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4.1 Contextualização do Programa Reuni

4.1.3 A Expansão da Educação Superior Brasileira

Considerando a existência de uma demanda reprimida almejando o ingresso na Educação Superior, incorpora-se nas prioridades do governo brasileiro a preocupação em torno da política de expansão do ensino e de ampliação do acesso, que se voltam tanto para o

91 setor privado quanto para o setor público, priorizando em suas propostas a democratização e a Educação Superior de grupos sociais tradicionalmente excluídos desse nível de ensino.

Muito embora tenham ocorrido movimentos importantes no sentido de ampliar o acesso à educação superior brasileira desde o seu surgimento, esta seção discorrerá a evolução desse crescimento apenas a partir da década de 1990. Essa escolha temporal deveu-se em função dessa década ser anterior e próxima ao primeiro mandato do governo Lula, cujos reflexos desse governo foram sentidos na busca da ampliação quantitativa de vagas, além de ser a década logo posterior à promulgação da constituição brasileira de 1988.

O início da década de 1990, ainda sob os efeitos do baixo crescimento econômico da década anterior, é marcado pelo pouco crescimento das matrículas no ensino superior público do país. A necessidade de ampliação do acesso a esse nível de ensino, contudo, é reconhecida já nos discursos do primeiro governo neste período. No ano de 1996, no primeiro mandato do governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso é promulgada a segunda Lei de Diretrizes e Base da Educação Nacional (Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996).

As formulações apresentadas pela abordagem neoliberal presentes neste momento histórico indicam o mercado como elemento regulador da economia do Estado e todos os serviços sociais de educação, saúde e habitação mantidos por ele. Nesta configuração, o papel do Estado passou a ser regido com base na elaboração de estratégias que diminuíram sua participação no financiamento e fornecimento da educação, mas que garantiam o controle dos resultados da Educação Superior.

Na lógica da expansão e eventual democratização da Educação Superior estão presentes nas políticas educacionais brasileiras, incluindo o REUNI que embora se tratar de política da expansão das Instituições Federais de Ensino, traz em sua concepção a mesma concepção de expansão e democratização utilizada para o crescimento do setor privado. Imbuída nas políticas para o ensino superior, a reforma das universidades públicas é pautada pela redução de investimentos nessa área. A expansão do ensino superior privado ocorre na influência das ideias neoliberais a respeito das propostas de reforma nesse grau de ensino, em particular, da universidade pública brasileira.

Simultaneamente à crescente procura pelo ensino superior, o que se observou durante a década de 1990 foi uma redução progressiva dos recursos destinados à manutenção das Instituições Federais de Ensino Superior. Corbucci (2004, p.681) comenta a questão:

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Os dispêndios do MEC com a educação superior, em especial, destinados à manutenção da rede federal, foram sistematicamente contingenciados ao longo da década de 1990. Ao se estrangular a capacidade das IFES, também se abriu caminho para o crescimento do setor privado.

Em um contexto de aumento de demanda por acesso à Educação Superior, de criação de renovadas opções de tipos de cursos e instituições, e da redução dos investimentos públicos nesse nível de ensino, as instituições privadas encontraram espaço para expansão. Os dados relativos à oferta desse nível de ensino no período são demonstrativos deste viés. Em termos de matrícula, a rede pública passou de 578.625 alunos, em 1990, para 832.022, em 1999. A rede privada por sua vez passou de 961.455 alunos para 1.537.923, no mesmo intervalo de tempo. Enquanto o crescimento no setor público foi de 43,8%, no setor privado foi de 60%. Ao final da década, a participação na oferta do setor público era de 35,1%, e no setor privado era de 64,9% (NOGUEIRA, 2008).

No início do ano de 2001 foi publicado o Plano Nacional da Educação, Lei nº. 10.172, de 09 de janeiro de 2001. O plano consiste em objetivos e metas diretamente relacionados ao desafio de expandir o ensino superior no país, bem como alguns que indiretamente contribuem para tal finalidade. Dentre eles, cabe mencionar o seguinte:

[...] prover até o final da década, a oferta de educação superior para, pelo menos, 30% da faixa etária de 18 a 24 anos (n°. 1); estabelecer uma política de expansão que diminua as desigualdades de oferta existentes entre as diferentes regiões do País (n° 3); estabelecer um amplo sistema interativo de educação à distância, utilizando- o, inclusive, para ampliar as possibilidades de atendimento nos cursos presenciais, regulares ou de educação continuada (n° 4); diversificar o sistema superior de ensino, favorecendo e valorizando estabelecimentos não universitários que ofereçam ensino de qualidade e que atendam clientelas com demandas específicas de formação: tecnológica, profissional liberal, em novas profissões, para exercício do magistério ou de formação geral (n° 10); diversificar a oferta de ensino, incentivando a criação de cursos noturnos com propostas inovadoras, de cursos sequenciais e de cursos modulares, com a certificação, permitindo maior flexibilidade na formação e ampliação da oferta de ensino (n° 13) (BRASIL, 2001).

