CAPÍTULO II – NECESSIDADES EDUCATIVAS ESPECIAIS: DESAFIOS NO SEIO
2.1. A família e as crianças com NEE: a dinâmica do sistema família
multiplicidade de imagens que torna a definição do conceito imprecisa no tempo e no
espaço (Rodrigues-Lopes, 1997).
Conceitualmente, o termo também tem denotado alguma evolução. Para Horton
e Hunt (1980, p.166) a família “é um agrupamento de parentesco que se incumbe da
criação dos filhos e do atendimento de certas outras necessidades humanas”, definição
esta também seguida por Giddens (2004). Já Fiuza (2008, p. 939) considera família de
modo lato sensu, como sendo “uma reunião de pessoas descendentes de um tronco
ancestral comum, incluídas aí também as pessoas ligadas pelo casamento ou pela união
estável, juntamente com seus parentes sucessíveis, ainda que não descendentes”. Tal
visão associada à instituição do casamento entre adultos de ambos os sexos é partilhada
por Magalhães (2007) para quem a família é “um grupo de social caracterizado por
residência comum, cooperação económica e reprodução. Inclui os adultos de ambos os
sexos, que mantêm uma relação sexual socialmente aprovada e uma ou mais crianças,
biológicas ou adotadas, coabitando com adultos” (p.69).
Atualmente, abordamos o termo família como sendo o núcleo central de pessoas
com quem o indivíduo inicia as suas primeiras experiências de interação. Nesta
perspetiva Pereira (2008, p. 43) indica que “a família é considerada a instituição social
básica a partir da qual todas as outras se desenvolvem, a mais antiga e com caráter
universal, pois aparece em todas as sociedades, embora as formas de vida familiar
variem de sociedade para sociedade”. Contudo, também é essencial a existência de um
ambiente familiar agradável, que possa proporcionar à criança um clima de estabilidade,
favorecendo, portanto, o seu desenvolvimento harmonioso no seio familiar.
Consequentemente, Nunes (2004) refere que
a família, quando estável e coesa, é o espaço mais próprio para descobrir e viver o amor; é o ambiente privilegiado para se realizar a primeira socialização; é o porto de abrigo onde se partilham experiências, se trocam pontos de vista e se elaboram as sínteses pessoais a partir dos dados recolhidos nas múltiplas vivências”(p.33).
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A evolução do conceito, denota um distanciamento de uma conceção
iminentemente religiosa do conceito família, para uma visão sociológica da mesma,
devidamente adaptada à realidade existente nos dias de hoje. Leandro (2001) apresenta
uma perspetiva evolutiva do conceito de família, afirmando que a família tem sido
objeto de profundas transformações, resultantes de variados aspetos como a economia, a
sociedade, a política, a organização do trabalho e do emprego, o jurídico, a cultura a
religião e as mentalidades.
Atualmente, existem uma grande diversidade de famílias que se distanciam dos
traços característicos da família tradicional, indo muito para além de situações de
paternidade biológica. De acordo com esta abordagem, Serrano (2007) considera que
uma família são duas ou mais pessoas que se consideram como tal e que assumem
obrigações, funções e responsabilidades geralmente essenciais para a vida familiar,
possuindo como traços distintivos os seguintes: a relação de parentesco, afinidade ou
afetividade; a coabitação; e a unidade do orçamento.
Contudo, para Gronita (2007) a família é “um constructo pluridimensional e
multicultural, sendo diversificadas as vivências familiares conforme as diversas
culturas, para além dos tempos” (p.10). Desta forma, pode-se encontrar diferentes tipos
de famílias consoantes as estruturas familiares estão organizadas, ou seja, tendo em
consideração as condições e papéis socialmente reconhecidos, que cada uma das
pessoas que a constituem assume e que se manifestam em interações constantes e
igualmente aprovadas em termos sociais. Neste respeito, Caniço, Bairrada, Rodrigues &
Carvalho (2010, cit. por Alves, 2013) apresentam vinte e um tipos diferentes de famílias
(Quadro 1).
