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B. Nossa pesquisa diante da bibliografia

I.3 A atuação da Força Sindical nos anos de 1990 – adesão e reticência ao modelo neoliberal

I.3.4 A Força Sindical e a política de abertura econômica

Vimos até esta parte do texto que, para implantar o 'neoliberalismo possível', os governos Collor e FHC contaram com a adesão da Força Sindical. Esta adesão não é incondicional. Não obstante a defesa das privatizações e da desregulamentação das relações de trabalho, a central mostrou–se reticente com a implantação das políticas de abertura e de juros altos. Mas quando as consequências perversas do Plano Real recaíram sobre os trabalhadores de sua base, a Força Sindical levantou–se contra ela. Vejamos esta inflexão.

Quando o governo Collor iniciou a abertura econômica, ele contou com concordância da central. No livro–programa da Força Sindical tal política era entendida como garantia da

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modernização econômica, em geral, e da modernização das relações de trabalho, em particular – condições fundamentais, supunham, para a inserção do País na economia mundial (Força Sindical, 1993). Esta posição, diga–se logo formal, tornar–se–ia inviável nos anos seguintes. Em 1994, na véspera do Plano Real, "o governo liberou por decreto a importação de milhares de produtos, levando a abertura gradativa do mercado interno, começada por Collor, a um novo patamar" (Singer, 1999: 31). A radicalização da abertura inundou o País de produtos importados, em particular os asiáticos, liberados de tarifas e barateados pelo valor rebaixado do dólar em reais. Quando o governo FHC elevou os juros e cortou o crédito, procurando estancar uma fuga de capitais em meados de 1995, empresas começaram a fechar. As políticas de abertura e de juros altos refletiram negativamente sobre a principal base da central131. Medeiros e Paulinho passaram a questionar "a maneira arrasadora" com que se implantou tal política. Os metalúrgicos, que se ressentiam com a redução de 26% no número de estabelecimentos nos anos 1980, foram especialmente afetados com a abertura. Sendo as pequenas e médias empresas as mais prejudicadas pela concorrência com os produtos importados, o SMSP sairia em defesa de um modelo de abertura gradual e restritiva132.

O apoio da Força Sindical ao neoliberalismo foi, portanto, seletivo. Enquanto os feixes da política neoliberal incidiram sobre o setor público e apenas, indiretamente, sobre o setor privado, a central aceitou–a. Todavia, quando as consequências afetaram sua principal base, a central reagiu ora com moderação – apresentando propostas compensatórias (qualificação profissional, contrato temporário e jornada flexível) e paliativas (PLR) –, ora com protestos. Foi exatamente para protestar contra os efeitos da política de abertura e de juros altos – que de resto também

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Importantes empresas da base metalúrgica de São Paulo como Sofunge, Eries, Mafersa e Vicunha ameaçavam fechar suas portas como consequência da abertura econômica.

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suscitou a reticência da FIESP – que a Força Sindical participou, de forma inédita, da greve geral de 1996 e atuou em algumas frentes, ao lado da CUT, pela implantação de políticas de emprego.

Procuramos tratar até aqui do perfil da Força Sindical. A central compôs, sob a égide do SMSP, uma frente política conservadora ao combater as oposições e sustentar a implantação da plataforma neoliberal nos anos 90. Em alguns momentos, a central constituiu–se como um "braço" da política neoliberal no sindicalismo; em outros, como "laboratório" dos experimentos neoliberais no País.

Para compreender a natureza conservadora da Força Sindical deve–se, a nosso ver, considerar tanto o "campo político sindical" e neste sentido os embates com a CUT, quanto o perfil de suas bases. Passemos, então, à análise de seu baluarte, o SMSP.

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87 CAPÍTULO II

O Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo – ativismo reivindicativo e conservadorismo político

Principal base da Força Sindical, o SMSP, desde a sua origem, tem se caracterizado por um comportamento peculiar, cujos traços, entretanto, têm escapado a alguns dos estudiosos do sindicalismo brasileiro133. Com exceção do interregno 1951–1964, quando esteve sob influência do PCB e incrementou a luta salarial, de 1932 – ano em que foi oficialmente fundado – até hoje, o SMSP tem assumido uma orientação político–sindical conservadora: seja resistindo ao avanço das lutas progressistas no período populista, seja apoiando os governos ditatoriais e neoliberais. São pouco mais de 70 anos de existência, durante a maioria dos quais salta aos olhos a tendência ao conservadorismo no plano político, enquanto, no plano reivindicativo, a ação do SMSP, de 1932 até o golpe de 1964, foi de inexpressiva a moderada; na ditadura militar, a ação grevista ficou restrita à oposição sindical metalúrgica, aglutinada em torno do MOMSP. Desde a emergência do "sindicalismo de resultados", o SMSP tem sido atuante na luta grevista e reivindicativa, enquanto no plano político representa uma das principais classe apoio dos governos neoliberais no Brasil.

Na primeira parte deste capítulo, retomamos a história do SMSP com o intuito de ressaltar sua tradição conservadora. Na segunda parte, procuraremos mostrar que, na primeira década neoliberal no Brasil, o SMSP intensificou a mobilização da categoria em torno de reivindicações econômicas que, apesar de defensivas e regressivas, trouxeram para seus filiados algum alento

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diante da crise vivida pelo setor metalúrgico na cidade de São Paulo. Não obstante, na terceira parte do capítulo mostraremos que o SMSP apostou na expansão do "novo assistencialismo", em particular no patrocínio de cursos de qualificação e requalificação profissional (ampliando a oferta de serviços assistenciais financiados pelo Estado tanto para associados quanto para não– associados) e na intermediação de mão de obra, bem como na criação de um "sindicalismo de serviços" – estratégias que levaram o SMSP à ampliação de seu patrimônio e à realização de investimentos de grande monta. Com tais práticas, segundo nossa análise, as lideranças procuraram assegurar alguns interesses imediatos dos metalúrgicos (reposição da inflação, pequenos ganhos com a PLR) e do próprio sindicato (expansão patrimonial e dos negócios sindicais).