Segundo Nogueira (2008, p.38), dentre os objetivos e metas apontados, entretanto, não há nenhum que direcione no sentido de assegurar o fortalecimento do setor público. No início do século XXI, teve prosseguimento a política expansionista do ensino superior apoiada, sobretudo, na iniciativa privada. A participação do setor público nas matrículas é progressivamente reduzida nos anos entre 2000 a 2006, passando de 33,0% para 25,9% nesse

93 período. Em 2006, o país possuía um total de 4.676.646 matrículas na graduação presencial, registrando um crescimento de 5,0% em relação ao ano anterior. As instituições públicas tinham 1.209.304 matrículas nessa modalidade de graduação, contra 3.467.342 matrículas nas particulares. Segundo este autor, a rede privada foi protagonista no processo de expansão.

As discussões que envolvem a democratização da educação e os seus desdobramentos se tornam evidentes quando se tem presentes o perfil da pirâmide educacional brasileira marcada por processos excludentes e mercadológicos. Surgem no mercado os holdings educacionais, que em sua maioria, são conjuntos de instituições privadas mantidas pela mesma mantenedora, que passam a atuar no modelo de holding.

É fundamental perceber que a expansão dos últimos anos ocorreu, principalmente, pelo setor privado. De acordo com os dados do INEP de 2007, a distribuição de IES por categoria administrativa apresenta-se com 89% de instituições privadas e 11% de instituições públicas, sendo 4,6% de instituições federais (BRASIL, 2007). Do mesmo modo que nos anos anteriores, as IES privadas foram responsáveis pela oferta do maior número de cursos em 2007, um total de 16.892. Todavia, as instituições federais de ensino superior apresentaram o maior crescimento percentual (8,8%) de crescimento no número de cursos em relação a 2006. De acordo com Nogueira (2008), além da ampliação progressiva dos recursos financeiros da rede federal já instalada, no Governo Lula deflagrou-se um processo de ampliação dessa rede, por meio da construção e/ou consolidação de novas universidades e campi. Ainda segundo a autora, é preciso registrar que o estímulo novamente à sobrevivência das instituições privadas não deixou de ser realizado durante a primeira gestão do Governo Lula. A criação do Programa Universidade para Todos (PROUNI), sob o argumento de regulamentação das isenções fiscais e de democratização do acesso ao ensino superior, trouxe novo fôlego às instituições privadas.

As matrículas no ensino superior do Brasil vêm crescendo constantemente a cada ano. Nogueira (2008) destaca algumas características relacionadas ao perfil atual do sistema de ensino superior do Brasil, dentre as quais: (1) a baixa taxa de atendimento da população, ainda hoje; (2) a privatização do ensino superior; (3) a heterogeneidade do sistema; e (4) as desigualdades regionais na oferta. Para retratar este quadro, a autora baseou-se nos dados do Censo de 2006 e 2007. Os dados analisados evidenciam o aprofundamento da privatização do ensino superior brasileiro.

No Brasil, a questão da expansão do acesso à Educação Superior, como proposta de democratização, está perpassada na tensão público versus privado, como se percebe nas

94 políticas educacionais implantadas. No desenvolver dessas políticas percebe-se o forte embate entre o financiamento da rede pública e o fortalecimento das instituições privadas.

A lógica da expansão do ensino superior está intercalada com as concepções capitalistas e ao analisarmos esse movimento de expansão podemos perceber que os investimentos foram realizados na área pública, mas também no setor privado, tendo este último prevalecido durante o período analisado. Logo, compreende-se que a opção escolhida pelo Estado para tratar a questão do acesso à Educação Superior foi também por meio do incentivo do setor educacional privado, o que reduz a participação e a responsabilidade do governo.

Percebe-se, ainda, que a questão da democratização nas políticas educacionais brasileiras está posta como a expansão do acesso por meio de mecanismos menos onerosos para o Estado, seja através do setor privado ou público, como é o caso do REUNI, e demais políticas, sem, no entanto, aliar essas políticas aos meios necessários para uma efetiva democratização, com todos os aspectos necessários, pois para haver de fato democratização do acesso, é necessário aliar a expansão aos mecanismos de inclusão de grupos excluídos nesse nível de ensino, com qualidade e meios de permanência dos estudantes.

É dentro desse perfil de compreensão das influências das práticas neoliberais nas políticas educacionais adotadas no Brasil que se contextualiza a abordagem nas políticas educacionais de reforma e expansão do ensino superior no Brasil a partir dos pressupostos do neoliberalismo vigentes no país, principalmente a partir da década de 1990.