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Num segundo momento, a metade final do curso é dedicada à formação na habilitação específica, tendo como eixo norteador a “história da construção de cada uma das áreas específicas das ciências matemáticas e da natureza” (UFMT, 2002, fl. 27).

Estes últimos quatro módulos do curso (dois últimos anos) para a habilitação em Matemática são constituídos por duas componentes: “a) A evolução histórica da Matemática: fundamentos, conceitos e princípios; b) Instrumentalização e prática pedagógica de matemática” (UFMT, 2002, fl. 64).

Com relação a primeira componente, item a, as ementas dos módulos seguem uma linha do tempo para caracterizá-los. Os módulos da habilitação em Matemática são: “Módulo 5 – Números e Formas. A Matemática da Antiguidade. A Matemática da Idade Média”; “Módulo 6 – O Renascimento e a Ciência Moderna. A Matemática no Renascimento”; “Módulo 7 – O Desenvolvimento da Matemática após a Invenção do Cálculo e da Álgebra Moderna”; e “Módulo 8 – A Matemática nos Século XX e XXI. A Ciência do Século XXI e a Teoria da Complexidade”. Logo de saída, nota-se que foram escolhidos momentos históricos marcantes para a composição dos conteúdos de matemática que deverão ser trabalhados em cada módulo.

Para a segunda componente, o item b, as ementas apresentam mais uma intenção de trabalho e de metodologias a serem desenvolvidas do que propriamente uma lista de conteúdos a serem estudados. Como exemplo de tais intenções de trabalho é apontado, em todas as ementas o “desenvolvimento de metodologias” onde será desenvolvida “através de uma experiência matemática rica e diversificada [...] experiências de diversos tipos”, tais como “Resolução de Problemas”, “Atividades de Investigação”, “realização de Projetos”, “Comunicação Matemática”, entre outras. Tais partes das ementas parecem ter sido influenciadas na sua elaboração por pressupostos que consideram que a conquista da interdisciplinaridade se dá em “prática docente inovadora”. Esses pressupostos estão arraigados na própria história de formação de professores de ciências naturais e matemática da UFMT, uma universidade relativamente nova afastada dos grandes centros de produção de conhecimento, que só no final dos anos 1980 teve instalado seu primeiro programa de pós-graduação stricto sensu44.

A componente “b) Instrumentalização e prática pedagógica de matemática”, nos módulos da habilitação em Matemática, são subdivididos em: “Fundamentação Teórica e Evolução de Conceitos”, “Desenvolvimento de Competências e Habilidades”, “Desenvolvimento de Metodologias”, “Projeto Político da Escola” e “Prática de Ensino”.

Na parte “Fundamentação Teórica e de Conceitos” estão indicados estudos sobre a evolução das ideias e princípios filosóficos e conceituais tais como teorias da aprendizagem (Módulo 5), epistemologia das ciências (Módulo 6), professor crítico- reflexivo (Módulo 7), Autopoiese e enação, educação e questões sociais (Módulo 8).

Em “Desenvolvimento de Competências e Habilidades” o projeto faz menção a intenção de se formar um “profissional competente”, desenvolvendo nos alunos “conjunto de atitudes, de capacidades e de conhecimentos relativos a matemática”, que envolvem “raciocinar matematicamente”, “comunicar descobertas e ideias matemáticas”, noções de conjecturas, teoremas e demonstrações, entender problemas e ser capaz de desenvolver processos de resolução, entre outras.

Diversos tipos de metodologias de ensino são elencados no item “Desenvolvimento de Metodologias”, tais como: “Resolução de problemas, atividades de investigação, realização de projetos, comunicação matemática, exploração de conexões, utilização das

44 O curso de Pós-Graduação em Educação Pública iniciou suas atividades em 1988, no antigo Centro de

Letras e Ciências Humanas – CLCH, tendo como coordenador pró-tempore o prof. Dr. Nicanor Palhares Sá.

tecnologias na aprendizagem da Matemática, construção e utilização de materiais manipuláveis, jogos”, que indicam a visão de que é necessário o ensinar a “fazer” instrumentalizando os alunos para que possam ensinar a matemática que lhes é ensinada no curso.

Nos item “Projeto Político Pedagógico da Escola” são indicados estudos sobre a proposta pedagógica da escola, sua relação com a legislação e diretrizes curriculares, a confecção de uma sua, de cada aluno, proposta para a escola estudada. Já na “Prática de Ensino” devem ser desenvolvidos e executados projetos de ensino tendo como base o que foi desenvolvido durante o curso, ou seja, os conteúdos matemáticos e metodologias com seus respectivos instrumentos. Aqui novamente tem-se o reforço da visão instrumentalista de formação de professores, o curso deve garantir aos alunos os conteúdos, métodos e instrumentos que eles desenvolveram na sua prática de docência.

No primeiro módulo desta segunda parte do curso, “Módulo 5 – Números e Formas. A Matemática da Antiguidade. A Matemática da Idade Média”, tem como ementa para a primeira componente, “a evolução histórica da Matemática: fundamentos, conceitos e princípios”, abrange a Matemática da antiguidade, Babilônica, Egípcia e Grega, da Idade Média e as Matemáticas Chinesas, Hindus e Árabes”. Incluindo tópicos de “Educação Matemática nas diversas civilizações da Antiguidade”.

Para a parte de “Instrumentação e Prática Pedagógica de Matemática”, a ementa do Módulo 5 apresenta para o desenvolvimento na parte de prática docente técnicas de observação e de avaliação de ensino, planejamento e elaboração de projeto de ensino, o projeto político pedagógico de uma escola.

