. No convênio, a BNP deve capacitar as bibliotecas públicas municipais, prestar assessoramento técnico e bibliográfico e suprir os primeiros gastos de funcionamento (BONINI, 2003).

A Venezuela criou sua Biblioteca Nacional em 1833 através de Decreto Presidencial e sua função é promover, planejar e coordenar o Sistema Nacional de Bibliotecas Públicas, que é subordinado ao Instituto Autônomo Biblioteca Nacional, que funciona em redes estatais e de serviços bibliotecários. O Instituto abriga as 727 bibliotecas públicas venezuelanas, inclusive a Biblioteca Nacional, e tem a responsabilidade de administrar as bibliotecas públicas e prove-las para a participação social14.

A primeira biblioteca de Cuba foi criada em 1793. A biblioteca da Sociedade Econômica de Amigos de Cuba surgiu com o objetivo de apoiar a educação e a cultura no país. A Biblioteca Nacional de Cuba foi criada em 1901 e o Sistema Nacional de Bibliotecas Públicas em 1963 (JARAMILO; MONTOYA RÍOS; URIBE-TIRADO).

Na Costa Rica, a Biblioteca Nacional foi fundada em 1888 e em 1890 iniciou-se um programa de desenvolvimento para as bibliotecas públicas através do estabelecimento da Direção Geral de Bibliotecas, subordinada à Secretaria de Instrução Pública. O Sistema Nacional de Bibliotecas de Costa Rica (SINABI) começou a funcionar a partir de 2000 e tem sob a sua coordenação 56 bibliotecas públicas, sendo 31 oficiais e 25 semioficiais. As oficiais são mantidas diretamente pelo SINABI através do Ministério da Cultura e Juventude; as

13 VER: http://www.bibliotecaspublicas.cl

semioficiais são as que foram criadas pelo Decreto nº 11.987C, de 17 de março de 1981, e são administradas a partir de convênios entre o SINABI/Ministério da Cultura e Juventude, os governos municipais, ONGs, Fundações e outras instituições de interesse. O SINABI coordena ainda o Bibliobús que presta serviços de extensão bibliotecária para as comunidades que não dispõem de bibliotecas públicas15.

A primeira biblioteca pública mexicana foi criada em 1946 por José Vasconcelos, que foi o primeiro diretor. A partir de 1983 se estabelece o Plano Nacional de Bibliotecas Públicas, que abriu mais de quatro mil bibliotecas em todo o país. No mesmo ano se cria a Rede Nacional de Bibliotecas Públicas e, com isto, as bibliotecas públicas passaram a ser consideradas como um elemento chave para a educação e cultura, tornando-se mais vivas, dinâmicas e abertas a todos (FERNÁNDEZ DE ZAMORA, 1994).

Em 1972 é fundada a Biblioteca Nacional do Equador Eugenio Espejo que desempenha funções essenciais para as bibliotecas públicas. O Sistema Nacional de Bibliotecas, um órgão descentralizado do Ministério da educação e Cultura, coordena as bibliotecas públicas do país16.

A Biblioteca Nacional da Bolívia foi criada a partir da Biblioteca Pública de Chuquísaca, em 23 de julho de 1825, quando o General Andrés Santa Cruz, presidente na ocasião, solicitou ao Marechal de Ayacucho, Antônio José de Sucre, sua organização. Depois do ano de 1883 a Biblioteca Nacional da Bolívia passou a ter autonomia e a servir como difusora da cultura letrada do país.

2.1.2 A Biblioteca Pública no Brasil

Suiaden (2000) afirma que a história dos livros e das bibliotecas registra uma interligação entre o acesso à informação e o poder aquisitivo, de forma muito intensa. O acesso à escrita sempre foi marcado por esforços isolados, sem, no entanto, se tornar uma prioridade dos governos, daqueles que dominavam o poder. A leitura e a escrita eram sinônimas de poder e de status e a biblioteca era o símbolo dessa imagem. Em virtude do acesso restrito e segmentado, abiblioteca tinha um perfil diferente do que possui hoje. Desse modo, pensar no usuário ou mesmo na informação não era uma prioridade, o que prevalecia

15 VER: http://www.sinabi.go.cr/ 16 VER: http://www.sinab.gov.ec

era a preservação da memória. A criação e manutenção de bibliotecas era a última coisa a ser pensada.

Pode-se afirmar que essa realidade mudou um pouco com a chegada da família Real ao Brasil, trazendo a Biblioteca Real e a Imprensa Real. Entretanto, não foi uma mudança significativa no que diz respeito a novos pensamentos e paradigmas em se tratando de bibliotecas, como afirma Suaiden (2000, p. 52), “a vinda da Biblioteca e da Imprensa Real também não representou indicadores efetivos do acesso e da disponibilidade de informação para toda a sociedade”. No entanto, essa Biblioteca representou uma significativa evolução nos costumes da comunidade leitora da época. De acordo com Schwarcz (2002), embora não tendo as mesmas funções de uma Biblioteca Pública e contando com outras, a maioria das pessoas que precisava de informação a procurava.