Ao nível da dinâmica e funcionalidade familiar, de acordo com Correia (2013) a
sua explicação pode ser feita através de três abordagens teóricas: abordagem sistémica
da família, o modelo transacional e o modelo da ecologia do desenvolvimento humano.
A Abordagem sistémica da família é baseada na teoria geral dos sistemas de Von
Bertalanffy (1968), segundo a qual todos os sistemas vivos são compostos por um
conjunto de elementos interdependentes, isto é, modificações que ocorreram num dos
elementos podem afetar os restantes. De acordo com Turnbull, Summers e Brotherson
(1986 cit. por Correia, 2013) a família é um sistema inter-relacional, onde coabitam
quatro subsistemas familiares: marital, parental, fraternal e extrafamiliar.
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Quadro 1: Tipos de Famílias
Tipo Díade
Família díade nuclear Casal em relação conjugal sem descendentes comuns, nem de relações anteriores de cada um dos elementos
Família nuclear ou simples Casal em relação conjugal com filhos
Família alargada ou extensa Família composta por ascendentes, descendentes e/ou colaterais por consanguinidade ou não, que coabitam com os pais e seus descendentes
Família reconstruída,
combinada ou recombinada
Família em que um ou ambos elementos que compõem o casal em relação conjugal tiveram relações anteriores e vivem com ou sem descendentes dessas mesmas relações
Família monoparental Família constituída por apenas um dos progenitores que coabita com os seus descendentes
Família dança a dois Coabitação de elementos da mesma família (de sangue ou não) sem relação conjugal ou parental (por exemplo avó e neto, tia e sobrinha, irmãos, primos, cunhados, entre outros)
Família unitária Família constituída apenas por uma pessoa que vive sozinha,
independentemente de ter uma relação conjugal (caso tenha, ser sem coabitação)
Família de coabitação Homens e/ou mulheres que vivem na mesma habitação, sem laços familiares ou conjugais e que podem ter ou não objetivos comuns (por exemplo, estudantes universitários, amigos, emigrantes, etc)
Família comunitária Família composta por homens e/ou mulheres com ou sem descendentes, que coabitam na mesma casa ou em casa relativamente próximas umas das outras (por exemplo comunidades religiosas, seitas, comunas, famílias de etnia cigana, etc)
Família hospedeira Família que acolhe temporariamente um elemento exterior à família, como por exemplo, uma criança, um idoso, um amigo ou um colega
Família adotiva Família que adotou uma ou mais crianças não consanguíneas, podendo coabitar ou não com os seus filhos biológicos
Família acordeão Um dos cônjuges ausenta-se por períodos prolongados e/ou frequentes, como por exemplo trabalhadores humanitários expatriados, militares em missão, emigrantes de longa duração entre outros.
Família múltipla Um dos elementos (pai, mãe ou um dos seus ascendentes) integra duas ou mais famílias, constituindo por isso diferentes agregados, podendo ter descendentes nesses mesmos agregados.
Família grávida Família em que uma mulher se encontra grávida
Família com prole extensa ou numerosa
Família com crianças e jovens de idades muito diferentes
Família homossexual Família em que a união conjugal é entre duas pessoas do mesmo sexo Família consanguínea Família em que existe uma relação conjugal consanguínea
Família com dependente Família que um dos elementos é dependente dos cuidados de outros, devido a doença (por exemplo, uma pessoa acamada, com deficiência mental e /ou motora, etc)
Família com fantasma Família em que um dos elementos desaparece de forma definitiva (falecimento) ou dificilmente reversível (divórcio, rapto, etc), mas o mesmo continua presente na dinâmica familiar, dificultando a (re)organização familiar e o desenvolvimento individual dos restantes elementos
Família flutuante Família que muda frequentemente de habitação, ou em que um dos progenitores muda frequentemente de parceiro
Família descontrolada Família em que um dos membros tem problemas crónicos de comportamento, por doença ou dependência, como por exemplo esquizofrenia, toxicodependência, alcoolismo, etc.