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A evolução tecnológica – sustentáculo da legendagem

Capítulo I – A Tradução Audiovisual

I. 5.3 – Os aspectos técnicos da tradução para legendagem

I.5.3.1 A evolução tecnológica – sustentáculo da legendagem

Ainda que seja provável o uso de diapositivos sobrepostos à imagem do filme desde 1909 (Chaume, 2004: 51), i. e., na época dos intertítulos, é na década de (19)20 que o chamado método óptico se desenvolve. Para além da apresentação das legendas através de diapositivos, o método óptico poderia incluir a fotografia das legendas num rolo de filme à parte, mas que era projectada em simultâneo com o do filme. Tveit (2004: 25) aponta a dificuldade suscitada quando as cenas cinematográficas patenteavam um fundo claro.

No dealbar da década de (19)30 utilizou-se a legendagem mecânica. Após esta inovação, introduzida pelo norueguês Leif Eriksen, que consistia na mecanografia das legendas numa emulsão protectora da fita, sucedeu-lhe a criação da legendagem térmica, que se deve ao húngaro O. Turchányi, e que se caracterizava pelo aquecimento de placas das letras, de modo a queimarem ligeiramente a emulsão da fita celulóide, deixando fixada a legenda (Chaume, 2004: 51).

Obviamente, as legendas de que aqui se fala reportam-se aos filmes exibidos nas salas de cinema. Em consonância com os informes facultados por Tveit (ibidem), a

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Evidentemente, estes números variam. Num estudo anterior da autoria de Jan Ivarsson (1992: 16), calcula- se que a legendagem seja entre dez a vinte vezes mais barata do que a dobragem.

legendagem para televisão foi encabeçada pelos canais de serviço público dos países escandinavos, desde o uso de cartões escritos aos rolos de papel com legendas dactilografadas (experiência levada a cabo pela Norwegian Broadcasting Corporation, em 1959) que obrigavam à permanência do legendador no estúdio durante a emissão do filme de modo a ir desenrolando o rolo que continha as legendas.

Rapidamente, o método químico conquistou o panorama da legendagem nos finais dos anos (19)30, tendo prevalecido até aos anos (19)80, estendendo-se até ao presente. A longevidade deste método, cuja invenção é repartida pelo húngaro R. Hruska, e pelo norueguês Oscar I. Ertnaes deveu-se, mormente, ao facto de se envolver a fita celulóide do cinematógrafo com uma ténue capa de cera ou de parafina para nela se poderem imprimir as letras previamente aquecidas (a 100 graus Celsius) (ibidem). Na sua fase inicial de aplicação, o método químico incluía um banho da fita em lixívia com o objectivo de dissolver a emulsão.

A primeira referência à vertente tecnológica da legendagem em Portugal que se conseguiu encontrar (até ao momento) data de 14 de Novembro de 1942 e é da autoria do director da revista Filmagem (nº 53), Raul Faria Fonseca, que redigiu o artigo “Aspecto da parte industrial do cinema, que os leitores desconhecem. A máquina de imprimir legendas, uma das maravilhas dos laboratórios da «Ulysseia Filme»”. Deslumbrado, Faria da Fonseca relata (idem: 3) a sua visita às instalações daqueles laboratórios (cujo proprietário era José Nunes das Neves):

[V]oltei ao princípio e tornei a admirar tudo. Aquela máquina complicada e matemáticamente rigorosa, que imprimia legendas de diálogos nas fitas, valia para mim o que o mais espantoso brinquedo significa para uma criança: – um passatempo deslumbrante!

Colocada a fita (300 metros de fita!) numa extremidade, ela desenrola-se, atravessa o labiríntico aparelho, e, em poucos minutos, sai pelo outro lado enrolada e sêca e – calcule-se! – com todas as legendas impressas, pronta a correr nas máquinas dos cinemas [sic].