Suaiden salienta (1980) que a primeira biblioteca pública brasileira foi a da Bahia, fundada em 4 de agosto de 1811. Sendo uma iniciativa de Pedro Gomes Ferrão Castelo Branco através de um projeto encaminhado ao Conde dos Arcos, então governador da Capitânia da Bahia, tornando-se, como aponta Lemos (2008), o primeiro grande mecenas do Brasil a advogar para a causa das bibliotecas públicas.

Mesmo com a restrição do empréstimo e da disponibilidade de informações, a Real Biblioteca veio a facilitar e abrir caminhos para o que viria a seguir: a criação da primeira Biblioteca Pública do Brasil, na Capitania da Bahia. O projeto de implantação dessa biblioteca foi o primeiro da história com o objetivo de facilitar o acesso ao livro. A primeira biblioteca pública do Brasil, porém, sem a intervenção do governo, era mantida e administrada pela sociedade e seus sócios. A Biblioteca da Capitania da Bahia foi inaugurada em agosto de 1811 e após essa iniciativa outras capitanias resolveram criar suas bibliotecas. A legalidade da criação se dava através de Decretos Estaduais (MORAES, 2006). Entretanto, Suaiden (1980, p. 5) ressalta que “a fundação da Biblioteca Pública da Bahia não se efetivou através de uma iniciativa governamental. Ela foi criada por iniciativa dos cidadãos”. É correto afirmar que foi a partir desse período que começaram os problemas que até hoje são de conhecimento nas bibliotecas, tais como: falta de estrutura física, acervo desatualizado, falta de pessoal qualificado, ausência de móveis adequados. Eram, portanto, essas as características dessas instituições (SUAIDEN, 2000).

A biblioteca pública que foi criada como consequência da Revolução Industrial, na Inglaterra, no final do século XIX, passou por várias transformações em seu conceito (BIBLIOTECA PÚBLICA..., 2010). Sobre a origem do conceito de biblioteca pública Araújo (2002) afirma que se deu a partir da confluência do humanismo renascentista, da invenção da

imprensa e da reforma protestante. Enquanto a invenção da imprensa permitiu em larga escala a reprodução da cultura escrita e popularizou a leitura, até então restrita a poucos, a ideologia da reforma pleiteava uma educação mais democrática, socializadora e comum a todos. Por sua vez, todos esses fatores vieram a contribuir para o aumento do número de alfabetizados. Assim, a “biblioteca pública é a instituição que, a princípio, deve estar a serviço de todos os cidadãos, oferecendo-lhes informação e lazer a partir de um modelo estatal de prestação de serviços” (ARAÚJO, 2002, p. 12).

Todavia, ainda faltava muito, pois as bibliotecas que foram criadas naquela época seguiam modelos baseados em países desenvolvidos, o que não era a realidade brasileira. Isso só mudou após a Semana de Arte Moderna, com a própria cultura nacionalista que se encontrava em alta e a critica a importação de modelos e paradigmas era uma constante dos intelectuais. Um produto desse período é a Biblioteca Pública Municipal Mário de Andrade, inaugurada em 1926, que como afirma Suaiden (2000, p. 53), foi um “marco importante da cultura brasileira e um exemplo para a América Latina”.

O diferencial era a falta de cooperação, ou seja, cada instituição que existia trabalhava individualmente, o que dificultava a disseminação da informação e quem saia perdendo era o usuário, que não podia contar com um bom acervo. O mercado editorial ainda não atendia plenamente aos interesses dos usuários e a falta de bibliotecas travava ainda mais o crescimento da cultura letrada. A formação do leitor, a disseminação da leitura e da cultura era um objetivo de difícil execução. A era Vargas trouxe a necessidade do crescimento industrial (SUAIDEN, 2000), o que refletiu na biblioteca e em sua função social, porém de forma mais tímida do que o que se registraria anos mais tarde.

Em 1937 foi criado o INL que tinha o objetivo de favorecer meios de produção e aprimoramento do livro e de melhoria dos serviços bibliotecários. Porém, esses esbarravam em problemas como, por exemplo, a dificuldade em criar meios para o aprimoramento e a produção do livro (SUAIDEN, 2000). Ocorria que a indústria editorial tinha receio de investir no produto nacional e acabava por reeditar clássicos estrangeiros, ao mesmo tempo em que esse processo era oneroso para o autor. Outro fator relevante era a falta de parques gráficos e a concentração de distribuição editorial apenas no eixo Rio - São Paulo.