A ementa do “Módulo 6 – O Renascimento: Desenvolvimento da Álgebra Clássica e a “Invenção” do Cálculo Diferencial” apresentam soluções de equações algébricas e álgebra clássica, geometria analítica, probabilidade e combinatória, invenção do cálculo diferencial e integral, implicações do Renascimento sobre a educação e a formação de matemáticos.

Para o item b) “instrumentação e prática pedagógica de matemática”, a ementa do Módulo 6 é composto, na parte de “Fundamentação Teórica e Evolução de Conceitos”, com teorias epistemológica e filosofia da ciência; e na parte de desenvolvimento de competências e metodologias para o ensino da matemática por: Resolução de Problemas, atividades de investigação, realização de projetos, comunicação matemática, exploração de conexões, utilização das tecnologias na aprendizagem da Matemática, construção e

utilização de materiais manipuláveis, jogos, reconhecimento da matemática na tecnologia e nas técnicas”.

Para o “Módulo 7: A Organização e o Desenvolvimento da Matemática após a Invenção do Cálculo e da Álgebra Moderna” a ementa apresenta para a primeira componente os itens Cálculo aplicado e séries, álgebra moderna e o teorema fundamental da álgebra, números complexos, análise matemática, conjuntos e números transfinitos, geometrias não-Euclidiana, fundamentos da matemática, escola de matemática moderna.

A segunda componente da ementa reforça o que já foi apresentado como metodologias de ensino de matemática nas ementas anteriores sobre estudos e desenvolvimento do projeto político pedagógico da escola e suas relações com as diretrizes oficiais, complementada com experimentação de prática de ensino.

A primeira componente na última ementa, a do Módulo 8, estabelece conteúdos de matemática desenvolvidos no século XX: Teorema de Gödel, Análise funcional, Topologia geral, matemática qualitativa, teoria da medida de Lebesgue, Bourbaki, caos, fractais e complexidade, análise não-stander, lógica e computação, informática educativa. O segundo componente nessa ementa trata da teoria de Francisco Varela, autopoiese e enação, questões sociais da educação, além do reforço sobre metodologias de ensino de matemática que aparece como conteúdo a ser trabalhado em todas as ementas dos módulos da habilitação matemática.

Como vemos as ementas dos módulos da habilitação para o ensino de Matemática da LCNM busca ajustar-se com a caracterização da ciência feita no projeto do curso como sendo histórica e dependente do contexto social e cultural de sua produção levando em consideração que

O desenvolvimento do conhecimento, por ser processual, não possui a limitação de inicio e fim, consubstanciando-se num continuum em que avanços e retrocessos se determinam e são determinados pelas condições histórico-culturais em que as ciências são construídas (UFMT, 2002, fl. 21).

E expectativa é qualificar os futuros professores para abordarem “as questões cotidianas sob um prisma científico, produzido a partir das percepções construídas historicamente dentro das diversas áreas específicas das ciências naturais”, associarem “os saberes científicos aos condicionantes externos à sua produção”, tenham “uma visão crítica com relação ao papel social da ciência e a sua natureza epistemológica, compreendendo o seu processo histórico-social de construção”.

Portanto, após a sua formação, caberão aos futuros professores tornarem didáticos, ao nível escolar, os conhecimentos historicamente produzidos das ciências e matemática. Assim, para os que propõem o curso a matemática e as ciências escolares são consideradas uma adaptação do conhecimento já produzido e não uma criação original das escolas em resposta aos condicionantes dispostos a ela. Posição não muito diferente do curso, no molde disciplinar tradicional, de Licenciatura em Matemática do Campus de Cuiabá da UFMT analisado anteriormente.

Dessa forma, o projeto de curso não propõe problematizar a escola como espaço gerador de cultura própria, sendo as disciplinas escolares com seus conteúdos, métodos, organização, etc. produto desta cultura. Como consequência, dificulta aos estudantes uma elaboração sistemática sobre o ofício da docência e seus problemas.

Mesmo sendo um projeto de curso de formação de professores que intenta alterar o panorama do ensino de ciências da natureza e matemática nas escolas mato-grossenses, capacitando professores de uma maneira não usual, as referências à escola, sua ambiência e organização como fenômeno a ser compreendida são poucas nos textos dos projetos dos cursos. Neles, há pouca reflexão sobre como as escolas do estado de Mato Grosso se organizam, definem seus conteúdos e condutas a ensinar, suas práticas que permitam a transmissão de conhecimentos e incorporação de comportamentos.

No projeto do curso de Licenciatura em Ciências Naturais e Matemática (LCNM), não há referências a estudos sobre formação de professores, a escola e sua organização para o ensino de ciências e matemática. Constando apenas referências aos trabalhos de Michael Apple e Tomas Tadeu Silva sobre currículo.

Em curso de formação de professores as disciplinas acadêmicas devem contribuir para a reflexão necessária sobre o lócus e instrumento do trabalho docente, as disciplinas escolares, fornecendo ferramentais teóricos aos professores para a construção de significados sobre a educação, a escola, a cultura escolar e suas relações com outras culturas. No caso de licenciatura em matemática, propiciar a elaboração e compreensão sobre significados da matemática escolar. Portanto, os conteúdos das disciplinas acadêmicas de Matemática, das Ciências da Natureza e as suas respectivas Histórias, não são os pontos de chegadas da formação dos professores. Esses conteúdos devem propiciar a problematização do ofício de professor e revelar a sua verdadeira especificidade, que se efetivará em uma prática pedagógica futura na orientação de seus alunos na posse progressiva da matéria escolar, que é o derradeiro ponto de chegada da formação docente.