Encandeado pela nova luz que o método químico trouxe para a consecução das legendas, Faria da Fonseca (ibidem), estabelecendo um paralelismo com os métodos de legendagem anteriores, realça as virtualidades da máquina Ulysseia, salientando que esta:

[…] opera prodígios que as suas irmãzinhas, saídas da mesma fábrica, não se atrevem a fazer, porque a da «Ulysseia» foi muito simplesmente... aperfeiçoada. O seu rendimento é muito maior e o trabalho inacreditàvelmente mais perfeito. Basta comparar o filme legendado nas duas fases (a inicial e a actual) para se notar a diferença [sic].

Embora, hoje em dia, ainda perdure e seja exequível, o método químico tem sido substituído pela legendagem a “laser”, cujo invento ficou a cargo do francês Denis Auboyer, em 1979, mas foi apenas comercializado em 1988. Esta técnica de legendagem é auxiliada pelo computador que controla um raio “laser” que, por sua vez, queima a fita (ibidem). Indubitavelmente, a legendagem a “laser” reveste-se de vantagens, nomeadamente a rapidez, a precisão de impressão dos caracteres, promovendo a sua qualidade e visibilidade, avultando entre estas o facto de não danificar tanto os fotogramas,

como acontecia com os métodos supra enumerados62.

Por seu turno, a legendagem electrónica, é um processo que consiste na emissão simultânea da tradução legendada no filme, através de programas informáticos que proporcionam a facilidade e a rapidez do trabalho do legendador e, por conseguinte, a optimização dos resultados da legendagem.

Presentemente, a evolução tecnológica tem facultado a criação de novos modos de apresentação da informação escrita no ecrã. Refiram-se, a título de exemplo, os caracteres manuscritos, imitando a escrita de um diário, registados na versão original do filme Bridget

Jones’s Diary, ou até mesmo a audácia artística patenteada nas legendas de Night Watch

(realizado por Timur Bekmambetov, 2004). Este é o primeiro filme (de terror) de uma trilogia, que oferece uma particularidade sui generis – por opção do realizador russo as legendas, em língua inglesa, constituem parte integrante do filme, tornando-se partícipes na

acção como qualquer outro elemento visual (Shaw Levy, 2006)63:

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Relativamente aos métodos da elaboração de legendas, apenas a tecnologia do futuro indicará o seu curso, porém, prevê-se que a curto prazo todos os processos tecnológicos de se resumam à legendagem electrónica. Para uma história da evolução tecnológica sobre a legendagem, consulte-se “A Short Technical History of Subtitles in Europe”, de Jan Ivarsson, in: http://www.transedit.se/history.htm (consultado a 30.07.2005). 63

Leia-se o artigo “‘Night’ takes flight’” in: The Oregonian, (10 de março de 2006) de Shaw Levy, disponível em http://www.oregonlive.com, consultado a 16.08.2006. Em 1992, a curta-metragem

Desperanto, realizada por Patrícia Rozema, também apresentou legendas que interagem com o processo

[T]he film is filled with cool little scenes of fighting and shape-shifting, and gloomy atmosphere. Subtitles themselves have morphed into gimmicks – sometimes they float, sometimes they dissolve, sometimes they appear in

unexpected places in the frame.

(negrito meu)

Muito antes das manifestações artísticas que se podem observar em muitos trabalhos de legendagem, já em 1992 Ivarsson (p. 8) percepciona a legendagem como uma arte, ao explicar o subtítulo que atribuiu ao seu livro Subtitling for the Media: A Handbook of an

Art. Na realidade e rendendo homenagem à opinião deste autor e profissional de TAV

tanto a tradução (principalmente do humor), como a legendagem poderão de certa forma, ser concebidas como resultado de talento criativo. Na TAV, a criatividade é expressa não só na negociação semântico-cultural, como também na adequação da legenda ao meio audiovisual (TV, VHS, DVD...), ao tempo (de leitura, de exposição da legenda...), ao espaço (número de linhas, de caracteres...), ao género de programa e ao público-alvo para o qual a tradução e as legendas são realizadas.